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Cheguei na escola mais cedo do que de costume, sem saber exatamente o porquê. Talvez porque minha cabeça ainda estivesse bagunçada desde o sábado, talvez porque queria evitar cruzar com Justin logo de cara. O ar da manhã ainda estava fresco, e o pátio começava a encher aos poucos.
Vi Mariana sentada no banco de sempre, perto das árvores que cercavam o refeitório. Ela mexia no celular distraída, com o cabelo preso num coque desleixado e o café na mão. Quando me viu, acenou com a cabeça, sorrindo.
- Achei que ia faltar - disse ela, empurrando a mochila pro lado pra eu me sentar.
- Pensei nisso. Mas seria fugir. E eu já tô fazendo isso demais - respondi, tentando não soar tão confusa quanto me sentia.
- Ele te mandou mensagem ontem?
- Mandou. Não respondi. Ele apareceu lá em casa.
- Meu Deus... sério? - Mariana arregalou os olhos. - E aí?
- Nada. Ele surtou. Ficou irritado. Disse que eu sou dele. Aquelas coisas que só o Justin diz como se tivesse todo o direito do mundo.
Mariana balançou a cabeça, mas não disse nada logo de cara. Por fim, suspirou.
- O Ryan também me mandou mensagem ontem - disse, quase num sussurro, mudando de assunto. - Foi... legal. Ele tem um jeito estranho, meio quieto, mas... sei lá. Não parece forçado.
- Isso é raro entre eles - falei, com um sorriso de canto. - Fica esperta. Não dá pra confiar tão fácil.
- Nem em você dá mais - brincou ela, me cutucando de leve. E por um momento, tudo pareceu normal.
Mas a sensação durou pouco.
Durante a terceira aula, a professora de História se atrasou. A turma virou uma zona. Mariana saiu com uma colega pra pegar um material na sala da coordenação, e eu fiquei ali, observando a confusão.
Foi quando Justin se aproximou da minha carteira, como quem não queria nada.
- Vem comigo - disse, sem rodeios, com as mãos nos bolsos da calça jeans escura.
- Pra onde?
- Vem.
Hesitei por um segundo, olhei em volta, mas acabei me levantando. Caminhamos em silêncio até um corredor lateral quase deserto. Ele parou em frente a uma porta velha: a sala do zelador.
Abriu como se já tivesse feito isso cem vezes e me puxou suavemente pra dentro.
O lugar era pequeno, com prateleiras bagunçadas, cheiro de madeira e produtos de limpeza no ar. A luz entrava por uma janela alta, criando feixes de poeira dançando no ar.
- Por que me trouxe aqui? - perguntei, me encostando na parede.
- Porque eu precisava te ver. Só nós dois. Sem Mariana, sem seus medos.Sem esse mundo idiota onde todo mundo acha que pode decidir por você.
Me aproximei, mas mantive uma distância segura.
- Você acha que pode decidir por mim também.
- Eu? - ele deu um sorriso torto. - Eu só quero que você pare de fugir do que tá na sua cara.
- E o que exatamente tá na minha cara?
Ele não respondeu com palavras. Deu dois passos, encostou a mão na minha cintura e, por um momento, os olhos dele suavizaram.
- Você não é como ninguém que eu já conheci, Carla. E isso me deixa louco.
Antes que eu pudesse pensar numa resposta, ele me puxou com força e me beijou.
Não foi delicado. Foi intenso, desajeitado, carregado de tudo o que estava entalado entre nós. Minha respiração travou. O gosto dele era um misto de urgência e confusão. E por mais que eu soubesse que aquilo era errado - eu não me afastei.
Me deixei levar. Por um minuto, só existíamos nós dois e o som abafado da escola do lado de fora.
Quando nos afastamos, ainda com o rosto colado, ele murmurou:
- Você vai me deixar maluco.
Antes que eu pudesse responder, ouvimos passos no corredor. Justin ajeitou a jaqueta e abriu a porta. Saiu primeiro, como se nada tivesse acontecido. Esperei alguns segundos e saí também, o coração martelando no peito.
No fim do corredor, vi Mariana voltando. E, alguns metros atrás dela, Ryan - mãos nos bolsos, encostado na parede, me lançando um olhar indecifrável, mas que se suavizou ao cruzar com o de Mariana.
Ela corou levemente. Ryan arqueou uma sobrancelha, e ela desviou o olhar, sorrindo de canto.
As coisas estavam mudando. Rápido, e talvez... perigosamente.