Capítulo 3 A Traição Revelada

Capítulo 3 – A Traição Revelada

Na manhã seguinte, o apartamento estava vazio. O cheiro do perfume barato de Bárbara ainda pairava no ar, como um insulto persistente.

Júlia se levantou com dificuldade. O corpo doía, o estômago revirava, mas a mente estava afiada como nunca. Aquela noite no banheiro mudara algo dentro dela. Chega de fingir. Chega de aguentar.

Enquanto esquentava um café fraco o único que conseguia suportar desde que começou a quimioterapia, seu celular vibrou. Era uma mensagem de Bárbara.

> "Oi, amiga! Passa aqui em casa mais tarde? Tenho uma novidade para te contar!! Beijos"

Júlia encarou a tela por um longo tempo. O descaramento era quase cômico.

Ao meio-dia, foi até o trabalho. Mesmo com o atestado médico em mãos, insistira em não se afastar.

Precisava da rotina, do mínimo de dignidade que ainda restava. Mas naquela manhã, tudo parecia mais claro, como se um véu tivesse caído.

Os olhares das colegas. Os cochichos.

Ela passou pela sala de reuniões e viu Rodrigo conversando com Bárbara.

Ambos rindo. Intimidade visível. Ela percebeu, com uma estranha calma, que aquilo não era recente. Era um caso antigo.

Um que se manteve escondido enquanto ela acreditava estar sendo amada, apoiada, protegida.

Na saída, ela passou por eles como se fossem fantasmas. Mas parou. Respirou fundo. E voltou.

- Rodrigo - chamou com firmeza. - Podemos conversar?

Bárbara fez menção de sair, mas Júlia a deteve com um olhar gelado.

- Os dois. Quero conversar com os dois.

Rodrigo cruzou os braços. Bárbara sorriu, forçando uma simpatia enjoativa.

- Claro, amiga. O que houve?

- Há quanto tempo vocês estão juntos?

O silêncio caiu como uma bomba.

Rodrigo desviou o olhar. Bárbara fingiu surpresa.

- J-juntos? Júlia, do que você está falando?

- Não precisa mentir. Eu vi. Em casa. Ontem à noite.

Rodrigo bufou, como se ela fosse um incômodo menor.

- Vai mesmo fazer escândalo no escritório?

- Vai mesmo me trair na minha cama e agir como se fosse a vítima?

Bárbara corou, depois mudou o tom. A máscara caiu.

- Você nunca fez esse homem feliz, Júlia. Sempre foi apagada, fraca, doente...

- Doente? - Júlia interrompeu, com a voz tremendo. - Eu tenho câncer, Bárbara. Estou morrendo. E mesmo assim, você... vocês dois...

Ela parou. O peso da verdade era quase insuportável. Mas dentro da dor, havia algo novo: ódio. Um ódio gelado e calculado. Pela primeira vez, ela não sentiu pena de si mesma. Sentiu nojo deles.

- Tudo o que vocês fizeram... vocês vão pagar. Um dia. Eu juro.

Rodrigo deu um passo à frente.

- Jura? Com quanto tempo de vida? Um mês? Dois?

O tapa veio automático. Estalou alto, ecoando pelo corredor vazio.

- Eu posso estar morrendo - disse Júlia, encarando-o nos olhos. - Mas vocês vão apodrecer em vida.

Ela saiu dali com o coração disparado. Pela primeira vez, não como vítima, mas como inimiga declarada.

Naquela noite, o corpo de Júlia não aguentou.

Sozinha no quarto, sentiu a dor no peito, a respiração falhar, a visão escurecer. Caiu de joelhos.

Enquanto tudo sumia ao seu redor, uma única frase ecoava em sua mente:

"Se eu pudesse voltar... faria tudo diferente."

Então, veio a escuridão.

Silêncio absoluto.

Até que...

Uma luz.

Uma sensação de queda.

E o som insistente de um despertador.

Júlia abriu os olhos.

Estava de volta ao seu antigo quarto.

Com cabelo. Com força. Com vida.

E no celular... a data: 15 de janeiro de 2015.

Exatamente dez anos antes.

            
            

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