Eu era uma garota que só ficava naquele mundinho de Brooklyn, indo na loja de CD's, na escola, voltando para o apartamento, todo o santo dia. Podia se dizer que Veneno havia mudado totalmente o rumo da minha vida desde que o mesmo havia chegado, não sei se para pior ou para melhor, mas, apenas estou seguindo para ver no que iria dar. Meu coração não batia rápido desse jeito, a emoção de meu corpo era tão grande, estava feliz, o que não acontecia há muito tempo atrás.
Dentro do trem, era geladinho e confortável. Minha mala estava guardada numa estante que tinha em cima, como todas as bagagens dali. Eu olhava pela janela, podia ver vários prédios desconhecidos no caminho, as ruas movimentadas lá longe. O barulho do trem andando pelo trilho, me fazia ficar sonolenta.
- Estou ansioso para ver minha família, o que eles devem estar pensando numa hora dessas? - Zack me encarou, encostado no assento do trem.
- Eles devem estar desesperados atrás de você. - respondi e soltei uma risada baixa. - Vão achar que eu te sequestrei...
- Eu posso falar que fugi de casa por alguns dias.
- Eles não vão acreditar nisso, Zack. - respondi fazendo em negativa com a cabeça.
- Estou com saudades do meu irmãozinho... - o mesmo sorriu mudando de assunto e olhou para frente. - Fico imaginando se ele encontrou o caminho de volta pra casa.
- Qual o nome dele?
- Ele se chama Liam, ele é um garotinho bem bagunceiro apesar de ser bem novo. - sinto que Zack é bem chegado com o irmão, devia ter sido difícil pra ele se afastar por esses dias da família, por causa de Veneno.
"Podia ter escolhido alguém melhor pra possuir, Veneno.", falei em meus pensamentos.
- Não foi culpa minha! - respondeu com a mesma voz zangada de sempre.
- Liam deve ter ficado sem entender nada do que aconteceu... - Zack continua falando. - Veneno controlou meus pensamentos e meu corpo, você tem que tomar cuidado, Lucy. Ele não é confiável.
- "Ele não é confiável..." e blá blá blá - Veneno imita a voz de Zack, com um tom bem fino parecendo estar irritado com o garoto.
- Eu vou tomar cuidado, pode deixar... Não precisa se preocupar. - respondi, Veneno não parecia gostar de Zack e vice e versa, Zack tinha seus motivos, mas, pra mim, Veneno estava só de birra por estar com tanta raiva assim.
- Eu não estou de birra! - respondeu Veneno em minha mente, ele estava bem ativo pro meu gosto. - Ele só é enjoado...
"Você possuiu o menino na frente do irmãozinho dele e deixou o mesmo pra trás, você é muito do mal, Veneno...", o respondi em meus pensamentos.
- Eu fiz isso pra chegar até você.
"Podia ter ficado com a pessoa de antes de Zack, ela não era tão ruim assim, né?"
- Eu cansei de ficar com ela, era uma velhinha. - aquela resposta me faz rir baixo, para que Zack não suspeitasse de nada.
"Veneno, você é a coisa mais doida e idiota do mundo."
- Isso é um bom sinal? - perguntou ele.
Fiz em negativa com a cabeça deixando o mesmo no vácuo, um sorriso bobo brotou em meus lábios.
O barulho do trem continuou tranquilamente, percebi que a viagem seria bem longa, fechei meus olhos e adormeci com a cabeça encostada no assento. Em alguns momentos, abri os olhos só para ver se já havíamos chegado ou não, meu sono não estava tão profundo, afinal, uma vergonha lá no fundo vinha em minha mente se Zack ficasse me olhando enquanto tirasse um cochilo.
