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DIAS ATUAIS
– O que quer nos contar, grande escritor? – perguntou Mil como se a curiosidade não lhe atingisse como a sua esposa e a sua filha.
– Semião parece que está desaparecido e em casa dele encontraram um corpo de uma menina, já sem vida. Falaram que no pescoço da menina havia algo estranho, mas não sei ao certo do que se tratava.
– De quem você buscou essa informação? – perguntou Ilda com uma voz seca, parecia que tinha algum problema contra aquele homem das palavras que ainda precisavam ser consertadas.
– Busquei do Lodji. – respondeu Roland de imediato após a Ilda terminar a pergunta.
– Pode contar mais sobre isso? – perguntou Mil.
Lika, agora estava no silêncio apenas olhando para cada um que falava naquele quarto, ela era uma ouvinte e assistente atenta, caçando uma oportunidade para poder falar alguma coisa para poder contribuir na conversa que aos poucos ia se desenvolvendo.
– Gostaria de contar mais, mas já não tenho mais detalhes para poder contribuir.
– Mas Semião não morava com nenhuma menina. Como é que encontraram uma menina na sua casa e ainda por cima sem vida? – pensativa Ilda indagou.
– Bem, poderia ser uma menina da vizinhança, mas nós conhecermos bem o comportamento dele. Ele não faria nada de mal contra uma menina e contra ninguém. – acrescentou Mil nas palavras da esposa.
– Ou pode ter machucado a menina quando voltou a ficar da forma que o vimos na igreja. – disse Roland.
Quando a Lika escutou a palavra Igreja ficou arrepiada e teve num breve momento uma alucinação visual. Viu o rosto do menino que lhe apareceu na casa de banho da igreja.
– O que mais me deixa intrigado é o facto dele ter ficado naquele estado, possuído por algo demoníaco, aquilo mexeu comigo. – disse Mil.
– A mim também me espanta e ainda coloco a mesma questão para mim mesma; Como que alguém que parecia viver exatamente o que pregava acabou sendo hospedeiro da maldição? – continuou Ilda nas palavras do marido.
Lika continuou olhando para eles, no entanto teve vontade de falar quando a mãe terminou de falar. Ela tossiu de uma forma exagerada e todos olharam para ela.
– Posso falar?
– Claro. – todos disseram em uníssono.
– Eu acho que ele não fez nada contra a menina, não só por conta do seu comportamento. Eu não sei explicar como, mas sinto que ele não machucou a menina.
– Então como é que se explica o facto da menina ter sido encontrada morta justamente no interior da casa? – disse Roland.
– Não sei, mas continuo dizendo isso, sinto que ele não fez nada contra a menina.
Ilda olhou para a filha com uma expressão estranha.
– Para ter mais informações vou ligar para o Lodji. – disse Mil.
– Depois dessa ligação, diga-me qualquer coisa, porque não quero perder nada. – disse Roland.
– Vai fazer o quê com essa informação? Escrever um novo livro de terror? – disse Ilda assim o clima mudou no quarto, Lika e Mil olharam para Ilda com uma expressão de desaprovação e ela tentou disfarçar o sentido das suas palavras, primeiro tossiu depois mudou a intenção da sua mensagem. – Brincadeira. Quis dizer, Mil vai te deixar informado de certeza, Mil não vai, meu amor? – mudou a sua voz para uma suave de uma forma forçada que soou algo mecânico.
– Claro, amor. Vou manter Roland informado de tudo. Eu sei que o Semião é seu amigo e grande.
– Pois, alguns casos que ele resolvia eram tão bizarros que eu incluia nos meus livros de ficção para trazer mais, como posso dizer, mais verossimilhança, sabe. – pronunciou Roland.
– Está ver, é isso que eu quis dizer com a piada. – Ilda tentou justificar as suas prévias palavras.
Roland sorriu sem nada dizer, mas Mil e Lika não gostaram da piada da Ilda, por conta da forma como foi enquadrada naquele contexto, isso incomodou aos dois, pai e filha.
