- Deus! Você quase nos mata do coração. - disse Vivian, que entrava atrás dela. Soltei um sorriso triste. - O que é? Não está com nenhuma doença terminal, né? - Abraçou-me forte.
- Não. - Pigarreei. - Apenas uma anemia boba.
- Não parecia boba. Pensei que estava morrendo. Posso rir agora, mas realmente foi assustador. A sorte é que estava com Mateus e ele ajudou te carregando.
- Agradeço, meninas. Mas não era nada de mais, prometo me cuidar melhor agora.
- Sim, você vai - disse Alice. - Sua mãe está vindo, Nicole. Ela pegou o primeiro voo quando Mateus ligou para ela contando o ocorrido.
- Nós não pudemos nem interferir. Não sabíamos o que você tinha, não seria justo não contar a ela.
- Sim, eu entendo. - Estou ferrada. - Vocês estão certas. - Minha mãe vai me matar. - É seu exame?
- ela disse, interrompendo a conversa e pegando o envelope com o ultrassom. Andei na sua direção e o tomei da sua mão.
- É sim - disse com grosseria. - Meu exame. Minha vida. Minha privacidade.
- O quê? - Vivian me olhou assutada. - Nicole, é tão ruim? - Ela abaixou o tom, para um preocupado que nunca ouvi em sua voz antes. - Se você está doente, precisamos saber a verdade. O que tem de errado com o seu exame?
- Nada! - gritei, histérica. - Eu só não quero mostrar a ninguém. É meu exame, não quero que ninguém veja. Por que não podemos somente esquecer isso?
- Nicole, você está nos assustando. Nós não temos segredos umas com as outras. Seja o que for que tenha dado no seu exame, não precisa agir assim. Nós somos amigas de longa data, não tem por que esconder.
- E por que vocês acham que estou escondendo algo? - gritei mais uma vez.
- Porque você está estranha, na defensiva, tendo atitudes suspeitas. - Ela gesticulou, indo na minha direção, quando puxou rapidamente o exame da minha mão. E eu fiquei sem reação.
- Vivian, me devolve agora!
- Nicole. Não me odeie. Mas você esta me assustando para caramba, já vou te devolver. - disse, abrindo o envelope e olhando para ele. Vivian olhou por um momento para o exame e, depois, para mim. Novamente exame e, depois, para mim. Em seguida, botou a mão na boca. Sua face era ilegível. Acho que ela tentou falar, mas perdeu a voz. Passou para Alice, que não demorou muito para falar.
- Quem é ele? - disse, olhando para baixo.
- Eu juro... - gaguejei. - Eu juro, eu ia contar para vocês. Não durou, foi só uma vez, então não vi necessidade de contar... eu... Vivian me cortou.
- Nós nunca escondemos nada de você! Como pôde esconder isso de nós? Pensei que fôssemos amigas. Poderíamos ter te ajudado.
- Eu não sei... - Tentei conter as lágrimas que nublavam a minha visão.
- Você ao menos sabe quem é o pai? - Porra, Vivian, pega leve.
- Alice se aproximou secando minhas lágrimas. - Luu... Luuuck... - disse entre lágrimas.
- Luck Petrelli? - ela completou. Acenei que sim com a cabeça.
- Puta merda! - Botou a mão na boca. - Ele abusou de você? - ela disse, se aproximando. - Não! - disse de uma vez. - quer dizer...não sei! Eu bebi demais, inicialmente eu queria muito ir com ele. A ideia de ter ele me tocando parecia incrível. Agora não sinto nada além de raiva dele, raiva de mim. Com sinceramente mal me importo se foi bom ou ruim. Mas não entendo. Nós nos prevenimos, não era para isso acontecer. Quando isso aconteceu?
- Alice perguntou.
- Na noite da nossa formatura. Alice soltou um assovio baixo.
- Luck é mesmo um filho da puta. A gente pode ir até a casa dele. Ir na policia, não sei. Deu um sorriso triste.
- Oque eu sei é que no seu estado, nenhum cara deveria transar com uma mulher.
- A gente pode falar com meu pai, pedir para darem uma surra nele. - Vivian sugere.
- Não. - Alice avisa. - Esqueceu que ele é filho do prefeito. Ouvi dizer que ele tem conexões perigosas. Nicole não precisa de mais problemas.
- Sendo assim, o que você vai fazer?
- Eu não sei. - Respondo a Vivian, sentando na maca atrás de mim.
- Você vai tirar esse bebê, né? Você não pode ficar com essa criança, o Luck nunca assumiria esse filho. E ainda tem Madeleine. Meu estômago revira com suas palavras.
- Sim, eu sei - respondi. - Mas ele precisa saber. Vivian riu, mas era lamentável, infeliz..
- Qual é o seu problema? Sério. Posso até estar enganada, mas juntando as peças, dá para perceber que ele abusou de você. Você não tem a quem recorrer Nicole.
