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Hope Narrando
Meus saltos tocavam o chão como se cada passo ecoasse por todo o salão.
O vestido se movia com leveza, a saia longa balançando conforme eu avançava. As luzes refletiam no cetim, fazendo a cor mudar sutilmente conforme eu me aproximava do centro. As alças finas deixavam meus ombros expostos, e a faixa de veludo na cintura marcava minhas curvas. Era elegante, sensual sem ser vulgar. Eu sabia que chamaria atenção.
Mas não esperava que fosse tanto assim.
O salão, antes cheio de vozes e risadas abafadas, foi se calando pouco a pouco. Senti os olhares. O peso deles. De aliados, de mafiosos, de pretendentes. Me observei por dentro, a filha da empregada, agora na ala da família Collins, apresentada como mulher.
Meu coração batia forte, mas meu queixo se mantinha erguido. Eu não podia demonstrar insegurança.
Então eu vi ele, Fred.
Parado perto da mesa de bebidas, copo na mão, olhar fixo em mim. Intenso. Escuro. Cortante. Era como se os olhos dele queimassem minha pele, despindo todas as minhas defesas.
Ele era o único ali que não fingia. Não sorria, não disfarçava. Me olhava como se me quisesse, como se me odiasse por estar ali no centro da atenção e como se não fosse deixar barato.
Quando começou a se aproximar, meu estômago virou. Alto, imponente, com aquele ar de perigo que todo mundo evitava. Eu só conseguia respirar porque meus pulmões sabiam que era ele.
Fred parou diante de mim e estendeu a mão.
- Dança comigo.
A voz dele era baixa, rouca, com aquela firmeza que não aceitava "não" como resposta. Meu corpo reagiu antes da minha mente. Minha mão foi até a dele, e quando ele a segurou, foi como se algo dentro de mim tivesse se acendido.
Fomos pro centro. As pessoas abriam espaço, olhando com surpresa, ou inveja.
A mão dele pousou na minha cintura e me puxou um pouco mais pra perto. Senti o calor do corpo dele, o cheiro do perfume amadeirado misturado ao uísque.
- Você está linda - ele disse no meu ouvido, e a voz dele arrepiou até a alma. - E não é pra aceitar mais ninguém essa noite.
Virei o rosto pra encará-lo.
- Como é?
- Esse baile - ele murmurou, girando comigo num compasso suave - além de te apresentar oficialmente, é pra escolher um pretendente.
Senti o chão girar mais rápido que a dança.
- Eu não quero nenhum pretendente, Fred.
Ele sorriu, mas não era um sorriso gentil. Era possessivo. Escuro. Um aviso.
- E se o pretendente for eu?
Meu corpo inteiro congelou por dentro, e ferveu por fora. A pele arrepiou. A respiração escapou descompassada. Tentei responder, mas nenhuma palavra saiu. Só consegui encará-lo, os olhos dele presos nos meus, como se me desafiasse a negar.
Mas como negar o que meu corpo já gritava?
Ele percebeu. Claro que percebeu.
Se aproximou mais, a boca quase tocando meu ouvido.
- Eu senti.
Fechei os olhos por um segundo. A música continuava, as pessoas ao redor dançavam, mas pra mim só existia ele. A força das mãos dele me guiando, o calor do corpo dele me envolvendo, e aquele silêncio cheio de tensão entre uma respiração e outra, Não era medo. Era desejo.
Era o reconhecimento de algo que sempre esteve ali, mas que nenhum dos dois tinha coragem de encarar.
Até agora.
E naquele instante, dançando no meio de tantos olhos, eu soube de uma coisa: por mais que aquele baile tivesse sido planejado pra me entregar pra outro homem, quem me teria seria Fred.
Se eu quisesse ou não. Mas o mais louco? Eu queria.
O salão ainda estava cheio de vozes, luzes e olhares quando ouvi meu nome ser chamado. Era o meu padrinho, parado no alto da escadaria com sua postura sempre firme e olhar impenetrável. Com um discreto gesto de mão, me chamou para subir até ele. Obedeci, sentindo os olhos dos convidados me acompanharem.
- Atenção, senhores - a voz dele ecoou pelo salão, autoritária, mas sem precisar ser alta. - Esta é Hope, minha afilhada. A partir de hoje, ela é o meu braço direito na empresa da família Collins. E tudo que for direcionado a mim, passa primeiro por ela.
Senti meu coração saltar no peito. Aquilo era mais do que uma honra. Era uma posição de poder. De respeito. Uma mulher em meio a um império dominado por homens. Olhei ao redor e vi olhares surpresos, alguns até desconfiados. Mas ninguém ousou contestar.
Depois dos cumprimentos formais, meu Padrinho pediu que eu o acompanhasse até o escritório. No caminho, uma de suas seguranças informou que minha mãe também havia sido chamada. Meu coração se apertou. Algo me dizia que aquilo não era apenas sobre trabalho.
Entramos os três. O escritório era amplo, com estantes repletas de livros, whisky caro sobre o aparador, cortinas pesadas e móveis de mogno escuro. Ele se sentou atrás da mesa e nos indicou as poltronas à frente. Cruzei as pernas, tentando manter a postura firme.
- Hope - ele começou, olhando diretamente nos meus olhos. - Você cresceu. Já é uma mulher. Está na hora de pensarmos no seu futuro.
Assenti com respeito, mas permaneci em silêncio.
- Você já está em idade de casar - ele continuou. - E este baile também serve pra isso. Para escolher alguém à sua altura. Alguém que fortaleça nossos laços com outros aliados.
Senti um peso cair sobre meus ombros. Minha mãe olhou pra mim com ternura, mas não disse nada. O silêncio dela doía mais do que qualquer palavra.
- Padrinho - respirei fundo. - Com todo respeito, eu não quero me casar. Não assim. Não desse jeito. Eu quero escolher meu próprio caminho. Meu futuro.
Ele me observou com olhos cansados. Suspirou, como se soubesse que eu diria isso.
- Eu entendo, Hope. Mas não posso ignorar as tradições. Nem as exigências do Conselho. Por isso, vou ser justo com você. Vou te dar opções. Três pretendentes. Aliados de confiança. Você escolhe entre eles.
Fechei os olhos por um segundo, tentando conter a frustração que subia como fogo pela garganta.
- Isso não é escolher, padrinho. É limitar. Não é assim que eu imaginei meu futuro.
Ele se levantou, passou ao nosso lado e colocou a mão no meu ombro.
- Você é especial. E mulheres como você não têm o luxo da liberdade total. Mas ainda tem mais do que muitas outras tiveram. Faça a escolha certa.
Assenti, mas por dentro, me sentia encurralada. Meu nome, minha posição, meu vestido de princesa, nada disso importava se meu destino já estava selado.