Capítulo 3 O tempo não espera

"Ei, parem com isso! Em que época estamos?"

Eles me olharam confusos, os olhos arregalados, como se o simples fato de eu questionar a realidade tivesse quebrado algum tipo de barreira no tempo. Por um momento, o caos ao nosso redor parecia diminuir. Os gritos e os sons do navio encharcado pela água pareciam ecoar à distância, como se tudo fosse parte de uma alucinação.

- "1760," um deles respondeu, com uma voz grave e cheia de incredulidade. "O que quer dizer com isso?"

"Merda," eu pensei. "Como fui parar aqui? No meio dessa bagunça?" A adrenalina corria pelo meu corpo, e minha mente estava em uma corrida desesperada para entender o que estava acontecendo. O navio balançava com a força das ondas, e o som do canhão que havia explodido ainda ressoava nos meus ouvidos, como um pesadelo vivo.

Sem tempo para mais perguntas ou respostas, ignorei os três homens que me chamavam, ainda tentando entender o que havia acontecido. Meu único foco agora era encontrar o capitão daquele navio, o responsável por essa confusão toda. Se eu tivesse alguma chance de sobreviver a isso, era com ele. Ou então, quem sabe, dar sentido a tudo isso.

Com o coração acelerado, comecei a me afastar dos homens. Eles ainda tentavam me segurar, mas eu estava decidida. "Não tenho tempo," murmurei para mim mesma, "não tenho tempo para isso." Corri pelos corredores estreitos do navio, tropeçando em cordas e caixas empilhadas enquanto o barco balançava violentamente. A água começava a invadir o convés, e eu sabia que, se não agisse rápido, tudo isso acabaria em desastre.

Fui até a escada que levava até o convés superior. O vento batia forte contra meu rosto, e as velas do navio estavam sendo arrastadas como se estivessem prestes a se rasgar. Lá em cima, os marinheiros gritavam ordens e tentavam manobrar o navio, mas o estrondo dos canhões e a fumaça que subia tornavam tudo ainda mais caótico.

Eu precisava de respostas. E rapidamente.

Finalmente, vi o capitão. Ele estava com uma expressão tensa, coordenando a tripulação com uma autoridade inconfundível. Seu cabelo escuro estava preso em um coque, e seu uniforme de capitão, embora desordenado pela luta, ainda refletia uma elegância sombria. Ele estava com os olhos fixos no horizonte, mas eu não sabia se ele me via ou não.

- "Capitão!" gritei, indo em direção a ele. "Preciso falar com você!"

Ele se virou lentamente, e seus olhos se encontraram com os meus. Algo em seu olhar me fez sentir uma mistura de alívio e desconforto. O homem era bonito, mas o tipo de beleza que não era fácil de decifrar. Seus olhos eram intensos, como se carregassem o peso de várias vidas vividas.

- "Você," ele disse, os lábios se curvando levemente, como se já soubesse quem eu era, "o que faz aqui? Você não é uma tripulante."

Senti a tensão aumentar. Como explicar o que eu estava vivendo? Como contar que eu não pertencia a este tempo, que eu vinha de um futuro distante e que agora, por algum motivo inexplicável, estava presa no século XVIII? Não podia parecer uma louca.

- "Eu... não sei como vim parar aqui," comecei, minha voz trêmula. "Mas preciso de ajuda. Este navio está em perigo, e o tempo que temos é... limitado."

Ele me olhou de cima a baixo, avaliando-me com uma mistura de desconfiança e interesse. Ele devia estar se perguntando se eu era uma prisioneira fugitiva ou alguém completamente fora de sua mente.

- "Você fala como se soubesse o que está acontecendo. O que exatamente você sabe sobre esse ataque?" Ele gesticulou para os marinheiros, que estavam agora tentando conter o caos.

Eu hesitei. Era a minha chance de ganhar sua confiança. Mas, ao mesmo tempo, a situação era tão surreal que eu mal sabia o que dizer.

- "O ataque... Eu... não sei os detalhes, mas os canhões são de um inimigo próximo. O que sei é que você deve agir rapidamente. A água está subindo, e a estrutura do navio não vai aguentar por muito tempo."

O capitão me observou por um longo momento, seus olhos examinando minha expressão. Ele parecia estar ponderando as minhas palavras, até que, finalmente, algo em seu olhar mudou. Talvez fosse desespero ou talvez ele apenas tivesse decidido que era mais sensato acreditar em uma desconhecida do que arriscar.

- "Você tem razão," disse ele, num tom firme. "Agora, fique perto de mim. Eu não sei quem você é ou de onde vem, mas se o que diz for verdade, podemos usar toda ajuda possível."

Eu assenti, sem saber se isso era uma bênção ou uma armadilha. Mas, naquele momento, tudo o que eu queria era sobreviver. E, de alguma forma, conseguir entender o que diabos estava acontecendo comigo.

O navio balançava com força, e o vento cortante fazia a água espirrar nas laterais, mas eu ainda estava tentando processar o que estava acontecendo. As palavras do capitão ecoavam na minha mente, misturadas com a confusão do que eu acabara de vivenciar. Mas algo me chamou a atenção. A mão de Sofia, inconscientemente, tocou o colar que ela ainda usava, o mesmo que havia encontrado no buraco durante a escavação. Ele parecia brilhar fraco, quase imperceptível, mas o toque da pedra da lua sob seus dedos causou um arrepio em sua espinha, como se alguma coisa no ar se alterasse.

