Capítulo 4 Sábado no Mani's

Sophia Hayes

Seis dias de relatórios intermináveis e testes de aptidão. Faltam 23 dias para receber finalmente meu distintivo definitivamente. Não voltei a fazenda desde a morte do meu pai, me joguei de cabeça no trabalho e por isso, em um sábado ensolarado, quente e bonito, eu estou aqui no J. Edgar Hoover, estudando estratégias e checando relatórios dos últimos seis meses.

Se vocês me perguntarem, esse deve ser o pior trabalho para alguém que sempre sonhou e estudou para estar em campo, mas a vista que tenho do meu atual parceiro, eu não trocaria por nada. Hendrix chegou tenso, ele falou o básico e foi direto para os próprios arquivos, ele esteve tão imerso em todos aqueles papéis que nem mesmo percebeu às vezes que lhe entreguei café ou que lhe fiz perguntas.

Tentei entender o que ele estava fazendo, mas como nos últimos seis dias ele me ignorou. Eu não sei se é proposital ou se é o jeito dele, mas às vezes me incomoda que ele não me note. E sim! É pelos motivos errados.

Passa das 14h, eu sei que ele não notaria se eu fosse embora, mas eu simplesmente não consegui, o andar ficou vazio há quase 2 horas, nem mesmo Arthur Braxton está em seu escritório. E eu sei disso por que todos eles passam por mim na minha maldita mesa no canto. Me sinto como se voltasse para escola e fosse a única colombiana no mundo.

Minha pele mais bronzeada, meus olhos maiores, castanhos amarelados, lábios volumosos, não era o ideal de beleza no colegial, mas nasci americana, como todo o resto, mesmo assim, eu nunca me encaixei. Agora parece tudo de novo, mas com adultos brancos e covardes que gostam da minha bunda, mas que não me respeitam o suficiente para serem educados. Exceto, é claro, pelo meu novo parceiro, que gosta da minha bunda e disse isso na minha cara no outro dia, de um jeito que não posso chamar de ofensivo, mas também não era educado.

Lembrar das palavras dele me dá um calafrio e eu tento controlar o calor que se espalha pelo meu corpo. Ainda mais por que ele está ali tão perto e parece tão solitário.

Aproveito que ele parece ter parado de trabalhar e me aproximo com cuidado, mesmo correndo o risco de ser ignorada novamente, - Você está bem, Hendrix? - Pergunto e sem nem mesmo perceber coloco minhas mãos nos ombros dele e aperto, estão tensos e pesados, mas também consigo sentir os músculos nas entre os meus dedos e me deixo levar pela minha pequena indiscrição quando finalmente percebo o que estou fazendo.

Sinto ele suspirar e imagino o pior, mas ele não me afasta, ele apenas responde a minha pergunta, então continuei, mas em um rompante de coragem, fiz um convite. E por isso agora estou no estacionamento seguindo um homem com o dobro da minha idade e sem ter a menor ideia de para onde ele está me levando.

- Onde você quer almoçar? - Tentei quebrar o gelo, mas notei o Chevi Firebird e não consegui conter o riso - é o seu carro da formatura? - Não que não fosse um belo carro, mas estava ultrapassado e nem era dos melhores de 68. - Não, do ano anterior - Ele respondeu mal-humorado e abriu a porta me encarando - Se você quiser pode ir no seu próprio carro - Sorri sem graça - Tudo bem, parece que o carro é uma linha de fundo, não farei novamente, - disse quando escorreguei para o banco do passageiro do chevi extremamente limpo e muito conservado, talvez fosse algo de um colecionador.

Resolvi me desculpar de verdade em outro momento. - Você já esteve no Mani's - Perguntou sentado no banco do motorista enquanto eu estava divagando sobre a história do carro - É um restaurante? - Perguntei e ele apenas me lançou um daqueles sorrisos que me faz pegar fogo e aparentemente ele sabe.

Saímos do Hoover em direção Dupont Circle, queria fazer mais perguntas sobre o lugar, mas o homem dirigia curtindo o som do Whitesnake, sem nem mesmo me olhar de lado, era a primeira vez que o vejo tão relaxado, se é que isso é possível.

"I'm torn and tattered, shattered and worn, I've had enough, trying to live my life in the eye of the storm... "

Cantarolei junto com o rádio e a minha voz se sobrepôs a do David Coverdale em algum momento, e eu só parei por que senti os olhos de um leão estavam me encarando. Esfomeado era uma palavra forte, mas se encaixava perfeitamente no que eu via ao encarar os olhos cravados em mim.

- Você conhece hard rock dos anos 80, e canta muito bem, - Mas o sorriso na cara do infeliz me fez pensar o contrário - Tenho uma alma velha - Disse ficando envergonhada, mas continuei murmurando a música, porque era verdade que eu adorava músicas dos 80, assim como várias bandas de Hard Rock. Meu parceiro também murmurava a música, até que no melhor do refrão nós cantamos juntos...

Restless heart, restless mind, I'm tired of Wasting, my precious time...

Sorrimos - você também não canta mal, agente Hendrix, nada mal. - Deu de ombros e estacionou na frente de uma lanchonete tipicamente norte-americana, as poltronas alemãs eram azuis e vermelhas, espalhadas em fileiras conectadas e no balcão alto que separava a lanchonete do público, havia bancos altos e desconfortáveis para uma mulher de 1,73 de altura.

Uma senhora sorridente na casa dos 60 nos recebeu - Ora, ora, ora quem é vivo sempre aparece - Ela disse para o homem ao meu lado, mas seus olhos estavam em mim. - Ela não é um pouco jovem demais para você, querido? - Era realmente como se eu não estivesse lá.

Harrison sorriu e passou o braço pelos ombros da mulher - Não, Vivian, você é que é muito velha para mim - Disse em tom de deboche e depois me puxando para perto com o outro braço - Hayes, essa é a Vivian; Vivian, está é a minha nova parceira Sophia Hayes, é filha do Fernando -

A mulher ficou surpresa por dois segundos e depois sorriu para mim - Sinto muito pelo seu pai, mas devo dizer que ele tinha um talento, aparentemente, fazia belas filhas - disse levemente como se fossem velhos amigos e então completou - Muitos agentes, vem aqui, mas o aqui Hatch é o meu favorito.

Sobre a segunda coisas, bem, eu não posso culpá-la.

- Vive, vamos ficar em uma mesa hoje, a do canto, ok? - Hendrix deixou que ela fosse à frente e seguiu comigo com sua mão quente na base da minha coluna, isso me causava tantas sensações que era até vergonhoso saber disso. Sentamos em um grande sofá vermelho e ele segurou o cardápio enquanto falava comigo.

- Aqui tem o melhor sanduíche rosbife da cidade e a torta de cereja é divina - Fazendo biquinho com a mão e sorrindo ao me entregar o cardápio que neguei - Bom, você é o especialista, vou aceitar sua sugestão - Ele acenou vitorioso e fez a Vivi o nosso pedido.

- Aqui é legal - Disse olhando tudo ao meu redor, uma radiola de ficha no canto, tocava Bon Jovi, Bad Medicine e logo Vivian voltou com dois sanduíches gigantes de rosbife, duas fatias de torta e duas cervejas - Acha que devemos mesmo beber? - Perguntei - Eu não vou te obrigar, mas você me disse para fazer o pedido e esse é o meu "de sempre".

Tomei um gole da cerveja, sorrindo. Por algum motivo eu continuava com esse sorriso bobo no rosto desde o momento que entrei naquele carro velho "oops, antigo".

            
            

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