Capítulo 5 Confusões de Alfie

Estabanado era meu nome do meio, mas só porque Walkers era o último. Carregar o violino para cima e para baixo era insuportável e eu tinha um ódio gigantesco disso. Por que violino? Porque é o que ela gostava, era o que ela amava e eu tinha que fazer isso para mudar tudo.

Eu havia esquecido alguma coisa enquanto caminhava correndo pela chuva carregando aquela maleta horrível e pesada com o instrumento. Ao menos não esquecera o guarda-chuva, quer dizer, esquecer ele com a chuva claramente caindo seria o ápice da memória questionável.

Corri para guardar algumas coisas na sala de aula, esbarrando pelos estudantes e tomando cuidado para não escorregar nas pequenas poças de água de guarda-chuva recém fechado. Sem julgamentos, o meu estava fazendo o mesmo pelos outros; alguém ia cair com certeza.

As aulas de música eram muito complicadas, quer dizer, a maioria era prática e eu não tinha a menor condição de acompanhar. De qualquer modo, eu devia tocar e ensaiar minha própria melodia alguns minutos depois.

Sempre que precisava, eu utilizava aquela sala em específico, que ficava nos corredores no caminho de vários cursos. Evidentemente era uma estratégia para encontrar a garota que tanto me atormentava nas memórias, a garota que eu precisava encontrar por alguma razão que eu com certeza havia me esquecido.

Iniciei a primeira nota da melodia, errando-a, como de costume. Recomecei. Precisei reiniciar o processo umas quatro vezes até finalmente conseguir quase metade sem desafinar uma única vez. Meu celular apitou por alguns segundos, indicando uma notificação direta, provavelmente encaminhada para todos. Festas universitárias é normalmente o interesse de um calouro, mas quando você passa da primeira, percebe que não tem nada de legal e que, na verdade, é tudo o mesmo todas às vezes. O encontro no Post Alley de novo, quer dizer, eu ainda não conhecia, eu era recém transferido, mas como um suposto calouro, não seria uma má ideia tentar sair de casa e não precisar me importar com as brincadeiras da minha mente.

"Com licença", disse uma voz feminina. "Posso entrar?", perguntou ela, abrindo sutilmente a porta, onde seu singelo cabelo loiro fez presença.

"Sim, claro", respondi, quase deixando o arco do violino cair. "Oi", respondi, sem jeito. Era a garota do outro dia, definitivamente a garota a qual eu não lembrava o nome.

"Espero não estar atrapalhando sua música", preocupou-se ela.

"Não é minha, quer dizer, não sei, é confuso, apenas vem na minha mente com uma frequência que eu não consigo ignorar, nem esquecer", desabafei, como se pudesse confiar minha vida inteira a ela.

"Uau, isso foi um pouco profundo", riu ela, discreta, aparentemente tão confortável quanto eu. "Sou Heather Mathis, psicologia. E você?", questionou-me ela, estendendo a mão. Minha mente deu um giro e retornei à noite anterior, me lembrando de ter escrito seu nome no papelzinho que estava branco de manhã. Alguns flashbacks de outros dias passaram velozes, onde minha escrita com o nome dela apareciam todas às vezes. Pisquei meus olhos e reparei na mão dela ali estendida, esperando minha recepção, com um enorme ponto de interrogação estampado em sua cara.

"Me desculpe. Sou Alfie, Alfie Walkers, música", respondi, tocando sua mão, finalmente. Era suave, como algodão, como a neve. Senti um baque forte em meu peito, algo gelado, muito gelado e vários flashs de neve em minha frente, como se eu tivesse sido transportado para qualquer outro lugar. Eu me sentia completamente frio e gelado e comecei a tremer, meus olhos faziam o mesmo. Enquanto piscava, ora observava a garota, ora via neve, ora via um carro. Senti meu corpo cair da cadeira e o barulho do violino indo ao chão, bem como o meu corpo quase rígido por completo fazendo o mesmo. Comecei a tremer ainda mais, enquanto continuava me debatendo e tentando voltar à realidade. Senti que alguém me tocava e gritava meu nome, mas não conseguia distinguir nada. De repente, vi uma imagem clara de Heather se aproximando de mim, com seus cabelos esvoaçantes correndo feliz em minha direção, segurando algum papel que eu não conseguia ler. Ela parecia feliz. No momento que a imagem dela estava se aproximando, eu pisquei e voltei à realidade, onde a Heather verdadeira me sacudia e gritava por mim.

"O que aconteceu?", perguntei, confuso. Ela me ajudou a sentar, mas ainda exibindo expressões claras de preocupação em seu rosto. Heather confirmou que fiquei tremendo por alguns minutos e que não parava de piscar. Disse também que não conseguia se levantar para chamar ajuda, só conseguia ficar ali tentando me ajudar.

Finalmente nos acalmamos. Tomei um pouco de água da pequena garrafa que ela me ofereceu. Havia sido meu primeiro encontro com ela e já tinha mostrado meu maior problema. Embora pela primeira vez eu tivesse ficado assustado de verdade.

"Talvez devesse pegar mais leve. Não acha que talvez esteja trabalhando demais?", perguntou ela, ainda preocupada e fazendo um contato visual que eu não tinha o menor interesse de desviar. Não queria ter de dizer a ela sobre meu problema estranho de esquecer sobre tudo e achar que estou ficando maluco, então concordei com o argumento dela de que talvez eu estivesse trabalhando demais. Fato esse que seria deprimente, afinal mesmo trabalhando tanto eu ainda continuava sendo um péssimo violinista.

Assim que consegui ficar em pé sem cambalear, peguei o violino e verifiquei seu estado. Suspirei de alívio quando percebi que não havia quebrado. "Quer sair hoje? O pessoal vai na Post Alley", disse ela. O comum são os homens convidarem para sair, aquilo me pegou de surpresa. Eu disse um sim quase que de imediato, não que eu precisasse pensar se teria tempo ou algo do tipo. Eu só precisava saber se a minha mente não iria me privar daquilo.

"Adoraria te encontrar lá. Qual horário?", perguntei. Heather respondeu que às 19h ela provavelmente já estaria por lá. Respondi a ela que com certeza iria e então ela deixou a sala com um sorriso no rosto. Ela fechou a porta abrindo um sorriso ainda maior. Rapidamente peguei uma folha de papel para anotar o horário, mas qual era mesmo?

            
            

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