O noivo traidor, impecável em seu terno escuro, conversava animadamente com alguns investidores. Ao lado dele, como uma sombra brilhante, estava a falsa filha - usurpando seu lugar com aquele ar doce e frágil que conquistava facilmente qualquer plateia. Ao vê-la, a impostora apertou ainda mais o braço do homem, como se quisesse marcar território.
Sabrina respirou fundo. O coração acelerava, mas não era mais de amor: era de guerra.
- Minha querida - o noivo aproximou-se, com aquele sorriso treinado que, um dia, fora capaz de desarmá-la. - Não esperava te ver tão radiante.
Ela deixou que ele beijasse sua mão, mas respondeu com ironia suave:
- O brilho vem quando a gente aprende a tirar a poeira das ilusões.
O sorriso dele vacilou, ainda que por um instante.
A falsa filha, percebendo o clima, apressou-se a intervir.
- É bom vê-la, irmãzinha - disse, com falsa ternura. - Tenho ouvido tantas coisas a seu respeito. Imagine, você cuidando de negócios... Quem diria?
O salão ficou em silêncio. Os convidados fingiam conversar, mas escutavam cada palavra.
Ela inclinou levemente a cabeça, mantendo a calma.
- Pois é. Quem diria que, às vezes, os papéis se invertem. - A voz soou doce como mel, mas cortante como navalha. - Alguns herdaram apenas um sobrenome emprestado. Outros nasceram com ele gravado no sangue.
O rubor subiu ao rosto da impostora, mas o noivo segurou sua mão, disfarçando a tensão com mais um sorriso.
- Estamos todos aqui para celebrar, não para discutir. - A voz dele soava conciliadora, mas os olhos queimavam de irritação.
- Concordo - ela respondeu, com serenidade. - Celebremos, então, os novos tempos.
Levantou a taça de vinho e brindou sozinha, deixando que o gesto ecoasse como um desafio público. Alguns convidados sorriram em aprovação discreta. Outros desviaram o olhar, temendo o escândalo iminente.
Mais tarde, quando a música suave dominava o salão e os casais dançavam, o noivo a puxou para um canto reservado. O charme habitual agora estava manchado de impaciência.
- O que está acontecendo com você? - perguntou, baixo. - Desde quando se tornou tão... ousada?
Ela o encarou sem desviar.
- Desde que percebi que ousadia é a única forma de sobreviver entre cobras.
Ele segurou seu braço com firmeza, mas disfarçou para não chamar atenção.
- Cuidado. Esse jogo que está jogando pode custar caro.
Ela se inclinou para ele, sorrindo como quem confidencia um segredo.
- Você ainda não entendeu, não é? - sussurrou. - Eu já paguei o preço mais alto. Não tenho mais nada a perder.
Ele recuou, confuso. Por um momento, parecia que uma sombra de dúvida o atravessava. Mas, em seguida, vestiu novamente o sorriso.
- Sempre misteriosa... - murmurou. - Mas lembre-se, querida: ninguém desafia impunemente a família que protegeu seu nome por tantos anos.
Ela riu baixinho, um riso que ele não reconheceu.
- Vamos ver de quem era o nome que realmente protegia quem.
E saiu, deixando-o parado, engolindo a própria fúria.
A noite avançava, e o salão começava a esvaziar. A falsa filha, sem conseguir suportar a atenção dividida, aproximou-se para o confronto final.
- Você acha que pode tomar tudo de mim só porque está jogando com papéis e juízes? - sussurrou, com veneno na voz. - Nunca será amada. Nunca terá o que eu tenho.
Sabrina se aproximou até que seus rostos quase se tocassem.
- Amada? - repetiu, em tom calmo, quase compassivo. - Você ainda acredita que ele ama alguém além de si mesmo?
O silêncio da impostora foi resposta suficiente.
- O que você tem é apenas a sobra da minha vida passada. E, desta vez, não deixarei que tome mais nada. - O olhar dela faiscava. - Aproveite enquanto pode. O relógio corre contra você.
Deixou-a ali, paralisada, e caminhou para fora do salão. O ar noturno a recebeu como uma lufada de liberdade.
Ela sabia que aquela batalha era apenas a primeira de muitas. Mas já não era mais a noiva enganada. Era a verdadeira herdeira, e os dias da farsa estavam contados.
No fundo, sentiu vontade de correr até o hospital, de contar a Gael cada detalhe, de deixar que o silêncio dele fosse testemunha de suas vitórias. Mas conteve-se. Haveria tempo.
Por ora, bastava saber que o mundo começava a perceber: ela não seria mais uma sombra apagada pela mentira.
Quando entrou em sua carruagem, abriu o caderno e escreveu apenas uma frase:
"Hoje, eles me viram. E não puderam me calar."
Guardou a pena, fechou os olhos e deixou que a noite embalasse sua determinação. O baile havia terminado, mas a guerra estava apenas começando.