Quando o Amor Vira Fumo
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Capítulo 3

O meu pai, o Rui, entrou primeiro, os seus olhos cheios de uma preocupação que eu não via há anos.

Atrás dele vinha a minha madrasta, a Clara. Ela sempre foi distante, mas agora, o seu rosto mostrava uma compaixão genuína.

"Filha," disse o meu pai, a sua voz embargada, enquanto se sentava na beira da cama e pegava na minha mão. "Soubemos do incêndio, viemos o mais rápido que pudemos. Como estás? Estás bem?"

Eu não consegui responder. Apenas abanei a cabeça, e as lágrimas que eu tinha segurado com tanto esforço começaram a cair novamente.

"O bebé..." sussurrei.

A Clara aproximou-se e colocou uma mão no meu ombro.

"Nós sabemos, querida. Nós sabemos. E lamentamos muito."

O meu pai apertou a minha mão com mais força.

"Onde está o Pedro?" perguntou ele, o seu tom a endurecer. "Ele devia estar aqui contigo."

Eu engoli em seco, a vergonha e a raiva a misturarem-se dentro de mim.

"Ele... ele está ocupado."

"Ocupado?" repetiu o meu pai, incrédulo. "Ocupado com o quê? O que pode ser mais importante do que estar aqui contigo agora?"

Eu não queria contar-lhes. Não queria admitir em voz alta a humilhação que tinha sofrido. Mas o olhar do meu pai exigia uma resposta.

"Ele está com a Sofia," disse eu, em voz baixa. "A amiga dele. Ela também estava no incêndio. Ele foi ajudá-la."

A Clara franziu a testa. "Ajudá-la? Mas e tu?"

"Ele foi salvar o gato dela," as palavras saíram antes que eu as pudesse impedir. "Ele deixou-me no apartamento para salvar o gato dela."

O silêncio que se seguiu foi pesado. O rosto do meu pai passou da preocupação para a pura fúria. Ele levantou-se, o seu corpo tenso.

"O quê?" ele rosnou. "Aquele desgraçado... Aquele filho da mãe!"

"Rui, acalma-te," disse a Clara, pondo uma mão no seu braço, mas ele afastou-a.

"Acalmar-me? A minha filha quase morreu, o meu neto morreu, e aquele canalha estava a salvar um gato? Eu vou matá-lo!"

Ele virou-se e dirigiu-se para a porta.

"Pai, não!" gritei. "Por favor, não faças nada. Não vale a pena."

Ele parou, virando-se para mim, o seu rosto vermelho de raiva.

"Não vale a pena? Ana, ele abandonou-te! Como podes defender isso?"

"Eu não o estou a defender," disse eu, a minha própria voz a ganhar força. "Acabou. Eu terminei com ele. Eu só... eu não quero mais confusão. Eu só quero sair daqui e esquecer que ele existe."

O meu pai olhou para mim, a sua raiva a dar lugar a uma profunda tristeza. Ele voltou para a cama e sentou-se, passando as mãos pelo rosto.

"Tens razão," disse ele, a voz abafada. "Ele não merece o teu tempo, nem a tua dor."

A Clara sentou-se do outro lado da cama, pegando na minha outra mão.

"Vais ficar connosco," disse ela, com uma firmeza que me surpreendeu. "Vais para casa connosco. Nós cuidaremos de ti."

Pela primeira vez em muitas horas, senti um vislumbre de esperança. Eu não estava sozinha. Eu tinha a minha família.

"Obrigada," sussurrei, sentindo um peso a sair dos meus ombros.

Eu ia sair daquele hospital, ia para casa dos meus pais, e ia começar a reconstruir a minha vida.

Uma vida sem o Pedro.

            
            

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