Capítulo 10 A amante passou dos limites

Agindo naturalmente como se nada tivesse acontecido, o Gordon ficou com a Janessa para cuidar dela.

Durante a sua recuperação, ele a proibiu de assistir à televisão e de usar o telefone. Para que ela pudesse se distrair, trouxe algumas revistas de moda.

Este era o jeito dele de dizer que era melhor para ela cortar qualquer contato com o mundo exterior naquele momento.

O que ele não sabia, era que cada vez que deixava o local, algum funcionário trazia o jornal diário para ela, e dessa maneira a jovem se inteirava das notícias sobre a empresa da família Qiu.

A princípio ela sentiu tanta raiva que rasgou o jornal, amaldiçoando o Rayan e o Aydin mentalmente.

Com o passar do tempo, se deu conta de que eles estavam fazendo de tudo para provocá-la propositadamente.

E quanto mais via que eles esperavam uma reação sua, mais ela se continha. Não podia permitir que eles se safassem.

A Janessa nunca tinha falado sobre este assunto com o Gordon, porque a última coisa de desejava era causar-lhe ainda mais problemas.

Certo dia, o telefone do Gordon tocou e ele saiu do quarto para atender a chamada.

Alguns minutos depois, alguém bateu na porta.

Janessa observou a porta com indiferença. "Pode entrar", ela disse com uma voz cansada.

A porta se abriu e uma figura familiar surgiu de trás dela. Ele trazia uma pasta em sua mão e seu rosto tinha uma expressão séria.

Em um primeiro momento a Janessa franziu o cenho, mas em seguida decidiu tentar relaxar. Folheando displicentemente a revista à sua frente, ela perguntou: "Senhor Wang, hoje é você quem veio me trazer o relatório? Agradeço pelo esforço."

O tom de sarcasmo em sua voz denunciava o desprezo que sentia.

O Rayan seria capaz de fazer qualquer coisa para aborrecê-la.

Ele era cruel e implacável. Tinha até pedido para o secretário do seu falecido pai que lhe entregasse o jornal.

Janessa deu um suspiro e se manteve impassível por alguns segundos.

O secretário ficou perplexo com a reação da jovem. Encarando-a sem dizer uma palavra, ele lhe entregou a pasta. "Senhorita Qiu, o senhor Qiu preparou pessoalmente este documento para você. Por favor, dê uma olhada e se estiver de acordo, assine onde está indicado."

A Janessa sentiu uma certa aspereza quando ele se dirigiu a ela naquele tratamento de "senhorita Qiu".

Então ergueu o olhar para ele, perplexa. Abrindo um sorriso, ela pegou o documento e comentou: "Me lembro de que alguns dias atrás você me chamava de 'chefe'. Por que está me chamando de 'senhorita Qiu' agora?", perguntou.

Ela enfatizou as palavras de propósito para irritá-lo e a expressão de sarcasmo em seu rosto era explícita.

Aparentando calma, o secretário a encarou e explicou: "A diretoria tomou uma decisão alguns dias atrás. Você não trabalha mais na nossa empresa. Neste envelope, estão a remuneração anual e o bônus da companhia."

Ele foi interrompido por um som seco.

A Janessa tinha rasgado o documento ao meio e agora o picava em pedaços. Colocando de volta na pasta, ela a devolveu para o homem.

Endireitando as costas, ela o encarou com um ar desafiador e disse: "Retorne e diga ao Aydin que ele não tem o direito de me despedir da minha própria empresa. Sou eu quem deve assinar a folha de pagamento dele, não o contrário."

A firmeza de sua postura e a aura de autoridade que emanava dela forçaram o secretário a suprimir qualquer objeção.

Mas ele não pôde resistir a dar-lhe um lembrete pouco antes de partir.

"Senhorita Qiu, a empresa já não é mais a mesma de antes. Será melhor você considerar isso com a devida atenção."

Ele deixou o local, levando o documento rasgado consigo.

Pressionando os dedos nas têmporas, a Janessa se recostou na cabeceira da cama. Agora podia ouvir vagamente o som de saltos altos se aproximando. Então olhou para a porta com um ar impaciente.

Chegou a pensar que fosse uma das enfermeiras que vinham regularmente, mas acabou descobrindo que era a Gracie.

