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Uma luz forte atravessa meus olhos, pisco freneticamente tentando me acostumar com a intensidade dela, percorro minha vista lentamente pelo teto que vai até as paredes brancas. sinto um colchão macio embaixo do meu corpo, o som de aparelhos de hospital me mostram onde estou.
Tento me levantar, mas tem várias agulhas enfiadas em minha mão, minha cabeça está tão pesada, passo a mão na testa e vejo que ela está enfaixada. Olho para o lado e vejo uma poltrona verde limão, ainda com marca de assento, do lado dela um cabide segurando um casaco marrom na parte lateral .
_ Você acordou, graças a Deus _ É o Ulisses o pai de Kira e também Presidente da fundação.
Ao ver ele, as lembranças começam a pipocar em minha cabeça. O monstro, Kira caída sem o braço, Diego morto com a barriga aberta no meio da fundação, a adaga, a luz saindo do meu corpo, meu Deus o que foi tudo aquilo.
_ Cadê a Kira _ Pergunto desesperado tentando levantar da cama, continuo _ E o Diego, você viu o que aconteceu? Porque ninguém estava lá? Porque ninguém foi ajudar? Porque?
Mais uma vez as lágrimas estão caindo dos meus olhos sem parar. Nunca, nunca imaginei que sentiria essa dor novamente. Minha cabeça, meu peito, minha alma, estão todos fodidos, tá tudo incompleto novamente. Eu só consigo chorar e imaginar que se eu não tivesse forçado-os a ir beber aquela maldita água, nada disso teria acontecido.
Ulisses me abraça, tentando me fazer parar de
chorar _ Calma, Kira está bem, ela está ... Ele engole seco prendendo o choro, mas prossegue
_ Você sabe, ela perdeu muito sangue, mas vai se recuperar, os médicos tem esperanças, e Diego.. Ulisses dá mais uma pausa, e dessa vez uma lágrima escorre pelo seus olhos _ Sinto muito _ Ele sussurra.
Eu já sabia o que ele iria dizer, mas eu não estou preparado, na verdade acho que nuca vou estar, ainda chorando eu pergunto _ Posso ver a Kira? Ulisses suspira _ Tá, mas primeiro você tenta descansar, tenta comer alguma coisa, enquanto eu vou perguntar para o médico se você está liberado para vela.
Antes que ele abra a porta eu falo _ Espera, e o Diego? e o velório? eu preciso estar lá, o que vão fazer? Ulisses volta até a cama que estou deitado _ A gente vai fazer o velório hoje, junto com a saudação, vamos dar a ele a marca do caçador que ele lutou tanto para ter _
_ Eu preciso estar lá, Kira precisa estar lá, nós juramos que estaríamos juntos nesse dia, não será como imaginamos, mas... ainda sim estaremos juntos _ Falo enquanto Ulisses balança a cabeça
_ Claro que não, ele exclama _ A Kira tá ... muito mal, e você? você nem consegue levantar da cama.
Ele segura minhas mãos e olha em meus olhos
_ Alan, seu pai era como um irmão pra mim, eu te criei como um filho, então jura, jura pra mim que você não vai levantar dessa cama, por favor? Eu já perdi minha esposa, perdi seu pai, agora o Diego. Eu não posso perder você, eu não posso perder a Kira, eu não vou suportar mais nada igual.
Um som abafado sai do meu pulmão quase que involuntário, a tosse consome quase todo o meu corpo, não consigo parar. Levo a mão a boca para abafar o som, mas sinto sangue, eu estou tossindo sangue?
_ Eu não quero morrer, não posso deixar a Kira sozinha _ Sussurro
Levanto a visita e olho diretamente para Ulisses que me olha com o rosto assustado, e de uma vez só, ele se vira e vai até a porta _ Vou chamar o médio _ Diz ele correndo pelo correr do hospital.
_Eu vou morrer? Pergunto para o Medido enquanto ele tira o raio X do meu pulmão _ Não, você só levou uma pancada muito forte, isso é só uma inflamação. Vai ficar tudo bem, você teve sorte garoto_ Ele diz sorrindo.
