VENENO
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Capítulo 3 FUNDAÇÃO VIDA

Acordei, me levantei do chão, meu corpo não estava doendo nem um pouco de ter dormido ali de mau jeito, mas a fome tinha voltado. Caminhei até o banheiro lentamente, me olhei no espelho, parecia que era um zumbi, comecei a lavar meu rosto, tinha olheiras embaixo dos meus olhos, nem sei como vieram parar ali. Me sinto tonta por alguns segundos, olho para o meu braço e vejo minhas veias ficando pretas, começo a sentir meu corpo suar.

- Temos que limpar aquele sangue lá na sala. - a voz de Veneno soa na minha cabeça.

- Já estava demorando a aparecer... - respondo, desligo a torneira e saio do banheiro.

Caminho até a dispensa do apartamento, pronta para pegar um balde e uma esponja, Lucy Walle iria limpar o sangue de seu padrasto que acabou de ser digerido, ele deve estar mais feliz aqui na minha barriga com certeza.

Entro na dispensa, acendo a luz e vou em direção à escada que era de madeira e não parecia muito nova, mas o balde estava muito alto na prateleira precisaria subir pra pegar. Encosto a escada na parede.

- Tenha cuidado, esse negócio não me parece muito confiável. - ele falou como se tivesse sentimentos se algo acontecesse de errado.

Não sabia mais o que pensar sobre Veneno, mas, parecia ser misterioso e assustador, não que eu tinha medo dele... Sei lá. Era um sentimento estranho.

- Não sou mais uma criança. - respondi e comecei a subir degrau por degrau a escada.

Assim que cheguei numa parte da escada que já dava para alcançar o balde com minhas próprias mãos, levantei o pé um pouco e senti o degrau por baixo de meus pés quebrarem. Pensei que iria cair de costas, mas, senti Veneno sair, me abraçando por trás me impedindo de bater com tudo no chão, percebi que ele tinha me protegido pela segunda vez, comecei a pensar que ele não era tão ruim assim como eu imaginava.

Talvez, ele possa querer mudar essa ideia de dominar a Terra e governar tudo por aqui. Talvez eu possa muda-lo.

- Quer pegar aquele balde, porque não me disse antes? - sinto algo elástico sair do meu braço esquerdo como se fosse um líquido viscoso preto, se esticar e pegar o balde, trazendo o mesmo até minhas mãos. - Baixinha!

- Obrigada, mas você consegue ler minha mente, né alienígena... - respondo meio sem jeito e faço um bico.

Veneno entra dentro do meu corpo novamente e minhas costas finalmente se encostam no chão com cuidado.

- Eu acho que agora você entendeu que a gente é um só.

Ao ouvir aquilo, meu rosto fica um pouco sem jeito, ninguém nunca tinha usado aquela frase comigo antes, parecia até romântico, mas, logo me levanto rapidamente, seguro o balde e a esponja que estava dentro dele.

- Eu não precisava da sua ajuda! - falo indo em direção à porta do meu quarto e à sala, o sangue estava espalhado pelo chão em quase todos os lugares.

Não gostava muito de sangue, mas, fazer o que né... Não podia deixar aquilo tudo melado.

Veneno ficou quieto por bastante tempo enquanto eu limpava o chão, também não sabia o que conversar depois daquele momento na despensa, estava muito confusa para inventar um assunto qualquer.

Tinha bastante sangue espalhado, Veneno tinha feito uma bagunça literalmente, não aguentava mais esfregar o chão, minhas mãos já estavam doendo, parecia que estava ali a umas meia hora. O sangue era bem difícil de sair. Já estava ficando bem estressada, logo fiz um bico com os lábios sem perceber, era uma mania minha.

- Me desculpa por comer seu padrasto... - disse Veneno em minha mente.

Aquela voz rouca ainda continuava assustadora mesmo tentando se redimir.

- Tudo bem, V. - continuei esfregando o chão lentamente, meus cabelos pretos caíram nos meus olhos, eles estavam bastante bagunçados desde ontem. - Ele iria fazer coisas piores comigo se você não tivesse feito algo... E eu que te dei liberdade para entrar no controle. Só não achei que você estava falando sério quando você disse "me deixa comer ele".

- Ele não tinha um gosto muito bom, mas, matou minha fome durante umas quatro horas. - ele fala como se isso fosse a coisa mais normal de todo universo. Minha barriga ronca. - Espero que possamos ter uma próxima refeição em breve...