As horas iam passando, o trem fazia um barulho estranho toda hora que chegava em um local diferente. Estávamos atravessando a ponte, "andando sobre as águas", fiquei em alerta na mesma hora, empurrei meu corpo para frente para que pudesse ver a vista da melhor forma pela janela. O Sol estava brilhando bem forte e a água reluzente, por um momento pensei em como seria Veneno nadando ali, imagens estranhas rodearam minha cabeça, apenas sorri com emoção, o mesmo deveria achar aquelas ideias bem malucas. Durante o resto da viagem, nem consegui dormir direito, as paisagens novas e desconhecidas me chamaram atenção, não era tão diferente de Brooklyn, mas, fiquei surpresa do mesmo jeito. Era minha primeira vez indo até Manhattan, podia se dizer que era a primeira viagem sozinha, mas, havia dois acompanhantes 'tomando conta' de mim.
JOE ON (Amigo de Rick)
Outro dia amanhece, acordo cedo para trabalhar, já havia mandado mensagens para Rick e o mesmo não tinha me retornado, decido que na hora do almoço iria passar em sua casa para ver o que havia acontecido. Ele tinha que dar alguma explicação, antes que eu pudesse fazer algo, pois também estava preocupado com meu amigo e não sabia de nada. Era a primeira vez que Rick não retornava minhas ligações, comecei a achar que o mesmo tinha ficado doente depois de ir embora andando no sereno, com certeza era uma gripe brava, mas nada que não possa resolver... A garotinha devia estar cuidando dele.
Trabalhei a manhã toda, pintando a parede da Srta. Rose, aquilo era bem cansativo, mas já estava acostumado. Rose era uma idosa e não reclamava de absolutamente nada, era uma pessoa muito boa por sinal. Também se preocupava com nosso bem estar, me fez várias perguntas sobre Rick e o porquê dele faltar o trabalho. Eu inventei uma história qualquer, mesmo não sabendo o motivo, quando chegasse em seu apartamento, iria ter uma conversa com o mesmo por não ter avisado nada. Isso não é coisa que amigos fazem.
[...]
Lá estava eu, indo visitar Rick. Cheguei na frente do prédio, toquei o interfone do apartamento dele, minutos se passaram e ninguém me atendeu. Algo estava me cheirando mal. Peguei meu celular e liguei para o dono do prédio, expliquei o que estava acontecendo e pedi para o mesmo se poderia vir até o prédio abrir o apartamento, o mesmo diz que estava a caminho, isso me deixou mais aliviado. Alguns minutos se passam e o dono chega, seu nome é David. Ele parecia um pouco mais velho do que eu pensava...
- Rick está criando problemas novamente? - ele pega a chave do bolso e faz uma expressão raivosa, ele tinha cara de ser bem rabugento. - Venha comigo...
O mesmo abriu o portão da frente e eu o segui pelas escadas. Sem demorar chegamos no apartamento de Rick, David pegou um chaveiro cheio e escolheu uma das chaves para abrir a porta.
Nheerc!
O velho empurrou a porta e um silêncio total tomou conta. Ele entrou e eu fui atrás, parecia que não havia ninguém no apartamento. Aquela sensação me causou um sentimento estranho, comecei a procurar Rick pela casa imediatamente.
- Rick? - não obtive nenhuma resposta. - Rick?
Fui até seu quarto, todas suas coisas estavam no guarda-roupa, nas gavetas, cama do quarto desarrumada, parecia que não tinha saído dali. Mas, David gritou do quarto da garota.
- Parece que a garota desapareceu... - disse o mesmo.
Comecei a ficar muito preocupado com o ocorrido, nós vasculhamos por todo o apartamento e decidi que não mexeríamos em nada, pois deveria ir na polícia relatar o sumiço de Rick e de sua filha. Não esperei muito tempo para fazer isso, logo avisei David que concordou com aquilo. Desci as escadas correndo e meu caminho era direto para a delegacia.
LUCY ON
As horas passaram voando, quando percebi já havíamos chegado em Manhattan. Zack e eu nos levantamos e descemos na estação, não era tão diferente quanto à que chegamos em Brooklyn, porém tinha várias lojinhas diferentes dentro. Quando pisamos para fora do estabelecimento, um pequeno desespero tomou conta de mim, mas, foi apenas por alguns segundos.
