Capítulo 3 Primeiros passos na Névoa

Valéria retirou a mão da dele com delicadeza, mas sem frieza. Apenas o necessário para restaurar a distância que ambos fingiam controlar.

- E por onde você deseja começar? - perguntou, com a voz serena, mas atenta.

Nicholas respirou fundo, como quem organiza os próprios pensamentos.

- Preciso conhecer o ambiente em que Arturo trabalhava... a boate. Ver quem frequenta, quem trabalha lá. Me parece o único caminho.

Ela assentiu, olhando-o com uma pontinha de admiração discreta. Nicholas era intenso, mas não era impulsivo sem propósito. Havia método no luto.

- E também... preciso conhecer Michelle. - Ele hesitou. - Ela não sabe que Arturo tinha um irmão.

Valéria ergueu uma sobrancelha, surpresa.

- E por quê?

- Ele nunca contou. Não sei se por proteção... ou por vergonha de mim.

O silêncio entre os dois foi cortado apenas pelo som distante do vapor da máquina de café.

- Eu vou esta noite - disse Nicholas, se erguendo levemente na cadeira. - Vai ser minha primeira visita à Névoa desde que tudo aconteceu.

Ele a olhou, com um sorriso provocador.

- Quer ir comigo dançar?

Valéria soltou um riso breve, quase sem mostrar os dentes.

- Não posso. Tenho que fazer o jantar pro meu filho. E como não estou de plantão hoje... quero aproveitar.

- Pena - disse ele, com ar sarcástico. - Vou perder um bom jantar, então.

Ela cruzou os braços, desconfiada, mas com os olhos levemente divertidos.

- Você é sempre assim, Nicholas?

- Assim como?

- Meio charmoso... meio inconveniente?

Ele riu. E então, não aguentou:

- Você é casada?

Valéria desviou o olhar, pousando a xícara na mesa.

- Não. Já faz sete meses. Não deu muito certo.

Nicholas sorriu. Mas não foi um sorriso qualquer. Foi aquele sorriso que diz "então talvez eu tenha chances".

- Podemos dançar outro dia, quem sabe?

Ela o encarou, sem responder. Deixou o silêncio dizer tudo - ou quase tudo.

- Vou te passar meu número. Assim... vamos nos informando sobre o caso.

Ele pegou o celular do bolso, entregou a ela. Valéria digitou rápido, depois devolveu.

- Nicholas... você tem que tomar cuidado. Às vezes o caminho da verdade é o mais perigoso.

- É por isso que você continua no caso? - ele perguntou.

- Sim. Mesmo com medo. Mesmo com tudo que pode acontecer.

Ela parou por um segundo. A voz saiu mais baixa.

- Quero um mundo melhor. Por mim. Mas, principalmente, pelo meu filho.

Nicholas se calou. Aquilo o pegou de surpresa. Ele não sabia. E isso mudava as coisas.

- Quantos anos?

- Dez.

- Uau - ele disse, com um tom sincero. - Eu também quero um mundo melhor... pra gente como ele. Pra gente como Arturo.

Valéria sorriu, dessa vez sem ironia.

- Então... boa sorte na boate.

- E você... bom jantar.

Ele se levantou. Ela ficou observando por um momento. Algo nele a intrigava. E algo nela já começava a ceder.

Quando ele saiu, o cheiro de café ainda pairava no ar. Mas havia outra coisa ali também.

Uma espécie de promessa silenciosa.

            
            

COPYRIGHT(©) 2022