Capítulo 4 3.º CAPÍTULO - QUEIMAR SEM FAZER BARULHO

Ela falou. Ele ouviu. Mas redenção não é tão simples.

Tyler está parado na porta. Pálido. Estático.

Os olhos colados em mim. Ou no que sobrou de mim.

A respiração dele está presa no peito. O olhar, travado no meu como se esperasse algo. Talvez perdão. Talvez a chance de voltar no tempo.

- Cat... - a voz dele mal sai.

Não desvio o olhar. Não abaixo a cabeça. Não vou dar isso pra ele.

- Você não devia estar aqui. - Minha voz é firme, sem tremer.

Ele não responde de imediato. O rosto perdeu a cor. Pela primeira vez, o homem seguro e charmoso que todo mundo conhece parece pequeno.

- Cat... - Ele tenta de novo, e a voz rouca me irrita, ele não tem o direito de fazer isso.

- Não. - Levanto a mão. - Não tem nada que possa dizer. - minha voz é firme, precisa.

- Eu... - A voz falha. Ele engole seco. - Por que não me contou?

- Porque não era sobre você. Porque eu passei anos tentando juntar os pedaços de quem sobrou. E você... - o encaro. - Você me apagou com uma mensagem.

Ele fecha os olhos. Respira fundo.

- Eu não sabia. - Ele parece estar implodindo. - Por Deus, Cat... eu... eu juro que não fazia ideia. - Dou um passo à frente, até ficar a menos de um metro dele. Ele prende a respiração.

- E ainda assim, você escolheu me condenar. Sem perguntas. Sem tentar entender. Agora que sabe, esqueça. Você não tem o direito de carregar isso. Não é sua história. Não é seu peso. E não tem o direito de usá-la como redenção.

- Você me odeia. - Ele sussurra. - Eu mereço isso.

- Não. - meus olhos encontram os dele. - Você não merece tanto de mim.

Junto minhas coisas e passo por ele sem hesitar. E pela primeira vez, é ele quem congela. Passo pelo corredor sem olhar para os lados.

Ouço passos atrás de mim.

- Você não pode simplesmente dizer uma coisa dessas e esperar que eu ignore! - ele caminha rapidamente atrás de mim.

- A única coisa que espero de você, é que fique longe de mim. - Não altero meu tom, ele não tem mais o poder de me machucar.

- Espera! Por favor... - a voz dele está rouca, arranhada. - Você não entende, Cat. Eu não dormi direito por anos. Eu pensei em você todos os dias. Senti raiva, dor, falta. Mas culpa? Culpa eu só estou sentindo agora. Porque eu entendi. E está me consumindo.

Paro na porta do estacionamento. Me viro uma última vez.

- Que bom.

- O quê? - ele franze a testa.

- Espero que te consuma.

Me afasto, mas dessa vez ele não me segue.

A porta do complexo fecha atrás de mim com um clique seco. O ar lá está úmido, abafado. Uma brisa carregada de cheiro de asfalto quente, gasolina, e cidade viva. A cidade continua, indiferente ao que acabou de acontecer lá dentro.

Minhas pernas doem. Os saltos afundam discretamente no asfalto mole. Ainda assim, caminho como se o mundo estivesse me aplaudindo.

Postura impecável. Olhar reto. Coluna ereta. Mãos firmes. Respiração contida.

Até que entro no carro.

Só então deixo o volante sentir a força com que agarro. Meus dedos tremem. As pontas latejam. Solto o ar entre os dentes. E por um instante, sou só eu. E o silêncio.

Eu disse.

As palavras ecoam dentro de mim como um trovão sussurrado.

Sete anos calada. Sete anos de terapias, de frases prontas, de medos sufocados. E agora saiu. Assim. Cru. Talvez tenha sido a raiva. Talvez tenha sido o desprezo deles. Ou talvez eu só estivesse cansada de fingir que o passado não lateja sob a pele.

Ligo o carro.

O caminho até o apartamento é automático. Como se os pneus soubessem onde fica meu novo esconderijo.

