Um carro parou ao meu lado, seus faróis cortando a cortina cinzenta de chuva. A porta do passageiro se abriu e Isabela Almeida se inclinou para fora, segurando um guarda-chuva. Seu sorriso era enjoativamente doce.
"Você vai pegar uma pneumonia aqui fora", disse ela, sua voz carregada de falsa preocupação. "Precisa de uma carona?"
Eu apenas a encarei, um animal preso no brilho de um predador.
"Ah, não me olhe assim", ela ronronou, saindo do carro. O guarda-chuva protegia seu cabelo perfeitamente penteado e seu vestido caro, enquanto eu estava encharcada e derrotada. "Eu não sou a inimiga."
Ela deu um passo mais perto, seus olhos me examinando com uma mistura de pena e triunfo. "Ele me contou tudo, sabe."
Meu sangue gelou. "Tudo?"
"Sobre o pequeno arranjo de vocês", disse ela, sua voz baixando para um sussurro conspiratório. "Como ele te tinha na palma da mão. Como você estava tão desesperada para salvar sua família patética que faria qualquer coisa que ele pedisse."
Minha mente voltou, não para a coação, mas para o começo. Antes das ameaças e da chantagem. De volta a um tempo que parecia outra vida, quando eu era apenas uma garota na Academia de Polícia, a melhor da turma, cheia de ideais. Caio Mendonça tinha sido um palestrante convidado, um jovem agente brilhante com olhos que viam através de mim. Nós nos conectamos instantaneamente, duas mentes afiadas atraídas uma pela outra. Conversamos por horas sobre justiça, sobre mudar o mundo. Eu tinha sido tão ingênua. Eu me apaixonei pelo homem, não pelo distintivo.
Nossas famílias eram o abismo entre nós. Meu pai, o Don, viu um Mendonça e viu o inimigo. Ele me forçou a abandonar a academia, me puxando de volta para a gaiola dourada de nosso império criminoso. Ele me disse que um homem como Caio nunca me aceitaria de verdade, que nossos mundos nunca poderiam se fundir. Eu o odiei por isso na época, mas agora, suas palavras pareciam uma profecia.
Anos se passaram. Não nos vimos novamente até que ele se tornou o agente principal de uma força-tarefa dedicada a derrubar a família Moretti. Quando ele me encurralou, o calor em seus olhos havia desaparecido, substituído por uma determinação fria e calculista. A escolha que ele me deu não era escolha alguma: tornar-me sua amante secreta e informante, ou ver minha família queimar. Eu os escolhi. Sempre eles.
"Você não tem ideia do que está falando", consegui dizer, minha voz rouca.
O sorriso de Isabela se alargou, uma coisa cruel e afiada. "Ah, eu acho que tenho." Ela se inclinou mais perto, seu perfume enjoativo no ar úmido. "Ele me disse que você era apenas um jogo. Um meio para um fim. Uma maneira de manter seu pai na coleira enquanto ele reunia provas suficientes para destruí-lo."
As palavras eram como pequenos e afiados cacos de vidro se cravando em meu coração.
"Ele me disse que você era um peão", ela continuou, sua voz um silvo venenoso. "Um brinquedo com o qual ele se cansou de brincar. Você realmente achou que ele poderia amar alguém como você? A filha de um mafioso?"
Uma única lágrima quente escapou e traçou um caminho pela chuva fria em minha bochecha. A última brasa de esperança dentro de mim se extinguiu, deixando para trás nada além de cinzas frias e escuras.
"Então, faça um favor a todos nós", disse Isabela, sua voz endurecendo. "Esqueça-o. Desapareça. Você já cumpriu seu propósito."
Ela voltou para o carro, a porta batendo com um ar de finalidade. Enquanto o carro se afastava, eu a vi olhar para trás, seu rosto emoldurado na janela, uma imagem de satisfação presunçosa.
A próxima vez que vi Caio, foi no ambiente estéril e impessoal de uma suíte de hotel que ele usava para nossas... reuniões. Dias se passaram. Eu não comia. Eu não dormia. Eu era um fantasma assombrando as ruínas da minha própria vida.
Ele estava parado junto à janela, assim como naquela noite, olhando para a cidade. Ele não se virou quando entrei.
"Você está um caco", disse ele, sua voz desprovida de simpatia.
"Eu me sinto como um", respondi, minha voz plana. Caminhei em sua direção, parando a alguns metros de distância. "Me diga uma coisa, Caio. Algo daquilo foi real?"
Ele finalmente se virou para me encarar, sua expressão indecifrável. "Do que você está falando?"
"Isabela me contou o que você disse a ela", falei, minha voz tremendo apesar de meus melhores esforços para mantê-la firme. "Que eu era um peão. Um brinquedo. É verdade?"
Um fantasma de sorriso tocou seus lábios, uma coisa cruel e zombeteira. "Ela tem um talento para o drama."
"Então você nega?", insisti, uma lasca desesperada de esperança que eu não conseguia matar crescendo em meu peito.
Ele deu um passo mais perto, seus olhos frios. "Eu nego que fui forçado a fazer qualquer coisa. Você veio até mim, Analu. Por vontade própria."
A mentira era tão descarada, tão audaciosa, que me tirou o fôlego. "Você me chantageou! Você ameaçou minha família!"
"E você obedeceu", disse ele suavemente. "Não tente se fazer de vítima agora. Nós dois conseguimos o que queríamos."
Ele estendeu a mão, segurando meu queixo, seu polegar acariciando minha bochecha. O gesto, antes tão terno, agora parecia uma marca de ferro. "E agora", disse ele, sua voz baixando, "eu tenho a Isabela. Uma mulher do meu mundo. Uma mulher que pode me dar um futuro. Você não pode competir com isso."
A finalidade em sua voz foi como uma sentença de morte. A esperança em meu peito murchou e morreu.
Afastei-me de seu toque, meu corpo recuando como se fosse de uma chama. Peguei um pedaço de papel dobrado da minha bolsa, minha mão tremendo enquanto o estendia para ele.
"O que é isso?", ele perguntou, seus olhos se estreitando.
"Leia", sussurrei.
Ele pegou o papel e o desdobrou. Era um laudo médico do meu doutor. Um laudo confirmando que, duas semanas atrás, eu havia passado por um procedimento. Um aborto.
O filho dele.
Nosso filho.
Observei seu rosto passar de confusão para choque, e então para uma raiva sombria e fervente.
"Quando?", ele exigiu, sua voz um rosnado baixo.
"Não importa", eu disse, minha própria voz ganhando uma força que eu não sabia que possuía. "Está feito. Assim como nós. A partir deste momento, Caio, você e eu não somos nada. Acabou."