Assumir a direção foi a tarefa mais difícil que já tive em minha vida. Grande parte dos funcionários começaram a me tratar de forma diferente. Foi desafiador encarar com maturidade críticas que vinham de todos os lados, do mais baixo cargo ao mais alto. Mas com o tempo, fui me acostumando a ser o centro das atenções e a ser a líder de uma equipe composta de pouco mais de sessenta pessoas. Como prometi a meu pai, me esforcei o máximo que pude em meu trabalho, e em poucos meses, trouxe de volta o nome de nosso escritório nas mídias, que até então só nos mencionavam para lembrar do trágico acidente que tirou a vida dele e de minha mãe. Os jornalistas sensacionalistas adoravam relembrar a tragédia, um dos motivos pelos quais até hoje em dia eu só assistia Netflix.
Meu foco sempre fora manter o nome do meu avô e do meu pai. E poucos paravam pra pensar na carga que eu carregava em minhas costas com tão pouca idade.
Meu celular tocou, tirando minha atenção da televisão. Era uma mensagem de meu tio me dando bom dia e avisando que só chegaria no
escritório bem mais tarde.
Richard Parker Williams era um dos principais sócios de meu pai na empresa, dono de 45% das ações. Era o meu segundo pai e o que cuidou de mim depois de tudo o que aconteceu. Nossa família não era extensa, minha mãe era filha única, Richard nunca se casou então éramos apenas nós dois.
Terminei meu café da manhã e subi as escadas rumo ao meu quarto. Depois de um delicioso banho peguei minha roupa já pendurada no closet, uma saia lápis cinza e uma blusa de botão branca. Calcei meus scarpins, peguei minha bolsa e desci para encontrar meu motorista, que já me esperava com um sorriso no rosto. Meu pai sempre fazia questão de ter os melhores funcionários à seu lado, e eu seria eternamente grata a ele por ter Carmela e Eric comigo.
- Bom Dia, Srta. Parker. - Ele disse levantando-se do sofá que ficava no hall do prédio.
- Bom Dia, Eric. Como você está?
- Estou bem. O tempo é que está louco hoje. Já fez sol e já choveu, em apenas cinco horas de claridade. - Abriu a porta do carro para mim.
- Normal. Essa cidade é uma bagunça. - Me ajeitei no banco e dei uma olhada rápida no celular para checar o horário.
- Direto para o escritório? - Ele perguntou.
- Sim, por favor.
- Bom dia, Srta. Parker, tudo bem? - Anna me recebeu sorridente entregando meu latte com canela.
- Bom dia, Anna. Tudo bem e com você? - Dei um gole no café.
- Pronta para seu último dia?
Ela assentiu e abaixou a cabeça enquanto caminhávamos até minha
sala.
- Vou sentir falta de ser sua assistente. Aprendi muito aqui.
- Também vou sentir sua falta Anna, acredite. Acho que não terei
uma funcionária tão eficiente quanto você. Mas está na hora de viver como uma advogada, e pode contar comigo para qualquer indicação que precise.
- Muito obrigada. - Ela sorriu. - Falando nisso, recebemos um e- mail do Senhor Flint, da Montgomery, indicando um de seus funcionários para o cargo de Advogado Júnior. Ele pode ser útil para as cortes de níveis médios, elas estão em desfalque ultimamente.
- Uhum - assenti. - Eu não consigo entender porque Montgomery fez essa loucura de fechar o escritório assim do nada. - Cheguei em minha sala e sentei em minha cadeira, tirando os sapatos logo em seguida e sentindo um alívio imenso. Odiava salto, mas sabia que eles faziam parte do look corporativo.
Ela assentiu.
- É o assunto do momento. Tem alguns que falam que é caso de doença, outros dizem que ele devia estar prestes a falir...
- Impossível. - Cortei enquanto assinava alguns papéis que já me aguardavam na mesa.
- É, não sei. - Ela foi pegando os papéis conforme eu ia assinando.
- Só sei que foi um choque para muita gente.