O prédio é silencioso à noite. O hall, frio. Aperto o botão do elevador e só quando as portas se fecham, encosto a testa no espelho metálico. Meu reflexo parece cansado. Os olhos, fundos. A maquiagem está perfeita, claro. Isso nunca falha. Máscaras são mais fáceis de manter que sentimentos.

Entro na casa. Largo as chaves no balcão da cozinha com um estalo. Os saltos, ali mesmo. O casaco, em cima da cadeira.

Então paro. No meio da sala.

Não há barulho, nem lágrimas dramáticas. Não sou esse tipo de mulher.

Porém, o corpo fala. Os ombros cedem. Os joelhos quase. E por um segundo, me deixo cair no sofá, abraçando os próprios braços como se fosse possível me proteger de novo.

Foi real. Eu disse. Eles ouviram. Tyler ouviu.

Sinto o cheiro do couro do sofá, misturado ao perfume doce que costumava borrifar em casa, e trouxe comigo, baunilha com lavanda. Sempre me acalma. Não hoje.

Hoje, o ar parece pesar uma tonelada. Hoje, as paredes do apartamento não me protegem.

E mesmo assim, algo mudou. Porque agora não sou a garota que se calou por medo. Sou a mulher que falou por si mesma. E que vai continuar falando. Mesmo que doa. Mesmo que o mundo ouça.

...........

Ando de um lado para o outro.

Lanço olhares na direção do homem sentado no sofá, com um sorriso tão largo que parece ter sido colado no rosto.

- Vamos lá, sabe que ainda preciso de você, dos seus serviços. - Estreito os olhos. Seria burrice me deixar enganar por esse idiota.

- Assinamos um contrato. Não é como se eu pudesse voltar para casa. Meus serviços são seus por seis meses, lembra? - Ele sorri como se fosse um prêmio. - Me diga o que, exatamente, você quer agora.

Ele se levanta devagar, com a segurança de quem acha que está prestes a ganhar.

- Kendra e eu precisamos tratar de alguns detalhes... e você precisa nos orientar.

- E por que ela não está aqui? - Paro de andar. A resposta já vem pronta.

- Tinha exames pra fazer. - O sorriso nunca abandona os lábios dele.

- Ah, claro. E você, o pai da criança, está aqui... tratando de negócios. Comigo. Sozinho. - Dou um passo na direção dele. - Por que será que não acredito nisso?

- Porque você é uma mulher incrivelmente cética. Aposto que já ouviu isso antes.

- Várias vezes. - Dou de ombros. - Nunca fez diferença.

- Vamos lá, Jones, preciso dos seus serviços. - Ele tenta parecer inocente. O que só me dá mais certeza de que há uma armadilha vindo.

- Tudo bem. Mas saiba que posso ser insuportável quando quero. E hoje? - Faço uma pausa, encarando-o. - Hoje eu quero.

Surpresa brilha nos olhos dele, mas é abafada rápido. Aposto que não está acostumado com mulheres que não caem nos seus sorrisos de comercial de pasta de dente.

- Vamos encontrar com ela no apartamento que aluguei para conversarmos, desde que descobri sobre o bebê.

- Me manda o endereço. Te encontro lá.

Isso o pega desprevenido.

- O quê? Isso não faz sentido. Estamos indo para o mesmo lugar, depois volto com você pro complexo. Podemos muito bem ir juntos. - Ele tenta soar casual, mas o nervosismo escapa nos olhos.

- Preciso me preocupar com suas intenções, O'Brien? - Ergo uma sobrancelha.

- Claro que não. Eu sei que não confia em mim... ainda. Mas sou um homem decente. Todos os caras do time são.

Solto uma risada seca. Sem humor.

- Não use o plural como desculpa. Não estou interessada em saber se seus amigos também são decentes.

Ele solta uma risadinha nervosa.

- Você é mesmo única, Caitlin Jones.

- E você é mesmo previsível, Lincon O'Brien.

Ele ri, rendido.

- Você conhece o Ty melhor que qualquer pessoa. Ele não fez por mal.

- Não comece com esse papo de: você conhece o Tyler melhor que qualquer um. Ele pode até ser um bom garoto, mas não muda o que fez comigo.

Ele hesita, depois murmura: - Não fez por mal.

