Eu apenas o encarei, sem piscar. Suas palavras eram um zumbido monótono contra o zumbido em meus ouvidos, o eco de sua traição.
Ele suspirou, depois enfiou a mão no bolso do paletó. Ele tirou uma pequena caixa de veludo. Minha respiração falhou. O que era isso? Outra manipulação? Outra bugiganga para comprar meu silêncio?
Ele abriu a caixa. Dentro, aninhado em cetim azul, havia um medalhão de prata. Era intricadamente esculpido, uma peça delicada, quase antiga. A prata estava gasta em alguns lugares, sugerindo anos de manuseio. Era lindo, inegavelmente.
"Isso pertenceu à minha mãe," ele disse, sua voz surpreendentemente gentil, infundida com uma rara vulnerabilidade. "Ela o usava todos os dias. Tem as iniciais dela, entrelaçadas com as do meu pai." Ele traçou o padrão com o polegar. "É uma das poucas coisas que me restam dela."
Meus olhos, contra minha vontade, foram atraídos para o medalhão. Era um pedaço dele, um pedaço de sua história, algo pessoal e querido. Ele estava me oferecendo um pedaço de sua alma. Ou assim parecia.
"Eu o procurei por anos," ele continuou, seu olhar vagando pela prata. "Finalmente o rastreei. Foi... difícil. Mas eu sabia que você apreciaria. Seu amor pela arte, pela história, por coisas que contam uma história..." Ele olhou para mim, seus olhos suplicantes, procurando por uma faísca da antiga Alice, aquela que poderia ter se comovido com tal gesto.
Um tremor percorreu meu corpo. Uma rachadura minúscula, quase imperceptível, em minha casca endurecida. O medalhão era lindo. Era pessoal. Era dele. Seria essa a sua maneira de se desculpar? Sua maneira de me mostrar que me valorizava, além da fusão, além de Bianca? Um lampejo da esperança tola que eu pensei ter extinguido tentou se acender.
Estendi a mão, minha mão enfaixada tremendo ligeiramente, e peguei o medalhão. Seu peso era frio contra minha palma. Eu o abri. Dentro, duas fotografias desbotadas em tons de sépia. Sua jovem mãe, sorrindo, vibrante. E um homem de aparência severa, presumivelmente seu pai. Uma família. Uma história de amor. Tão diferente da minha.
"Obrigada," eu disse, minha voz plana, desprovida de emoção, as palavras um eco oco no quarto estéril. Eu não ia lhe dar a satisfação de ver minha emoção. Não agora. Nunca mais.
Ele me observou, um lampejo de incerteza em seus olhos. Uma leve carranca franziu sua testa. Ele não conseguia mais me ler. Bom.
Nesse momento, a porta do meu quarto de hospital se abriu com um estrondo. Miller, o segurança, estava lá, parecendo agitado. "Sr. Montenegro! Ligação urgente! É do gabinete do Presidente. Prioridade máxima."
O olhar de Caio se desviou de mim para Miller, seu rosto instantaneamente revertendo para sua precisão controlada e militar. O breve momento de vulnerabilidade se foi, substituído pela máscara impenetrável do poderoso herdeiro político. "Eu tenho que atender," ele disse, sua voz ríspida. Ele se virou para mim, seus olhos suavizando ligeiramente. "Eu volto. Descanse. Miller garantirá que ninguém a incomode." E então ele se foi, um turbilhão de dever e autoridade, deixando-me sozinha com o medalhão na mão.
Ele sempre ia embora. Sempre. Sua vida, seus deveres, seu 'amor inesquecível'... sempre o afastando.
Apertei o medalhão com força. O medalhão de sua mãe. Um símbolo de amor, de permanência. Ele pensou que isso me amoleceria. Ele pensou que isso lhe compraria tempo. Mas tudo que fez foi alimentar minha resolução. Ele pensou que isso era uma oferta de paz. Eu o transformaria em uma arma.
Os dias que se seguiram foram um borrão de descanso forçado e observação silenciosa. Meus ferimentos cicatrizaram lentamente, meu corpo se recuperando, mas meu espírito permaneceu uma paisagem estilhaçada. Miller, fiel à palavra de Caio, era uma presença constante e discreta do lado de fora da minha porta. Sem visitantes. Sem telefonemas. Apenas o silêncio estéril do hospital.
