Caminhei para o meu escritório, o cômodo onde antes encontrava consolo, agora apenas mais uma gaiola dourada. Meus materiais de arte jaziam intocados, uma acusação silenciosa dos sonhos que Bernardo havia esmagado sistematicamente. Eu tinha que ir embora. Não apenas da casa, não apenas de Bernardo, mas de toda esta cidade, de toda esta vida construída sobre mentiras. Eu desapareceria, um fantasma se desvanecendo no fundo, deixando-o com sua profecia e sua família perfeita e fabricada.
Enquanto começava a arrumar distraidamente uma pequena mala, meus olhos caíram no meu celular. Sua tela se iluminou com uma notificação. Era a rede social de Bernardo. Uma nova postagem. Meu dedo, contra meu bom senso, tocou o ícone.
Lá estavam eles. Bernardo, radiante, com o braço em volta de uma Cíntia resplandecente, que segurava um dos meninos gêmeos. A legenda dizia: "O futuro da nossa família, finalmente completo. Abençoados pelo universo." Abaixo, uma enxurrada de comentários de parabéns. "Tão feliz por você, Bernardo!" "Cíntia está incrível!" "Esses meninos são adoráveis!" A felicidade pura e não adulterada da imagem, a celebração pública de seu engano, me atingiu com uma nova onda de náusea.
Minha visão embaçou, o telefone escorregando de minhas mãos. Senti uma onda de tontura, o quarto girando ao meu redor. Eles eram perfeitos. Eles estavam felizes. E eu era... eu era apenas o adereço descartado.
Um clique repentino no andar de baixo quebrou o silêncio, seguido pelo som familiar dos passos pesados de Bernardo. Ele estava em casa. Meu coração saltou para a garganta, um medo primitivo me dominando. Eu não o tinha ouvido entrar. Ele me viu? Ele viu os papéis do divórcio?
Ele entrou no escritório, seus olhos caindo imediatamente em minha mala meio arrumada e na página de mídia social aberta em meu telefone. Sua testa franziu. "O que você está fazendo, Amélia?" Sua voz era calma, mas o tom de fundo era de um frio desagrado.
Instintivamente, apertei o acordo de divórcio em branco com mais força atrás das costas. Minha voz era um sussurro trêmulo. "Estou arrumando as malas. Estou indo embora."
Ele zombou, seu olhar varrendo meus pertences humildes, os poucos itens pessoais que eu ousara chamar de meus em seu mundo opulento. "Indo embora? Com essas bugigangas? Você acha que pode simplesmente sair daqui, Amélia?" Seus olhos se demoraram em um pequeno pássaro de madeira esculpido à mão, um presente de minha mãe. "Honestamente, sempre me perguntei por que você se apega a tanta... tralha sentimental."
Suas palavras, mais uma vez, pareceram um insulto deliberado e calculado. O pássaro da minha mãe, um símbolo de seu amor, era "tralha" para ele. Minha garganta apertou, a ardência das lágrimas ameaçando me dominar. Como eu pude amar este homem? Como pude ser tão cega? Meus pertences, cada um imbuído de significado, eram inúteis aos seus olhos, assim como eu.
De repente, um choro suave ecoou do corredor. Um bebê. Meu fôlego engatou. Cíntia devia estar aqui.
O rosto de Bernardo suavizou instantaneamente. Ele se virou de mim, sua irritação derretendo em um sorriso carinhoso enquanto Cíntia aparecia na porta, embalando um dos gêmeos. "Meu pequeno príncipe", ele arrulhou, estendendo a mão para o bebê. "O que há de errado, meu homenzinho?"
Ele nem sequer olhou para trás para mim. Eu fiquei ali, invisível, um fantasma em minha própria casa, observando enquanto ele cobria Cíntia e o bebê com o afeto que eu antes ansiava, o afeto que ele havia fingido tão habilmente. A cena era doentiamente doméstica, uma farsa cruel encenada só para mim.
Minhas mãos se fecharam em punhos, os últimos vestígios do meu autocontrole se desfazendo. "O que você quer, Bernardo?" Minha voz era quase inaudível, tremendo com uma mistura de desespero e desafio. "O que é isso? Você está tentando me torturar?"
Ele finalmente se virou, seu olhar desdenhoso. "Torturar? Não seja melodramática, Amélia. É simplesmente como as coisas são agora. Cíntia e os meninos vão se mudar para cá. Permanentemente." Ele gesticulou vagamente ao redor da vasta sala. "Esta casa é grande o suficiente para todos nós."
Meu queixo caiu. Ele esperava que eu morasse aqui, sob o mesmo teto, observando-o brincar de família feliz com outra mulher e filhos que eu deveria ter tido? "Você espera que eu fique parada e veja você criar filhos com ela? Depois do que você fez?"
Ele suspirou, sua paciência visivelmente se esgotando. "Amélia, podemos fazer isso funcionar. O guru previu. Você pode ser uma influência maravilhosa para os meninos. Uma figura de tia, talvez. Ou até mesmo..." Ele fez uma pausa, um brilho estranho e calculista em seus olhos. "Poderíamos adotar os gêmeos juntos. Pense na estabilidade que isso ofereceria."
Meu sangue gelou. Adotar os filhos dele, nascidos de sua mentira, criados pela mulher que ajudou a me trair? A pura audácia, a lógica distorcida, era de tirar o fôlego.
Cíntia, sempre oportunista, deu um passo à frente, seu sorriso sacarino. "Oh, Amélia, sou Cíntia, embora eu tenha certeza que você se lembra de mim. E estes são nossos lindos meninos, Phoenix e Orion."
Phoenix. Orion.
Meu mundo inclinou. Eram os nomes. Os nomes que eu sussurrei para Bernardo na intimidade silenciosa de nossa cama, os nomes que eu escolhi para nossos filhos, os filhos que ele deliberadamente destruiu. Ele deu meus nomes aos filhos deles.
Um grito gutural rasgou minha garganta. "Não! Tire-os de perto de mim!" Eu tropecei para trás, balançando a cabeça violentamente. "Eu não vou adotá-los! Eu não vou fazer parte desta farsa grotesca! Você deu meus nomes a eles!"
O rosto de Bernardo endureceu. "Amélia, chega. Sua irracionalidade é perturbadora. Este é um assunto espiritual, um alinhamento divino. Você vai aceitar." Ele deu um passo em minha direção, sua presença de repente ameaçadora. "Você é minha esposa, Amélia. Você permanecerá minha esposa. O guru proíbe o divórcio. Isso perturbaria o equilíbrio cósmico, traria má sorte para minha casa."
O equilíbrio cósmico? Má sorte? Não era sobre espiritualidade. Era sobre imagem pública, sobre o escândalo que um divórcio causaria à sua vida cuidadosamente curada, à reputação imaculada de sua família. Eu vi então, exposto: seu egoísmo absoluto, seu cálculo frio, disfarçado de retidão espiritual.
Meu corpo balançou, meus joelhos quase cedendo. Senti como se estivesse caindo em um poço sem fundo. Bernardo, vendo meu sofrimento físico, apenas acenou para Cíntia, que rapidamente se retirou com os bebês. Ele então se virou para a porta, sua voz ecoando com uma finalidade arrepiante. "Amélia, você vai mover seus pertences para o quarto de hóspedes no terceiro andar. Cíntia e os meninos, é claro, precisarão da suíte principal."