- Relaxa Lucy, conheço bem a cidade... - Zack colocou a mão em meu ombro, aquele gesto me fez ficar confortável e tranquila.
Como eu não sabia nada sobre aquele lugar, Zack que me guiou. Ele chamou um táxi, indicando o endereço da casa dele e tudo o mais. O mesmo guardou minha bagagem no porta malas e quando entramos, ele partiu. O canal de rádio era diferente, mas, algumas músicas que tocavam eram as mesmas que as de Brooklyn. Demorou alguns minutos para chegarmos, percebi que era mais longe do que eu pensava... O motorista parou o carro, desceu e foi pegar minha mala, enquanto eu e Zack descíamos também. Assim que tudo estava pronto, paguei o homem e agradeci, logo ele foi embora.
Meu rosto se fechou assim que encarei a casa de Zack.
- O que vai falar pra eles? - perguntei para o mesmo parado ao meu lado, parecendo pensativo.
- Eu vou contar a verdade. - disse Zack, lembrei que sua mãe já havia trabalhado na fundação, devia ter visto várias coisas estranhas acontecendo lá dentro. Mas, uma certa dúvida ficava em meu pensamento.
- E se não acreditarem?
- Veneno pode sair do seu corpo e se mostrar. - falou como se fosse o obvio.
- Não gostei da ideia, merda, sou tímido!
- Quieto! - repreendi o alienígena no meu corpo em voz baixa.
Zack deu de ombros e começou a caminhar em direção à porta, apenas o segui. Ele tocou a campainha e ficamos esperando por alguns segundos, até que a porta se abre, um homem alto e magro aparece, seus olhos verdes brilham ao encarar Zack, os dois eram realmente muito parecidos.
- Oh, meu deus! Zack! - o homem fala com uma grande emoção e puxa o mesmo para um abraço apertado. - Meu filho!
Fico meio sem jeito e desvio o olhar, Zack se solta rapidamente do pai, mas, o mesmo continua a acaricia-lo todo como se estivesse com medo que o mesmo desaparecesse de novo.
- Onde você estava esse tempo todo? Ficamos tão preocupados com você! - o pai começou a falar rapidamente, deixando Zack confuso. Logo o mesmo se vira para mim, engulo em seco. - Quem é essa?
Sem nem deixar Zack responder, aparece uma nova figura desconhecida atrás, empurrando o pai para o lado. Uma mulher baixa e um pouco gordinha, seu rosto era fofo e simpático, também parecia muito com Zack e foi abraça-lo.
- Meu filho! - ela sorriu toda animada. - Fiquei tão preocupada com você, está bem?
- Estou mãe... - respondeu Zack sorrindo também. E eu só parada observando aquilo tudo. - Eu tenho que te explicar muita coisa!
Zack me encarou na mesma hora, fazendo com que seus pais me olhassem também, meu rosto ficou muito vermelho, parecendo que iria explodir. Zack logo me apresentou, iriamos falar mais coisas ali, mas, a mãe de Zack logo disse para entrarmos.
- Antes de tudo vou ligar para a polícia dizendo que voltou pra casa e depois vou preparar um chá para vocês, parecem bastante cansados. - a mesma falou, o que me deixou mais à vontade.
Após a ligação para a polícia, segui Zack e seus pais até a cozinha, o mesmo estava carregando minha mala para mim, aquilo era muito gentil de sua parte. A casa de Zack era bem simples, não tinha muita coisa chique ou que parecia cara. A família parecia ser bem educada e acolhedora. Zack nem esperou sua mãe terminar o chá para começar a contar a história toda.
Ela nos serviu e eu comecei a beber aquilo enquanto Zack ainda terminava de falar tudo, não deixou passar nenhum detalhe do que sabia... E eu também não me intrometi em nada. A mãe, que descobri que se chamava Ellen, ficou um pouco chocada com a história, mas, Robert, o pai, ficou ainda mais, pois não trabalhava com coisas "estranhas" desse tipo. Quando chegou na parte que Zack teve que falar sobre mim, fiquei com a maior vergonha... Ainda mais sobre ter que ficar por alguns dias na casa deles. Achei que iriam achar uma loucura e me mandar pra um abrigo de crianças abandonadas, mas, a senhora Ellen aceitou numa boa, o que me fez ficar muito surpresa.
