Harém Reverso - Mulheres no Poder
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Capítulo 3 3

DELILAH

-- Então foi só isso? O impacto me fez ficar sem ar?

O médico estava parado à minha frente, à luz do amanhecer, bocejando sem parar. Ele segurava um copo de café fumegante em uma mão e meu prontuário na outra. Parecia uma cena diretamente saída de alguma série médica semanal.

-- Ainda estamos esperando uma segunda rodada de exames de sangue, mas...

-- Por que?

O homem parado aos pés de minha cama me olhou confuso. Ele não estava preparado para aquela pergunta.

-- Como assim por que, Srta. Gallo?

-- O que estava errado com a primeira rodada de exames de sangue? -- perguntei. -- Tinha algo errado?

Ele voltou a encarar o prontuário, como se esperasse encontrar alguma resposta que não tivesse visto antes.

-- Bem, não, mas...

-- E quanto ao raio-X do tórax? -- perguntei. -- E acredito que vocês tenham feito uma ressonância?

-- Os raios-X não mostraram nada negativo -- disse ele, engolindo em seco. -- Nenhuma costela quebrada. Você tem algumas costelas machucadas, o que pode ser tão ruim quanto uma fratura. Na verdade, mesmo que tivesse fraturado alguma delas...

-- Eu sei. Eu sei -- disse o cortando --, o tratamento seria o mesmo. Você não poderia imobilizá-las; isso ficou no passado. Já que inibe a respiração e os ossos cicatrizam em um ângulo mais superficial do que deveriam.

Eu tinha aprendido a maioria dessas informações em minhas aulas de anatomia no segundo ano de faculdade. Isso quando eu ainda frequentava as aulas e ainda estava matriculada na universidade.

-- Então meu sangue está normal, não quebrei nada e não bati a cabeça -- disse sem rodeios. -- Eu desmaiei por falta de oxigênio nos pulmões por ter batido fortemente no chão.

O homem torceu o bigode, o qual àquela altura de sua vida estava 50% grisalho.

-- Parece que sim -- respondeu, incerto, voltando a encarar o prontuário. -- Aparentemente quando você caiu das arquibancadas...

-- Pulei -- disse, o corrigindo.

-- O que?

-- Eu pulei das arquibancadas -- disse novamente. -- Eu não caí.

O médico soltou o café, pegando a caneta. Quando voltou a me encarar, ele estava coçando o queixo.

-- Se estiver me dizendo que pulou intencionalmente, Srta. Gallo -- disse ele com a voz grave --, temo que precisaremos de outro tipo de médico.

-- Não foi intencionalmente -- disse, suspirando em exasperação. -- Caramba, por que todo mundo sempre tem que presumir o pior

-- Então o que você...

-- Eu pulei para salvar uma criança que estava caindo -expliquei. -- Era um menininho; cabelos loiros, olhos azuis... -- Olhei ao redor, sem saber ao certo o que estava buscando. -- Ele está internado aqui? Ele está bem, certo?

-- Não ouvi nada sobre nenhum menino, Srta. Gallo.

-- Ai que bom -- suspirei aliviada. -- Se ele não está aqui é porque provavelmente está bem. Tenho quase certeza de que absorvi todo o impacto. Do jeito que bati no chão, sentirei isso por um bom tempo.

Me inclinei para a frente, mas quase imediatamente fui obrigada a retomar minha posição anterior ao sentir uma dor aguda atravessar o lado direito do meu corpo.

-- É, eu realmente machuquei algumas costelas.

Eu tinha estado grogue durante o trajeto de ambulância, mas voltei aos meus sentidos rapidamente na emergência do hospital. Eu tinha deixado o pessoal da equipe fazer o que precisava por metade da noite, me examinando por todos os ângulos e então finalmente dormi a outra metade. Mas agora, eu estava farta.

Mais do que farta, na verdade.

-- Algum sinal dos dois homens que me viram cair? -- perguntei esperançosa. -- Altos. Morenos. Lindos. Um tinha uma barba bem aparada... o outro talvez tivesse um cavanhaque, ou...

-- Não -- disse o médico balançando a cabeça --, não tenho ideia sobre quem você está...

-- Deixa pra lá então -- disse retirando a agulha do meu braço. - Obrigada por tudo, doutor. Tenho certeza de que o departamento financeiro estrará em contato comigo.