Mas mesmo dentro desses limites, a verdade das prioridades de Caio era dolorosamente clara. Da minha janela, eu podia ver o quarto de Bianca, do outro lado do pátio, em um andar inferior. E eu o via. Várias vezes ao dia. Ele estaria lá, sentado ao lado da cama dela, segurando sua mão, murmurando para ela. Às vezes, ele lhe trazia flores. Às vezes, ele apenas sentava e a observava dormir, seu rosto marcado por uma ternura que ele nunca me mostrou.
Eu o observava, uma espectadora silenciosa e invisível de sua história de amor perfeita e trágica. Cada avistamento era uma nova facada no meu estômago, um lembrete da minha irrelevância. Ele saía do quarto dela, às vezes parecendo cansado, às vezes preocupado, mas sempre voltava. Nenhuma vez ele veio ao meu quarto depois daquela breve visita. Nenhuma vez ele perguntou a Miller sobre mim.
Ele era devotado. E sua devoção não era para mim. O conhecimento se instalou no fundo dos meus ossos, frio e pesado. Ele estava completamente desapegado de mim agora. E eu estava completamente desapegada dele. Isso era bom. Era libertação.
Uma tarde, uma enfermeira entrou correndo no meu quarto, parecendo agitada. "Sra. Drummond! Você viu? Seu... seu medalhão? O de prata?"
Meu coração deu um salto. O medalhão. Eu o havia deixado na minha mesa de cabeceira. Olhei. Tinha sumido. Meu estômago se contraiu. "Não," eu disse, minha voz aguda. "Não está aí. O que aconteceu?"
"Oh, céus," a enfermeira torceu as mãos. "Eu... eu pensei... bem, eu vi a Sra. Valente mais cedo, ela estava andando por aí, se sentindo muito melhor. Ela estava o admirando. Eu só pensei que talvez..." Ela parou, seus olhos arregalados com um horror crescente.
Bianca. Claro. Ela o havia pegado. A audácia. A petulância. Ela queria apagar todos os vestígios de mim da vida de Caio, até mesmo o medalhão de sua mãe. A audácia era quase admirável. Quase.
Uma raiva fria, precisa e focada, agitou-se dentro de mim. Isso não era sobre Caio. Era sobre minha propriedade. O legado de sua mãe. E o desrespeito flagrante dela.
Arranquei o soro do meu braço, ignorando os gritos de pânico da enfermeira. "Onde ela está?" exigi, minha voz baixa e perigosa.
"A Sra. Valente está na sala de fisioterapia," a enfermeira gaguejou, apontando um dedo trêmulo pelo corredor. "Mas, Sra. Drummond, você não deveria estar fora da cama!"
Eu a ignorei, meus pés descalços batendo no chão frio. Meu braço ainda doía, minha cabeça ainda latejava, mas uma nova onda de adrenalina me impulsionou para frente. Eu não me importava com meus ferimentos. Eu só me importava em pegar aquele medalhão de volta. E fazer Bianca entender que eu não era uma mulher com quem se brincava, não mais. Nunca mais.
Encontrei Bianca em uma sala grande e bem iluminada, fazendo exercícios leves com um terapeuta. Ela estava rindo, um som leve e despreocupado que irritou meus nervos. Ela ergueu os olhos, seu sorriso vacilando quando me viu, meu roupão de hospital pendurado frouxamente, meus olhos em chamas.
"Alice!" ela ofegou, seu rosto empalidecendo. "O que você está fazendo aqui?"
"Onde está, Bianca?" exigi, minha voz perigosamente suave. "O medalhão. O medalhão da mãe do Caio. Devolva."
Ela apertou o peito, fingindo inocência. "Medalhão? Não sei do que você está falando."
"Não minta para mim," eu sibilei, dando um passo mais perto, meus olhos queimando nos dela. "Você o pegou. Eu sei que pegou."
Seu terapeuta, sentindo a tensão crescente, se interpôs entre nós. "Sra. Drummond, por favor. A Sra. Valente está se recuperando. Você precisa voltar para o seu quarto."
"Fique fora disso," avisei, meu olhar nunca deixando o de Bianca. "Isso é entre nós."
Bianca, vendo minha fúria inabalável, abandonou seu ato inocente. Um sorriso zombeteiro brincou em seus lábios. "E se eu peguei? É só um medalhão velho e bobo. Caio não vai se importar. Ele me deu, de qualquer maneira."
"Ele me deu," eu corrigi, minha voz fria. "Ele deu para a esposa dele."
