- Que não se repita! - Ele coloca a bolsa na mesa e abre seu livro. - Primeiramente, preciso me apresentar. Sou Frederic Martiolle, tenho 28 anos, vim do México e vou ficar um tempo com vocês. Não admito falta de respeito, atraso e nunca me interrompa enquanto eu estiver falando. Seus problemas pessoais não me interessam. Se não estiver bem ou não estiver feliz comigo, é só sair!
- Nossa. - Estou aqui pensando como fui sonhar com um homem assim e acabo sussurrando. Não consigo acreditar que o homem que eu amo realmente existe, mas a realidade é totalmente diferente. No meu sonho, ele é doce, divertido, era meu amigo, confidente, sua voz transmitia calma. Esse é arrogante, autoritário, seu olhar é frio. Ele me causa raiva, odeio pessoas assim, com esse ar de superioridade.
- Parece que tem alguém disposto a me irritar! Você está me interrompendo, senhorita Lupita.
- Acredito que tenha se enganado, pois não sei em que parte eu te interrompi!
- Quanta petulância! Estou explicando e você está resmungando. Se tem algo para dizer, essa é a hora.
- Nossa, devo ter falado muito alto. E, respondendo à sua colocação, não, não tenho nada a dizer para você.
- Pois bem! Já que a amiga de vocês resolveu testar minha paciência, vamos de um teste surpresa. Todos guardem o livro e os celulares. - Todos começam a resmungar, me culpando, mas eu não tenho culpa. Eu mal abri a boca e ele já veio com implicância comigo. Frederic entrega o teste, mas antes ele abaixa e sussurra em meu ouvido.- Vamos ver se você é tudo isso que os professores falam. - Meu coração parece que vai saltar do peito, seu sussurro me fez arrepiar. Suspiro fundo sentindo seu perfume, viro meu rosto na direção dele e nossos olhos se encontram por alguns segundos. - O que foi? Está gostando do que vê? - Fico em silêncio e abaixo a cabeça. Estou com uma mistura de medo, alegria e decepção por ver que o homem que eu desenhei na minha cabeça é isso. Tão anti profissional e ignorante.
Foco no teste e não demoro muito para finalizar. Sou a primeira a terminar, me levanto e vou entregar.
- Revisou? - Ele fala assim que me coloco na frente da sua mesa. - Ou é daquelas que corre terminar só para ficar sem fazer nada?
Deixo o teste na mesa e volto a me sentar. Todos estão me olhando, parece que querem que eu faça ou fale alguma coisa. Todos da sala viram os meus desenhos, sabem que eu não me aproximo de um homem há 1 ano. E agora não sei o que fazer.
Não demora muito e todos já tinham entregado a prova e ele estava corrigindo. Frederic começa a chamar os nomes dos alunos, e a maioria ele fala "parabéns". Percebo que ele deixa minha prova por último.
Zoe, que senta ao meu lado, recebeu 7,5 e ele deu parabéns com um sorriso satisfeito.
- Talvez ele não seja tão ruim assim. - Falo baixinho.
- Lupita! - Ele fala juntando as mãos sobre a mesa. Me levanto nervosa, mesmo sabendo que fui bem, parece que preciso da aprovação dele. Me aproximo da mesa e espero ele me entregar o teste. - Pode sentar, ou está esperando alguma coisa?
- O que esperaria de você? - falo baixo só para ele escutar. Ainda não me conformei que ele é o amor da minha vida, só de ele falar meu nome, meu coração dispara. Pego minha prova e tirei 10.00, ele não disse uma palavra sobre minha nota. Confesso que senti uma pontinha de decepção. Não consigo entender o porquê ele me trata com tanta indiferença. No decorrer da aula, percebi que ele sorri com facilidade com os outros alunos, mas comigo é um ogro. - Só você o conhece, Lupita, não esqueça disso. - falo comigo mesma.
- Continua querendo chamar a atenção? - Ele fala se dirigindo para mim. Não respondo, ignoro a sua ignorância. Na saída, Rian está me esperando na porta. Me apresso para sair logo, mas o professor me interrompe. - Não fique achando que vou facilitar sua vida só porque você é filha do dono. - Pouso minhas mãos na mesa e o encaro com indiferença.
- Não espero facilidade, nunca busquei coisas fáceis. Se escolhi essa faculdade, não foi porque meus pais são donos, mas sim porque é a melhor.
- Assim espero!
- Você não tem que esperar nada. Você é meu professor, seu dever é ser justo e me ensinar o que sabe. Já que está sendo ignorante comigo sem motivos, vou te dar motivos para isso.
Saio sem esperar sua resposta. Quando me aproximo dos meus amigos, abraço Rian pela cintura. Com ele, me sinto segura. Mesmo que ele não tenha culpa de ser o rosto do homem que amo em meus sonhos, ser tratada assim dói.
- O que aconteceu? Você parece estar assustada. - Rian segura meu rosto com as duas mãos, erguendo-o para encará-lo. - Fizeram alguma coisa? - Desvio meu olhar e ele segue. - Como isso é possível? - ele fala surpreso.
- O QUE? - Renata grita, chamando a atenção do professor.
- Minha nossa, ele é real?
- O que está acontecendo? - Raffa fala se aproximando. - Vocês parecem que viram um fantasma... - Ela olha dentro da sala. - O quê? Como isso?
- Só vamos embora, por favor. - Falo desanimada.
- Ele te fez alguma coisa?
- Não, Rian, eu só quero ir embora, deitar e dormir.
- Me diz o que aconteceu.
- Vamos! Dá para ver que não está bem, ela.
Já fora da faculdade, me despeço dos meus amigos, chego no estacionamento e lembro que estou sem carro.