O homem observou com incredulidade enquanto eu removia cuidadosamente a agulha, arrumava os tubos e reaplicava o curativo médico em meu braço. Ele me olhava tão chocado enquanto eu pegava o celular e abria o aplicativo do Uber, que achei que o copo de café fosse escorregar por seus dedos.

-- Você poderia me passar minhas roupas, por favor? -Apontei. -- E puxar a cortina?

-- Srta. Gallo -- gritou ele --, você não pode simplesmente...

-- Ir embora? -- perguntei rindo. -- É claro que eu posso. E eu vou.

Saltei da cama, pisando do chão frio. Merda, por que os pisos de hospitais tinham que ser sempre tão frios? Eles não poderiam ter algum tipo de piso aquecido?

-- Mas você não recebeu alta! -- disse o médico, franzindo a testa. -- Ainda precisamos esperar...

-- O médico do próximo turno vir olhar meu prontuário pela terceira vez? -- perguntei com desembaraço. -- Outra rodada de exames de sangue inúteis?

-- Você não pode simplesmente...

-- Devo esperar duas horas depois disso pelos papéis da minha alta? -- perguntei rindo. -- Depois outra hora para alguém encontrar uma cadeira de rodas desocupada e uma ordem para trazê-la até aqui?

-- Mas...

-- Sim, toda essa baboseira iria levar umas seis ou oito horas -disse eu. -- No mínimo. Eu não chegaria em casa antes do jantar e eu estou faminta.

Peguei minha calça jeans e a vesti diante dele mesmo, puxando-a por baixo da camisola do hospital. Quando peguei minha blusa, suas bochechas já estavam vermelhas.

-- É melhor assim -- disse eu, terminando de me ajeitar. -Acredite.

Encurralado do outro lado do quarto, o médico não teve outra alternativa a não ser encarar o chão até eu terminar de me vestir. Faço uma careta enquanto passo blusa e suéter pela minha cabeça, calço os sapatos e largo a camisola, sem cerimônias, em cima da cama.

Quando o homem abre a boca pela última vez eu o corto antes que ele possa falar qualquer coisa.

-- Muito descanso, gelo e o mínimo de esforço por um tempo. Não é isso?

-- Bem, sim, mas...

-- Mas o que?

Ele apontou para a cadeira vazia onde minhas roupas estavam até pouco tempo atrás. Só que ela não estava vazia.

-- Eu apenas ia dizer que você esqueceu sua jaqueta.

No meio da cadeira de laminado e aço estava uma grande jaqueta preta, de couro. Ela tinha tachinhas nos ombros, exatamente como...

Exatamente como a que o cara segurando a garotinha usava, no aquarium.

-- Essa jaqueta não é minha -- disse quase como um reflexo.

-- Bem, ela definitivamente veio com você -- respondeu o médico, dando de ombros. -- Isso é tudo o que eu sei.

Peguei a jaqueta, chocada com o tamanho e o peso dela. Ela tinha um cheiro de couro, óleo e aço; um cheiro bem masculino. Colônia também. O cheiro era viril sem ser sufocante. Doce, almiscarado e delicioso.

Ainda sentindo um pouco de frio por causa da camisola do hospital, eu me enfiei dentro dela. Pela janela, eu podia ver que o céu tinha ido do violeta para o azul, com um tom amarelado.

-- O café é da cafeteria lá embaixo, não é? -- perguntei. -- Ele é bom?

Como que em piloto automático, o médico apenas balançou a cabeça, devagar.

-- Deixa pra lá, eu dou um jeito.

-- E quanto à sua metade do aluguel -- suspirei, fervilhando de raiva por dentro. -- Você teria como pagar pelo menos isso?

Do sofá, Traci sinalizava que não, com um gesto de mão. Eu já tinha visto esse filme tantas vezes antes que podia imitar cada gesto perfeitamente.

-- O velho nos dará outra semana -- respondeu ela. -- Ele sempre dá.

O "velho" a quem ela se referia era nosso locador, que infelizmente, morava logo no andar de cima. Mesmo trabalhando o número insano de horas que eu trabalhava, era eu quem normalmente lidava com ele. Traci raramente o via e se recusava a abrir a porta nas raras ocasiões em que ele aparecia.

-- Além do mais -- continuou ela --, ele nem precisa do dinheiro. Você viu o Escalade estacionado na vaga dele? Ele está nadando no dinheiro.

