A Garota Da Caixa
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Capítulo 4 4

Pov Luke

Donald manteve seu olhar julgador sobre mim, era pesado demais para suportar em pé, dei a volta pela sala e me sentei no sofá jogando os pés sobre a mesa de centro, levei uma mão ao rosto na tentativa de controlar o nervosismo que uma possível bronca me causava e esperei, felizmente, não por muito tempo.

- O que está fazendo Luke?

- Ela estava sozinha, precisei usá-la.

- E a trouxe? O que foi, as balas acabaram?

Olhei por cima do ombro, para o novato parado com as mãos ás costas. Tive pena dele, devia ter uns vinte e poucos, era dedicado e certamente estava dando pulinhos eufóricos por dentro por acreditar que tinha sido aceito entre a cúpula estreita da minha confiança quando a verdade ele só estava ali porque viu demais, teve outros antes dele, assim que tudo estava no lugar, Spooky resolvi com um tiro rápido.

- Está me ouvindo? – Donald não se importava m falar comigo dessa maneira na frente do Novato, sabia do destino do menino.

- Estou.

- Olha, não tem problema, deixe que Spooky resolve, você tem que se concentrar em outra coisa. O contrato das docas.

- Vou pensar nisso depois que achar quem matou meu irmão.

- Luke, sei que quer vingança, mas a vida não para, não para você. Precisa decidir o que fazer.

- O que eles querem?

- Levar suas mercadorias para fora pelo porto, sabem que você tem negócios nas docas.

- O que vão levar?

- Uma das exigências é que não faremos perguntas.

- Nós lidamos com drogas, armas, lavagem de dinheiro. O que querem esconder?

- Não é da nossa conta, não chegou onde está fazendo perguntas.

- Não sei porque deixei você me conversar a me meter em coisas assim, eu sou um assassino, sou bom nisso, mas negócios, não é para mim.

- Não ia conseguir comandar essa cidade sendo um mero assassino de aluguel.

Na minha cabeça eu queria que essa cidade explodisse em fogo.

- Eu tenho um encontro essa noite, falamos disso amanhã – forcei um sorriso.

Donald deu de ombros.

- Descobriu algo útil pelo menos?

- Talvez.

- Ah, que seja. Eu vou dormir e fingir que você não existe por pelo menos essa noite,

Ele bateu os pés até o andar de cima e logo ouvi a porta do quarto sendo fechada, no meu íntimo, tinha perdido toda a vontade de lidar com Charlotte, Donald conseguiu me tomar isso.

- Senhor?

Virei o rosto para o novato atrás de mim.

- Se me permite dizer, acho muito honrada sua atitude de vingar seu irmão, a família é o mais importante.

- Sabia o que estávamos indo fazer naquele galpão?

- Não senhor, recebi as ordens na hora.

- E porque foi.

- Lealdade.

- Não, você nem me conhece, não existe lealdade assim. Seja sincero, abra seu coração, garoto.

- Eu sou órfão, cresci em um orfanato com minha irmã, nunca fomos adotados, ela era complicada. No ano passado, ela saiu de casa e foi encontrada morta dias depois. O homem que fez isso com ela está na prisão e foi diagnosticado com câncer terminal, não tem nada que eu possa fazer. Mas eu tenho raiva, você me deu uma arma e eu a descarreguei em seus inimigos, hoje vou dormir em paz pela primeira vez em meses.

- Porque matou?

- O senhor pediu a resposta sincera.

- Não falou do salário.

- Ah, tem isso também.

Nós rimos, ele relaxou o corpo, desmanchando a tensão pouco a pouco.

- Sabe cozinhar?

- Sim senhor.

- Veja p que tem na cozinha e leve para a garota.

- Não vai jantar com ela?

- Estou sem fome, além disso, ela é uma distração.

Meu peito doeu com essas palavras, a verdade era que Charlote era inocente, doce e sofreu por anos, ela tinha marcas em seu corpo que eram muito parecidas com as que eu tinha em minha alma. Consequências das escolhas que eu fiz um dia.

Parei em frente a janela, abaixo da torre, tudo o que eu conquistei, com a ajuda de Donald e a obediência de Spooky além de vários como novato.

