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Levantei cedo e o meu não querido, irmão dormindo. Talvez eu esteja acordando meio cedo e isso me assusta.
Ontem eu não dormi muito mal, não foi tão pior quanto das últimas noites. Fiquei ate tarde com as minhas paranoias na cabeça e não consegui pregar os olhos até certa hora da madrugada. O bom é que eu não estudo de manhã. O ruim e que mesmo sabendo disso, meu corpo simplesmente decidiu que quer acordar cedo, não importa quanto tempo eu tenha dormido.
Nessa manhã, eu não vou pensar sobre aquela página. Calma, só de escrever aqui eu já estou pensando nisso, né? Bom, eu só não quero que falem de mim. Da última vez tive que ir no psicólogo e até hoje tomo meus remedinhos. Ajudam? Não, mas eu não vou dizer pra psiquiatra. Vai que ela me receita outro remédio? O que eu tomo já está de bom tamanho pra enganar minha mãe.
Sabe? Todos temos coisas que não gostamos ou que ficamos mal no passado, mas eu ainda tenho essa paranoia e tudo por causa de banhos. As crianças do ensino fundamental podem ser bastante cruéis. O ensino fundamental ao todo pode ser bem cruel.
Meu pai morreu quando eu estava no 8º ano do fundamental, só de saber disso, era para os pré "aborrescentes" terem mais idade mental, pelo menos em teoria.
O fato é que eu fiquei muito mal pelas circunstâncias da morte dele. Então fragilizado, eu fui uma semana de aulas inteira com a mesma camisa, uma que ele havia comprado para mim e adorava quando eu usava.
A morte do pai do coleguinha deveria ser algo tratado seriamente, já que faltei uma semana inteira. Bom, indo para o colégio todo dia com a mesma roupa e bem estranho. Eu admito, mas eu percebi na sexta, daquela mesma semana, que as pessoas haviam se afastado mais do que já faziam antes e já estava meio mal. Na outra semana, ainda usava a mesma camisa, que era lavada todo santo dia por mim, comecei a tentar entender a distância e alguns olhares estranhos. E quando o intervalo tocou, fui conversar com Luísa, que era a única pessoa que eu poderia conversar para perguntar sobre o que estava acontecendo.
Notei que ela estava na porta o banheiro com duas meninas, mas antes mesmo que eu chegasse, percebi que estavam falando de mim, mas não haviam notado a minha presença.
- Lu, você ainda fala com o nojentinho? – perguntou uma menina que eu não gostava.
- O Guilherme? Eu não. Você viu que nem banho ele toma? Por que vou andar com gente assim?
- O pessoal que sentava perto dele até se afastou. Dizem que o cheiro está na sala toda.
- Agora o fedor dele virou o centro das atenções aqui no colégio.
- Vou passar reto se ele quiser falar comigo, vai que ele me passa a sujeira dele pelo toque. – Ouvi risadas de crianças traquinas. Bem estilo criança debochada.
Não consegui entender mais o que elas diziam e nem me importava em estar escondido, talvez elas tenham percebido quando solucei e sai correndo. E lá se foi mais uma semana sem ir pro colégio.
Foi ai que comecei com as minhas paranoias. Tomava três banhos num dia porque temia que realmente cheirasse mal e me entupia de perfume. Meu irmão dormia na sala por não aguentar o cheiro de perfume que pairou no quarto por meses.
Depois de uma semana mesmo, voltei ao colégio. Minha mãe havia ido ao colégio para entender o motivo de eu estar sem falar com ninguém e nem mesmo com ela. Não sei o que aconteceu, mas depois disso as criaturas voltaram a ignorar minha existência.
A questão é: Eu ganhei a atenção do colégio, mas eu sinceramente não gostei daquela atenção. Talvez tenha até me traumatizado. Como eu disse. O Ensino Fundamental pode ser horrível com pessoas sem popularidade.
Mas sabe algo que chamou minha atenção nessa situação? Nunca vi o Luís me olhar torto ou com nojo, mais provável que ele tenha me olhado com pena. E talvez tenha sido nessa época que eu comecei a reparar nele.
Ele era calado, mesmo que tivesse amigos, mas ficava no intervalo sentado fazendo qualquer cousa que conseguisse. Desenhava, pintava, escrevia e levou um violão certa vez, até aquele momento, ele ficava sozinho.
Foi a primeira vez que ouvi sua voz, tentei ficar longe para não ser notado, mas não tão longe para não conseguir ouvir. "Perfect" de Ed e Beyonce, quase ninguém notou, só a turminha que depois de um tempo virou da roda de música. E eu também notei, é claro.
Enfim, na verdade depois disso, ele começou a levar o violão e eu sempre tentava escutar. Ouvir ele cantar era algo que me ajudava. E na maioria das vezes, as pessoas não notavam que eu estava escutando, pois eu fingia ler um livro. Uma vez ele tocou uma musica tão bonita que se eu não segurasse, iria chorar bem ali. Acho que e uma das musicas que se alguém cantasse para mim, eu casaria. Mas não sei qual música era.
Em um dia em que eu me dirigia para o lugar que sempre ficava escutando ele tocar, vi que ele não estava lá ainda. Me senti meio decepcionado, já que havia virado um hábito ouvir ele cantar nos intervalos. Ainda assim, fui sentar na minha muretinha com meu olhar de decepcionado para ler um livro que havia levado.
- Você gosta de violão? – Perguntou alguém e eu não estava entendendo. Quando me virei era ele. Naquele momento eu travei olhando para ele. Tentei lembrar do que ele havia perguntado, mas para falar a verdade eu estava meio ocupando surtando e tentando fazer minhas pernas pararem de tremer.