O colar estava diferente agora. Quando o encontrei, a pedra da lua, de um tom leitoso suave, parecia quase comum, mas agora, sentindo sua textura fria e lisa, ela emitia uma leve vibração, quase como se tivesse vida própria. Não era apenas a beleza peculiar da pedra que chamava a atenção, mas os intrigados detalhes que a rodeavam. O metal que envolvia a pedra tinha símbolos, formas geométricas e linhas que pareciam quase de outro tempo - linhas que dançavam, mudavam ligeiramente, dependendo do ângulo da luz, como se estivessem se adaptando à realidade em que ela agora se encontrava.

"Você... tem certeza que não é uma prisioneira?", perguntou o capitão com uma sobrancelha levantada, interrompendo meus pensamentos. Sua voz grave e autoritária me tirou da distração momentânea, e eu olhei para ele, tentando controlar a respiração acelerada.

Ele era imponente. Usava um uniforme que, mesmo com os sinais de batalha e desgaste, ainda exibia uma certa classe - o tipo de classe que não podia ser tirada por sujeira ou o caos da guerra. Seus ombros largos e sua postura altiva refletiam a confiança de alguém que havia comandado muitos navios ao longo dos anos. Seu cabelo escuro estava preso em um coque baixo, e os fios soltos que caíam sobre sua testa denunciavam o quão agitado estava o ambiente. Os olhos dele, de um tom profundo de azul, pareciam analisar não só a situação, mas também a mim.

- "O que sabe sobre esse ataque?" - ele insistiu, seu olhar fixo na pedra do colar.

Eu, ainda um pouco atordoada, fingi não perceber a intensidade de seu olhar. "Eu... não sei. Mas, de alguma forma, essa guerra está ligada ao que está acontecendo comigo. Eu fui trazida aqui... e não tenho ideia de como ou por quê." Tentei parecer convincente, mesmo que cada palavra fosse um salto de fé.

Ele não parecia totalmente convencido, mas se inclinou levemente, dando-me uma pequena chance de falar. O capitão fez um sinal com a mão para que eu o seguisse, e, antes que eu pudesse responder, ele se virou para a tripulação e começou a ordenar que se preparassem para enfrentar o ataque.

"Fique perto de mim", disse ele, com uma firmeza que indicava que ele não estava acostumado a ter que lidar com distrações. "Mas me avise se souber de mais alguma coisa."

Enquanto ele se afastava, me senti estranhamente conectada ao seu comando, como se algo no fundo de mim soubesse que ele não era apenas um capitão qualquer. Mas então, outra sensação começou a se formar na minha mente, algo que eu já sentia desde o momento em que ele apareceu: uma estranha conexão, algo inexplicável entre nós dois. O colar parecia pulsar levemente em meu pescoço, como se estivesse respondendo à presença dele.

Antes que pudesse me perder em pensamentos, ouvi uma voz familiar e sarcástica atrás de mim.

- "Ah, então é assim que as coisas funcionam agora?" A voz era inconfundível. James. Ele estava ali, de braços cruzados, observando-me com um olhar desafiador. "Você é a nova prisioneira do capitão agora? Pensei que já tivéssemos passado dessa fase."

James... Eu o reconheci imediatamente. Ele era alto, de cabelos castanhos escuros, com uma barba bem feita que só adicionava à sua aparência de "homem de guerra". Sua expressão estava misturada entre uma diversão incontrolável e uma irritação, como se eu fosse um enigma que ele não conseguia resolver. O que me fazia pensar que, talvez, eu também fosse um enigma para ele. O tipo de homem que nunca ficava satisfeito com nada, mas que, ao mesmo tempo, parecia perceber todas as minhas falhas e me provocar com isso.

Ele se aproximou de mim, seus passos pesados ecoando no convés, até que ficou a poucos metros de distância. Eu não queria olhar para ele, mas, como sempre, não consegui evitar.

- "É assim que é, não é?" disse ele, com um sorriso debochado. "Sempre uma prisioneira ou sempre uma intrusa? Ou talvez apenas uma sonhadora perdida no tempo?"

Eu tentei ignorá-lo, mas algo na sua presença me irritava profundamente. Ele parecia estar sempre a um passo de me fazer perder o controle. E, no fundo, havia uma parte de mim que queria entender por que ele parecia tão familiar, como se já o conhecesse, embora soubesse que nunca o havia encontrado antes.

Mas a minha mente estava ocupada demais com outras coisas para me concentrar nele. Eu ainda estava vestindo o pijama de cetim vermelho que tinha usado em casa, algo completamente inadequado para uma situação como aquela. O tecido brilhante e leve grudava em meu corpo com o vento forte do mar, deixando-me ainda mais desconfortável. Eu me sentia completamente deslocada, vestindo algo que certamente não era apropriado para um navio do século XVIII.

"Você não está vestida para a guerra, minha cara," James disse, como se estivesse se divertindo com minha aparência desajeitada. Ele lançou um olhar sutil para minha roupa, um olhar cheio de sarcasmo.

Eu, por outro lado, não sabia se deveria rir ou chorar. Como eu podia explicar que havia sido transportada de um tempo completamente diferente, sem sequer entender como ou por que tudo isso estava acontecendo?

- "James, se você não se calar, vai acabar me matando antes de qualquer outra coisa," disse, tentando manter a calma. Mas a voz dele, agora mais baixa e provocante, parecia se infiltrar em cada pensamento.

- "Ah, você acha que me preocupa, Sofia?" Ele se aproximou mais, sua presença esmagadora. "Eu sou o último homem que você deveria desafiar... principalmente quando está tão perdida quanto agora."

O capitão, que parecia estar ciente de nossa troca, não se afastou, mas observava com atenção. Eu não sabia o que esperar dele, mas, de alguma forma, a situação estava ficando mais e mais tensa.

Eu só sabia de uma coisa: meu coração batia mais rápido com cada palavra que trocava com James. E, por algum motivo, isso me deixava ainda mais confusa.

            
            

COPYRIGHT(©) 2022