Baixando o olhar, Carina suspirou. Mais uma vez, ela continuava sendo a causadora de tumulto na casa de um Gambino.
- Otávio, leve a minha hóspede até o quarto do meu filho.
- Sim, signor! - Resignado, o segurança indicou o caminho para Carina.
Sem olhar para trás, saiu dali, deixando a hostilidade entre o ex e a atual noiva dele no auge.
- Que diabos está fazendo, Ryan? - Ultrajada, Verônica disparou.
- Querida, o meu filho não estava comendo e não para de chorar.
- Não estaríamos passando por essa situação se você tivesse mandando o Giulio para o colégio...
Irritado, Ryan foi para o lado oposto. Através do reflexo do vidro da janela, vislumbrou o vinco na testa.
- Se o meu filho não se adaptar em trinta dias, vou mandá-lo para colégio interno. - Ele tentou dissuadir Verônica do mesmo jeito que fez com Carina.
Ryan virou devagar para a noiva. O olhar de Verônica se prendeu aos lábios carnudos. A boca máscula tinha o poder de seduzir e persuadir com vãs promessas que nem ele mesmo sabia se tinha a capacidade de cumprir.
- E se a sua ex falar mal de mim para o seu filho? - Num tom mais brando, Verônica perguntou enquanto chegava perto de Ryan.
- Otávio está de olho... aliás, a babá dele chega amanhã. - Dando um passo atrás, Ryan mencionou.
Pondo a mão sobre a blusa de linho que se ajustava ao peitoral largo, Verônica acariciou e então repousou a cabeça sobre o ombro do noivo. Não tinha a mínima intenção de ajudar na adaptação do enteado e muito menos de prolongar a estadia de Carina naquela casa.
- Com licença, signor! - O assistente pediu assim que apareceu na sala.
- Fale.
- Os documentos estão prontos. O seu advogado solicitou que lesse atentamente antes de assinar. - O funcionário informou,
Distanciando-se da noiva, Ryan foi até o assistente, apanhou o iPad e tocou na tela enquanto lia cada parágrafo atentamente.
Conforme o noivo se distraía com a leitura, Verônica deixou a sala. Entrou no elevador que a levaria para o andar superior. Ajeitou as madeixas com fios bem hidratados sobre os ombros e analisou o rosto bem maquiado antes que as portas se abrissem no andar superior. Cuidava da aparência externa e, ao mesmo tempo, a sua mente maquinava uma forma de se aproximar do pequeno Giulio longe do olhar dos pais e daquele segurança que foi incumbido de seguir mãe e filho pra todo lado.
No segundo piso, dava para escutar as pirraças da criança.
- Venha, é por aqui, signorita. - Otávio indicou a porta entreaberta com um gesto de mão.
- Quer ver o cavalo?
- Não, quero a minha mamãe... - Birrento, Giulio dizia.
O coração de Karina se apertou e um nó já tinha se formado em sua garganta. Cuidadosa, ela empurrou a porta e então, abriu os braços ao ver o filho choroso.
- Mamãe! - Sorrindo, Giulio levantou os braços e correu em sua direção.
- Oi, amorzinho.
Carina segurou o filho no colo, dando-lhe um abraço caloroso.
- Por favor, não vai embora, mamãe. Me leva com você... - A criança pediu enquanto choramingava.
Então, aquela foi a desculpa patética que deram para o filho. Ela nem ao menos teve a chance de lutar depois que foi dopada.
- Não, meu docinho. Não vou embora. - A voz de Carina estava embargada.
- A bruxa má disse que você me abandanou.
Sentada na poltrona azul ao lado da cama infantil do amplo quarto, Carmela apertou os lábios.
- Meu filho, não diga mais isso. - Com carinho, Verônica repreendeu. - A signorita Martini é a noiva do seu pai e sua madrasta.
Os bracinhos do pequeno Giulio envolveram o pescoço da mãe. O rosto estava encostado no pescoço de Carina.
- Sente aqui! - Ao levantar, Carmela cedeu o lugar. - Trouxe um lanche pro Giulinho, mas ele se recusa a comer.
Pacientemente, a mãe rumou pelo quarto e acomodou-se na poltrona. Ela ajeitou as costas, sentindo a maciez do estofado.
O nariz afilado de Carina afundou nos cabelos do filho, onde depositou um beijo no topo da cabeça. A mão afagava o rosto do menino que, pouco a pouco, ficava mais calmo.
- Vou preparar alguma coisa pra você comer e não aceito não como resposta... - disse Carmela antes de deixar o quarto. - Volto logo!
Sob o olhar atento do segurança, Carina continuava dando conforto ao filho. Os olhos percorreram pelo enorme quarto com paredes azuis claras. As prateleiras exibiam bonecos de super-heróis e carros. Alguns ainda estavam dentro da caixa.
- Tô com fome, mamãe... - disse a criança ao se mover em seu colo.
O segurança de meia-idade notou a mudança súbita no humor da criança. Otávio observou quando Giulio desceu do colo da mãe e foi comer o lanche que Carmella insistia para ingerir minutos atrás.
- Vamos ver o cavalo... - mastigando, o menino sugeriu.
- Filho, não fale de boca cheia, não é educado... - O tom sereno corrigiu.
Pegando o copo, Giulio bebericou o suco de laranja. Depois de engolir, voltou na direção de Carina.
- Vem, mãe, vamos ver os cavalos.
Ela estava a ponto de responder quando viu Otávio mover a cabeça, negando.
- Que tal brincarmos com o lego... - apontou para a maleta amarela.
Sem hesitar, o garotinho foi pegar o brinquedo.
Naquela tarde, não houve choros e birras. Apenas sorrisos infantis que compartilhavam uma boa energia.
Atrás de sua mesa no escritório, Ryan assistia a tudo. O filho era apegado à mãe e isso era inquestionável.
Ryan pegou a taça de cristal. Levou aos lábios e sorveu todo bourbon.
Os olhos escuros se desviaram da tela e se voltaram para as folhas impressas do documento que estavam sobre a mesa.
Leves batidas atraíram sua atenção para a porta. Pegando os documentos, ele jogou sobre a gaveta aberta e depois, fechou.
- Entre.
Espremeu o olhar e passou a mão pela barba que modelava o seu queixo quadrado com uma leve protuberância no queixo.
- Com licença, signor! - Educadamente, Carmela pediu ao passar pela porta.
- Sim, Carmela.
Embora a senhora de meia idade tivesse trabalhado como cozinheira dos Gambino desde que era criança, Ryan decidiu promovê-la como sua governanta de sua casa na fazenda. Precisava de algum rosto conhecido em meio a tantos funcionários novos.
- O jantar está servido. A sua noiva e sua sogra estão te esperando...
- Diga que já vou - disse Ryan friamente.
Ele desviou o olhar de sua nova governanta para a tela de seu computador ao notar o movimento de sua ex pelo quarto do filho. Carina colocava o menino na cama e cobria com um cobertor azul com estampas no Superman.
- Espere. - Ryan pediu antes que a funcionária cruzasse a porta.
- Sí, signor!
- Peça a Carina que venha ao meu escritório.
- Claro. - Resiliente, confirmou com a cabeça.
No corredor, Carmela andava e rezava silenciosamente pela jovem mãe e pela criança antes de transmitir a ordem de seu chefe.