- Eu imagino. Gostaria de pegar mais funcionários dele, mas infelizmente não posso agora. Estamos com a casa cheia. Seria irresponsabilidade pensar em aumento de pessoal.
- Os funcionários dele costumam ser muito bons. Até os estagiários são escolhidos a dedo. Amigos meus que já fizeram prova pra lá disseram que a triagem foi muito difícil.
- Sim, eu sei - suspirei. - Tinha muita mente brilhante ali dentro.
- No e-mail, ele disse que está nos enviando sua galinha dos ovos de ouro. - Ela riu. - O melhor de todos.
- Ótimo. - Sorri. - Fico satisfeita, não teremos tanto trabalho para preencher o cargo. - Entreguei o último papel assinado. - Daqui a pouco eu dou uma olhada no e-mail dele. Qual é a minha agenda de hoje?
- Ah, sim! Tribunal de Apelação às onze, caso Malcomm. Almoço. Reunião com Stela Olivier, caso Olivier versus Estado da Georgia. Livre
depois.
Ah, um dia relativamente tranquilo.
- Será que conseguimos chamar essa tal galinha dos ovos de ouro de
Flint para uma entrevista ainda hoje? - perguntei, fazendo aspas com os dedos. - Você pode tentar entrar em contato com ele?
- Claro, pode deixar. - Ela anotou em seu caderno. - Marco a reunião para o quê, final do dia? Cinco horas?
- Está ótimo, pode ser. É bom que ele tem tempo para se preparar também.
- Ok. Assim que tiver uma confirmação atualizo na agenda virtual e te aviso. - Ela prendeu a caneta em seu caderno.
- Obrigada, Anna. Já disse que vou sentir sua falta? Ela foi em direção à porta.
- Desse jeito você faz com que eu não queira ir embora, chefe.
Capítulo 3
Era oficial. Eu odiava a vida de desempregado.
Era simplesmente angustiante, pela primeira vez em muito tempo, estar acordando depois da hora do almoço em uma sexta-feira. E não estava gostando nem um pouco disso.
Já sentia falta da rotina de trabalho. Acordar cedo, tomar banho, colocar meu terno e tomar café. Porém, a ressaca moral de todos os acontecimentos do dia anterior somados à briga com Megan e ao meu novo colega de apartamento, me colocaram a madrugada inteira em pé. Quando fui dormir, já estava quase amanhecendo.
Em meu celular, havia oito ligações perdidas de Megan e algumas mensagens muito mal educadas. Nelas, chegou até a me acusar de estar negando suas ligações propositalmente, que eu havia provavelmente dormido fora de casa e eram em situações como essa que eu me perguntava o que ainda estava fazendo naquele relacionamento que mais parecia abusivo do que saudável. Não me dei o trabalho de responder aquelas mensagens que mais me machucavam do que davam raiva. Definitivamente precisava ter uma conversa com Megan. E não sabia onde isso ia levar.
Depois de tomar um banho e também ver um recado muito do mal educado de Ethan na geladeira avisando que não tinha comida, decidi que era
uma boa hora para ligar para o escritório que Montgomery me indicara. Eu não conseguiria ficar mais um dia dentro de casa sem ter o que fazer, ou pensando em minha vida pessoal. A ansiedade já estava me consumindo.
- Parker Williams Associates, Anna falando, em que posso ajudar?
- Boa tarde Anna, sou Trenton Miller. O Senhor Flint Montgomery pediu para que eu ligasse e falasse com Caroline Parker-Williams? Sobre a vaga de advogado?
- Ah, sim! Senhor Trenton, eu já estava prestes a ligar! A senhorita Parker gostaria de saber se estaria disponível para uma entrevista hoje, às cinco da tarde?
Uma rápida olhada no relógio me fez ver que se eu começasse a me arrumar, provavelmente chegaria no centro de Atlanta a tempo e com uma boa tranquilidade.
- Claro, sem problemas. Posso sim. - Me surpreendi com o desenrolar rápido da situação, mas ao mesmo tempo não esperava que ainda fosse passar por alguma triagem. Ele não estava me indicando?
- Ótimo! Peço que por favor traga o seu currículo atualizado para análise.