– Bem, eu vim visitar a Lika e trazer a informação sobre o Semião, meu grande amigo. Agora não sei o que pensar depois de ter visto aquele acontecimento na igreja, mas rezo que ele não tenha desaparecido e que não tenha nada a ver com a morte da menina encontrada na casa dele. Agora tenho que voltar para casa para escrever mais.
Com desprezo Ilda olhou para Roland desmerecendo o trabalho do homem, mas na verdade as obras do homem ainda precisavam de mais substâncias para prestarem. Antes que Roland saísse, no quarto entrou uma médica muito clara e a sua expressão serena já denunciava que os resultados eram positivos, coisa que todo mundo estava a espera, mesmo que tenha acontecido numa situação talvez sobrenatural.
– Saudações, vim informar sobre o estado clínico da paciente, Lika Ghrumu.
A ansiedade era visível no olhar de todos, mas quem dominava a todos era da Ilda.
– Conta, Sr. médica. Como está a minha filha?
Mil virou de imediatamente olhando para sua esposa com um olhar de quem diz "essa não é sua filha, é nossa filha", e aí Ilda olhou de volta para seu esposo onde percebeu a mensagem em cada ruga na expressão facial.
– Felizmente, Milka encontra-se fora de risco. Incrivelmente está tudo bem com ela. Diferente do senhor Mil que fraturou um dos ossos do antebraço a vossa filha está completamente "intacta" como se não tivesse sofrido uma queda de risco.
Os olhos dos quatro no quarto brilharam e não demoraram para festejarem entre abraços e palavras doces. A médica sentiu-se parte daquilo e também não escapou das palavras doces e abraços. Ela estava feliz por ser a portadora da boa nova e também por ser inclusa na festa da família.
Ninguém dos profissionais do hospital da cidade de Orge estava a espera de um resultado positivo, pois alguns puderam testemunhar a queda da Lika na casa de Deus e também a queda do seu pai, que na verdade também não se esperava que tivesse uma consequência não tão grave.
Um milagre havia acontecido na família Ghrumu.
...
Após receber alta Lika voltou para casa e as coisas pareciam ter voltado a normalidade. Agora ela estava de volta a casa, sentada na sua cama com os pensamentos borbulhando na sua mente, fora do controle, até uma dor de cabeça começava a dar sinal de em seguida lhe assolar. Chovia lá fora com uma preguiça que Lika apreciava no interior do seu quarto. Muitas perguntas circulavam sem fim, inerentes ao episódio da igreja que o protagonista fora o Semião Lorgon.
Alguém bateu na porta com o intento de entrar, talvez para ter uma conversa com ela. A primeira batida não provocou nenhuma reacção à adolescente que não conseguia sair do quarto, apenas apreciando a dança da chuva pela janela, sem nenhuma motivação, o tédio havia tomado conta dela, mas quando soou o segundo toque na porta, do mesmo modo como segundos atrás, ela respondeu:
– Pode entrar. – Os seus olhos viraram para a porta por alguns segundos e depois voltou à janela.
Uma adolescente alta que mais parecia prestes a atingir dois metros entrou no quarto com um semblante preocupado, influenciada pela Lika que olhava para ela com uma expressão nada convidativa.
– O que foi? Lika, alguma coisa aconteceu?
– Nada, só estou me sentindo mal disposta.
– Entendo. Pensei que estivesses melhor.
– Estou melhor comparado com os últimos dias depois... você entende.
– Claro. Eu também tento esquecer aquele acontecimento da igreja, mas não está sendo fácil.
– Kilvana. – disse Lika quando a amiga se aproximava dela na cama. – Senta aqui, tenho algo que gostaria de compartilhar com alguém de confiança e que não me ache uma louca. – Pegou na mão da outra e desceu os seus olhos em direcção das mãos.
– Está me deixando assustada. O que quer me contar? – Com uma surpresa nas suas palavras Kilvana disse olhando para os olhos da outra.
Batidas fortes na porta soaram naquele exacto momento em que a Lika queria revelar o que lhe deixava pensativa, e da forma como a porta era agredida havia uma grande probabilidade de ser o seu pai, pois ele era uma das pessoas que tinha aquele jeito inadequado de pedir licença.