- Que dia de merda. - Falo caminhando pela saída. Mas paro quando vejo um carro parando ao meu lado.
- Olha, a filhinha do patrão está sozinha. - O professor substituto fala com um sorriso debochado.
- Frederic. Me diz uma coisa.
- Sou seu professor, que intimidade é essa de me chamar pelo nome?
- Não, dos portões para fora você não é meu professor!
- Tá legal. Fala o que quer, patricinha.
- Quantos anos você tem? 4? Um homem barbado resolveu pegar no meu pé só por ser filha do dono da escola?
- Quem disse que é só por isso? Tem certeza de que você não sabe o porquê te trato assim.
- Hoje é a primeira vez que te vi pessoalmente, não tem lógica ser tão ignorante comigo. - Saio andando, deixando ele para trás. Pego o celular e vejo a hora. - Droga, perdi o ônibus por causa desse ogro. - Olho para trás, ele está parado me olhando. Começo a andar. Esse era o último ônibus, então vou ter que ir a pé. Logo vejo que ele está atrás de mim. - Agora resolveu perseguir seus alunos? Não acha estranho?
- Vem, entra que te levo para casa, marrenta.Ele fala igual ao homem dos meus sonhos, sua voz é autoritária.
- Tenho que recusar! Obrigada. Prefiro andar dois dias a pé do que entrar no seu carro.
- Para de cena, Lupita. Eu sei que você quer ficar perto.
- Por que ficaria perto de alguém que não conheço? - Falo fingindo não ter ligado. Como se fossem minhas orações sendo atendidas, Rian buzina logo atrás e para o carro ao meu lado.
- Lupi. Entra.
- Meu salvador. - Brinco. Dou a volta, Rian desce e abre a porta para eu entrar.
- Senhorita.
- Obrigada. - Frederic serra seu maxilar, Rian acelera e ultrapassa ele, deixando somente poeira para trás. Depois de 1 hora de carro, chegamos na minha casa. - Vamos subir? - Falo descendo do carro e ele faz o mesmo. Subimos para o quarto e começamos a conversar. Sei que ele não está bem, ele é apaixonado pela Renata e ela nem imagina, tanto que ela fica com qualquer pessoa, menos com ele. - Veja só, dois amigos sofrendo por amor, um que até algumas horas atrás não existia e o outro sofre em ver a mulher amada com outro. Isso é uma droga, não é?
- Nem me fala. Por que ela não consegue me enxergar como eu quero? - Deito ao seu lado, ele com a cabeça de um lado e eu do outro.
- Rian, não se preocupe, na vida tudo tem a hora certa das coisas acontecerem. Talvez a mulher que vai abalar o seu coração esteja tão perto e só você não consegue ver.
- De quem está falando? - Ele pergunta baixinho. Fecho os meus olhos até que pego no sono.
Nele, Frederic está de costas olhando para o mar. Me aproximo e faço o mesmo, sua mão segura a minha. Ficamos uns minutos em silêncio, até que ele resolve falar.
- Oi amor, demorou para chegar. - Ele fala sem me encarar.
- Pois é, até pensei que você não estaria aqui.
- Eu disse que sempre estaria ao seu lado. Não disse?
- Sim, disse. Hoje eu te vi...- Falo um pouco com receio.
- É, eu sei.- Viro de frente e tento encontrar seus olhos.- Desculpa por te tratar daquele jeito.
- Como assim você sabe? Fui eu que te inventei, não era para você existir na minha realidade.
- Nunca disse que não sou real. Sempre soube que esse dia ia chegar.
- Por que me tratou tão mal? - abaixo a cabeça sem conseguir entender o que está acontecendo. De como ele sabe que conheci seu verdadeiro eu.- Fred, fala comigo, o porquê de tudo isso?
- Fui eu que entrei em seus sonhos, posso ser isso que sou aqui, neles, minha realidade é diferente, nela você nunca iria me amar. Sei que vou te perder daqui para frente, por isso, não deixe de sonhar comigo.
- Não consigo entender.- levanto os meus olhos e ele se aproxima, segurando na minha cintura ele me beija intensamente.
- É simples de entender, amor. Você está entre o sonho e a realidade, aqui sou eu quem dita as regras, no seu mundo, é ele, não consigo controlar o que ele faz.- Me afasto me sentindo estranha, como se eu estivesse vivendo em dois mundos.- Eu sei que é assustador, você achou mesmo que era apenas um sonho? Minha marrenta, eu não posso te perder, quando disse que você seria só minha, estava falando a verdade.
- Ei, Lupita, acorda, Porque abre os olhos.
- Num, onde estou?- Forço a acordar e me sento, Rian coloca a mão no meu rosto limpando minhas lágrimas.- Teve um pesadelo?
- Não sei. - Olho para ele querendo falar o que aconteceu. Mas desisto. Suspiro pesadamente e encosto minha cabeça no ombro do Rian.- Por que ele simplesmente não some e volta a ser o meu sonho? Perfeito, com o seu sorriso lindo?
- Os sonhos são exatamente isso, sonhos. Às vezes, não basta amar uma pessoa que você desenhou. No seu sonho, ele é perfeito, alegre, mas na vida real, ele é amargo e o seu olhar é frio. Por isso, é mais fácil amar algo que queremos que seja real. Tente tirar esse sentimento que você alimentou do coração, do mesmo jeito que você o desenhou. Dê um jeito de apagar. Até porque você se apaixonou por alguém sem nome. E esse homem não é o mesmo. Pode ter o mesmo rosto, mas não tem como ser o mesmo. Entre a fantasia e a realidade, prefira viver a realidade, por mais amarga que ela seja.