Sério? Ela realmente tinha dito isso? Eu dividia o apartamento com a mulher de 25 anos mais imatura do planeta.

-- Se não pagarmos, ele vai nos despejar -- insisti. -- Não seria nada difícil, Traci. A gente nem mesmo tem um contrato.

-- Ele não pode nos despejar -- argumentou ela. -- É preciso seguir todo o processo de ordem de despejo antes.

Suspirei tão fundo que minhas costelas voltaram a doer. Merda, por que mesmo eu concordei em morar junto com essa idiota?

-- Relaxa, Delilah. -- Minha companheira de apartamento sorri, adicionando uma risadinha para ajudar a aliviar o clima. -- Eu terei o dinheiro. Não se preocupe.

-- Quando? Uma semana antes do vencimento do mês que vem?

-- Não. Eu só preciso ver o Mark antes -- disse ela confiante. -As coisas têm estado intensas entre nós dois. Você viu todas as flores que ele me enviou?

Se eu vi? Elas praticamente estavam tomando a cozinha inteira! Devia haver uns seis ou sete buquês, de diferentes formatos, tamanhos e variedades. Dava para imaginar que uma florista tinha aberto uma floricultura em um apartamento de merda no subsolo. No entanto, eu tinha que admitir, o cheiro era maravilhoso.

-- Ao invés de gastar centenas de dólares com flores que já estarão mortas semana que vem -- teorizei --, talvez seu namorado pudesse te emprestar esse dinheiro e, com isso, você pagar o que deve?

Os comerciais tinham acabado e Traci estava novamente prestando atenção na televisão. Quando finalmente me encarou de novo, parecia irritada.

-- Espera, como é que é?

Como é que é?... Ela era tão estúpida. Eu odiava isso! Com o tempo, a expressão favorita de Traci tinha se tornado minha criptonita.

-- Esquece -- suspirei com raiva. Eu estava mais irritada do que nunca hoje, provavelmente porque minhas costelas doíam muito e eu me recusava a tomar remédio. -- Você poderia pelo menos tirar algumas das suas coisas daqui? Eu preciso da mesa.

-- Pode tirar -- respondeu Traci, cheia de preguiça --, é só empurrar pro lado.

Usando o braço eu abri um espaço na entediante mesa amarela de fórmica, de modo a poder pagar algumas contas. Ao fazer isso, um cartão escrito à mão caiu de um dos buquês, acertando minha mão.

Argh, rosnei internamente, lutando contra a vontade de ler aquilo (embora eu soubesse que o faria de qualquer jeito). A última coisa que eu preciso agora é de alguma coisa estúpida, melosa...

Eu parei, piscando. O cartão não era para Traci. Ele era para mim.

-- Traci?

-- Quê?

-- De quem você disse que eram as flores?

Com um braço ainda sobre o sofá, minha colega de apartamento levou outra colher de sorvete até a boca.

-- Mark me enviou.

Você tem certeza disso?

-- Certeza -- disse ela, dando de ombros. -- Quer dizer, eu não perguntei a ele, na verdade, apenas agradeci por...

Ignorei o resto da frase e virei o cartão. Ele estava endereçado diretamente a mim, com um endereço de devolução para o hospital Southampton. Bastou uma olhada rápida nos outros buquês para ver que todos tinham vindo da mesma florista. Todos eles para mim.

Que merda era aquela?

Rapidamente liguei para o número principal do hospital e fui transferida para o setor de emergência. Depois de ser passada de uma pessoa para outra três vezes, fui atendida por uma mulher chamada Rose.

-- Sim, eu fui a pessoa que encaminhou as flores para você -disse ela com alegria. -- Elas eram lindas, não eram?

-- Sim, elas eram -- concordei. -- Mas... por que?

-- Bem, elas foram enviadas para você, meu bem. Foram trazidas logo depois que você saiu. Os homens que as trouxeram ficaram bem chateados por terem se desencontrado de você. E eu prometi encontrar suas informações e encaminhá-las para você.

Eu me virei. Traci continuava assistindo televisão, totalmente distraída.

-- Estes homens deixaram algum contato? -- perguntei rapidamente.

-- Não -- disse Rose, pensativa --, acredito que não. Mas você sempre pode telefonar para a floricultura. Tenho certeza de que eles ficarão felizes em ajudar.

-- Sim, claro -- disse começando a me sentir animada. -Obrigada, Rose.

-- Fique bem, docinho.

            
            

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