Assinei cada página do contrato segundos depois de a entregarem para mim, calculando o salário diversas vezes. O cargo de assistente executiva da Bolsa de Valores da Russ era de cento e cinquenta mil por ano, e as outras vagas a que tinha me candidatado variavam entre setenta e oitenta mil por ano.
Trezentos e cinquenta mil dólares por ano? Mesmo com a dedução de impostos, ainda dá mais de vinte mil dólares por mês. Por mês!
Quando voltei ao apartamento, decidi entrar pela porta da frente. Como bem suspeitava, o proprietário tinha trocado as fechaduras enquanto eu estava fora, então passei uma embalagem de camisinha para soltar a tranca e usei meu grampo de cabelo para abrir a fechadura.
– Oi, coleguinha! – Minha colega de quarto, Ava, rolou por cimados nossos pufes enormes, colocando de lado sua revista de fofoca com capa brilhante. – Como está hoje?
– Ótima! Tenho novidades incríveis! – Fechei a porta e coloqueiuma toalha para tampar a fresta. – Adivinha o que é.
– Adivinho, sim, mas antes você vai ter que ouvir sobre as minhas novidades. Tenho duas coisas maravilhosas para contar!
– Pode falar.
Ok. – Ela se sentou. – Lembra que eu tenho roubado papel higiênico do meu trabalho para o apartamento?
– Sim...
– Bem, a gerente acabou de trocar aquela marca horrorosa queparece lixa para uma de folha dupla, então nós duas estamos prestes a limpar nossos respectivos traseiros com papel nota dez daqui pra frente. – Ela sorriu com orgulho. – Já surrupiei seis rolos e coloquei no armário. Me conta quando sentir a diferença. – Pode deixar. – Dei risada. – Qual é a segunda coisa?
– Paguei o aluguel hoje à tarde, mas aquele babaca já tinha trocado a fechadura. Falou que vai entregar a chave nova só se não atrasarmos no mês que vem.
– Ele não vai nos dar a chave nova?
– Não. – Ela balançou a cabeça. – Disse que a gente parece entrar e sair numa boa mesmo sem a chave certa. Mas me perguntou se podia pegar algumas camisinhas emprestadas.
Nós duas rimos, e eu me joguei no sofá.
– Enfim, você parece estar prestes a explodir com as suas novidades. – Ela ficou de pé. – Mas deixa eu tentar adivinhar alguns detalhes menores antes que você exploda.
– Fique à vontade.
– Chute número um: você finalmente terminou com o seu namorado, que eu odeio com cada fibra do meu ser, porque ele não é bom o bastante para você. – Não...
– Bem, perguntar não ofende. – Ela sorriu. – Chute número dois:descobriu a senha do Wi-Fi do vizinho?
– Pior que sim, descobri mesmo. – Assenti. – É Parem de pegar minhas coisas, suas ladras do caralho.
– Com ou sem espaços?
– Sem.
– Vou tentar. – Ela pegou o celular e clicou algumas vezes na tela.– Perfeito! Deu certo! Agora é sério: quais são as suas novidades de verdade?
Consegui meu primeiro emprego hoje! – As palavras saíram daminha boca com mais rapidez do que nunca. – Tipo, um trabalho pago de verdade, com benefícios, vale-transporte e férias remuneradas. E, voltando para casa, a diretora do RH me mandou um e-mail dizendo que vão me dar um adiantamento de nove mil dólares do meu próximo pagamento.
– O quê? – Ela saltitou pelo apartamento. – É sério?
– Sim! – Enxuguei algumas lágrimas. – Fui contratada na hora, emeu salário é tão ridículo que a ficha ainda não caiu.
– Dá oitenta mil no ano?
– Não, mais.
– Cento e vinte?
– Mais ainda.
– Hum... – Ela parecia chocada. – Cento e cinquenta?
– Trezentos e cinquenta!
Nós duas gritamos na mesma hora e, sem combinar, fizemos o que sempre fazemos quando há um motivo raro para comemorar. Ela pegou uma garrafa de champanhe barato e eu tirei o item mais cobiçado do nosso freezer: massa de cookies da Dean & DeLuca.
– Me conta os detalhes – disse ela, tirando a rolha da garrafa. – ABolsa de Valores da Russ te fez pensar que não iam contratar você antes de aparecerem com o contrato? Bateram palmas quando você assinou?