Eu precisava descansar, a cada minuto do dia eu precisava estar alerta, se eu não dormisse isso estaria comprometido. Mas por mais que eu tentasse, o sono não vinha, e Charlote não saía da minha cabeça.

Não demorou muito tempo até eu desistir de tentar, me levantei, prendi o cabelo em um coque alto enquanto atravessava o corredor ao quarto onde Spooky a colocou, respirei fundo e entrei sem bater, estava escuro. Charlote havia fechado as cortinas, usei a pouca luz que vinha do corredor para chegar até a cama, levantei o edredom com cuidado me deitei. Fiquei quieto por um tempo, mas logo a necessidade falou mais alto.

Eu só queria sentir sua pele, saber que ela era real e a noite maluca que a trouxe para mim realmente aconteceu, mas estiquei todo o braço e não a encontrei, me sentei e puxei os cobertores, a cama estava vazia.

Saltei no chão, acendi a luz, olhei no banheiro, atrás da cortina, embaixo da cama.

- Charlotte?

Um gemido breve me atraiu até o closet, abri a porta de uma vez e ela estava sentadinha no chão, esfregando os olhos com o dorso da mão como uma criancinha.

- Me chamou?

- O que faz aqui?

- O quarto é grande demais.

Me aproximei devagar, ela levantou o rosto para mim, amassado e o cabelo desgrenhado.

- Sei que parece besteira.

- Não, eu entendo.

Fechei a porta, deixando o closet escuro e me deitei ao lado dela, Charlotte hesitou, coloquei a mão em seu ombro e aos poucos ela foi cedendo até estar deitada comigo, não a toquei depois disso, mas o sono veio, finalmente, me fazendo mergulhar em um abismo de sonhos loucos.

Saber que ela estava comigo, praticamente em meus braços, ainda que distante, me dava calma, pela manhã, eu poderia pensar nas informações que recebi e como as usaria, além do que faria com Charlie e Novato.

Não seriam decisões fáceis ainda mais porque minha vontade era diferente da de Donald e eu não tinha certeza se podia ir contra ele.

***

Pov Charlie

Nunca me senti daquela maneira, nunca nem mesmo pensei em algo do tipo, durante meus anos no quarto fechado e ainda mais dentro daquela caixa, meus dias se resumiam a sobreviver, dormir, comer, suportar a dor. Nenhum toque, nenhum contato e quando o tinha era odioso.

Luke não pareceu perceber o que o gesto de se deitar ao meu lado causou em mim, ainda mais com seus braços me envolvendo, era como se eu estivesse de novo na caixa, protegida, eu estava tão desesperada para sair que não pensei em quanto seria assustador.

Eu dormi logo e acordei logo, era difícil manter um horário de sono longo, estava acostumada com cochilos que não passavam de duas horas no mês.

Me desvencilhei de seus braços com cuidado para não acordá-lo, andei pelo quarto, voltas e mais voltas até ficar ofegante, não precisou muito, uma luz arroxeada entrou 9+

pela janela, estava amanhecendo.

A janela me atraiu, me aproximei dela, do meu quarto, eu só conseguia ver o beco e o prédio alto que cobria a janela minúscula, por onde passava pouca claridade.

O sol saiu de trás dos prédios, lentamente, me hipnotizando. Lágrimas brotaram nos meus olhos pela sensibilidade, me lembrei de ter seis e tentar olhar direto para o Sol, me lembrei do calor dele na minha pele, me lembrei do rosto da minha mãe bloqueando a luz.

Toquei o vidro, estava quente e aconchegante.

- A quanto tempo não vê a luz do dia?

Me virei para Luke, ele colocava o cabelo loiro desgrenhado atrás da orelha, sua cara de sono era impagável.

- Mais de uma década, acredito.

- Fez uma lista?

- Uma lista?

- Coisas que você precisa, escova de dentes, de cabelo, shampoo. Alguma marca que você prefere.

- Acho que preciso de roupas.

- Que estilo você prefere?

Não tinha uma resposta para isso, nunca pensei sobre esse assunto, nunca tive oportunidade de comprar nada ou pedir algo que eu gostasse.

- Só precisa estar limpo, essa tem manchas de sangue – levantei um pouco a blusa para que ele visse as manchas.

Luke se aproximou um pouco mais, avaliando os ferimentos em minha cintura.

