O salão de festas era um mar de joias brilhantes e sorrisos falsos. No centro de tudo, estavam Lucas e Kássia, o casal de ouro, banhando-se na adoração da elite da cidade. Os convidados os cercavam, oferecendo parabéns e perguntando sobre a data do casamento.
Kássia, vestida com um vestido esvoaçante que acentuava sua barriga de grávida, olhou para Lucas com um olhar tímido e amoroso. Ele respondeu colocando uma mão terna em sua barriga, seu sorriso cheio de orgulho e afeto.
A entrada de Laura silenciou a sala. Todos os olhos se voltaram para ela enquanto ela mancava pelo chão de mármore, seus sapatos quebrados fazendo um som desajeitado e irregular. Sussurros a seguiram, cruéis e afiados.
- Olhe os sapatos dela. Que vergonha.
- Ela é aleijada. Que pena, ela tem um rosto bonito.
As palavras eram mil pequenos cortes. Ela esteve ao lado de Lucas por vinte anos, e nenhuma pessoa nesta sala sabia seu nome. Kássia estava aqui há menos de dois, e já era a celebrada "futura Sra. Almeida".
Ela chegou ao centro da sala e parou na frente de Kássia. Respirando fundo e trêmula, ela inclinou a cabeça.
- Sinto muito - disse ela, a voz mal um sussurro.
Kássia fingiu choque, escondendo-se atrás de Lucas.
- Não consigo te ouvir - disse ela, a voz carregada de um medo fingido. - Por favor, Laura, fale mais alto. Eu só quero que isso acabe.
A mandíbula de Lucas se contraiu.
- Deixe todo mundo ouvir - ele ordenou.
Laura fechou os olhos com força. Sentia-se como se estivesse sendo esfolada viva, sua dignidade arrancada camada por camada para que todos vissem. Ela respirou fundo novamente e gritou, a voz rouca de dor.
- SINTO MUITO!
Ela se endireitou e olhou para Lucas, seus olhos suplicantes.
- É o suficiente?
Ele desviou o olhar, um lampejo de algo indecifrável em seus olhos.
Kássia deu um passo à frente, toda perdão magnânimo.
- Claro, eu te perdoo, Laura. Só espero que você não tente machucar meu bebê de novo.
Laura a ignorou. Ela se virou para sair, mas a mão de Kássia se esticou, agarrando as costas de seu vestido. Ao mesmo tempo, Kássia esticou o pé, fazendo-a tropeçar.
Laura caiu com força. O som de tecido rasgando encheu o ar. As costas de seu vestido foram rasgadas, expondo suas costas finas e com cicatrizes e a bolsa médica presa ao seu lado.
A bolsa foi deslocada pela queda. Atingiu o chão e estourou, seu conteúdo se espalhando pelo mármore imaculado.
Kássia soltou um suspiro teatral.
- Oh, meu Deus! O que é isso?
Alguém na multidão reconheceu.
- É uma bolsa de urina! Que nojo!
A sala explodiu em suspiros de horror e repulsa. Kássia começou a ter ânsias de vômito, agarrando o estômago como se a visão e o cheiro a estivessem deixando doente.
Lucas correu para o lado de Kássia, seu rosto uma máscara de preocupação, esfregando suavemente suas costas.
- Está tudo bem, está tudo bem - ele acalmou.
Os outros convidados se afastaram de Laura como se ela estivesse carregando uma praga. Eles apontavam e sussurravam, seus rostos contorcidos de nojo.
Ela estava completamente sozinha, exposta e humilhada em uma multidão de estranhos. Com as mãos trêmulas, ela tentou juntar o vestido rasgado, para esconder sua vergonha. Ela lutou para se levantar e fugiu, o som de suas risadas e nojo a perseguindo para fora do salão de festas.
Lucas a viu partir, uma dor aguda no peito. Mas ele se voltou para Kássia, seu dever como futuro pai superando o fantasma do amor que um dia sentiu.
Lá fora, a cidade estava fria e implacável. Nenhum táxi parava para a mulher desgrenhada e chorosa em um vestido arruinado. Finalmente, uma mulher de rosto gentil parou.
- Você está bem, querida? Precisa de uma carona para o hospital?
O simples ato de bondade quebrou Laura completamente. A voz gentil da mulher, a primeira que ela ouvia no que parecia uma eternidade, abriu as comportas. Ela entrou no carro e chorou, uma tempestade de luto e dor que vinha se acumulando por anos.
Depois de pegar uma nova bolsa médica no hospital, ela voltou para a casa. Lucas a esperava na sala de estar.
- Você está bem? - ele perguntou, um pingo de preocupação em sua voz. - O que é aquela coisa? Por que você precisa disso?
Por um momento, um fiapo de esperança retornou. Talvez agora ele ouvisse. Talvez agora ele entendesse.
Ela abriu a boca para contar tudo a ele - sobre o rim, a doença, a sentença de morte.
Mas, naquele exato momento, o telefone dele tocou. Era Kássia, sua voz um gemido fraco e lamentoso do outro lado.
- Lucas, meu amor, não estou me sentindo bem. O cheiro... ainda está no meu nariz. Acho que vou ficar doente.
O rosto de Lucas se suavizou instantaneamente.
- Não se preocupe, Kássia. Estou indo agora mesmo.
Ele desligou e se virou para Laura, todos os vestígios de sua preocupação anterior se foram. Ele já havia esquecido sua pergunta.
- A Kássia é sensível a cheiros por causa da gravidez - disse ele, sua voz fria e distante. - O cheiro do seu... dispositivo... a está incomodando. Acho que é melhor você se mudar para o sótão por enquanto.
Ele não esperou por uma resposta. Correu para o quarto de Kássia, ansioso para confortá-la.
Laura ficou congelada no meio da sala de estar, a dor familiar e surda em seu peito retornando com força total. Por um breve e tolo momento, ela pensou que ele ainda poderia se importar.
Ela estava errada.