O coração dela batia descompassado. Sabia exatamente o que encontraria ali. Em sua primeira vida, havia lido apenas breves notas sociais nos jornais: "O filho ilegítimo do magnata Castellani permanece em coma após um acidente misterioso. Parentes disputam sua fortuna em longas batalhas judiciais." Na época, não dera importância. Estava ocupada demais lutando contra sua própria ruína. E só muito tarde descobrira que aquele homem era o mesmo menino que, um dia, lhe prometera proteger sua inocência no orfanato.
Agora, diante das portas duplas do hospital, respirou fundo. Dessa vez, não deixaria o destino roubá-lo também.
A recepcionista a olhou com estranheza, mas bastou o selo da família em seu anel para que as portas se abrissem sem resistência. Todos ainda a viam como a futura noiva do "príncipe encantado" - ninguém desconfiava da podridão escondida por trás daquele sorriso. Usaria essa fachada enquanto fosse necessário.
- O quarto do senhor Gael Castellani, por favor. - A voz dela saiu firme, ainda que o peito estivesse em chamas.
A enfermeira a conduziu pelo corredor perfumado de desinfetante e flores caras enviadas por parentes hipócritas. Cada porta que passavam parecia guardar histórias de dor, mas nenhuma importava tanto quanto a última, no fim do corredor.
Quando a enfermeira abriu a porta, um arrepio percorreu-lhe a espinha.
O quarto era amplo, iluminado por uma luz suave. No centro, sobre a cama, estava ele. O homem que, em sua outra vida, vingara sua morte, mas a encontrara tarde demais. Seu corpo parecia repousar em paz, com fios ligados a máquinas que monitoravam cada batida de seu coração. O rosto era belo e austero, traços marcantes que carregavam tanto poder quanto fragilidade. Parecia uma estátua esculpida em mármore, perfeita, mas intocável.
Ela se aproximou devagar, sentindo o peso de cada passo. Suas mãos tremiam quando tocaram os lençóis, e uma onda de emoção a dominou.
- Gael... - sussurrou, o nome escapando como um segredo guardado por anos. - Você não imagina o quanto eu esperei por esse momento.
A lembrança dele, ainda menino, voltou com força. Os olhos brilhantes, o sorriso tímido, a promessa feita em voz baixa: "Mesmo que o mundo nos separe, eu vou voltar para você."
As lágrimas encheram seus olhos, mas ela não as deixou cair. Não podia se permitir fraquejar.
- Eu falhei com você uma vez... - disse, a voz embargada. - Quando acordei da doença, você me procurou, mas eu já estava acorrentada a uma farsa. Não sabia que era você quem me esperava, não sabia que era o único que teria lutado por mim.
Ela apertou a mão dele, fria e imóvel, mas sólida.
- Desta vez, eu não vou falhar.
Sentou-se ao lado da cama e abriu novamente seu caderno. Anotou datas, nomes e detalhes. O mapa de sua vingança se expandia, mas agora havia uma nova prioridade: proteger Gael. Sabia que os parentes dele o consideravam um fardo, apenas um obstáculo para se apoderarem da fortuna Castellani. Já devoravam a empresa, dilapidavam negócios, vendiam propriedades. Estavam apenas esperando a morte definitiva para encerrar a história de um herdeiro incômodo.
- Eu não vou deixar. - Sua voz tornou-se firme. - Vou cuidar de você, vou segurar seu império até que desperte. Quando abrir os olhos, tudo estará em ordem. E juntos... juntos vamos esmagar aqueles que nos traíram.
Ela não sabia, mas cada palavra dita ecoava na consciência adormecida de Gael. Por trás das pálpebras fechadas, sua mente lutava. Ele sentia o calor da mão dela, sentia o peso da promessa. Estava preso em um corpo inerte, mas sua alma reconhecia aquela voz, a mesma voz que havia iluminado seus dias no orfanato.
Naquele instante, um leve movimento percorreu seus dedos, quase imperceptível. Ela não percebeu, perdida em suas próprias juras silenciosas.
A madrugada avançou, e Sabrina permaneceu ali, em vigília. Contou-lhe segredos, confidenciou medos, prometeu vitórias. O silêncio do quarto foi preenchido por sua determinação, como se cada palavra fosse um feitiço que costurava o destino deles.
Quando o relógio anunciou as primeiras horas da manhã, levantou-se, cansada, mas decidida.
- Voltarei amanhã, e no dia seguinte também. Não vou deixar você sozinho, Gael. - Aproximou-se dele e, pela primeira vez, ousou beijar-lhe a testa. - Desta vez, não serei a noiva de uma farsa. Serei a esposa que protege seu legado... até que você acorde.
Saiu do quarto em silêncio, sem notar que, por trás das máquinas, o coração de Gael batia um pouco mais forte.
Do corredor, lançou um último olhar pela fresta da porta. O guardião adormecido estava ali, e com ele toda a esperança de reescrever seu destino.
A guerra havia começado.