- Não vamos falar sobre isso. - minha voz corta o ar como lâmina. - Achei que isso já estava claro.

- Não deveria mesmo. Ainda mais quando isso está enterrado no passado.

Ele ri, tentando aliviar a tensão, mas não funciona.

Estreito os olhos.

- Sem brigas, Cat. Só vamos dividir um carro. Prometo me comportar como o cavalheiro que sou. Se quiser, pode até ir atrás. Serei seu motorista, o mais bonito e sexy que já teve.

- Não seja ridículo. - Jogo o necessário na bolsa. - Só não me faça me arrepender desse voto de confiança. Ou vou esmagar seus miolos.

Poucos minutos depois, saímos do centro esportivo. Homens e mulheres seguem treinando. Mas param para encarar Lincon. E, por tabela, a mim.

Acho que pensam que sou só mais uma conquista do queridinho de Nova York - o segundo, claro, depois do Crush. Dois idiotas.

- Parece incomodada com a atenção. - Ele sorri. - Eles agem como se eu fosse algo além de um homem grande que gosta de esportes.

- Vai tentar me convencer de que não gosta da fama, das mulheres caindo aos seus pés, e dos privilégios que vêm no pacote?

Chegamos ao estacionamento. Ele abre a porta para mim. Gesto automático. Ponto pra ele.

- Sinceramente? - diz ao entrar. - Quando era garoto, sim. Mulheres fáceis, dinheiro, festas. Tudo era novo e incrível. Mas isso passou. Eu e os caras... não somos mais esses atletas que todo mundo imagina. Mesmo que alguns ainda finjam.

- Hum... - Cruzo os braços, cética.

- Hoje, tudo isso é sufocante. Uma mulher invadiu um banheiro de lanchonete uma vez e tentou... enfim. Esquece. A verdade? Ser famoso é uma droga, na maioria das vezes.

Ele dirige com habilidade pelas ruas da cidade, como se já tivesse feito aquele trajeto mil vezes. Luzes se misturam ao reflexo nos vidros do carro. Tudo vibra. Por dentro, eu sou o oposto: contida, estagnada, atenta.

- Essas pessoas não nos conhecem de verdade. Mas você, Kendra, nossos irmãos, nossas famílias... essas sim. Importam.

- Eu? Corta essa. Acabamos de nos conhecer.

Dou um sorriso. Raro. Sincero.

- Sei que não quer falar sobre o passado, e respeito isso. Mas não posso fingir que você não é importante pro Ty. Então é importante pra mim também.

Reviro os olhos.

- Vocês falam como se eu fosse o amor da vida dele. A realidade é simples: a gente namorou quando era adolescente. Acabou. Hoje somos estranhos com um passado comum. Só isso.

Ele balança a cabeça. Discorda, mas não insiste.

- Tá. Concordamos em discordar. - Ele lança um sorriso de paz. - E agora que estou tentando fazer você gostar de mim, não quero estragar o progresso.

- Boa sorte com isso.

- Vamos mudar de assunto. Me fala da sua vida amorosa. - O sorriso dele é todo dentes e atrevimento.

- Não. - Gemo, exasperada.

- Tem alguém esperando por você no seu país chique? Foi por isso que sorriu quando falei que Kendra mudou de ideia?

- Vamos acabar com isso logo: não tenho relacionamentos amorosos ou sexuais. E não, você e os outros não têm permissão pra bancar os cupidos da minha vida.

- O quê? Nunca faríamos isso! - Ele finge ultraje com maestria. - Jamais!

- Não vou cair nesse teatrinho. É óbvio que vocês têm planos idiotas pra juntar o que acham que existe entre mim e seu amiguinho. Mas não tem nada. Tá tudo perfeito do jeito que está. Só fiquem fora disso.

Ele ri com deboche. Eu respondo com um suspiro que é pura derrota emocional.

- É sério, Lincon. Fique longe do meu passado e do meu futuro.

Ele assobia. Filho da mãe.

Mordo a língua. Um escândalo por agressão ao cliente não está nos meus planos.

Trinta minutos depois, paramos em frente a um prédio colossal. Aço, espelhos, concreto e uma vibe de prisão de luxo.

