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O céu começava a tingir-se de laranja enquanto eu caminhava pelo convés, ainda sentindo o peso das palavras do capitão. Minha mente estava uma bagunça, mas antes que pudesse organizar meus pensamentos, fui interrompida por risos altos e uma cantoria desafinada.
Os marinheiros estavam reunidos perto de um monte de cordas, jogando dados e aparentemente curtindo um raro momento de descontração. Quando passei por eles, os risos cessaram, e todos os olhares recaíram sobre mim.
- "Olhem só, a dama de cetim!" gritou um deles, arrancando gargalhadas dos outros.
Eu tentei ignorar, mas outro continuou:
- "Não é todo dia que temos uma visão dessas por aqui, hein? Quem sabe ela não pode nos dar sorte com os dados?"
Mais risadas. Meu rosto esquentou, mas mantive a cabeça erguida. O terceiro marinheiro, mais ousado, se levantou, bloqueando meu caminho.
- "E aí, senhorita, que tal dividir um gole de rum com a gente? Podemos até ensinar uns truques de navegação."
Ele se inclinou um pouco, tentando parecer sedutor, mas só conseguiu me deixar ainda mais irritada. Antes que eu pudesse responder, uma voz familiar surgiu do nada.
- "Deixem a dama em paz, ou vocês vão acabar lavando o convés até o próximo porto."
Era James, é claro. Ele se aproximou com aquele sorriso insuportável no rosto, mas havia uma firmeza em seu tom que fez os homens recuarem, embora ainda rindo.
Eu suspirei, cruzando os braços.
- "Eu não preciso da sua ajuda."
- "Ah, eu percebi," disse ele, inclinando a cabeça. "Mas vamos ser sinceros: sozinha, você não vai durar muito tempo aqui."
Eu dei um passo à frente, tão perto que podia sentir o cheiro de rum em sua respiração.
- "Você realmente acha que pode falar comigo assim?!"
- "Eu acho que posso falar com você como quiser, princesa," respondeu ele, debochado.
Foi o suficiente. Antes que pudesse pensar, minha mão direita se fechou em um punho, e eu o acertei direto no nariz. James cambaleou para trás, segurando o rosto com uma expressão incrédula.
- "Mas que... você está maluca?!" ele gritou, enquanto sangue começava a escorrer de suas narinas.
Os marinheiros ao redor explodiram em gargalhadas, mas a diversão não durou muito.
A Intervenção do Capitão
- "O que está acontecendo aqui?!"
A voz autoritária do capitão Edward cortou o ar como uma lâmina. Todos os risos cessaram imediatamente, e até James endireitou a postura, embora ainda segurando o nariz.
- "Nada de mais, capitão," respondeu ele, com um sorriso forçado. "A dama só quis mostrar que tem um direto impressionante."
Edward olhou para mim, depois para James, e suspirou profundamente.
- "Vocês dois, na minha cabine. Agora."
A conversa decisiva
Dentro da cabine do capitão, o silêncio era quase palpável. James estava sentado em uma cadeira, pressionando um pano contra o nariz, enquanto eu cruzava os braços, olhando para o chão, ainda furiosa.
Edward nos observou por um longo momento antes de falar.
- "Isso precisa parar. Já temos problemas suficientes sem vocês dois se atacando como cães e gatos."
- "Eu só estava defendendo a honra da senhorita," disse James, com sarcasmo evidente.
- "Ah, claro, porque você é tão honrado," retruquei, sentindo o sangue ferver novamente.
Edward ergueu a mão, pedindo silêncio.
- "Sofia, você precisa entender que estar aqui, no meio de uma tripulação que não vê uma mulher há meses, é... complicado. E você, James, pare de provocá-la como se fosse uma criança. Isso é um navio, não uma taberna."
Ele fez uma pausa, respirando fundo antes de continuar.
- "Sofia, vou providenciar roupas mais adequadas para você. Algo que não... distraia tanto os homens."
Eu abri a boca para protestar, mas ele levantou a mão novamente.
- "Não é uma questão de moda ou conforto. É uma questão de segurança. Sua e de todos aqui."
Relutante, assenti. Ele tinha razão, mesmo que eu odiasse admitir.
Novas roupas e um novo desafio
Na manhã seguinte, Miguel entregou-me um conjunto de roupas que claramente pertenciam a algum membro da tripulação: uma camisa branca folgada e calças de algodão ajustadas com um cinto. Não era exatamente o que eu chamaria de confortável, mas era funcional e, mais importante, não chamava tanta atenção.
Quando apareci no convés com a nova roupa, ouvi algumas assobios e piadinhas, mas nada tão ousado quanto antes. No entanto, James estava encostado no mastro, com aquele sorriso de sempre.
- "Eu gostava mais do cetim," provocou ele.
Eu rolei os olhos, mas não pude evitar um pequeno sorriso. Talvez ele não fosse completamente insuportável.
Mas, enquanto olhava para o horizonte, uma coisa ficou clara: se eu queria sobreviver naquele navio, precisaria mais do que roupas novas. Precisaria conquistar meu lugar entre eles, sem depender de ninguém.