Capítulo 6 Bastardo ganancioso

Janessa caminhou até eles com uma expressão de desprezo e encarou o rosto calculista e sofisticado do seu tio Aydin.

"Antes mesmo de eu receber as cinzas da minha mãe, você já havia me dado a notícia de sua morte, e o funeral foi preparado sem que me pedissem ajuda ou opinião. Eu não tenho palavras para expressar a minha sincera gratidão."

Ela pronunciou entredentes palavra por palavra e abriu um sorriso desdenhoso para o tio.

Era evidente para todos os presentes a ironia que havia em suas palavras, mas ninguém se atreveu a comentar nada.

A expressão do Aydin foi mudando gradualmente, refletindo o seu desagrado. Mas ele escolheu permanecer em silêncio.

"Entre os mais velhos, o meu pai é o único que pode ajudar com esses arranjos, Janessa. A propósito, de nada, sempre ao seu dispor."

Sua prima, que estava apoiada ao braço da mãe, se aproximou dela com um sorriso, embora seu olhar desviasse eventualmente para o Rayan com um resquício de timidez.

Apesar de encará-la em silêncio, os pensamentos da Janessa estavam repletos de sarcasmo.

Que família mais inescrupulosa.

Felizmente, eles não causaram nenhum problema depois que o funeral começou.

Mas a verdade era que o ar de fingida tristeza que emanava deles, era tão nauseante para ela que se sentia a ponto de vomitar.

Quando estava saindo para o cemitério com a urna da mãe, sua tia a deteve.

"Seu tio precisa conversar com você", ela disse e apesar do tom suave, suas mãos estavam crispadas e havia expectativa em seu semblante.

Sua vontade era recusar a solicitação, porque já estava de saída, mas por fim decidiu regressar e ouvir o que o Aydin tinha para lhe dizer. Então acompanhou a mulher, levando em suas mãos a urna com as cinzas.

O Rayan seguia logo atrás delas, mas foi impedido de passar pela porta por um dos seguranças.

"Senhor Lu, este assunto só diz respeito à família Qiu. Eles não querem você aqui."

Ele não tinha consciência de que havia passado dos limites, mesmo tendo usado um tom respeitoso.

Com um ar de desprezo, ele respondeu: "Eu sou o marido da Janessa, qualquer assunto familiar dela é assunto meu também. Quem você pensa que é para me dizer se sou requisitado ou não?"

Seu tom de voz denotava superioridade e, olhando friamente para o homem, ele abriu a porta e entrou.

O interior possuía poucos móveis, e o senhor Aydin estava sentado à cabeceira de uma mesa. Com a urna em seus braços, a Janessa o seguiu e se sentou à sua direita, ainda que tentasse aparentar tranquilidade, por dentro sentia uma ponta de inferioridade em relação ao seu tio.

A expressão dele havia mudado quase que imperceptivelmente quando viu que o marido dela estava entrando, mas ainda assim permaneceu sereno. "Nós só vamos discutir um pequeno detalhe familiar. Por que o senhor Lu está aqui?", ele questionou antes de sorver um gole de seu chá.

Sentado ao lado de sua esposa, Rayan aparentava uma calma displicência. "Não era a minha intenção ter vindo, mas como minha reunião foi cancelada, eu resolvi vir escutar o que tem a dizer. Pode ser até que o negócio dos Qiu tenha decaído significativamente, mas seu desenvolvimento futuro ainda me interessa."

As últimas palavras dele atingiram a Janessa em cheio, ela pensou que se ele não tinha ido até ali para zombar dela, para que mais poderia ter sido.

Só mesmo o Rayan era para ser tão insensível em um momento tão doloroso.

Pensando sobre isso, ela agarrou a urna com mais força, a ponto de os nódulos de seus dedos ficarem esbranquiçados. Mas procurou se recompor, respirando profundamente.

Seu marido a observou por um instante e desviou o olhar para outro lado.

Ainda que estivesse bastante descontente com a presença indesejada do Rayan, o velho tio decidiu não se incomodar e foi direto ao ponto, após repousar a sua xícara de chá.

