Culpados? O pensamento era tão absurdo que uma risada histérica borbulhou no meu peito. Eles eram incapazes de sentir culpa.
"Você acha que isso é algum tipo de performance?", ele rugiu, agarrando meu braço e me arrastando para fora. "Você acha que morrer vai resolver alguma coisa? Não vai! Seus pecados são grandes demais!"
Ele estava gritando, seu rosto a centímetros do meu. Em sua fúria, ele me empurrou.
Perdi o equilíbrio no degrau de cima do escritório. Houve um momento de leveza, e então um baque doentio quando bati nos degraus de pedra abaixo. A dor explodiu nas minhas costas e na minha cabeça, e o mundo se dissolveu em escuridão.
Acordei com a sensação de chuva fria no rosto. Estava escuro. Eu estava deitada em uma poça de água e sangue no pé da escada do cemitério.
Eles me deixaram lá.
Cada parte do meu corpo gritava em agonia. Minha perna estava dobrada em um ângulo antinatural. Tentei me levantar, mas uma onda de náusea e dor me fez desabar novamente.
Lentamente, meticulosamente, comecei a rastejar. Arrastei meu corpo quebrado pela lama e pela chuva, deixando um rastro de sangue borrado para trás. Cada movimento era um novo inferno, mas eu não podia ficar ali.
Não sei quanto tempo levei para chegar à estrada, ou como consegui chamar um táxi. O motorista parecia horrorizado, mas me levou para o pronto-socorro mais próximo.
Era quase amanhecer quando finalmente cheguei à mansão.
Caio estava esperando na sala de estar, sentado no escuro como um predador.
"Você entende seu erro agora?", ele perguntou, sua voz um rosnado baixo.
Eu estava envolta em bandagens novas, minha perna engessada, meu corpo tremendo de exaustão e dor.
"Sim", sussurrei, minha voz rouca.
"Qual foi o seu erro?", ele pressionou, levantando-se e caminhando em minha direção.
Eu apenas balancei a cabeça, lágrimas de puro desespero traçando caminhos pela sujeira em meu rosto.
"Bom", disse ele, um lampejo de satisfação em seus olhos. Ele parecia satisfeito com meu estado de quebrantamento. Ele se virou e subiu as escadas, deixando-me mancar de volta para o meu quarto no sótão.
Algumas semanas depois, eles me forçaram a ir a uma festa luxuosa em um iate. Era para Heloísa. Uma celebração de sua "recuperação" e "bravura".
Fui vestida com um vestido simples e sem graça e obrigada a ficar nas sombras, um fantasma no banquete. Observei enquanto Heloísa, radiante em um vestido de grife, era brindada por meu irmão, por nossos amigos, pela elite da cidade.
Observei enquanto Caio ficava ao lado dela, seu braço possessivamente em volta de sua cintura, um sorriso orgulhoso no rosto.
Esta costumava ser a minha vida. Estes eram meus amigos. Este era o homem que havia prometido me amar para sempre.
À medida que a noite avançava, o iate navegava para o mar. Fogos de artifício explodiram no céu, brilhantes explosões de cor que pareciam uma zombaria.
A multidão correu para o convés para assistir, e eu fui varrida junto com eles. O tempo mudou de repente, o vento aumentando, agitando o mar em um frenesi.
O iate balançou violentamente. Alguém tropeçou em mim, e eu perdi o equilíbrio, caindo por cima do corrimão na água negra e agitada.
Ao atingir o mar frio, ouvi outro barulho de água por perto. Olhando para cima, vi Heloísa na água também, se debatendo e gritando.
"Socorro!", gritei, minha voz engolida pelo vento e pelas ondas. "Caio! Nando!"
Eu os vi no convés, seus rostos frenéticos. Caio pulou na água sem hesitar.
Meu coração se apertou com uma esperança desesperada. Ele estava vindo me buscar.
Mas ele não nadou em minha direção. Ele passou por mim, seus olhos fixos em Heloísa.
Ele a alcançou, puxando-a para seus braços, empurrando-a em direção à boia salva-vidas que Fernando havia jogado.
Ninguém olhou para trás. Ninguém me viu afundando sob as ondas. Eles haviam feito sua escolha.