Ela ligou para Eleonora Almeida.
Sua voz era um sussurro rouco.
- Eu vou desaparecer - disse ela, as palavras com gosto de veneno. - Assinarei quaisquer papéis que você quiser. Deixarei a vida de Lucas para sempre. Apenas me consiga a cirurgia. Consiga-me o Dr. Rios.
Houve uma pausa do outro lado da linha, depois a voz fria e calculista de Eleonora.
- Tudo bem. Mas você não contará a ninguém sobre este acordo. Você partirá silenciosamente após a operação.
Laura concordou. Ao desligar, uma onda de amargo arrependimento a invadiu. Eleonora sabia o tempo todo. Ela sabia que Laura era a doadora do rim. Um investigador particular havia descoberto a verdade anos atrás. Mas uma garota doente e aleijada do orfanato, mesmo uma que havia salvado a vida de seu filho, ainda não era boa o suficiente para a família Almeida. O mancar que Laura adquiriu ao salvar Lucas de ser atropelado por um carro quando criança era apenas mais uma marca contra ela aos olhos de Eleonora.
Eleonora já havia tentado comprá-la antes, oferecendo-lhe milhões para deixar Lucas. Laura sempre recusara, acreditando que o amor deles não tinha preço. Agora, ela estava implorando por sua vida, trocando aquele mesmo amor por uma chance de sobreviver. Como ela tinha sido tola.
A porta de seu quarto se abriu e Lucas entrou. Ele segurava um pequeno pote de pomada.
Ele se sentou na beira da cama dela, sua expressão uma mistura de culpa e irritação.
- Seus joelhos devem estar doloridos - disse ele, evitando seus olhos. Ele começou a esfregar o creme em sua pele machucada. Seu toque era gentil, um fantasma do cuidado que ele costumava demonstrar.
- Você me levou ao limite, Laura - ele murmurou, como se isso desculpasse tudo. - Você não deveria ter ido atrás da Kássia.
Sua garganta estava ferida. Doía para falar.
- Você acredita em mim? - ela sussurrou. - Que eu não fiz isso?
O silêncio dele foi sua resposta. Era uma parede sólida entre eles, construída tijolo por tijolo com sua confiança mal colocada em outra mulher.
Ele finalmente falou, sua voz baixa.
- Estou com a Kássia por nós, Laura. Pelo nosso futuro. Ela está nos dando um filho. Você não vê? Assim que o bebê nascer, eu posso finalmente te reconhecer. Podemos ser uma família de verdade.
Ele expôs seu plano distorcido: Kássia daria à luz, e eles registrariam a criança no nome de Laura. Ele então apresentaria oficialmente Laura como sua esposa, a mãe de seu herdeiro.
Ele viu o olhar no rosto dela e zombou.
- Que olhar é esse? Seja realista. Você é uma aleijada de um orfanato. Esta é a única maneira de minha família te aceitar.
Cada palavra era uma nova ferida. Ele a via não como sua parceira, sua alma gêmea de vinte anos, mas como um caso de caridade que ele tinha que contrabandear para sua vida.
- Não - disse ela, sua voz tremendo com uma força que ela não sabia que tinha. - Eu não quero esse futuro.
O rosto de Lucas endureceu. Ele estava prestes a discutir quando um forte trovão sacudiu a janela. Ele se levantou imediatamente.
- A Kássia tem medo de tempestades - disse ele, já se movendo em direção à porta. - Eu preciso estar com ela.
Ele parou na porta, olhando para trás.
- Apenas espere um pouco mais, Laura. E pare de ser tão difícil.
Então ele se foi.
Laura olhou para a porta vazia, uma risada amarga escapando de seus lábios. Ela se abaixou e esfregou o tornozelo. A velha lesão, do acidente em que ela o empurrou para fora do caminho de um carro, sempre latejava na chuva. Ele costumava se lembrar disso. Ele costumava sentar-se com ela em noites de tempestade, massageando suavemente seu tornozelo, sussurrando que sentia muito por ela estar com dor por causa dele.
Agora, ele só se lembrava que Kássia tinha medo de trovão. Ele havia esquecido todo o resto. Ele a havia esquecido.
No dia seguinte, ela os viu no corredor do hospital. Lucas estava saindo do consultório do obstetra com Kássia, segurando uma pasta com o último ultrassom do bebê. Ele estava radiante, seu rosto iluminado com uma alegria que Laura não via há anos. Ele se inclinou e beijou a testa de Kássia, sua mão repousando protetoramente em sua barriga.
Era o mesmo olhar terno que ele costumava lhe dar. O mesmo toque gentil.
O coração de Laura se apertou. Ela se virou para sair, mas Kássia a viu.
- Laura - ela chamou, sua voz doce como mel, seu sorriso triunfante. Ela se aproximou, bloqueando o caminho de Laura. Lucas a seguiu, uma leve carranca no rosto.
- Você está com uma aparência horrível - disse Kássia, seus olhos percorrendo o rosto pálido e a camisola de hospital de Laura. - Mas suponho que seja de se esperar. Pessoas da sua laia não envelhecem bem. - Ela deu um tapinha na própria barriga. - O Lucas está tão preocupado comigo e com o bebê. Ele diz que eu sou o mundo inteiro dele agora.
Laura apenas a encarou, depois olhou para os próprios pés. O mancar. A lembrança constante de um sacrifício que ele não valorizava mais.
- Este mancar - disse Laura, sua voz baixa, mas clara. - Eu o adquiri salvando a vida dele. Este corpo, que você acha tão nojento, deu a ele um rim para que ele pudesse viver. O que você já deu a ele além de mentiras?
Ela olhou além de Kássia, diretamente para Lucas.
- Eu estou indo embora. Espero que você consiga mantê-lo apenas com seu rostinho bonito e suas mentiras.
O rosto de Kássia se contorceu em um lampejo de fúria. Ela levantou a mão para golpear Laura.
Mas então, ela viu Lucas voltando do posto de enfermagem em direção a eles. Sua expressão mudou em um instante. A mão levantada que era para o rosto de Laura veio e deu um tapa em sua própria bochecha, com força.
Com um grito dramático, Kássia Ribeiro desabou no chão.