Mal o Pedro desligou, o meu telemóvel tocou novamente.
Era um número desconhecido, mas eu atendi, esperando que fosse ele, talvez a ligar de volta para pedir desculpa.
Mas não era.
"É a Ana?" perguntou uma voz de mulher, fria e autoritária.
"Sim, sou eu."
"Sou a Helena, a mãe do Pedro."
Senti o meu estômago revirar. Dona Helena nunca gostou de mim. Ela sempre achou que eu não era boa o suficiente para o seu precioso filho.
"Eu sei o que aconteceu," continuou ela, sem qualquer pingo de simpatia na sua voz. "E liguei para te dizer para parares de incomodar o meu filho."
Fiquei sem palavras.
"Ele está a passar por um momento muito difícil. A Sofia está destroçada, coitadinha. Perdeu tudo no incêndio. E o Pedro, como o bom homem que é, está a dar-lhe todo o apoio."
"Dona Helena," consegui dizer, "eu também perdi tudo. Eu perdi o meu filho. O seu neto."
Ela soltou um suspiro impaciente.
"Olha, querida, não vamos dramatizar. Foi um acidente infeliz. Mas não podes culpar o Pedro. Ele fez o que qualquer pessoa decente faria. A Sofia estava sozinha e desesperada."
"Eu também estava sozinha e desesperada!" gritei, já sem conseguir controlar-me. "Eu estava presa naquele apartamento a arder!"
"Mas foste salva, não foste? Então, qual é o teu problema? Estás a tentar usar esta tragédia para prender o meu filho? Para o fazeres sentir-se culpado?"
A sua acusação deixou-me gelada.
"Eu não preciso de o 'prender'. Ele é o meu namorado."
"Um namorado que está a reconsiderar as suas escolhas," retorquiu ela, venenosa. "Talvez este incidente tenha servido para lhe abrir os olhos. A Sofia é uma rapariga tão doce, de boa família. Sempre se deram tão bem."
A mensagem era clara. Ela estava a usar esta tragédia para me afastar e empurrar a Sofia para os braços do Pedro.
"Se tens alguma decência," disse ela, a sua voz a baixar para um tom ameaçador, "vais deixar o Pedro em paz. Deixa-o decidir o que ele quer, sem o teu drama e as tuas manipulações. Entendido?"
Ela não esperou por uma resposta. Desligou o telefone, deixando-me num silêncio ensurdecedor, com as suas palavras cruéis a ecoarem na minha cabeça.
Eles eram todos iguais. O Pedro, a sua mãe. Para eles, eu era um incómodo, um obstáculo no caminho da sua felicidade perfeita com a Sofia.
A minha dor não importava. O meu filho perdido não importava.
Nesse momento, uma enfermeira entrou no quarto.
"Ana, querida, como te sentes?" perguntou ela gentilmente. "Os teus pais estão lá fora. Querem ver-te."
Os meus pais. O meu pai e a minha madrasta. Eles tinham vindo.
Um pequeno calor espalhou-se pelo meu peito. Pelo menos eu não estava completamente sozinha.
"Sim," disse eu, a voz rouca. "Pode deixá-los entrar."