Capítulo 2 Tristan Slater

Tristan Slater .

Merda. É uma garota. Uma garota de cabelos escuros preso num coque grosso no alto da cabeça , grande olhos azuis e um rosto magro de pele muito clara.

Eu acabei de ameaçar atirar em uma garota , porra!

Tudo que vi quando eu invadi a casa velha na base do chute , foi a lâmina da faca brilhando na escuridão e o movimento de um vulto tentando fugir.

Que diabos ela faz aqui sozinha nesse barraco ? Isso não importa . Ela é a única ajuda que tenho agora. Se eu não der um jeito esse sangramento logo, estou fodido.

A garota deixa a vela no chão e se afasta rapidamente para um canto , longe da luz da vela , se escondendo como ratinho assustado.

- Essa é a única luz que tenho aqui. -Ela diz quase num sussurro .

Corro meus olhos pelo espaço onde a luz pode alcançar e não vejo nada mais que um colchão velho no chão com um cobertor sobre ele e algumas caixas empilhadas num canto.

Porra fodida.

Ela não vai ter nada do que eu preciso para cuidar do ferimento . Também, eu não tenho como ligar para os meus irmãos porque eu deixei cair o meu celular durante um confronto com os homens do maldito Lourenzo num hotel de beira estrada perto daqui. Se eu não conter esse sangramento logo , vou ser um defunto daqui há algumas horas.

-Você está esperando alguém ? -Eu pergunto ,tentando entender que diabos essa garota está fazendo aqui . É uma casa velha e abandonada ,longe do bairro mais próximo e cercada por mato e árvores. E sem luz.

-Não. Não estou esperando ninguém. -Ela respondeu num tom de voz trêmulo.

-Me empreste o seu celular. Preciso fazer uma ligação e perdi o meu.

-Eu não tenho celular. -Ela responde como se estivesse se desculpando por isso.

Que diabos?

-Você está aqui sozinha e está me dizendo que não tem um celular? Que diabos faz aqui afinal de contas? É um lugar perigoso. Um ímã para a desgraça de uma garota sem a porra do juízo funcionando ! Tipo você. - Disparei ,

olhando na direção onde ela está e noto que está tremendo.

- Eu sou uma sem teto ou , mendiga se preferir. Não tenho dinheiro nem pra comer ,imagine pra ter um celular. -dizendo isso, ela se aproximou da luz da vela. Ela está vestindo um casaco de moletom preto grande demais para o seu corpo pequeno e magro e uma calça jeans que já estiveram em dias melhores.

Oh, porra. Eu sou um idiota.

-Eu não tenho um celular, mas se quiser eu posso pedir ajuda. Você precisa de um médico. - Ela diz ,olhando assustada para a minha camiseta rasgada que deixa o meu ferimento amostra e depois para as minhas mãos sujas de sangue. Ela engole em seco ,seus lábios trêmulos e os olhos arregalados como os de corsa sobre um farol de um carro , não escondem o medo que está sentindo. É a primeira vez que o fato de alguém estar com medo de mim me incomoda.

Mas , independente disso , eu gostando ou não do medo estampado nos olhos dela ,ignoro esse sentimento confuso e vou direto ao ponto .

-Eu não posso ir pro hospital . E você não vai chamar ninguém , entendeu? -Eu digo em resposta. Ela assente, seu peito subindo e descendo num ritmo louco. Merda , ela está muito apavorada.

-Eu não vou machucar você . Sinto muito pela ameaça. -deixei a arma de lado e engolindo através da garganta seca , acrescento -Mas não posso deixar você sair daqui sem que eu faça isso primeiro ,ok ?

- Tudo bem. Eu não tenho outro lugar para ir mesmo. - disse ela ,voltando pro canto escuro.

Ficamos em silêncio depois disso ,ela encolhida no canto do cômodo com a cabeça baixa enquanto estala os dedos o que eu acho que é um tipo de tique nervoso ,e eu sentado no chão ,com as costas apoiada na parede e uma mão pressionada no corte para evitar perder mais sangue do que já perdi. Merda. Eu estou perdendo o foco.

As minhas pálpebras estão ficando pesadas e a minha visão embaçada. E isso não é nada bom , porra. Eu preciso de uma distração. Não posso me dar ao luxo de apagar agora. Não com a garota aqui.

A primeira coisa que ela fazer se eu apagar é dar no pé e dar com as línguas nos dentes assim que encontrar alguém e esse alguém pode muito bem ser uns dos homens de Lorenzo. Os que sobraram deles.

Eu despistei eles pelo caminho

, mas sei que não vão desistir tão fácil de tentar me encontrar. Não é sempre que eles têm a oportunidade de pegar um membro dos Sombrios sozinho. Principalmente aquele que eles mais anseiam para matar. Eu.

Eu ferrei as coisas pra Lourenzo uma vez. De um jeito bem feio.

E fui bem pago para isso. E desde então, a minha morte se tornou um tipo de honrra pro fodido doente de merda. Ele quer a minha cabeça fora do meu corpo pra empalha-la e exibir prós seus sócios como uma demostração do seu poder. Foi o que uns dos idiotas dele disse antes de eu estourar os seus miolos.

"Boa sorte nisso ,fodido.

Eu olho para a garota e a pego me olhando ,mas rapidamente , ela desvia os olhos para os pés.

-Por que você está aqui, afinal ?-Pergunto.

Ela me olha com a testa franzida .

-Eu já disse , não tenho outro lugar melhor pra ir.

-Eu não quis dizer só aqui ,nessa casa velha e abandonada ,mas no geral. Você disse que é uma sem teto. Quero saber o porquê. Onde está a sua família ?

-Eu não tenho família. -ela responde. Noto que a voz dela está mais firme agora.

-E há quanto tempo vive desse jeito ?

- Há um ano e meio mais ou menos. - ela emite um suspiro fundo como se estivesse desconfortável com a conversa. - Posso dar uma olhada no seu ferimento ? Talvez eu possa fazer alguma coisa.

Essa garota é mesmo real ?

- Claro. Fique à vontade. -eu respondo , surpreso que mesmo depois de eu tê-la ameaçado com a arma ela ainda quer me ajudar.

Com passos hesitantes, ela se aproxima e fica de joelhos na minha frente e observa o meu ferimento.

-É muito fundo e está sangrando muito.Você pode morrer se não for para o hospital. -Ela disse , pavor moldando cada palavra da sua voz suave.

-Que seja , mas nada de hospital.

Ela levantou as sobrancelhas e apertou os lábios como se tivesse ficado irritada com o que eu disse.

- Então esse é o seu plano ? Me obrigar a assistir você sangrar até a morte ? É sério isso? Que idiota! -disse ela , se afastando bruscamente.

Porra ! Onde diabos foi parar o ratinho assustado ? Se bem que, uma pequena coisa fofa furiosa é muito mais interessante. Sorrio .

- Não se preocupe. Você não vai me assistir morrer. Eu aviso antes para poupá-la desse pesadelo.

-Isso não é nem um pouco engraçado. A minha vida já é uma merda para ter a sua morte na lista me causando pesadelos. -Ela saiu pisando duro e desapareceu por uma porta onde a luz não podia alcançar ,me deixando ali com um sentimento estranho que nunca senti antes apertando o meu peito. Seria remorso? Talvez.

            
            

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