Como ele chama isso de sorte, perder o cara que eu amo é sorte? Saber que minha melhor amiga está gravemente ferida em uma cama de hospital, é sorte? Não sei qual o conceito de sorte desse cara, mas ele tá muito enganado quanto a isso. Eu daria minha vida pra que as pessoas que eu amo estivessem bem, isso sim seria sorte.
O médico ergue a seringa contra luz e dá dois toques com o dedo para se certificar que não há nem uma bolha de ar dentro do frasco, apenas o líquido. Tenho até a impressão de ver um pequeno e suave brilho sair da ponta da agulha de tão nova e afiada que ela está
_ Vou injetar esse calmante em você que vai te ajudar a dormir _
Acordo com gritos vindo do lado de fora do quarto, olho pela janela de vidro da porta e vejo várias pessoas correndo pelo corredor. Sem pensar duas vezes eu arranco as agulhas da minha mão e caminho até a porta, antes de girar a maçaneta os gritos param. Saio do quarto e o corredor está morbidamente escuro, um calafrio toma conta do meu corpo e percorre toda minha espinha. Sinto a mesma sensação que senti no corredor da fundação naquela maldita noite.
Caminho devagar até o único quarto com a luz
acesa. Me aproximo e vejo Kira deitada imóvel, seus olhos estão abertos, e ela olha fixamente para o teto. Minha respiração está ofegante, meu coração parece que vai pular pela boca a qualquer momento. Vou em passos largos até a sua cama, e no exato momento em que me aproximo, as veias do pescoço dela começam a inchar, seu corpo começa a convulsionar. Eu seguro sua mão para tentar acalma-la, grito por ajuda, mas ninguém parece ouvir.
As bochechas dela estão inchando, seus lábios estão tentando se mexer. Parece que ela quer me dizer algo. Me aproximo o máximo que eu posso do seu rosto para ao menos tentar entender o que ela quer falar, e mesmo antes que eu me prepare, sua boca abri de uma única vez, enlanguescendo todo o seu lábio como se não tivesse fim, e jogando para fora um verme que sai se arrastando tão rápido pela porta, que nem me sobra tempo para assimilar tudo o que está acontecendo.
A convulsão para, Kira fecha os olhos, mas logo em seguida os abre de novo, ela escorrega pela cama soltando a mesma gosma que o verme solta quando está se arrastando pelo chão.
A gosma cobre seus olhos, seu nariz, seus cabelos deixando apenas a boca visível.
Eu corro pelo corredor tentando achar uma saída, avisto o elevador aberto, mas antes que eu chegue até ele. O verme que saiu do corpo de Kira cai do teto em minha frente, ele se transformou da mesma forma que outro. Estou encurralado no meio do corredor, a única coisa que me resta agora é esperar pela minha morte.
Kira que agora é um monstro, corre em minha direção de um lado, o verme que agora é grande robusto corre também em minha direção do outro.
Já ciente do meu fim coloco minhas mão sobre a cabeça esperando tudo acabar.
Tenho a impressão de sentir meu corpo se chocar contra cama, meu olhos abrem com tanta rapidez que sinto os arder, percorro meu olhar pelo quarto com pressa tentando me situar com o local
_ Droga foi apenas um sonho _ sussurro ainda ofegante, mas parecia tão real. Minha cabeça ainda dói tanto, a cama e a roupa de hospital que estou vestido estão encharcados de suor.
Ulisses entra no quarto de cabeça baixa que nem percebe que estou acordado, ele senta na poltrona, coloca as mãos sobre a cabeça e começa a chorar _ O que ouve? Pergunto. Ele se assusta e logo enxuga as lágrimas _ Há! Nem percebi que você estava acordado, não é nada! Só estou cansado, apenas isso. Balanço a cabeça em negação _ Agora é uma péssima hora para mentir, você não acha? Ele suspira já levantando a cabeça, e apenas me olha nos olhos.
Ele nem consegue falar, mas do jeito que ele me olhou agora, já sei o que aconteceu. Deito minha cabeça no travesseiro e derramo mais rios de tristeza, de culpa, de impotência. Despejo nessa cama toda a dor em forma de lágrimas que me consome a cada minuto, a cada segundo que passa, não sinto mais a dor no corpo, porque a dor que estou sentido em minha alma é muito maior.
Como alguém pode suportar perder tanto em tão pouco tempo? E por que eu? sinceramente eu não consigo entender.