O barulho do despertador toca em meu quarto, o que me faz virar a cabeça para o lado, olhando diretamente para a porta do mesmo. Alguns segundos depois o despertador para. A porta se abre lentamente, lá estava o garoto da noite passada, um dos hospedeiros dessa coisa insuportável, dava para ver em seus olhos que estava bem perdido e assustado.

Quem não ficaria, né? Ele aponta o dedo para mim, parecendo estar meio grogue. A boca dele se abre.

- Onde está Veneno?

- Ele conhece você? - pergunto, logo meu "bichinho de estimação" me responde dentro da minha mente.

- Nós conversamos um pouco, mas, ele é tedioso.

Me levanto e jogo a esponja dentro do balde que estava no chão, o mesmo já estava quase limpo, mas, resolvi que não iria ficar ali esfregando por mais tempo.

Caminho devagar até o garoto, ele não parece ficar com medo, ainda bem que ele era uma pessoa normal e não uma gosma preta que se transforma num monstro de três metros de comprimento.

- Esse bicho está dentro de você? - o garoto solta mais uma pergunta, ele tinha as mesmas características que eu, quando Veneno entrou em meu corpo.

Olheiras, cabelo castanho bagunçado, cara de quem morreu e voltou a vida do nada. Mas, eu já estava me recuperando disso tudo... É, pode se dizer que rolou muita coisa num dia só.

- Já posso comer ele?

- Ele não é um bicho, nós somos amigos. - respondo dando um sorriso e ignorando o que Veneno havia dito, chego bem perto do garoto e coloco as mãos na minha cintura.

Esse garoto não podia ficar por muito tempo desse jeito, se não iria começar a fazer mais e mais perguntas, ainda mais que o chão não havia ficado totalmente limpo, logo iria reparar nisso. Resolvi mudar as coisas com perguntas direcionadas a ele. - Agora, me responde, quem é você mesmo?

- Meu nome é Zack e... Eu não devia estar aqui. - o garoto começa a caminhar para a porta de saída do meu apartamento, ele devia estar bem confuso.

Isso me faz ter mais curiosidade sobre ele.

- Ei! Espera... Para onde você vai? - corri para frente do garoto e o parei com as mãos.

Seus olhos se encontram com os meus, posso ver que realmente tinha razão da cor castanha dos olhos que havia visto ontem à noite no meio daquela escuridão do beco.

- Em qual cidade que eu estou? - ele olha para os lados meio desnorteado, percorre a sala inteira e anda até uma das janelas.

- Você tá em Brooklyn, meu amigo... - respondo o mesmo. - E agora você não pode ir embora sem se explicar.

O garoto olha pela janela, percebe que tem vários prédios em todo lugar, tudo e todos fazendo barulho pelas ruas. Percebo que ele faz uma cara de espanto, percebi que não era daqui. O assunto podia se encurtar se ele falasse tudo de uma vez, onde ele morava, o que tinha acontecido e outras coisas mais.

Não o apressei em nada, porque acho que quando sai um bicho do seu corpo, deveria ser um alívio total, se é que me entende... "Não é Veneno?"

"Bicho?!", ele respondeu na minha mente de imediato.

[...]

Alguns minutos depois de eu ter conseguido acalmar o garoto, ele se senta no sofá e entrego um copo de água para o mesmo, me apresentei também. Ele olha para a janela novamente, como se tivesse tentando pensar em algo para poder começar a falar tudo que aconteceu com sua vida. Acho que eu fiz bem em trazê-lo pra casa... Se não ele estaria perdido por aí a fora. Mas, afinal, daqui a alguns dias eu também estarei assim.

- Eu moro em Manhattan, esse bicho atravessou a ponte pra vir até aqui. Eu me lembro que estava no parque perto de casa brincando com meu irmão, ele tem uns seis anos, daí uma pessoa bem estranha pulou em cima de mim, depois disso senti coisas esquisitas acontecendo com meu corpo, esse monstrengo começou a falar na minha cabeça e não consegui me controlar, deixando meu irmão para trás e sozinho... - quando ele acabou de falar, respirou fundo e deu uma golada de água, a raiva que sentia de Veneno era nítida. Olhou para mim com uma expressão séria no rosto. - Ele estava com muita pressa, acho que seu amigo está fugindo de alguém.

