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Diyat era um dos poucos povoados onde não existia nenhum avanço quanto à autonomia das mulheres. Era apenas ali e nos povoados vizinhos que isso acontecia. Em outras regiões, as mulheres já começavam a fazer rebeliões exigindo os direitos que lhes eram negados.
Qualquer homem podia matar, estuprar e sentir-se dono de qualquer mulher que tivesse o azar de ser sua esposa. Muitas vezes os casamentos eram forçados, inclusive menores de idade eram obrigadas a se casar com homens mais velhos.
Zeynep arrependia-se uma e mil vezes de ter viajado para um lugar como aquele. Pensava que, se não tivesse ido, a teriam procurado e tentado levá-la à força, mas estando nos Estados Unidos, onde há leis que protegem as mulheres, talvez tivesse conseguido se salvar.
Kerem soltou sua mão assim que deram a volta na sala, pois a moça não podia vê-los.
-Você me deve uma. Salvei você da sua namorada.
-Não me deve nada. -Parecia que seu mau humor havia retornado.
-Desculpe, me esqueci que você é o grande chefe.
Kerem não deu atenção. Entrou para tomar um banho rapidamente, vestiu um tipo de calça estranha, uma camisa e por cima uma espécie de colete sem mangas. Calçou botas que ficaram por fora da calça, que em cima era larga e embaixo um pouco justa.
-O que é tão divertido? -Sentiu-se irritado ao perceber a expressão da moça.
-Nada, não ligue. -A garota achava graça na roupa dele, não estava acostumada a ver um homem vestido daquela maneira.
-Sou o chefe. Hoje há uma reunião importante com os chefes dos outros clãs.
Zeynep não disse mais nada. Ele saiu para ir ao local da reunião, seu pai foi com ele.
No local, a reunião ocorria em uma ampla sala. Não havia móveis, apenas um grande tapete cobrindo todo o chão e alguns travesseiros para que os presentes ficassem mais confortáveis.
Naquele dia, falaram sobre os problemas que os diversos clãs tinham com brigas familiares por terras. Famílias inteiras haviam morrido por causa desse problema. Era um assunto muito delicado: as heranças.
Além disso, os crimes de honra tornavam-se cada vez mais frequentes.
-Precisamos implementar novas leis ou pelo menos mudar as que já existem. A este ritmo, vamos ficar sem mulheres no clã.
-Eles não vão obedecer. Fazem isso por ser questão de honra. Sabe bem que, se a honra da família não for lavada, as pessoas do povoado negam-lhes a palavra e suspendem todos os serviços. Nem alimentos podem comprar.
-Então devemos organizar reuniões com os homens do povoado para conversar com eles e avisar que as leis serão alteradas, e todos devem seguir as mudanças.
Kerem esforçava-se para trazer mudanças ao seu povo. Diyat estava se afundando, as pessoas não permitiam que a modernidade chegasse até elas.
Sua proposta foi rejeitada definitivamente por todos os membros dos clãs vizinhos.
-A decisão unânime é que nossas leis sejam respeitadas, elas não podem ser alteradas. Foram respeitadas ao longo dos anos. Quem somos nós para mudar o que nossos antepassados decidiram? Além disso, se uma mulher da minha família ou tribo cometer algum erro, é justo que ela pague. Por isso as educamos desde pequenas para não cometerem faltas. As que cometem, é porque pouco se importam conosco.
Kerem não podia acreditar no que ouvia. Tomou um copo, depois muitos mais, de uma bebida com gelo que lhe serviram. Era arak, que ao misturar com gelo adquiriu uma cor leitosa. Era uma bebida forte.
Perdeu a conta de quantos bebeu. Não costumava beber tanto. Quando seu pai viu que já estava muito bêbado, decidiu se despedir para levá-lo para casa.
No quarto, Zeynep dormia tranquilamente. Kerem entrou se apoiando nas paredes para não perder o equilíbrio.
Estava cansado das tantas responsabilidades. Parou diante da cama e tirou completamente suas roupas. Quando a moça percebeu, ele já estava sobre ela. Ela sentiu seu hálito alcoólico.
-Kerem, o que está acontecendo? Por favor, me solte.
-Você é igual ou pior que ela. Também vai acabar me abandonando. Mas antes vou te ensinar quem manda aqui. Se for embora, levará minhas carícias marcadas no corpo.
Zeynep lutou para resistir, mas Kerem tinha muita força. Naquele momento, ele estava prestes a fazer algo que jamais faria em seu juízo normal. Rasgou a fina camisola que cobria o corpo da moça.
Beijou-a, até mesmo a mordeu em algumas partes do corpo frágil dela. Tapou sua boca para abafar os gritos e a penetrou de uma só vez, com muita força.
