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Valéria retirou a mão da dele com delicadeza, mas sem frieza. Apenas o necessário para restaurar a distância que ambos fingiam controlar.
- E por onde você deseja começar? - perguntou, com a voz serena, mas atenta.
Nicholas respirou fundo, como quem organiza os próprios pensamentos.
- Preciso conhecer o ambiente em que Arturo trabalhava... a boate. Ver quem frequenta, quem trabalha lá. Me parece o único caminho.
Ela assentiu, olhando-o com uma pontinha de admiração discreta. Nicholas era intenso, mas não era impulsivo sem propósito. Havia método no luto.
- E também... preciso conhecer Michelle. - Ele hesitou. - Ela não sabe que Arturo tinha um irmão.
Valéria ergueu uma sobrancelha, surpresa.
- E por quê?
- Ele nunca contou. Não sei se por proteção... ou por vergonha de mim.
O silêncio entre os dois foi cortado apenas pelo som distante do vapor da máquina de café.
- Eu vou esta noite - disse Nicholas, se erguendo levemente na cadeira. - Vai ser minha primeira visita à Névoa desde que tudo aconteceu.
Ele a olhou, com um sorriso provocador.
- Quer ir comigo dançar?
Valéria soltou um riso breve, quase sem mostrar os dentes.
- Não posso. Tenho que fazer o jantar pro meu filho. E como não estou de plantão hoje... quero aproveitar.
- Pena - disse ele, com ar sarcástico. - Vou perder um bom jantar, então.
Ela cruzou os braços, desconfiada, mas com os olhos levemente divertidos.
- Você é sempre assim, Nicholas?
- Assim como?
- Meio charmoso... meio inconveniente?
Ele riu. E então, não aguentou:
- Você é casada?
Valéria desviou o olhar, pousando a xícara na mesa.
- Não. Já faz sete meses. Não deu muito certo.
Nicholas sorriu. Mas não foi um sorriso qualquer. Foi aquele sorriso que diz "então talvez eu tenha chances".
- Podemos dançar outro dia, quem sabe?
Ela o encarou, sem responder. Deixou o silêncio dizer tudo - ou quase tudo.
- Vou te passar meu número. Assim... vamos nos informando sobre o caso.
Ele pegou o celular do bolso, entregou a ela. Valéria digitou rápido, depois devolveu.
- Nicholas... você tem que tomar cuidado. Às vezes o caminho da verdade é o mais perigoso.
- É por isso que você continua no caso? - ele perguntou.
- Sim. Mesmo com medo. Mesmo com tudo que pode acontecer.
Ela parou por um segundo. A voz saiu mais baixa.
- Quero um mundo melhor. Por mim. Mas, principalmente, pelo meu filho.
Nicholas se calou. Aquilo o pegou de surpresa. Ele não sabia. E isso mudava as coisas.
- Quantos anos?
- Dez.
- Uau - ele disse, com um tom sincero. - Eu também quero um mundo melhor... pra gente como ele. Pra gente como Arturo.
Valéria sorriu, dessa vez sem ironia.
- Então... boa sorte na boate.
- E você... bom jantar.
Ele se levantou. Ela ficou observando por um momento. Algo nele a intrigava. E algo nela já começava a ceder.
Quando ele saiu, o cheiro de café ainda pairava no ar. Mas havia outra coisa ali também.
Uma espécie de promessa silenciosa.