Os Olhos da Herença
img img Os Olhos da Herença img Capítulo 2 Oito anos antes
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Capítulo 6 O que nunca voltou img
Capítulo 7 Os olhos que não se esquecem img
Capítulo 8 A verdade não dita img
Capítulo 9 As coisas que não podem ser ignoradas img
Capítulo 10 Mães img
Capítulo 11 Margaret Hale img
Capítulo 12 O anel img
Capítulo 13 Pai img
Capítulo 14 As mulheres Hale e Ferrari img
Capítulo 15 A forma exata do lar img
Capítulo 16 O preço do nome img
Capítulo 17 Aviso img
Capítulo 18 Véspera de Natal img
Capítulo 19 Rotinas frágeis img
Capítulo 20 A primeira linha img
Capítulo 21 O que é nomeado img
Capítulo 22 O ano que não dava medo img
Capítulo 23 Sobrenomes, batimentos e promessas img
Capítulo 24 A Imagem img
Capítulo 25 Controle de danos img
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Capítulo 2 Oito anos antes

A universidade estava em plena movimentação.

Era outono, e as árvores do campus começavam a se tingir de tons âmbar e dourados. Estudantes caminhavam apressados com cafés nas mãos, mochilas carregadas de livros e conversas que se misturavam no ar. Para muitos, era apenas mais um dia de aula. Para Isabella Ferrari, era o início do terceiro ano e a sensação - ainda tímida - de que estava exatamente onde deveria estar.

Ela cursava Design de Interiores e passava grande parte do tempo entre plantas, maquetes e amostras de tecidos. Não era a aluna mais barulhenta nem a mais popular, mas havia algo em seu olhar atento e na maneira como observava os espaços que fazia com que os professores a notassem. Isabella via o que os outros deixavam passar.

Naquela manhã, chegou atrasada a uma disciplina optativa compartilhada com estudantes de Economia e Arquitetura. Entrou com cuidado, tentando não interromper, e procurou um lugar livre em uma das fileiras do meio.

- Está ocupado? -sussurrou, apontando para a cadeira vazia ao lado de um jovem loiro que escrevia concentrado no caderno.

Ele levantou o olhar.

Alexander Hale não estava acostumado a ser desconcertado, mas foi exatamente isso que aconteceu.

Não foi apenas a beleza dela - embora a tivesse notado de imediato -, e sim a naturalidade com que aguardava a resposta, sem ansiedade, sem necessidade de aprovação.

- Não -respondeu-. Fique à vontade.

Isabella se sentou, agradecida, e começou a tirar suas coisas da bolsa. Alexander voltou a olhar para a frente, mas sua concentração já não era a mesma. Havia algo nela que o inquietava de um jeito novo.

A aula avançou entre conceitos teóricos e exemplos práticos. Em determinado momento, o professor pediu que formassem grupos para um trabalho interdisciplinar.

- De três -indicou-. Podem escolher.

Alexander suspirou em silêncio. Detestava trabalhos em grupo, mas sabia que não tinha escolha. Virou levemente a cabeça em direção a Isabella.

- Se você quiser... podemos fazer dupla... quer dizer, grupo -propôs-. Eu ainda não tenho.

Ela o olhou, avaliando-o por um segundo.

- Tudo bem -disse-. Mas eu sou de Design. Espero que isso não seja um problema.

Alexander sorriu pela primeira vez.

- De forma alguma. Vai ser bom ter alguém que pense diferente.

Assim, sem dramatização nem frases memoráveis, tudo começou.

Nas semanas seguintes, passaram a se encontrar com cada vez mais frequência. Na biblioteca, na cafeteria do campus, nos corredores. O trabalho virou desculpa, e a desculpa, costume.

Alexander descobriu que Isabella tinha uma sensibilidade especial para os detalhes. Falava dos espaços como se tivessem alma. Isabella, por sua vez, percebeu que Alexander não era apenas "o garoto brilhante de Economia". Tinha uma mente afiada, sim, mas também uma curiosidade genuína e um humor seco que surgia quando ela menos esperava.

- Você é sempre tão sério? -perguntou ela certa tarde, enquanto revisavam esboços.

- Não -respondeu ele-. Só quando tento parecer responsável.

Ela riu, e aquele som ficou gravado nele.

Alexander vinha de um mundo de regras claras, expectativas altas e pouco espaço para erros. Isabella, em contrapartida, parecia se mover com uma liberdade que ele nunca tivera. Não falava de sobrenomes nem de futuros escritos em pedra. Falava de projetos, de ideias, de sonhos.

Sem perceber, Alexander começou a procurá-la.

Isabella começou a esperá-lo.

Numa tarde, depois de uma aula longa, caminharam juntos até a saída do campus. O sol se punha entre os prédios e o ar estava fresco.

- Quer tomar um café? -perguntou ele, quase como se a resposta não importasse.

- Quero -disse ela-. Vai me fazer bem.

Sentaram-se em um bar pequeno, longe do barulho. Conversaram por horas. Sobre tudo e sobre nada. Sobre o que queriam fazer depois de se formar, sobre o que os assustava, sobre aquilo que ainda não sabiam como nomear.

Alexander não mencionou a mãe.

Isabella não perguntou sobre a família dele.

Ainda não era necessário.

Quando se despediram, ele hesitou por apenas um segundo antes de falar.

- Amanhã... a gente se vê? -perguntou.

Isabella o olhou com aquele meio sorriso que parecia prometer algo mais.

- Amanhã -confirmou.

Naquela noite, nenhum dos dois dormiu muito.

Eles não sabiam que aquele encontro casual em uma disciplina optativa havia marcado o início de uma história que os uniria para sempre.

Nem imaginavam o quanto, anos depois, doeria lembrar daquele começo.

Mas naquele momento, oito anos atrás, tudo era simples.

E, pela primeira vez, ambos sentiram que algo importante acabava de começar.

            
            

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