- Joca! - Ouço me chamarem e viro-me furioso. É o Caco. - Estão te chamando ali em baixo. Bufo e vou ver o que é. Deixo Vitória sozinha um pouquinho, já já eu volto.
- E aí meu! - Vejo Marcão, um amigo de longa data!
- E aí cara! O que faz aqui?
- Ah cara, voltei, sabe como é, a vida direita não é fácil.
- Mas a esquerda também não é. - Dou uma zoada com ele, que gargalha. Ficamos cerca de uns 20 minutos conversando e o convido pra entrar no camarote, mas ele recusa, pois está com duas gatas e vai as levar para o motel. Desejo boa sorte e volto pra minha gata, que vale mais que duas.
Vitória, está de costas, com aquela bünda arrebitada pra mim, ando admirando o corpinho, quando ela se vira, e para minha agradável surpresa ela sorri, mas ao me aproximar ela se atira nos meus braços, derrubando uma bebida de um copo que ela segurava. Na mesma hora sinto um cheiro estranho. Franzo o cenho e junto o copo, cheirando mais de perto. Merda! - Quem te deu esse copo? - Ela não me responde, tenta me limpar. - Vitória? - Ela começa a rir. Não acredito que eu saí alguns minutos e tentaram dopar a garota.
- Quem foi que deu esse copo pra ela? - Claro que ninguém se manifestou, mas eu vou descobrir. Vitória está eufórica, dançando e pulando, o corpo dela parece estar ficando mole, o quanto disso ela bebeu? - D2? - Chamo-o e ele larga a loira que está com ele. - Tu viu quem deu esse copo pra ela?
- Não vi cara, eu tava ocupado. - Ele pega o copo e cheira. - Que merda! - Ele olha para trás e para os lados. Tento sacudir Vitória pelos ombros, e fazer ela me ouvir, ela parece estar com sede, mas não posso dar água pra ela agora. Chamo-a e ela arregala os olhos pra mim, sua boca treme levemente, e seu corpo vai ficando mole em meus braços. D2 me ajuda a amparar ela, e pego nos braços.
Desço as escadas do camarote, e ando até a moto, não tem como levar ela desmaiada de moto. Olho para os lados e Salsicha aparece, e seu olhar me acusa.
- O que você fez com ela? - Ele tenta tirar ela dos meus braços, e eu não deixo. Eu vou matar esse garoto, se ficar se metendo!
- Eu não fiz nada! Agora sai da minha frente!
- Pra onde vai levá-la?
- Pra minha casa! - Brado, carregando a garota desmaiada, com o corpo completamente mole.
- Eu vou ir junto, então!
- Sai fora, meu! - Ele para na minha frente e ranjo os dentes. - Salsicha, não me provoca!
- Joca! - Ele grita comigo, e estreito os olhos.
- A sua sorte, que não posso pegar a arma agora. - A noite está escura, e um vento começa a soprar, logo ouço as vozes de D2 e V13.
- O que aconteceu Joca?
- Diz pro pessoal tomar conta do baile, e vocês vem comigo. - Olho pro chato parado a minha frente. - E tu vai tentar descobrir quem foi que dopou ela.
- Não mesmo! - Ele franze o cenho, e já to duvidando da viadajem desse cara. - Ela é minha amiga, eu a trouxe, e é minha responsabilidade.
- Daonde, meu! Ela tá comigo!
- Pede pros caras ver, eu vou com ela! - Olho pro D2 e ele assente, enviando uma mensagem. Eu vou matar quem fez isso. Acabou com a minha noite!
Subimos até minha casa e levo ela pro meu quarto, com aquele bando de marmanjo atrás de mim. Eu não sou eles, que pegam mina desacordada.
- Eu vou matar! - Grito passando as mãos nos cabelos. - Eu juro que vou matar quem fez isso! Qual a intenção? Sumir com ela antes de eu voltar? Ou só estragar a noite mesmo? - Olho a linda menina na minha cama, e que grande merda! Eu podia estar tirando aquele vestidinho dela agora.
- Merda! - Ouço Salsicha dizer, logo em seguida ele senta ao lado dela. - Tá convulsionando.
- O que deram pra ela, porrä?!
- Pode ter sido uma mistura forte, energético, ecstasy, boa noite cinderela... - Eu arfo.
- Vamos levá-la para o hospital! - Salsicha diz, mas só se ele perdeu o juízo!
- Tá doido? Liga pro Geraldo! - D2 pega o telefone, e me sento ao lado dela, pupilas dilatadas, e revirando os olhos.