- Você prende pessoas aqui dentro? - Alfineto.

- Prendo? Isso é um conto infantil agora? Essa seria minha torre e você, a princesa presa? - Ele se diverte com a própria piada.

- Só cale a boca e vamos logo.

No subsolo, o ambiente é estéril e quieto. Metal, silêncio, espaço demais.

Meus punhos se fecham. Meu corpo responde sem permissão.

Ele percebe.

- Ei, está tudo bem, você tá segura comigo.

Eu assinto, sem olhar.

- É só reflexo.

- Vamos sair logo daqui. - Ele aperta o botão do elevador. - Mas Cat... sério, qualquer coisa, me chama... - ele para de falar. - Pode me ligar, seja para dar uma surra em um engraçadinho, ou para conversar. Quer ver filme ruim com chocolate? Eu também topo. Você não precisa passar por tudo sozinha.

- Estou acostumada a passar por tudo sozinha.

- Então desacostuma. A gente cuida dos nossos. Somos disfuncionais, mas funcionamos. E agora você faz parte disso.

- Por 6 meses. - Meu tom é baixo, quero terminar essa conversa, nunca me permito ficar vulnerável na frente de outras pessoas, muito menos de homens.

- Pelo tempo que quiser. Se for embora amanhã e ligar um ano depois, eu vou atender.

Entramos no elevador, ele começa a subir. Aperto os dentes quando vejo o número da cobertura iluminando o painel.

- Você é como uma irmãzinha para mim, Jones, e está segura. - Respiro fundo e calmamente, focada apenas em não desmaiar.

- Estou bem. - Minto. Respiro. Devagar. Foco na respiração. Conto até três. Preciso sobreviver à subida. - Vamos falar de trabalho, como planeja lidar com a situação?

- Preciso confessar uma coisa. - Me preparo para o pior. - Estou completamente apaixonado por ela, e planejo reconquistar minha garota, a quero de volta. - Isso me pega de surpresa, achei que a relação era sobre sexo, que estava acabada.

- Estou um pouco perdida, não posso te auxiliar na parte da conquista, então o que estamos fazendo aqui? - estreito os olhos enquanto o elevador continua subindo, vejo seu risinho de canto, um alarme soa em minha cabeça. - Sabe O'Brien, faço aulas de tiros desde os 18 e tenho uma arma bem aqui na minha bolsa, só para você saber. - Ele solta uma gargalhada alta, o que me faz relaxar um pouquinho.

- Já disse o quanto gosto de você? - observo ele limpar lágrimas imaginárias. - Você é como uma bonequinha. - Estreito os olhos novamente. - E é fofinha como um coelho irritado, como a personagem de um filme infantil que vi um dia desses.

- Filme infantil? Sério mesmo? - Quem é esse cara, o papai smurf?

- Sim, não seja esnobe, esses filmes são divertidos, muitas vezes Hilário. - Deuses sagrados, e as mulheres acham esses caras machões enrustidos, acho que se apaixonariam ainda mais fácil se vissem esse lado deles.

- O que você disser, cara, nada contra, só fiquei surpresa. - Sorrio de lado.

Ficamos em silêncio pelo resto da subida, então é claro que quando o elevador para, é na cobertura, nada menos para um dos homens mais famoso do país.

Ele não me olha ao sair do elevador, apenas caminha até a porta e digita a senha, depois coloca o dedo em um sensor, ele já havia digitado um código de segurança ao entrar no elevador.

Entramos em um apartamento é imenso. Vidro, aço, luxo calculado. A cidade se derrama pelas paredes transparentes.

Caminhamos até o que parece ser uma sala. Há sofás de aparência macia, de um tom azul-escuro. Três das paredes são de vidro, deixando visível a cidade, a vista é de tirar o fôlego. A disposição do lugar é perfeita, dando um ar aconchegante mesmo com tanto espaço. Não há muitos móveis, apenas os sofás, uma mesa de centro, alguns balcões, e prateleiras, com peças metálicas e fotos, muitas fotos.

- Onde está sua namorada? - pergunto desviando os olhos das fotos, mesmo morrendo de curiosidade.