"Ah, Alice," ela simulou, sua voz pingando condescendência. "Você realmente está delirando, não está? Ele está comigo. Ele se casou com você como um negócio, uma conveniência. Ele me ama. Sempre amou. Sempre amará." Ela respirou fundo, seus olhos brilhando com malícia. "E aquele medalhão? Provavelmente está melhor comigo. Você vai apenas perdê-lo, ou estragá-lo, como você estraga tudo em sua vida."
Minhas mãos se fecharam em punhos. A raiva era uma força fria e pura agora. "Onde está, Bianca?"
Ela riu, um som triunfante e zombeteiro. "Ah, eu o coloquei em um lugar seguro. Um lugar especial. Um lugar que você nunca encontrará." Ela fez uma pausa, seus olhos se estreitando. "A menos que você esteja disposta a procurá-lo. Está na ala abandonada do hospital. O antigo necrotério. Lá no porão. Boa sorte com isso, 'rebelde indomável'. Espero que não tenha medo de fantasmas."
Meu sangue gelou. O antigo necrotério. Ela estava tentando me assustar. Tentando me fazer parecer tola. Mas ela me subestimou. Ela subestimou o quanto eu odiava ser manipulada.
"Você é uma vadia doente e perversa," eu disse, minha voz plana, desprovida de emoção. "E você vai se arrepender disso."
Virei nos calcanhares e saí, deixando seu silêncio atordoado para trás. O antigo necrotério. Ela pensou que poderia me quebrar com um pouco de medo. Ela pensou que poderia esconder o que era meu. Ela estava errada. Muito errada.
Fui para o porão do hospital, meu coração batendo forte, mas uma determinação sombria alimentando meus passos. O ar ficou mais frio, a luz mais fraca. A ala antiga estava deserta, corredores se estendendo em escuridão ecoante. O cheiro fraco de decomposição, de medo antigo, pairava no ar. Meus ferimentos gritavam em protesto a cada passo, mas eu superei a dor. Isso não era mais sobre o medalhão. Era sobre reivindicar o que era meu. Sobre provar a mim mesma, e a ela, que eu não era uma vítima.
Encontrei a porta do antigo necrotério. Era pesada, feita de metal grosso e enferrujado, uma barreira arrepiante para um passado sombrio. Eu a empurrei. O quarto estava envolto em escuridão, o ar pesado e imóvel. Fileiras de lajes de aço frias brilhavam fracamente na fresta de luz do corredor. Minha respiração ficou presa na garganta. Isso era um filme de terror. Mas eu não recuaria.
Entrei, meus pés descalços no chão sujo. E então, a porta pesada bateu atrás de mim. O som ecoou, um baque final e arrepiante. Eu me virei, meu coração pulando para a garganta. Presa.
Uma risada fraca e zombeteira veio do outro lado da porta. Bianca.
"Aproveite a escuridão, Alice!" sua voz, abafada, mas triunfante, gritou. "Espero que encontre o que está procurando! E então... espero que encontre uma saída!"
Bati na porta, meu punho atingindo o metal frio, mas era sólido, inflexível. "Bianca! Me deixe sair daqui!" Minha voz estava rouca, cheia de um medo súbito e gelado.
Sua risada desapareceu, deixando-me na escuridão sufocante, cercada pelos fantasmas do passado. Meu corpo tremia, não apenas pelo frio, mas por um medo primal. Minha cabeça latejava, minhas costelas doíam. Eu estava ferida, sozinha e presa. Em um necrotério.
Tentei acalmar minha respiração, racionalizar. Ela estava apenas jogando um jogo cruel. Ela voltaria. Alguém me encontraria. Mas o silêncio que se seguiu foi ensurdecedor, absoluto. Sem passos. Sem sussurros. Apenas a quietude pesada e opressiva dos mortos.
Minhas pernas finalmente cederam. Deslizei para o chão, agarrando meu braço enfaixado, a dor na minha cabeça se intensificando. A escuridão me pressionava, um cobertor sufocante. Eu estava tão cansada. Tão absolutamente, completamente cansada. Alice Drummond, a rebelde indomável, presa e indefesa.
Um som fraco, como um murmúrio distante, mal registrou através do zumbido em meus ouvidos. Vozes. Lá fora? Ou era apenas minha mente pregando peças? Fechei os olhos, sucumbindo à fadiga avassaladora, a escuridão um esquecimento bem-vindo. Mas mesmo enquanto eu desvanecia, um único pensamento ecoava em minha mente: Ela não vai se safar dessa. Eu não vou deixar.