- Sim, eu sei. - Limpei as lágrimas escorrendo em meu rosto. - Mas ele precisa saber.
- Ok, eu lavo as minhas mãos. Você precisa começar encarar a realidade. Olha onde essa paixão platônica te levou. Você é linda, podia ter tido qualquer garoto decente dessa cidade. Mas não, precisou experimentar a única pessoa que não presta. E pior, engravidar dele. E ainda pior, alimentar a esperança de que esse pedaço de merda que ele é, assumirá você e essa criança. De verdade, eu tentei alertar você que Luck não era o mocinho. Eu amo você, e por isso que temo, que se levar essa história adiante, quebrará o seu coração de uma maneira irrecuperável. Você teve todas as chances para escolher certo e acabou de ferrar a sua vida. E sabe, mesmo que não queira assumir, que sua melhor chance é se livrar desse bebê.
- Ela jogou seus olhos em direção à minha barriga. - Eu te levo a um lugar e ninguém ficará sabendo que isso um dia aconteceu.
- Você não precisava ser tão má. - As palavras foram ditas debaixo de sua respiração tensa.
- Por Deus Vivian. - Ela sussurra infeliz. - E não acho que seja a melhor pessoa para dizer coisas assim, você sabe o porquê! - Alice estreitou os olhos para Vivian, que estava entre nós. Ambas compartilhando um segredo do qual eu não fazia ideia.
- Alice, eu só disse o que você queria dizer há muito tempo! Você não tem mais dez anos, Nicole, vê se cresce.
- Eu queria ter contado, juro, só não sabia como. Eu estava tão confusa... - Suspirei fundo entre os soluços. - Nunca pensei que Luck me trataria assim.
- Nicole, por favor... - Alice disse, alisando meus braços carinhosamente de cima para baixo. - Se ele lhe fez algo, se você não queria, ou se ele te forçou, você precisa nos falar. Não há vergonha nisso, mas nós precisamos saber de tudo.
- E que credibilidade eu tenho? - falei. - Eu quis! Subi para o seu quarto por livre e espontânea vontade. - Limpei meu rosto. - E mesmo não querendo continuar, em nenhum momento eu fui corajosa para dizer para ele parar, para dizer não.
- Eu sinto muito que esteja passando por isso Nicole. - Vivian completa. - Mas você não precisava chegar a esse ponto para poder enxergar a verdadeira face do Luck, que estava lá o tempo todo, você apenas não quis ver. Nem quero pensar em como esse caminho será longo para você. - Ela disse baixo e, em seguida, saiu batendo a porta.
- Ei, tá tudo bem. - Alice me abraçou. - Ela só precisa de um tempo. Todas cometemos erros. Caí no choro por muito tempo. Saímos e fomos para casa. Ela quis dormir comigo, mas preferi ficar sozinha.
*
Na manhã seguinte, acordei com uma batida forte na porta. Despertei rápido e levantei ainda enxergando embaçado, por causa da noite mal dormida e do choro. Atendi e dei de cara com Madeleine.
- Arrume suas coisas - ela disse, passando direto por mim. Sua face era impassível, ela continuava da mesma forma que em minhas lembranças. Cabelos pretos presos em coque. Seu rosto parecia branco feito neve, sobrancelhas pretas, grossas bem esculpidas, lábios cheios, olhos azuis contornados por belos cílios negros. Magra, seios fartos. Ela era certamente era minha versão mais velha. Vestia um terninho azul marinho, saia lápis abaixo do joelho e um escarpim nude.
- Esse lugar está um chiqueiro! - ela disse, tampando o nariz e pulando algumas caixas no caminho. Fiquei parada por um momento. - Vamos! - Dei um pulo com o timbre da sua voz. - Não fique aí parada, tenho que resolver negócios na cidade e não posso demorar. Tive que adiantar meu voo por causa do seu mal-estar. Enquanto eu estiver aqui, você ficará na nossa casa. Depois disso, partirá comigo.
Ok. Pensei: Nenhum "Olá, tudo bem?" "Que bom que não morreu." "Que pena que não a vejo há nove anos, apenas por videoconferências." "Que sorte que tinha negócios na cidade, não seria vantagem para mim vir para cá porque você teve um 'mal-estar".
- Ok, Madeleine. - Virei-me para ela. Por favor, Nicole, você sabe que eu não gosto que me chame assim. Eu sou sua mãe.
- Ela se aproximou, acariciando meu rosto com os dedos. Unhas vermelhas bem pintadas e nenhum anel em seus dedos. - Desculpa, mamãe - respondi, baixando a visão.
- Agora, vamos! - Deu dois pequenos tapinhas no meu rosto.
- Tenho negócios na cidade. Era tão estranho estar perto dela. Sentei ao seu lado no carro, mais parecíamos duas estranhas. Não conversamos, nem nos olhamos. Eu não conhecia aquela mulher. O carro parou e ela desceu sem sequer se despedir.