– Não vou trabalhar para a Bolsa de Valores da Russ. Essa é umahistória para outro dia. – Esperei que ela colocasse o champanhe em duas taças e levantasse a dela para um brinde. – Você está olhando para a mais nova assistente pessoal... não, espera. Para a assistente executiva de Preston Parker, o CEO dos Hotéis Preston.
– O quê? – Ela cuspiu o champanhe. – O que foi que você disse?
Sou a nova assistente executiva de Preston Parker, dos HotéisPreston. Ou será que o nome é Hotéis Parker?
– Com certeza é Hotéis Parker. – Ela abaixou a taça e não parecia mais empolgada. Agora o medo tomava conta do seu rosto.
– Não está feliz por mim? – perguntei. – Sei que o cargo não éexatamente de conselheira legal, mas atuar como assistente executiva dele abrange uma série de responsabilidades e, por isso, requer formação em Administração ou Direito. Me disseram até que, se eu fizer um bom trabalho, posso ser transferida para o departamento jurídico nos próximos três anos.
– Olha – ela balançou a cabeça e soltou o ar –, como sua melhoramiga, estou mais do que feliz por você finalmente ter conseguido um emprego, mas não acho que esse em específico seja digno de comemoração.
– Por que não?
– Porque você está prestes a trabalhar para o Preston Parker.
Preston. Parker.
Eu a encarei, sem entender suas palavras.
– Você não tinha a mínima ideia de quem ele era antes de hoje,né?
– Não. – Balancei a cabeça. – Ele é mais do que um CEO?
Ela suspirou e foi até sua coleção extensa de revistas, jogandome cinco exemplares da Senhor Nova York e três da Page Six.
Aquele rosto lindo estampava cada uma das capas – o que me fez perceber que ele era ainda mais sexy pessoalmente, mas as manchetes da Page Six estavam longe de ser lisonjeiras.
O Senhor Nova York fatura mais uma, mas um de seus antigos assistentes conta tudo. O Senhor Nova York acaba com a concorrência e deixa outro assistente para trás. O Senhor Nova York passa a exigir que seus
novos funcionários assinem um contrato de confidencialidade depois de largar o último em Paris.
– Então ele é tipo uma celebridade? – perguntei.
– Não, ele é um barão. Um barão podre de rico e completamentearrogante. – Ela se jogou no pufe. – Se parasse para ler as fofocas comigo de tempos em tempos, teria saído correndo assim que ele te ofereceu um emprego.
– Mesmo ele tendo me oferecido trezentos e cinquenta dólarespor ano?
– E quem disse que você vai durar um ano inteiro? – Ela apontoupara as revistas. – Pode ler. Agora.
Folheei as páginas da primeira revista, sentindo um aperto no peito ao ler cada palavra impressa, o coração acelerando de incerteza.
"Ele é um babaca cruel. Um chefe sem coração. A pior pessoa para quem já trabalhei. A única coisa boa nele é a aparência, mas a ilusão acaba assim que ele abre a boca."
Folheei uma edição de alguns anos atrás, à qual ele dava sua "última entrevista", e juro que pensei que a matéria teria melhorado um pouco a reputação dele, mas senti meu queixo caindo ao ler as primeiras linhas da transcrição.
Entrevistador: Como se sente sendo um dos cinco finalistas do prêmio Senhor Nova York mais uma vez, sr.
Parker?
Sr. Parker: Sinto que eu sempre deveria estar entre os dois melhores e que nunca deveria ser o segundo colocado.
Entrevistador: Bem, Reeve Henderson, da NYB, também está tendo um ano muito bom, senhor.
Sr. Parker: Reeve Henderson é multimilionário. Eu sou bilionário.
Entrevistador: Tenho certeza de que, a esta altura de sua carreira, o senhor já sabe que dinheiro não compra tudo.
Sr. Parker: Quando você começar a ganhar bem, vai ver do que o dinheiro é capaz.
Joguei a revista para o outro lado da sala e abri outra e depois outra. Só então percebi que tinha acabado de assinar um contrato para trabalhar com o babaca mais prepotente de toda a cidade de Nova York; que tinha atado meu destino a um homem que uma vez dissera a um entrevistador: "Espero que você foda melhor do que faz 'entrevistas profundas'. Se não, recomendo com urgência que tente melhorar a primeira dessas práticas, já que a segunda não tem salvação".
Em que merda será que eu me meti?
DOIS MESES DEPOIS...