- Eu preciso cuidar de você.

- Tem um livro que eu li, as roupas pareciam lindas – disse timidamente, não me sentia no direito de pedir mais do que ele estava me dando.

- Me diz qual?

- O senhor dos anéis, aliás, as roupas de livros de fantasia são minhas preferidas.

- Terei uma elfa andando pela casa – ele abriu um sorriso enorme que me fez sorrir também.

- Ou pode só me conseguir uma camiseta.

- Vou fazer isso hoje e marco uma costureira essa tarde. Se você quer roupas de fada, terá roupas de fada – ele tocou minha cintura de leve e mesmo assim fez as feridas arderem – está infeccionando, vou precisar limpar e talvez tenha que tomar antibióticos. Mas vai ficar tudo bem.

- Obrigada.

- Outra coisa que precisamos fazer é tirar esse cinto de castidade de você, nem sei como consegue ir ai banheiro ou se lavar.

- Estou acostumada, mas um banho seria ótimo.

- Você quem manda.

Luke era enérgico, em passos apressados e amplos ele entrou no banheiro e ouvi a torneira sendo aberta.

- Vai encher logo.

- Você tem que ir.

- Não, vou rapidinho na cozinha porque não sou nada sem café, mas preciso sair essa manhã. Vou deixar Donald de olho em você e talvez o novato, pra te defender do Donald.

- Acho que ele não gostou de mim.

- Ele só é rabugento, mas vai se acostumar.

- Obrigada.

- Não precisa agradecer a todo momento.

Ele saiu, dando um ultimo sorriso antes de passa pela porta, me sentei a luz da janela, aproveitando o calor do sol em meu rosto, não demorou até a banheira estar cheias, tirei a roua em frente ao espelho, eu não tinha muita vaidade, mas odiei cada hematoma, marca, ferida. Tudo o que aparecia na minha pele me incomodava, evitei olhar para o cinto de castidade caseiro, embora sentisse o peso dele todo o tempo.

Sim, eu menti para Luke ao dizer que estava acostumada, eu não conseguia me sentar, fazer xixi sem me sujar ou me limpar adequadamente e não via a hora de tirá-lo.

Entrei na banheira devagar, estava quente na medida certa, abaixei aos poucos sentindo as feridas na cintura e barriga arderem em contato com a água, quando amenizou, peguei alguns produtos na lateral da banheira e li os rótulos.

- Melhor não usar esfoliante.

Decidi ficar só com o sabonete mesmo, ouvi uma batida leve na porta e Luke colocou a cabeça para dentro.

- Posso entrar?

- Claro.

- Trouxe uma camisa minha, deve servir como um vestido e chinelos fofinho – seu sorriso foi delicado.

- Está de saída?

Eu devolvi o sorriso embora me sentisse mal, como se estivesse ficado para trás, ele se aproximou, sentando-se sobre a borda da banheira.

- Ainda tenho alguns minutos, me deixe lavar seu cabelo.

Luke despejou o shampoo na palma da mão e o passou pelo meu couro cabeludo, com cuidado. Era uma massagem gostosa, fechei os olhos e aproveitei o toque no meu cabelo, deus dedos firmes, mas suaves, me fizeram sentir confortável. Durou alguns minutos deliciosos.

- Vamos enxaguar?

Escorreguei para baixo, mergulhando a cabeça na água quente como fazia quando era criança.

Durante os anos de cárcere, a imagem da minha mãe e as lembranças da minha infância pareciam tão distantes, sentia como se as estivesse perdendo, mas desde que saí daquele lugar, tudo me lembrava algo.

Os pequenos prazeres, banho quente, sol, aconchego.

Me levantei e passei as mãos nos olhos, quando abri, vi que Luke me olhava de um jeito estranho.

- O que houve?

- Você é linda.

- Não sou, não assim.

- Você é, seu corpo é lindo – ele se levantou de repente – e é melhor que eu saia antes que perca a cabeça.

- Vejo você mais tarde?

- Depois do almoço, pedi ao novato para ficar de olho em você durante a manhã.

Assenti, Luke saiu mas voltou de repente deixando um beijo na minha testa. Mergulhei mais uma vez, me concentrei e vi o rosto da mamãe, pairando sobre a banheira, através da água.

            
            

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