Pego o termomêtro, uma cumbuca com água e um pano. Meço a temperatura, e já está em 38 graus. Pego o pano e molho na água fazendo uma compressa e colocando na testa dela.
Salsicha, parece mais desesperado que eu, e ta me irritando.
- Meu, se tu quer ficar, para quieto.
- Você disse que ia cuidar dela! - Ele me diz por entre os dentes e eu vou esganar ele.
- Eu saí 20 minutos.
- Vinte minutos? Se demorasse mais dez, poderiam ter levado ela! Eu te falei que ela era inocente de mais!
- Cara! Tu é o que dela?
- Tu não sabe o significado de amizade né?
- Tu conheceu ela ontem! - Grito com ele, pensando em torturar ele antes de matar.
- E tu também, e tá aí fazendo compressa! Eu saí do camarote, porque tu pediu, eu tinha dito pra ela que eu ia cuidar dela no baile. Tu prometeu cuidar! E agora?
- Edgar - Falo sério. - Vai embora, eu tô te avisando! Não estou bom... - Vejo-o empalidecer.
- Joca...
- Só vai, ou eu vou acabar mandando te dar uma surra.
- Vou ficar lá fora. - Ele me diz por entre os dentes. E apenas assinto. Pelo menos vai sair das minhas vistas. Idiota!
Vitória continua ali desacordada. Molho o pano de novo e coloco em sua testa. Que raiva que eu estou. De mim mesmo, e de todos aqueles pamonhas que estavam no camarote e não viram quem deu aquele copo pra ela. Seguro a sua mão, mole e macia.
- Desculpa Vih... vou tomar mais cuidado. - Acaricio a sua mão, enquanto seguro a compressa em sua testa, e aguardo o médico.
Geraldo vem em meu socorro sempre que preciso, claro que quando necessário vamos na Unidade de Pronto Atendimento mais próxima, que é 24 horas. Eles sabem dos nossos corre, e nos auxiliam, a menos que não tenha jeito, que vamos para o hospital. E em casos menos graves, ou desespero que não dê pra sair do morro, chamamos o Geraldo. Ele é médico da UPA, mas trabalha só no período da manhã, nos outros horários faz particular a domicílio, e o pago muito bem, para vir aqui quando preciso.
Ele chega ofegante, com a maleta e me encara sério.
- O que houve com a garota?
- Doparam ela, com bebida.
- Que bebida?
- Energético, mas não sei tudo que tava lá.
- Sintomas?
- Euforia, sede, acho que tontura e visão turva, e então desmaiou. E parece ter convulsionado.
Ele a examina com cuidado. Vejo ele olhando pra ela, e ele vai ver só quando sair daqui. Geraldo deve ter uns 40 anos, é casado e tem um filho adolescente. Mas não confio em sua fidelidade a esposa, e agora ainda olhando para a minha gatinha. - Para de olhar pra ela assim, ou vou arracar seus olhos. - Digo e ele me encara assustado.
- Calma, Joca. Estou só examinando a mulher! - Ele checa a pressão, batimentos cardíacos, febre, abre os olhos dela, faz mais umas coisas, e pega uma seringa.
- O que vai fazer?
- Dar o antídoto para aliviar as reções da droga.
- Mas nem sabe o que deram! - Digo preocupado.
- Vou dar naloxona, serve para os öpióides.
- Que merda de öpióides, é cocáinä? Heroínä? Que merda de öpióides?!
- Joca, me deixa fazer meu trabalho! - O médico me diz, e sinto vontade de apertar o pescoço dele. Ele pega o remédio, coloca em um adaptador nasal na ponta da seringa e depois empurra pra dentro de uma das narinas de Vitória, depois na outra. Em muito tempo não sinto um aperto tão forte no peito. Desde a morte dos meus pais, para ser mais preciso. Era como se fosse em mim, como se tivessem ferido a mim, ou até pior. Preferia que tivessem feito a mim e não a ela.
- Certo. Em algumas horas ela vai acordar. Dê a ela essas cápsulas de carvão vegetal para inibir as toxinas de serem absorvidas ainda mais pelo organismo.
- Ok.
- Agora é esperar, e dar essas cápsulas. Duas a cada 8 horas por dois dias. - Apenas assinto, estou sem forças, até para esganar ele.
- Passa com o D2, ele vai acertar a conta. - Digo e ele me dá um tapa no ombro. Me sento na cama ao lado da pequena garota e aguardo. Todo um preparo pra noite terminar assim. Que merda hein!