Nos dias que se seguiram, o hospital tornou-se o meu mundo. Um ciclo de enfermeiras, médicos, dor e a ausência ensurdecedora de Tiago.
Ele não voltou. Mandou algumas mensagens curtas e impessoais.
"Como estás a sentir-te?"
"Precisas de alguma coisa?"
Eu nunca respondi. Cada notificação era um lembrete da sua traição.
A minha mãe tornou-se a minha rocha. Trazia-me comida caseira, lia para mim, e simplesmente sentava-se em silêncio quando eu não queria falar.
Numa tarde, o meu sogro, o Sr. Alves, apareceu. Ele era um homem bom, com olhos cansados que carregavam o peso do mundo.
"Eva, minha querida. Soube do que aconteceu. Sinto muito."
Ele sentou-se na cadeira que Tiago tinha ocupado.
"Vim pedir desculpa em nome do meu filho. Ele não sabe o que faz."
Eu apenas assenti. Não tinha energia para raiva.
"Ele sempre foi assim", continuou o Sr. Alves, a olhar para as suas mãos. "Impulsivo. Tenta ajudar toda a gente, mas acaba por magoar as pessoas que mais importam."
"Ele amava-a?", perguntei, a palavra a sair antes que eu a pudesse parar.
O Sr. Alves suspirou.
"Ele pensava que sim. A Lia... ela tem uma forma de fazer as pessoas sentirem-se necessárias. O Tiago caiu nisso. Mas eu sei, no fundo do meu coração, que ele te ama a ti, Eva. Ele só está perdido."
"Estar perdido não é desculpa para matar o próprio filho", disse eu, a minha voz a quebrar.
As lágrimas voltaram. O Sr. Alves estendeu a mão e pousou-a no meu braço, um gesto de conforto paterno.
"Eu sei. Não há desculpa. Mas ele vai arrepender-se disto para o resto da vida. Por favor, não desistas dele ainda."
Eu queria acreditar nele. Uma pequena parte de mim, a parte que ainda se lembrava do homem por quem me apaixonei, queria acreditar.
Mas depois lembrava-me da publicação nas redes sociais, da sua ausência, da sua escolha.
Quando o Sr. Alves saiu, a minha mãe olhou para mim.
"O que vais fazer?"
"Eu não sei, mãe. Eu não sei."
Naquela noite, não consegui dormir. A dor na perna era intensa, mas a dor no meu coração era pior.
Peguei no telemóvel e, contra o meu bom senso, procurei o nome de Lia outra vez.
Havia uma nova publicação. Uma fotografia dela e de Tiago, sentados juntos numa cafetaria. Ele tinha o braço à volta dos ombros dela. A legenda dizia: "O meu porto seguro nestes tempos difíceis."
O meu porto seguro.
Senti uma náusea. O telemóvel escorregou-me da mão e caiu no chão.
A decisão foi tomada. Não por raiva, mas por uma clareza fria e dolorosa.
Acabou.
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