Sentindo as têmporas latejarem violentamente contra as pontas dos dedos, ela riu por dentro. Em seus olhos havia uma expressão ao mesmo tempo desolada e zombeteira.

"É maravilhoso estar em um lugar como este. Todo tipo de gente vem me visitar. Gracie, por que você não entra na fila junto com aquele cretino e espera pela sua vez?", ela perguntou.

Em vez de revidar a ira que a Janessa descarregava, ela apenas se sentou em silêncio na beira da cama e a encarou com uma expressão de indiferença. Então abriu a caixa com a comida que havia preparado. Ao oferecer-lhe a refeição, ela parecia gentil e generosa.

"Eu soube que você teve uma hemorragia grave por causa do aborto e vim te visitar."

A Janessa não sabia dizer se ela havia dito aquilo para provocá-la ou não. Parecia que estava distorcendo a realidade a seu favor.

Este pensamento a deixou tão furiosa que ela começou a rir de nervoso, e riu com tanta vontade até formar lágrimas em seus olhos. Então lançou um olhar gélido para a mulher.

A médica, por sua vez, a encarava como se nada estivesse acontecendo. Em um tom cheio de ironia, a Janessa afirmou: "Naquela noite em que desmaiei, foi você quem me socorreu e contou para o Rayan da minha gravidez. Não me lembro de você ter verificado o meu pulso quando aconteceu, mas com certeza deve ter feito isso e deduzido que eu estava grávida."

Baixando a voz, ela se inclinou para olhar a Gracie mais de perto.

"Tem uma sala especial na mansão cheia de equipamentos médicos. Duvido que você também não tenha descoberto que se tratava de uma gravidez ectópica. Você tem mesmo certeza de que é uma médica formada no exterior? Não parece ter aprendido muito sobre a sua profissão, você parece melhor inventando histórias."

Os olhos da Gracie tremeram levemente quando ela ouviu aquelas palavras.

Seu primeiro instinto foi franzir a testa e refutar os insultos que a Janessa lançava sobre a sua profissão.

Quando se deu conta do tom zombeteiro no rosto da convalescente, foi invadida por uma raiva intensa, mas a conteve.

A Janessa que estava na frente dela agora não tinha nada a ver com a pessoa que ela conhecia. Seu olhar era penetrante e persuasivo e ninguém conseguia se esquivar de suas defesas.

Ao que tudo indicava, não seria tão simples assim para eles lidarem com ela, como costumava ser.

A expressão incomum no rosto da Gracie fez com que as suspeitas da Janessa se confirmassem. E com a descoberta o seu coração ficou devastado.

Ela desviou o olhar da mulher. "Infelizmente o bebê não pôde ser salvo, mas eu sobrevivi. Enquanto eu existir, você nunca vai poder ficar legalmente com ele."

Agarrando uma revista que estava próxima, ela a atirou no chão. "Pegue sua sopa patética e saia daqui. O cheiro do seu perfume misturado com líquido amniótico me dá náuseas", ela disse esboçando um leve sorriso, mas por dentro a estava xingando.

A expressão da médica ficou desfigurada e o seu olhar estava repleto de crueldade.

Destampando a tigela de sopa, ela a entregou para a Janessa. "Se você não se sente bem, significa que tem algo errado com o seu corpo. Deveria tomar um pouco de sopa. Eu empreguei muito tempo e dinheiro para comprar os ingredientes aqui no hospital. E preparei a sopa especialmente para você."

Que tipo de ingredientes ela teria conseguido naquele hospital? Que história era aquela?

A Janessa estremeceu e sem poder resistir à tentação, olhou para a tigela de sopa.

A sopa era nojenta, tinha aspecto de água suja e podia-se distinguir o cheiro de sangue.

Ela já tinha ouvido falar que algumas pessoas ignorantes compravam placentas clandestinamente em hospitais para fazer sopa, mas jamais poderia esperar que a Gracie, uma médica estudada, fosse fazer algo assim.

A mulher segurou a sopa nas mãos estendendo-a para ela. Mordendo o lábio, a Janessa aceitou a tigela e imediatamente despejou o seu conteúdo na cabeça da outra.