Eu fiz uma expressão de compaixão. "Eu sinto muito pelo Prince. Fiquei sabendo do que aconteceu. Foi horrível."
"Foi inexplicável," disse minha tia, balançando a cabeça. "Um minuto ele estava bem, no outro... aconteceu aquilo. Mariana acha que ele foi envenenado."
Meu coração deu um pulo, mas mantive a calma. "Envenenado? Mas como? Onde?"
"Ela não sabe. Ela fica repetindo que ele comeu alguma coisa. Ela me perguntou mil vezes o que ele comeu ontem à tarde." Minha tia me olhou, os olhos cansados buscando respostas. "Eu disse a ela que ele não comeu nada, só... aquele biscoito que você deu a ele."
O silêncio pairou entre nós por um segundo.
Eu arregalei os olhos, fingindo choque e horror.
"O biscoito? Tia, não... não pode ser. Era um biscoito do pacote que minha mãe trouxe. Eu comi um também. Eram biscoitos amanteigados normais."
Minha reação foi tão genuína, tão cheia de pânico, que a dúvida no rosto da minha tia se dissipou imediatamente.
"Claro que não, querida. Me desculpe, eu não quis dizer isso," ela se apressou em dizer. "Mariana está fora de si, está procurando culpados onde não existem. É claro que não foi o biscoito."
"Mas... ela acha que fui eu?" Eu perguntei, a voz tremendo. "Tia, por que eu faria uma coisa dessas?"
"Não, não, claro que não," ela me assegurou, pegando minha mão. "Ela não está pensando direito. Ela está apenas com dor. Por favor, esqueça que eu disse isso."
Eu assenti, enxugando uma lágrima falsa. "É terrível. Pobre Mariana. E pobre Prince."
Consegui extrair mais algumas informações dela. Mariana estava tão histérica que a família de Pedro – os Alencar, uma das famílias mais ricas e tradicionais do Rio – teve que intervir. Eles tinham ficado constrangidos com o escândalo no hospital. Afinal, Mariana estava se apresentando para a alta sociedade como a futura nora deles, através de sua conexão comigo e com Pedro. Um comportamento tão descontrolado em público não era bem visto.
Depois que minha tia foi embora, fiquei sozinha com meus pensamentos.
Mariana era estúpida em sua dor. Ela queria meu noivo, minha herança, minha vida, mas não entendia o que sustentava tudo isso. Não era apenas o dinheiro. Era a reputação. A imagem. A discrição. O poder da minha família vinha de décadas de comportamento impecável em público.
Ela, com seu primeiro passo em falso, já havia mostrado que não pertencia a esse mundo. Ela era guiada por emoções cruas e ganância, sem a sofisticação necessária para navegar naquelas águas perigosas.
Na minha vida passada, ela usou minha dor e meu luto para me pintar como instável, enquanto ela se mostrava como a rocha serena e confiável. Desta vez, os papéis se inverteram. Ela era a histérica. Eu era a mãe calma e serena, sofrendo com o barulho em um momento que deveria ser sagrado.
A ironia era deliciosa. Ela me acusava de envenenar seu cachorro, o que era verdade, mas ela nunca poderia provar. E ao fazer acusações tão selvagens, ela só parecia mais louca aos olhos de todos. Ela estava se destruindo.
Alguns dias depois, recebi alta. Minha casa estava cheia de flores e presentes pela chegada de Lucas. Meus pais estavam radiantes. Pedro mal saía do meu lado, um noivo e pai dedicado. A vida que Mariana queria roubar estava florescendo, mais forte do que nunca.
O primeiro grande evento social após o nascimento de Lucas foi o batizado, uma grande festa na mansão da minha família. Todos que importavam no Rio de Janeiro estariam lá.
Eu sabia que Mariana viria. Ela não perderia a oportunidade de tentar se reafirmar no círculo social, de tentar consertar o estrago em sua imagem.
Eu a vi chegar. Ela estava usando um vestido elegante, mas caro demais para a ocasião, um pouco chamativo. Havia uma tensão em seu sorriso, uma dureza em seus olhos que não estava lá antes. Ela parecia mais magra, o rosto abatido apesar da maquiagem pesada.
Ela caminhou pelo salão, tentando se misturar, mas eu podia ver os olhares. As pessoas sussurravam umas com as outras, olhando discretamente em sua direção. A história do cachorro no hospital havia se tornado uma fofoca macabra na alta sociedade.
Nossos olhos se encontraram do outro lado do salão. O ódio em seu olhar era puro, sem disfarces. Ela sabia. Ela não podia provar, mas em seu coração, ela sabia que eu era a responsável.
E eu devolvi o olhar. Não com ódio, mas com um sorriso calmo e sereno. O sorriso de uma anfitriã graciosa. O sorriso de uma vencedora.
O confronto era inevitável. E estava prestes a acontecer, na frente de todos.
Ela começou a caminhar em minha direção. No meio do caminho, ela foi interceptada por Pedro.
"Mariana," ele disse, o tom formal e um pouco frio. "Que bom que veio."
"Pedro," ela sorriu, tentando injetar calor em sua voz. "Eu não perderia o batizado do pequeno Lucas por nada. Ele é um anjo."
"Ele é. Com licença, preciso falar com alguns convidados."
Ele a dispensou educadamente, mas com uma finalidade que a deixou parada no meio do salão por um momento, desajeitada e sozinha.
As pessoas viram. As pessoas notaram. O noivo da anfitriã mal lhe dera atenção.
A humilhação dela estava apenas começando.