Ela sentiu uma dor imensa, como se fosse um ferro quente trespassando seu corpo. Ele a invadiu uma e outra vez até se sentir satisfeito. Ao terminar, simplesmente virou-se e adormeceu profundamente.
Zeynep não fazia mais do que chorar. Que tipo de monstro era Kerem? Levantou-se imediatamente para ir ao banheiro. Ao tentar se levantar, quase caiu, pois as pernas mal respondiam.
Notou um fino filete de sangue escorrendo por entre suas pernas. Colocou as mãos sobre o ventre e fez um grande esforço para alcançar o banheiro.
Entrou no boxe do chuveiro, abriu a água quente e deixou que caísse sobre seu corpo. A água queimava sua pele, mas a dor dentro de sua alma era ainda maior.
Quando Kerem acordou pela manhã, sentiu uma forte dor de cabeça. Não lembrava de nada, nem sequer como havia chegado em casa. Viu que o lado de Zeynep na cama estava vazio. Talvez tivesse decidido dormir novamente no andar de baixo.
Levantou-se para tomar um banho. Ao sair do chuveiro, notou no chão algumas gotas de sangue. Pensou que Zeynep tivesse se cortado com alguma coisa. Vestiu-se rapidamente.
Ao sair, ouviu os soluços da moça, mas não conseguia identificar de onde vinham. Percebeu que pareciam vir de dentro de um armário. Ao abri-lo, encontrou Zeynep no chão, com as mãos abraçando fortemente os joelhos.
Zeynep, ao senti-lo perto, começou a gritar alto. Ele tentou acalmá-la. Ao tocá-la, percebeu que ela ardia em febre.
Tomou-a nos braços e a levou ao hospital. Felizmente, alguns anos atrás havia mandado construir um, senão teriam que viajar até a cidade mais próxima.
-Solte-me, por favor, não me machuque, não faça isso. -Kerem pensou que ela estivesse delirando por causa da febre, pois ainda não lembrava de nada.
Ao chegar ao hospital, por ser a esposa do chefe, dois médicos aproximaram-se imediatamente. Levaram-na para uma sala para examiná-la. Kerem esperou do lado de fora. Quase uma hora depois, os médicos o chamaram.
-Senhor Öztürk, o caso é muito grave. Sua esposa passou a noite com o senhor?
-Passou, sim. Ela não sai de casa.
-Alguém entrou?
-Como o senhor deve saber, minha casa é uma das mais vigiadas. É impossível que alguém tenha entrado. Os guardas não estão dentro da propriedade, mas vigiam toda a quadra.
-Sua esposa está muito machucada. Foi brutalmente abusada.
Naquele momento, Kerem sentiu uma terrível pressão no peito. Entendeu então as gotas de sangue no chão e o medo de Zeynep ao vê-lo.
-Cuidem dela da melhor forma possível. E sobre isso, nem uma única palavra a ninguém, ou terão consequências cruéis.
Os médicos empalideceram. Procederam a fazer seu trabalho em completo silêncio. Kerem observava-os apoiado contra a porta, com os braços cruzados no peito. Em que tipo de monstro ele se tornara para fazer algo assim?
Zeynep permaneceu dormindo pelos dois dias seguintes devido à febre. De vez em quando, gemia e suplicava.
-Por favor... já... pare, Kerem.
Kerem estava sozinho com ela naquele momento. Seus pais haviam estado com ele, foram à casa descansar e voltariam mais tarde.
O turco golpeou com força várias vezes a parede com o punho. Nesse instante, o médico entrou e, ao vê-lo, impediu-o. Estava se machucando.
-Senhor, vai machucar seriamente a mão.
-Mereço. Sou um monstro desumano. -O médico compreendeu imediatamente o motivo de suas palavras.
Examinou e enfaixou cuidadosamente sua mão. Afinal, tratava-se do chefe. Kerem era muito respeitado.
O médico estranhou que ele tivesse sido capaz de ferir sua esposa daquela maneira. Sabia que ajudava a todo o povoado. Sua tribo era o que mais importava para ele.
Zeynep despertou pouco tempo depois. Kerem dormia ao seu lado, sentado numa cadeira, com a cabeça apoiada na cama onde ela estava.
Sentiu um forte repulsa. A simples presença dele lhe dava náuseas, mas não podia enfrentá-lo.
Havia percebido que ele era capaz das piores atrocidades. Não queria acabar açoitada na praça do povoado.
Tampouco poderia denunciar. Ele era o chefe, e em lugares com costumes tão arraigados como aquele, se uma mulher denunciasse um estupro, no melhor dos casos seria ela quem iria para a prisão.