F-fugindo de alguém? Veneno soltou:

- Não liga para o que esse garoto fala! É Besteira.

Começo a ficar pensativa com o que ele disse no final, fiquei um pouco em silêncio pensando no que eu deveria fazer, se estivessem atrás do Veneno, estariam atrás de mim também e não queria me meter em confusão. Comecei a caminhar até a cozinha para que eu e Veneno ficássemos a sós. Parei de andar assim que chego até lá.

- Começa a falar... - digo em tom baixo para que Zack não ouvisse lá da sala. - Anda, desembucha logo!

- Você vai mesmo acreditar naquele garotinho? - responde com um certo tom de deboche.

- De quem está fugindo, Veneno?

- Você está se preocupando demais com isso, Lucy. Vamos mata-lo de uma vez e isso acaba. Estamos com fome... - imagino Veneno sorrindo maléfico nessa hora, mas afasto meus pensamentos daqueles dentes pontudos.

- Sem segredos, Veneno. Você disse que éramos um só.

Um silêncio percorre minha mente, parecia até que Veneno havia saído de meu corpo naquele instante.

- Eu fugi de uns cientistas malucos, Lucy. E agora estou aqui. Está satisfeita?

- E eles estão atrás de você? - perguntei novamente, mas fui interrompida antes que Veneno pudesse me responder.

- Eles estão atrás dele sim... - uma voz masculina preenche a cozinha, o garoto estava encostado na porta, o que me fez olha-lo diretamente. Ele continuou. - Você lembra daquele foguete que caiu e passou no jornal a alguns dias atrás que trazia coisas desconhecidas de outros planetas?

- Sim... Foi a notícia que mais passou no jornal esse dia. - concordei.

- Aquela empresa o quer de volta. Digo, quer o Veneno.

- Esse garoto é bem espertinho, pro meu gosto.

- Cala a boca, Veneno! - gritei. - Você fazia parte disso e agora eles podem vir te buscar a qualquer momento? - o garoto se assustou com meu tom de voz e se afastou um pouco. Mas, estava me dirigindo à Veneno.

- Lucy, nada vai acontecer com você, irei protegê-la. - fico em silêncio com sua resposta, uma dúvida imensa surge na minha cabeça, será que ele está dizendo isso para poder me usar? Não poderia confiar em suas palavras, ele era um monstro. - Eu prometo. Se você morre, eu morro também.

- Você sabe alguma coisa sobre essa empresa? - olhei para Zack, querendo respostas.

- Ela se chama Fundação Vida, eles fazem experimentos com simbiontes, mas, isso é muito confidencial. Eles acreditam e estão preparando pessoas para o fim do mundo... - Zack me surpreende por saber tantas coisas sobre a empresa, algo não me cheirava bem, será que ele trabalhava lá e mentiu esse tempo todo sobre o que aconteceu e Veneno estava tentando me dizer para não acreditar no que ele dizia? Dúvidas começaram a surgir na minha cabeça, mas, o garoto voltou a falar. - Minha mãe já trabalhou lá dentro, se é o que quer saber... - isso me aliviou bastante.

- Eles têm outros como o Veneno? - perguntei aterrorizada. Logo imaginei o mundo todo sendo dominado por vários monstros igual à Veneno, matando as pessoas e destruindo tudo que podiam no caminho.

- Lucy, da última vez que minha mãe foi trabalhar, ela me disse que os cientistas matavam as pessoas, pois elas não eram fortes o bastante para aguentar as experiências dentro de seus corpos que faziam lá. - o semblante de Zack pareceu ficar mais sombrio, aquilo estava me dando medo.

- Nós temos que impedir isso... - falei logo em seguida.

- Lucy, é muito perigoso ir para lá. - ouvi a voz de Veneno, pela primeira vez, ele me pareceu preocupado de verdade.

Mas, meu pensamento dizia que tínhamos que fazer algo e impedir que mais pessoas morram com substancias e experimentos dentro de seus corpos... O corpo daquelas pessoas eram fracos demais para receber coisas como essa, tínhamos que salvá-los. E se Veneno citou que essa empresa recuperou outros dois simbiontes que caíram do foguete, pode ser que eles também iriam uni-los às pessoas e algo muito ruim pode acontecer, não podemos ficar aqui parados.

Veneno soltou:

- Porém, gostei dessa ideia, algo me diz que teremos mais lanchinhos...

            
            

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