- Namorada... Gosto de como isso soa. - Claro que sim. - Ela deveria estar aqui. Quis buscá-la, ela recusou. Odeia atenção. Um dos motivos do término. - Ele parece irritado com isso. - Vou ligar para ela. - ele tateia nos bolsos e sua expressão murcha. - Droga, pode ligar para meu celular? Acho que deixei no carro.

Faço o que pede. Nenhum toque. É claro que o idiota deixou o aparelho no carro.

- Vou descer e buscar, fique à vontade. Ligue a TV, se estiver com fome pode fuçar a geladeira. Quando ela chegar, pedimos comida e conversamos. - Me sinto como uma idiota caindo no papo de um picareta, mas aceno concordando.

- Cinco minutos, Lincon. Se não acontecer, estou dando o fora daqui. E me recusando a aceitar suas caronas no futuro. - Esse cretino de dentes perfeitos.

- Ninguém vai te machucar. Prometo.

- Só vá pega o maldito celular.

Ele sai correndo, me viro para observar a paisagem novamente, ouço a porta batendo, então meus olhos são atraídos para as fotos, não parece certo, mas caminho até lá e quando estou perto o suficiente para observar as imagens, minha boca abre, quase a ponto de bater no chão, só pode ser uma brincadeira de muito mal gosto.

Meu rosto. O dele. Nós dois. Minha família. Nossa infância. Anos e mais anos em fotos distribuídas nas prateleiras.

Meu estômago revira.

- Que inferno! - murmuro.

Ouço passos.

- Se não me der uma boa explicação para isso, vou atirar em você! - me viro apontando para as fotos.

Arregalo os olhos ao dar de cara com um homem quase nu, apenas alguns passos me separam de Abbott, enrolado em apenas uma toalha minúscula, os cabelos ainda molhados, me olhando como se eu fosse um fantasma.

- Cat. O que faz aqui? - ele parece perceber o que eu estava e fica vermelha.

Assim como eu, quando o susto inicial passa e lembro que ele está praticamente pelado, dou um passo para trás.

- Desculpe, achei que era o Lincon, vou por roupas. - Ele se vira pronto para sair. - Espere, o que está fazendo na minha casa? - Vou matar o desgraçado do O'Brien, ele é definitivamente um homem morto.

Olho novamente para seu estado nu.

- Certo, roupas, conversamos depois. - Ele sai correndo sem esperar minha resposta.

Corro até a porta. Trancada. Senha. Painel de segurança.

Quem em nome de Deus coloca senha de segurança para sair de um apartamento?

Ligo pro Lincon. Caixa postal.

- Vou matar você O'Brien! Estou pagando a multa, você e eu estamos acabados, Deus, se você aparecer na minha frente, vou te dar um tiro, seu desgraçado filho da mãe!

- Acho que sei quem trancou você na minha casa. - Pulo assustada, ele está atrás de mim, me viro e vejo que está a uma distância razoável.

- Um passo mais perto e eu grito. - digo, mesmo que minha voz não trema.

- Ok. - Ele levanta as mãos. - Eu abro se você quiser sair. Não planejei isso e vou chutar a bunda dele de um lado ao outro do país por ter te colocado nessa situação. - Não respondo, eu mesma vou chutar a bunda do desgraçado. - Mas se quiser conversar, eu estou aqui. Mas só se for da sua vontade. Nada que te machuque. Nunca mais.

Aceno concordando, então me dou conta de que estou agindo como uma idiota.

- Posso te dar alguns minutos do meu tempo. Mesmo que só tenhamos essas malditas fotos pra discutir. - Aponto novamente para a parede repleta de imagens.

- Se vamos conversar depois de tantos anos, vou precisar de um café, aceita algo para beber? - Sua bochecha esquerda treme levemente, entregando o quanto ele está nervoso.

- Quero uma bebida com bastante álcool, o que tiver de mais forte. - Ele sorri com o canto da boca.

- Saindo o uísque mais forte da minha coleção. - Ele caminha para fora da sala e só então me recomponho e me afasto da porta.

Ele sai.

Encaro as fotos de novo. Pela primeira vez em anos... acho que vou falar.

Minha terapeuta ficaria orgulhosa.

            
            

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