-Ah, se eu pudesse fazer isso mesmo -suspiro. -Eu nunca mais iria limpar chão na minha vida, ia arrancar uma vida confortável daqueles dois. -Respondi também rindo. Sabe aquelas coisas loucas que passam pela nossa cabeça e começamos a pensar -pensar demais- no que não deveria? Então, tá eu aqui lembrando daqueles filmes, aqueles que eu falei, os filmes de romance que o bilionário fica com a mocinha pobre no final e dá a ela uma vida luxuosa e feliz. Bom, lá eles se apaixonam naturalmente no primeiro contato, mas como aqui é vida real obviamente precisa de um pouco mais de convivência, né? O único problema é que é praticamente impossível essa aproximação, já que eu e o meu alvo estamos a anos nus de distância na questão econômica. Mas isso pode mudar se eu tiver um apoio, uma carta na manga. Não, a questão amorosa não é a principal aqui. Na verdade o que eu desejo mesmo é uma vida melhor, sem ter que trabalhar tanto só para comer e pagar as contas. Eu sempre sonhei em sair da favela, ter uma casa boa, uma vida confortável e respeito. Poder ir comer em um restaurante chique e não receber aqueles olhares de nojo dos outros clientes e até mesmo dos funcionários, parece que eles têm um detector de pobre só pode, sabem que somos pobres, mesmo quando estamos com roupas caras. Mas se eu tiver um apoio para entrar nesse meio, as pessoas vão me olhar diferente, vão me receber direito e assim eu vou fazer meu próprio caminho, vou conquistar tudo que eu quero. Respeito. Dinheiro. Conforto. Vou ter a vida dos sonhos e ainda ser feliz com um homem educado, elegante e bonito, o homem perfeito, bem diferente daqueles pé-rapados metido a bandido lá da favela.
É justamente essa ideia louca que eu acabei de criar aqui. Claro, não será nada fácil ter mais convivência, pelo menos não naturalmente como nos filmes, mas e se eu seguir a ideia da Loane? Será que aquele homem realmente pagaria pelo meu silêncio se gravasse um encontro dele? É muita loucura, mas se isso dar certo eu vou mudar a minha realidade pra sempre e ainda posso ter uma chance com ele, o meu "deuso" gostoso. E assim eu fiz. É verdade que planejar é mais fácil do que fazer, mas se o objetivo vale a pena, vai compensar o risco e o esforço.
-Tudo bem, eu topo! -A Loane diz depois de ouvir minha proposta. -Mas eu não posso ir pra cadeia se isso der errado, Grazi, você sabe que eu tenho um filho pequeno para criar, e ele só tem eu. Ela está visivelmente receosa, mas assim como eu, ela está cansada dessa rotina pesada e no caso dela é ainda pior, já que tem um filho pequeno na história.
-Você só vai me avisar se a primeira dama vier novamente, eu cuido do resto.
-Certo. -Ela concorda.
A Loane trabalha aqui há quinze anos. Coitada, quinze anos nessa rotina sofrida. Como ela é uma das funcionárias mais antigas, ela tem intimidade com a gerente geral e pode entrar no escritório com a desculpa de conversar e assim verificar às escondidas a agenda de hospedagem.
[...]
Eu estou uma pilha de nervos. Como já era de se esperar, a primeira dama e o Samuel Moretti tiveram um novo encontro e eu coloquei meu plano em ação. Ontem quando preparei o quarto deixei a câmera lá, bem escondida e posicionada na direção da cama. Se eu disser que consegui pregar o olho essa noite vou estar mentindo. Eu estou com uma mistura de ansiedade e medo, sim medo, o que eu fiz é crime e se eles descobriram, assim que eu chegar para trabalhar estou lascada.
-Já está saindo minha filha? Bom dia! -Como todos os dias minha mãe está lá no corredor, esperando para me ver sair.
-A bênção, mãe. Sim, já está na minha hora. A Gabriela não voltou pra casa ontem? -Pergunto só por perguntar, eu sei que ela não voltou.
-Não, ela foi dormir na casa da amiga que mora lá no asfalto.
-Amiga? Sei. É claro que ela dormiu no Russo. A minha mãe é muito inocente se realmente acreditou nessa história de amiga.
-Ela não dormiu no Russo, Graziela. Na verdade acho que eles nem estão se falando muito, desde o dia do baile. Tudo bem, agora eu realmente fiquei surpresa, a Gabriela não está falando com o Russo? Isso é muito estranho. O que me deixa muito curiosa para saber o que aconteceu nesse baile.
-A senhora sabe o que aconteceu nesse baile? -Pergunto e minha mãe nega.
-Não sei. A Gabriela não quis falar os detalhes, mas ela está bem chateada com o Russo. Tanto que nem foi mais nos churrascos lá na laje dele, nem dos amigos.
-Isso é bom. Né?!
-Graziela, eu sei que isso é o que você queria, mas a Gabriela tá sofrendo com isso. Por que você não tenta fazer ela se abrir com você?
-Tudo bem, mãe, eu vou conversar com ela. Já vou indo, ou vou perder a van. Assim que dou alguns passos depois de fechar o portão de casa, a assombração pára bem na minha frente.
-Graziela, podemos conversar um minuto? -Ele faz uma pergunta, mas seu tom é de comando.
-Estou atrasada, Ruan. E também não tenho nada pra falar com você! -Digo e tento contornar seu corpo para seguir meu caminho.
-Onde a Gabriela foi? -Pergunta segurando meu braço. Tudo bem que eu fiquei surpresa por a Gabriela realmente não estar com ele, mas não vou conversar com esse traste, muito menos dar informações a ele.
-Eu não faço ideia. -Respondi tentando puxar meu braço.
-Não sabe? Mas você não é irmã dela?! -responde entre os dentes. Ele parece tá bem irritado.