- Foi ela quem sugeriu isso. Ela disse que quer esclarecer as coisas, consertar as coisas entre vocês duas pelo bem de uma casa pacífica.
O absurdo de tudo aquilo era impressionante. Laura finalmente encontrou sua voz. Ela o olhou diretamente nos olhos.
- Por quê? - ela perguntou, a voz rouca. - Por que você acredita em cada palavra que ela diz, mas nem sequer me ouve?
- Porque não é ela que está causando todo esse drama! - ele retrucou, a voz se elevando. - Ela está te dando uma saída, Laura! Uma maneira de consertar isso. Você não consegue ver?
Uma risada amarga escapou de seus lábios.
- Consertar? Eu nunca vou pedir desculpas a ela. Não a menos que eu esteja morta.
- Não me provoque, Laura! - ele rugiu, o rosto ficando vermelho de raiva. - Não me faça fazer algo de que nós dois vamos nos arrepender.
Ele enfiou a mão no bolso e tirou um medalhão de prata em forma de coração. A respiração dela ficou presa na garganta. Era o medalhão que seus pais lhe deram antes de morrer, a única coisa que ela tinha deles. Dentro havia uma pequena e desbotada fotografia deles, e do outro lado, uma foto dela e de Lucas quando crianças.
Ele abriu um isqueiro, a chama dançando perigosamente perto do metal precioso.
- Peça desculpas - disse ele, sua voz uma ameaça baixa e perigosa - ou eu o queimo. Eu os queimo.
- Não! - O grito foi arrancado de sua garganta. Lágrimas escorriam por seu rosto. - Por favor, Lucas, não. Isso não.
Aquele medalhão era sua posse mais preciosa. Ela se lembrou de quando o orfanato pegou fogo. Ela estava segura do lado de fora, mas percebeu que o medalhão ainda estava em seu quarto. Lucas, sem hesitar um momento, mergulhou de volta no prédio em chamas para recuperá-lo. Ele emergiu momentos depois, tossindo, com o braço gravemente queimado, mas o medalhão estava seguro em sua mão. Ele o pressionou na palma da mão dela e disse: "Está tudo bem, Laura. Contanto que você esteja feliz."
Ela pegou o medalhão e o colocou em volta do pescoço dele.
- Você é mais importante que a minha vida, Lucas - ela sussurrou.
Ele o usava desde então. Ele até jurou sobre ele, jurou à memória dos pais dela, que a amaria e protegeria para sempre.
Agora, ele o estava usando como uma arma contra ela.
- Eu faço - ela soluçou, o corpo tremendo. - Eu peço desculpas. Apenas... apenas me devolva.
Ele fechou o isqueiro e guardou o medalhão no bolso.
- Bom - disse ele, a voz fria novamente. - Alguém vai te trazer um vestido para a festa.
Ele se virou e voltou para o quarto sem outro olhar, sem uma única pergunta sobre sua saúde ou sua estadia de uma semana no hospital.
Laura ficou ali, seu coração um destroço. Ela mordeu o lábio com tanta força que sentiu o gosto de sangue. Aquele medalhão não era apenas uma foto de seus pais. Tinha uma foto dele também. O menino que ele costumava ser. O menino que agora era um estranho.
Ela levantou a mão e se esbofeteou, com força, no rosto.
Tola, ela pensou. Você é uma tola por ter acreditado nas promessas dele.
Naquela noite, uma caixa chegou. Dentro havia um vestido de grife e um par de sapatos de salto agulha tão altos que pareciam armas.
Uma risada seca e sem humor escapou dela. Ele sabia que ela não podia usar saltos. Seu mancar tornava impossível. Ele costumava ser tão cuidadoso com o conforto dela, sempre comprando os sapatos baixos mais macios e confortáveis, mesmo quando ele mesmo tinha que usar sapatos com buracos.
"Contanto que você esteja confortável, Laura, é tudo o que importa", ele costumava dizer.
Isso era outro castigo, outra crueldade calculada para humilhá-la. Ele ainda se lembrava do seu mancar? Ou ele havia apagado cada parte da verdadeira Laura de sua memória, substituindo-a pela caricatura quebrada e patética que ele via agora?