"Janessa, você sabe que a sua mãe estava no comando da empresa desde o falecimento do seu pai. No entanto, o desempenho da empresa decaiu muito durante a administração dela, e quando foi internada só piorou. Não fosse pela minha intervenção em socorro, o estrago teria sido enorme. Além disso, há um número grande de funcionários dependendo da empresa, e venho trabalhando incessantemente para apoiar cada um deles."

A jovem sentiu um nó no estômago, porque sabia perfeitamente que o tio havia se dado ao trabalho de encenar aquele pequeno monólogo diante dela, quando na verdade, tudo que queria fazer era se apropriar indevidamente dos bens da família. Aquele homem era um hipócrita. Será que esperava que ela dissesse o quanto ele era gentil e generoso? Esperava gratidão por parte dela?

Depois da morte do seu pai, ele havia tentado forçar a Fannie a desistir da empresa, agora que ela havia falecido, estava tentando fazer o mesmo com a sua herdeira.

Janessa arqueou as sobrancelhas e disse, com um sorriso de escárnio: "Foi muita generosidade sua se empenhar tanto, tio. Mas vamos direto ao que interessa, aonde você quer chegar? Não sou tão esperta quanto você, então não estou entendendo as entrelinhas."

O olhar dela era tão penetrante que parecia ser capaz de enxergar através da alma das pessoas. E naquele momento, um sorriso inexpressivo tomou conta do seu rosto.

Dirigindo o olhar para o Rayan, o velho falou em voz baixa: "Mas você ainda é jovem e imatura em muitos aspectos. Então o conselho administrativo se reuniu e nomeou você temporariamente como administradora geral, quando chegar o momento certo, você volta para o cargo de CEO."

"Conselho administrativo? Houve uma reunião? Quando foi?", ela perguntou. Nesse momento sua voz adquiriu um tom mais agudo e desdenhoso. "A minha mãe era a maior acionista da empresa e estava internada há vários meses. A menos que o conselho administrativo tenha se reunido com ela em seu quarto de hospital, eu não vou ceder a nenhuma das suas decisões, porque elas não tem peso para me rebaixar. Você está passando dos limites, Aydin!", ela disse.

"Janessa! Como você se atreve a falar assim com os mais velhos?", sua tia a repreendeu subitamente, com o rosto vermelho de indignação.

Longe de se intimidar, a jovem agarrou a urna e a colocou diante deles com uma expressão zombeteira em seu rosto.

O gesto repentino deixou os presentes nervosos.

Então ela girou a urna de forma que a foto da Fannie ficasse de frente para o olhar do Aydin.

"As cinzas da minha mãe ainda nem assentaram e você já está louco para tirar a empresa de mim, tanto que recorreu a uma suposta diretoria para me calar. Para mim, pouco importa se vocês se reuniram e tomaram uma decisão. Se a minha mãe não estava presente, não tem valor algum. Agora trate de me pedir desculpas diante dela!", ela exigiu sem hesitar.

Rayan tinha uma expressão séria naquele momento, e observava profundamente a sua esposa.

Aydin se sentiu constrangido e enfurecido ao ver que suas verdadeiras intenções estavam sendo expostas, então ele sacou um acordo e o colocou sobre a mesa.

"Leia com atenção! Aqui está a decisão claramente escrita e tem a impressão digital da Fannie. Querendo ou não, você tem que renunciar ao cargo!", ele gritou.

Ele estava tão furioso que gotas de saliva saíram de sua boca para serem borrifadas no rosto de sua sobrinha.

Ela apertou os punhos, seus dentes estavam cerrados e então o agarrou pela gravata e gritou: "Qualquer um poderia ter carimbado a impressão digital dela nesse pedaço de papel miserável. Isso não prova necessariamente que tenha concordado com a decisão idiota do conselho. E a sua mãe não te ensinou a falar sem cuspir na cara das pessoas?", ela disse furiosa.

Um estampido silenciou completamente a sala.

Janessa o encarou com os olhos injetados de ódio e levou a mão ao rosto, no local onde o tio tinha acabado de estapeá-la.

"Você... é uma insolente...", ele disse.

Enfurecido demais para continuar falando, o Aydin apontava o dedo para o rosto perplexo de sua sobrinha.