Ele estava tão consumido pelo pânico por Juliana que não vira o quão frágil Helena realmente estava. Ele vira sua frieza, seu desafio, e confundira com força. Ele não vira a fragilidade por baixo.
A porta se abriu rangendo. Juliana estava lá, apoiada por sua mãe. Ela usava um avental de hospital branco, o rosto pálido e manchado de lágrimas, parecendo uma flor murcha.
"Damião", ela sussurrou, a voz fraca.
Ele correu para o lado dela. "Juli, você deveria estar na cama."
Lágrimas brotaram em seus olhos. "Eu soube da Helena. É minha culpa? Oh, Damião, sinto muito. Eu nunca quis que nada disso acontecesse. Eu só... não suportava a ideia de ser mandada embora, de perder todo mundo."
Ela enterrou o rosto no peito dele, os ombros tremendo com soluços. "Por favor, não culpe a Helena. A culpa é minha. Fui eu que causei todo esse problema. Por favor, perdoe-a por minha causa."
Suas palavras eram uma aula de manipulação. Ela assumiu a culpa enquanto se pintava como a vítima magnânima. Damião sentiu uma onda de frustração e impotência. Ele estava preso entre essas duas mulheres, se afogando em culpa.
"Não foi sua culpa, Juli", ele murmurou, acariciando seu cabelo.
Ela olhou para ele, os olhos brilhando. "Eu... eu perdi o bebê, Damião."
As palavras o atingiram como um golpe físico. "O quê?"
"O estresse... o médico disse...", ela engasgou em um soluço. "Nosso bebê se foi. Por minha causa."
Ela não estava culpando Helena diretamente, mas a implicação era clara. Era brilhante. Era cruel. E funcionou. A culpa que era um lampejo no peito de Damião se transformou em um inferno. Um bebê. O bebê deles. Perdido. E tudo estava ligado às exigências de Helena.
Juliana enxugou os olhos com um lenço delicado. "Sei que é uma coisa estranha de se pedir... mas me traria algum conforto."
Damião mal estava ouvindo, sua mente atordoada. "O quê? O que é?"
"Helena", disse Juliana, a voz mal um sussurro. "Ela é uma artista tão brilhante. O trabalho dela... parece que tem uma alma."
Ela olhou para a cama onde Helena jazia, pálida e imóvel. "Eu estava pensando... talvez ela pudesse criar algo para mim. Uma obra de arte. Para homenagear nosso filho perdido. Algo para... para abençoar seu espírito em sua jornada."
O pedido era tão bizarro, tão fora de lugar, que Damião levou um momento para processar. Arte? Agora?
"Sei que parece bobagem", continuou Juliana, sentindo sua hesitação. "Mas dizem que a arte feita de um lugar de emoção profunda tem um poder especial. E a Helena... ela te amava tanto. Tenho certeza de que ela entenderia. Uma pequena pintura, talvez. Para me ajudar a encontrar a paz."
Damião lutou com o pedido. Parecia errado, até mórbido. Pedir a Helena, em seu estado atual, para criar arte para a mulher que, em essência, destruiu o relacionamento deles?
Mas então ele olhou para o rosto de Juliana, devastado pela dor. Ele pensou no filho que haviam perdido. Um filho que ele nem sabia que existia até aquele momento. Sua responsabilidade, sua culpa, era um peso esmagador.
"Ela é uma pessoa muito espiritual", acrescentou Juliana, a voz suave e persuasiva. "Tenho certeza de que ela gostaria de criar algo para rezar pela alma do bebê. Ela tem um coração tão bom."
Coração bom. As palavras se contorceram nas entranhas de Damião. Ele acabara de acusar aquele mesmo coração bom de ser desumano. A culpa se intensificou. Ele tinha que consertar as coisas. Ele tinha que fazer algo.
"Por favor, Damião", sussurrou Juliana, a mão apertando seu braço. "É a única coisa que vai me ajudar a curar."
Ele olhou do rosto suplicante dela para a forma imóvel de Helena. Ele se sentiu dividido, mas a dor de Juliana, sua perda, parecia mais imediata, mais tangível. Era uma dívida que ele sentia que devia.
Ele respirou fundo. "Tudo bem", disse ele, a voz tensa. "Eu vou pedir a ela."
Os olhos de Juliana brilharam com um breve, quase imperceptível lampejo de triunfo antes de se encherem de lágrimas de gratidão novamente.
"E Damião?", disse ela, uma nova e estranha intensidade em sua voz. "Há um meio específico que eu tinha em mente. Algo que tornaria a peça... verdadeiramente significativa. Algo para mostrar que sua redenção é sincera."
Seus olhos, frios e calculistas por uma fração de segundo, encontraram os dele. O frio de seu olhar era agudo e perturbador, um vislumbre da verdadeira Juliana sob a fachada frágil.