O chá estava muito gostoso, tudo estava dando certo, eu havia gostado demais dos pais de Zack, pareciam uma família bastante feliz. O que me dava falta, era o irmãozinho de que Zack tanto falava...
- Vamos ficar com eles, gostei do chá. - escuto a voz de Veneno depois de muito tempo em minha mente, quase que cuspo o chá para todos os lados por causa do susto.
"Ainda não sabemos o que vai acontecer, mas pelo visto já mudou de ideia...", respondo Veneno.
- Eu precisei relatar para a polícia que você finalmente apareceu e... - Ellen pegou as xícaras da mesa e colocou na pia assim que acabamos de tomar o chá, estava se explicando. - Disse que você fugiu com a namorada porque ficou rebelde.
- Fugiu com a namorada? - Veneno pergunta indignado, parece que alguém não gostou da brincadeira.
Eu e Zack nos entreolhamos e rimos.
- Nem começa com isso, mãe... - o mesmo revira os olhos.
[...]
Depois de muita conversa, quase horas discutindo sobre os acontecimentos a hora de Veneno aparecer chegou. No começo ele não gostou muito da ideia, mas quando eu o incentivei falando que era legal dar sustos nas pessoas, ele pareceu cooperar. Os pais de Zack ficaram horrorizados, mas Zack controlou a situação e disse que apesar de ser uma coisa nova, teriam que se acostumar com aquilo também (o que talvez demoraria dias), porém, não contamos a parte que Veneno queria destruir o planeta (as coisas só poderiam piorar).
Zack me ajudou a levar a mala para o quarto de hóspedes, já estava quase entardecendo, logo lembrei de perguntar sobre seu irmão assim que entramos no quarto.
- Zack, onde está o Liam? - encarei o mesmo colocando a mala em cima da cama.
- Ele estuda à tarde, agora é hora do meu pai ir busca-lo no colégio... - ele sorri, percebi que está mesmo com saudades, aquilo me deixou feliz. - Eu vou deixar você à vontade.
- Obrigada... - segui Zack sair do quarto com os olhos, o mesmo fecha a porta lentamente.
- Até que enfim... - Veneno sibilou em minha mente. - Vamos preparar nosso plano para destruir a fundação.
- Já havia quase me esquecido dessa ideia. - me sentei na cama, minhas pernas estavam um pouco dormentes de terem ficado paradas enquanto estava dentro do trem viajando.
- O que você está pensando em fazer? - perguntou Veneno curioso.
- Não quero machucar as pessoas, estou pensando em fazer algo à noite quando ninguém está trabalhando. - disse, essa era uma boa ideia em meus pensamentos.
- E não vai sobrar nenhum lanchinho pra mim? Não gostei! - o mesmo falou entristecido, aquilo me fez revirar os olhos e soltar um suspiro longo. Veneno e suas brincadeirinhas bobas, que na real era tudo verdade.
- Veneno, pessoas não são lanches. - disse em tom sério.
- Mas elas têm um gosto bem suculento! - ele respondeu com um tom mais natural do mundo.
A imagem de Zack vem à minha mente, sua família e tudo mais. Começo a pensar que seria muito perigoso para ele, se fosse comigo nessa missão... Já que não tem nenhum Veneno em seu corpo para protege-lo.
Certa preocupação começa a surgir. Mas, uma parte de mim me dizia que não precisava ficar tão preocupada assim, aquilo era muito estranho. Parecia que Veneno não queria que eu me preocupasse com Zack, isso me deixou um pouco brava com o mesmo, mas, não tinha certeza se era isso mesmo que ele estava me fazendo sentir. Será que Veneno estava com ciúmes do Zack!?