Capítulo 5 No.5

Era meia-noite. A Mansão Sterling rangia com o vento, os sons da casa velha amplificados pelo silêncio.

Audrey acordou com sede. A garrafa de água na mesa de cabeceira estava vazia. Ela levantou-se, calçou os chinelos e saiu do quarto, tentando fazer o mínimo de barulho possível nas tábuas de madeira que rangiam.

Ao passar pela porta do escritório no andar de baixo, ela viu uma fresta de luz. Vozes abafadas vinham lá de dentro.

Audrey parou. A curiosidade venceu o decoro. Ela aproximou-se da porta entreaberta.

Pela fresta, ela viu Victor. Mas ele não estava na cadeira de rodas.

Victor estava de pé.

Ele caminhava de um lado para o outro da sala, com uma passada firme e poderosa, gesticulando com uma mão enquanto segurava um copo na outra. Não havia qualquer sinal de atrofia ou fraqueza nas suas pernas.

Audrey sentiu o mundo girar. Ele anda. É tudo uma mentira.

No sofá de couro, um homem estava sentado nas sombras, longe da luz direta do candeeiro de mesa. Audrey não conseguia ver bem o rosto dele, apenas a silhueta de um fato caro.

- Quanto tempo vais manter este teatro com a esposa, Victor? - perguntou o homem no sofá.

Victor parou, virando-se para a janela.

- Até saber se ela é leal. Ela voltou ao apartamento do ex hoje. Isso mostra fraqueza.

- Ou coragem - contrapôs o homem. - Ela enfrentou-o.

- Talvez. Mas preciso de ter certeza.

O chão rangeu sob os pés de Audrey.

Victor virou-se instantaneamente, os reflexos aguçados como os de um predador.

- Quem está aí?

Com uma velocidade impressionante, Victor atirou-se para a cadeira de rodas que estava estrategicamente colocada perto da mesa. Ele sentou-se e puxou uma manta sobre as pernas num movimento fluido, transformando-se de volta no inválido em segundos.

Audrey, percebendo que não podia fugir, empurrou a porta. O coração dela batia tão forte que doía. Ela tinha de fingir. Se ele soubesse que ela vira... o que ele faria?

Ela esfregou os olhos, fingindo sonolência.

- Victor? Ouvi vozes... achei que precisavas de ajuda.

Victor olhou para ela, tenso. Ele procurava qualquer sinal de que ela tivesse visto o milagre da sua caminhada.

- Estou numa reunião, Audrey. Não sabes bater?

Audrey olhou para o homem no sofá. Ele manteve-se nas sombras, inclinando a cabeça levemente.

- Ah, desculpe. Não sabia que tinhas visitas a esta hora.

O homem levantou-se, mas manteve-se longe da luz.

- Sra. Sterling. - A voz dele era polida, profissional. - Sou Arthur Vale. Sou... o consultor jurídico da massa falida do Victor. Estamos a discutir os credores.

- Advogado? - Audrey olhou para as pilhas de papel na mesa. - A situação é assim tão grave?

- Crítica - disse Arthur, mentindo suavemente. - Os credores estão impacientes.

Audrey assentiu, forçando um ar de preocupação para esconder o choque da descoberta sobre as pernas de Victor.

- Entendo. Vou deixar-vos trabalhar.

Ela virou-se para sair, mas Victor chamou-a. A voz dele estava carregada de uma tensão estranha, talvez para testá-la, talvez para afastá-la.

- Já que estás aqui - disse Victor, cruelmente -, cumpre o teu dever de esposa.

Audrey congelou na porta.

- Como?

Victor apontou para o teto.

- Vai-me esperar na cama. O Arthur está de saída. E não durmas.

Arthur tossiu, desconfortável com a ordem bruta.

- Victor, isso é desnecessário...

Audrey sentiu o rosto arder. A humilhação de receber tal ordem à frente de um estranho era palpável. Mas ela estava demasiado assustada com o segredo que descobrira para discutir.

- Sim, Victor.

Ela saiu e fechou a porta. Assim que o trinco estalou, ela encostou-se à parede do corredor, a respirar ofegante. Ele anda. Ele mente sobre tudo. Quem é este homem?

Dentro do escritório, Victor passou a mão pelo rosto.

- És um bastardo, Victor - disse Arthur, saindo das sombras.

- É o único jeito de ela ir embora ou manter a distância - respondeu Victor, a voz sombria. - Se ela se aproximar demais, vai descobrir a verdade. E eu não posso arrastá-la para a guerra que vem aí.

            
            

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