As duas adolescentes viraram ao mesmo tempo para a origem do ruido.
– Sim, pai. – Lika não quis perguntar de quem se tratava, pois já conhecia o comportamento do seu pai na casa. – Pode entrar.
Mil entrou no quarto da filha numa velocidade absurda como se quisesse flagrar a mesma numa acção pecaminosa, mas o seu intento ali era outro. De imediato com uma grande urgência o homem abraçou a sua filha com todo carinho que circulava dentro e fora dele. O homem ignorou por completo a presença da amiga da filha por conta do que havia atingido o seu coração, em nada mais pensava além da sua Lika, era somente sobre ela que ele pensava, a sua pequena que ele sofreu para lhe ter na sua vida.
– Graças a Deus, você está tudo bem, você está tudo bem.
– O que foi pai? Está me assustando. – Disse Lika estranhando a atitude do seu pai, pois ele nunca fizera algo parecido antes.
Kilvana também estranhou ainda aguardando pela resposta que viria do Mil que continuava abraçando a sua filha numa acção infinita. A curiosidade morava na face da Kilvana assim como nos movimentos da Lika. Depois do abraço Lika colocou de novo a questão que era necessária para satisfazer a sua curiosidade.
– Minha filha, que bom que está tudo bem consigo. É que recebi uma chamada do Lodji dizendo que encontraram o seu corpo perto da torre de bronze sem vida.
– Como assim? Como é que isso é possível? – Questionou Lika em busca de algo que fizesse sentido na afirmação do pai.
– Bem, significa que encontraram alguém com as suas características sem vida.
Em silêncio Kilvana, apenas assistia os dois que ainda procuravam a resposta.
– Muito estranho. E eu nunca fui até a zona da torre de bronze, tio Lodji sabe disso, porquê que se confundiria desse jeito?
– Não sei, a coisa sensata por fazer agora é ligar para ele para dar o relatório, pois primeiro, eu disse que consultaria a veracidade disso para depois dizer algo.
Mil, levou o seu celular do bolso e ligou para Lodji o seu irmão.
– Lodji, pode ficar tranquilo, não é a Lika.
– Sério?
– Muito sério.
– Você não vai acreditar. A menina que está aqui é igualzinha a Lika, sério.
Um arrepio percorreu a espinha do Mil quando escutou a última parte. Aquilo soava assombroso mesmo aceitando a possibilidade de existirem por aí muitas versões da mesma pessoa com as características idênticas como se se tratasse de um molde. Com o pensamento peculiar tendo passado da sua mente, Mil ficou alguns segundos em silêncio escolhendo as melhores palavras para continuar a conversa com o seu irmão acerca da situação que mexeu com o seu coração de um jeito que nunca sentira.
– Mil, ainda estás aí?
– Estou-estou. Estou. – disse Mil como se tivesse acordado duma sessão de hipótese onde não tinha mais esperança de retornar.
– Prefere vir para poder ver o corpo?
As duas meninas olhavam para Mil com curiosidade que transbordava através dos olhos. Mil, antes de responder, acariciou a sua barriga com movimentos circulares.
– Sim. – respondeu sem hesitar.
Na sua mente aparecia o pensamento: tenho que o fazer para a minha alma acalmar-se, mesmo já tendo a certeza de que a minha filha está bem.
– Está bem. Chegue aqui, dentro de no máximo uma hora. Consegues?
– Consigo.
– Pai o que tio está dizendo? – Lika sem aguentar mais segurar a sua curiosidade perguntou ao pai.
Mil, tira o celular do ouvido e tampa com a outra mão para poder interagir com a filha.
– Está me convidando para ver o corpo.
– Quero ir consigo.
– Espera.
Tornou a colocar o celular no ouvido para continuar a conversa com o irmão.
– Lodji, em que estado o corpo se encontra?
– Ainda está num estado "normal" apenas tem marcas no pescoço que mais se aproximam a ficção.
– Como assim marcas que se aproximam a ficção?
– Marcas de mordida de um vampiro.
Continua...