- Oi? – Perguntei engolindo em seco.
- Oi. – Ele riu de mim. – É que você sempre vem nos escutar e eu queria saber gosta de música. – Ele falou e eu entendi. Ele achou que eu vinha pela música. Geralmente eu ia era para ver ele, não escutar a música.
- Ah, vocês me notaram. – Olhei meio triste. – Se você quiser eu paro. Sei que as pessoas se incomodam comigo.
Naquele momento da minha vida eu ainda achava ser um estorvo e um zero a esquerda. Ainda acho, mas era bem pior. Quando eu disse aquilo pude ver a pena nos olhos dele e eu me senti totalmente miserável, então eu acabei andando de volta para minha sala de aula.
Fiquei o resto do intervalo lá pensando que ele não gostava da minha presença apreciando ele cantar e até me achei indigno de conversar com ele. Até aproveitei que não tinha ninguém na sala e chorei um pouco.
Até sentir uma mão no meu ombro. E levar um susto, até que vi que era ele, então limpei minhas lágrimas do rosto com a manga da minha blusa de frio, coisa que era atípica, já que aquele lugar e naquela época era quente como o inferno.
- Não sei os outros, mas eu não me incomodo com você. – Acho que um tiro doeria menos, então eu acabei chorando mais um pouco e ele me abraçou. – Vamos fazer assim, eu sento aqui do lado e canto e você faz o de sempre. Eu gosto da sua plateia. – Ele se afastou sorrindo para mim e eu soube que aquele menino iria destruir minha vida somente sorrindo.
Acabei aceitando a proposta e limpei as lágrimas. Ele sentou-se numa cadeira e fingiu a minha inexistência na sala, mas eu não me senti mal pela primeira vez com isso. Então ele tocou "My love is like a star" e uma coletânea de músicas que me faziam sentir bem. Voltei a tentar me concentrar no livro que lia, mas me perdia sempre, já que só conseguia pensar sobre o quanto ele era diferente.
- Fica bem e nunca mais ouse dizer que me incomoda. – Ele deu um sorriso para mim, indo pela porta com seu violão quando o sinal tocou.
E assim ele voltava todos os dias e tinha abandonado os seus amigos de intervalo, ficando comigo e cantando. Me ganhando aos poucos, no sentido de ganhar a amizade e me ganhar romanticamente. Ele era engraçado, fofo e me fazia sentir muito bem. Eu me sentia a pessoa mais feliz por ter ele.
E isso aconteceu há praticamente três anos atrás, mas depois de um certo tempo, para falar a verdade foi um longo período de mais de dois anos, percebi que aquele proximidade estava me fazendo mal, então acabei tentando me afastar de uns meses para cá, mas ainda não deu certo. Sempre senti isso por ele e eu odeio querer ele assim, porque sei que tudo aquilo era pelo seu grande altruísmo e eu sei que só sentia isso por ele ser o primeiro a se importar comigo. Mas ele nunca havia me apresentado a ninguém e depois do colégio nunca nos falávamos.
Acho que eu só precisava achar outra pessoa para ter um crush e para falar a verdade, achei. Gabriel, mas era algo da distância e eu nunca o teria, acabei sofrendo com paixonite pelos dois amigos.
Voltando ao meu dia de hoje, Luís ainda não me ligou ou mandou mensagem. Não estou ansioso. Pode parar. Eu só queria saber se ele está bem. Só isso.
Fui na padaria, arrumei a casa e passei a estudar um pouco. O machucado? Eu quase não notava sua presença e já nem me incomodava. Talvez me incomode, mas o fato dele cicatrizar rápido e logo não terei desculpas para tocar na mão de Luís?
Ou talvez eu tente achar outro motivo para aproveitar um toque dele. Afinal, nós somos namorados e ele quer ser convincente, certo? Entenda que, apesar sermos amigos assim, nunca houveram muitos toques entre nós e até os apertos de mãos eram raros, acho que foram poucos, o maior contato, até então, haviam sido poucos e o mais íntimo foi aquele abraço no primeiro dia.
A manhã passou rápido, logo eu estava me arrumando para o colégio. Como sempre, eu não vou usar nada que chame atenção, além da minha beleza descomunal que não posso arrancar.
Mas falando sério mesmo, não adianta tentar não chamar atenção, já que isso não vai ajudar muito.
- Tá arrumado, cheiroso e com carinha de bobo alegre. O amor muda todos, né? – Lá veio a praga me atentar. Estava demorando.
- Pelo menos eu tenho alguém que me ama, já você, não posso dizer o mesmo. – Bom, não consegui rir da cara dele, já que tive que sair correndo enquanto ouvia ameaças.
- Vamos ver se ele vai te amar quando eu arrancar teus dentes num soco.
Tarde demais. Eu já havia me trancado no quarto, daqui a pouco ele supera e esquece que é mal amado.
As I said before, depois de um tempo, ele se acalmou e eu pude sair do quarto. Esse é um ponto interessante. Apesar de termos mini brigas, não fica um clima estranho, a extroversão e alto astral dele não deixam isso acontecer.
Sai do quarto, comi um pouco e fui para o colégio, já estou imaginando o que Luís vai levar para comer. Sim, eu já estou com fome. Tem algum problema? Se tiver, vá para a terapia tratar, porque quem precisa aturar ele é o seu terapeuta, não eu.
Cheguei e já tinham algumas pessoas na sala, me dirigindo ao fundo da sala vi que Luís já estava lá, aparentemente me esperando.