Capítulo 4 No.4

Audrey saiu do prédio arrastando a mala, sentindo-se mais leve e, ao mesmo tempo, completamente destruída. O céu, como num clichê de um filme triste, decidira abrir-se. Uma chuva fina e gelada começou a cair, encharcando a sua blusa fina em segundos.

Ela tentou chamar um Uber, mas a aplicação rejeitou o pagamento.

- Cartão inválido? - Ela olhou para o ecrã, incrédula.

Uma notificação do banco apareceu: "Conta Bloqueada por Suspeita de Fraude - Titular Conjunto Blake Miller".

- Aquele miserável... - sussurrou ela, as lágrimas a misturarem-se com a chuva. Ele tinha congelado os bens conjuntos.

O Mercedes antigo de Victor encostou suavemente ao meio-fio, o motor ruidoso tossindo um pouco antes de parar. A janela de trás desceu manualmente.

Bruno saiu do carro com um guarda-chuva enorme antes que Audrey pudesse reagir.

- Sra. Sterling - disse Bruno, a voz respeitosa. - O Sr. Sterling mandou buscá-la. Ele imaginou que poderia haver... complicações.

Audrey entrou no carro, agradecida pelo calor, embora o aquecimento do veículo antigo demorasse a funcionar. Havia uma manta de lã axadrezada no banco de couro rachado.

Bruno estendeu-lhe um tablet antigo.

- Ele quer falar.

A chamada de vídeo estava ligada. O rosto de Victor apareceu no ecrã, pixelizado pela conexão fraca. Ele estava no escritório, com uma estante de livros escura atrás.

- És uma Sterling agora - disse Victor, a voz cortada pela estática. - Não andes à chuva. Bruno estava a vigiar o perímetro caso precisasses.

- Tu mandaste-o seguir-me? - perguntou Audrey, tremendo de frio.

- Mandei-o proteger o meu investimento. - A voz de Victor era dura, mas os olhos dele no ecrã pareciam examinar o rosto dela à procura de ferimentos. - O teu ex-noivo bloqueou as contas. Eu avisei-te que ele era previsível.

- Eu não tenho nada, Victor. Nem dinheiro para o táxi.

- Tens um teto. E tens comida. Enquanto estiveres nessa casa, o básico não te faltará.

O ecrã tremeu quando Victor pareceu mover-se na cadeira.

- E sobre o vídeo... - começou ele.

Audrey gelou.

- Já viste?

- A tua amiga Tiffany tem jeito para a ficção. Já está a circular. "Noiva rejeitada ataca casal apaixonado".

Audrey cobriu o rosto com as mãos.

- A minha carreira acabou. Ninguém contrata uma pessoa instável.

Victor ficou em silêncio por um momento.

- Não subestimes o valor de uma má reputação, Audrey. Às vezes, o medo é mais útil que o respeito. Vem para casa.

Ele desligou.

Audrey encostou a cabeça no banco. Ele não oferecera palavras doces, mas oferecera uma solução prática. Num mundo onde todos a apunhalavam pelas costas, a honestidade brutal de Victor era estranhamente reconfortante.

O carro entrou na mansão. Audrey saiu. Victor não estava no hall. Higgins informou-a que ele estava a trabalhar e não queria ser incomodado.

Audrey subiu para o quarto, tomou um banho quente para tirar o frio dos ossos e deitou-se, exausta.

Enquanto isso, no escritório trancado, Victor estava ao telefone.

- Arthur? - disse Victor, a voz baixa. - O vídeo da Tiffany Kensington. Quero que desapareça.

- Isso não é fácil, Victor - respondeu uma voz do outro lado. - E vai custar favores. Tens a certeza que queres gastar cartuchos com a rapariga?

- Apaga o vídeo. E certifica-te que as contas dela são desbloqueadas. Usa aquela falha no sistema bancário do banco do Miller que descobrimos no ano passado. Faz parecer um erro informático.

- Estás a ficar mole, chefe.

- Estou a proteger a minha fachada - mentiu Victor, desligando o telefone e olhando para a chuva lá fora.

            
            

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