Benício. Claro. Era sempre sobre o Benício. Minha cabeça se ergueu, uma onda de adrenalina afastando minha vergonha. "O que tem o Benício? O que ele fez agora?"
Dimitri zombou, um som sem humor. "Seu irmão, Sra. Coutinho, conseguiu agredir Léo novamente. Desta vez, ele o ameaçou com uma arma."
Minha mente girou. "Não! Isso não é possível! Benício não faria-"
"Ele faria", Dimitri me cortou, sua voz fria. "E ele fez. Parece que seu 'bom garoto' tem um temperamento e tanto. Talvez se você não estivesse tão ocupada entretendo homens ricos, você pudesse supervisioná-lo adequadamente."
As palavras foram um golpe direto, mirado com precisão cirúrgica no meu ponto mais vulnerável. Minha boca ficou seca. "Como você ousa? Você não tem ideia do que eu passei, do que eu fiz por ele." Minha voz se elevou, rachando de indignação. "Ele é apenas um garoto, e está com raiva. Você acha que eu não tentei guiá-lo? Protegê-lo?"
Os olhos de Dimitri se estreitaram. "Proteção, Sra. Coutinho, não desculpa comportamento criminoso. Seu irmão ameaçou o primo do meu cliente. E ele se recusa a pedir desculpas. Você não me deixa outra escolha a não ser pressionar pela pena máxima."
Uma dor oca se espalhou pelo meu peito. "Pena má-máxima?" Minha voz tremeu. "Você... você não pode estar falando sério. Ele é menor de idade."
"As leis se aplicam a menores também, Sra. Coutinho", disse Dimitri, seu rosto uma máscara de pedra. "Especialmente quando há reincidência." Ele se virou para sair, sua silhueta nítida contra as luzes bruxuleantes da rua.
"Dimitri, espere!" gritei, o desespero arranhando minha garganta. Minha voz estava rouca, mal audível. "Você... você já confiou em mim? Pelo menos uma vez?"
Ele parou, de costas para mim. "Eu confio em evidências, Juliana. Sempre confiei. É o meu trabalho."
Ele não se virou. Apenas se afastou, desaparecendo na escuridão, me deixando sozinha sob o brilho forte do poste de luz. A humilhação, as feridas frescas das palavras cruéis de Benício, o peso da morte dos meus pais - tudo convergiu, ameaçando me afogar.
Caminhei para casa em transe, as luzes da cidade borrando através das minhas lágrimas não derramadas. Meu apartamento, pequeno e escassamente mobiliado, parecia frio e vazio. Benício não estava lá. Ele ainda estava fora, sabe Deus onde, provavelmente remoendo sua raiva.
Desabei no sofá gasto, a exaustão se infiltrando em meus ossos. Meus dedos encontraram meu celular e digitei uma mensagem rápida para Benício. Onde você está? Por favor, volte para casa. Precisamos conversar.
Horas depois, a porta rangeu. Benício entrou furtivamente, seus olhos escuros e desafiadores.
"Onde você esteve?" perguntei, minha voz tensa de preocupação. "Dimitri disse que você ameaçou Léo de novo. O que aconteceu?"
Ele deu de ombros, largando a mochila com um baque. "Nada. Só dei uma lição naquele dedo-duro."
"Uma lição?" gritei, pulando de pé. "Benício, eles estão falando da FEBEM! Você não pode continuar fazendo isso!"
"O que você se importa?" ele retrucou, sua voz carregada de veneno. "Você está muito ocupada bancando a vítima, como sempre. Você acha que eu não vejo? Você só quer parecer bem, sendo a 'irmã mais velha responsável' enquanto eu apodreço em alguma prisão maldita!"
"Como você pode dizer isso?" perguntei, minha voz rachando. "Eu sou sua irmã! Sou tudo que você tem! Mamãe e papai... eles me fizeram prometer cuidar de você!"
Seu rosto se contorceu em um escárnio. "Mamãe e papai? Você acha que eu esqueci? Eles morreram por sua causa! Você gritou com eles, os deixou nervosos, e então eles bateram o carro! É tudo culpa sua, Juliana! Eu te odeio!"
As palavras, cruas e sem filtro, me perfuraram, abrindo velhas feridas. Minha respiração ficou presa na garganta. Ele me culpava. Ele realmente me culpava.
Benício, como um animal ferido, olhou para mim uma última vez, depois bateu a porta do seu quarto. O som ecoou pelo pequeno apartamento, deixando apenas o silêncio em seu rastro.
Afundei de volta no sofá, meu coração uma bagunça crua e sangrenta. Ele me odiava. Ele me culpava por tudo. A morte dos meus pais, nossa dívida, nossas vidas quebradas. Ele estava certo? Era tudo culpa minha? O pensamento se torceu em minhas entranhas, um veneno amargo.
Lágrimas escorreram pelo meu rosto, silenciosas e intermináveis. O único som no apartamento era minha própria respiração irregular, lentamente se transformando em soluços de desespero.
Acordei com a luz do sol entrando pela janela, meus olhos inchados e doloridos. A porta de Benício estava entreaberta, seu quarto vazio. Ele tinha sumido. De novo. Meu celular vibrou. Era Karen. Camarote VIP 5. Esta noite. Esta é sua última chance, Juliana. Não me decepcione.
Senti um pavor frio me invadir. Esta noite. Outra humilhação, outro pedaço da minha alma arrancado. Mas eu não tinha escolha. Benício estava lá fora, volátil e imprudente. Eu precisava daquele dinheiro mais do que nunca.
Mais tarde naquela tarde, enquanto me preparava para o meu turno, ouvi uma voz familiar da TV na sala de estar comunitária. Era Cláudia. Seu rosto, impecavelmente maquiado, brilhava na tela, irradiando uma aura de falsa sinceridade.
"Tem sido uma longa jornada de cura", disse ela, sua voz suave, quase angelical. "Depois do trauma que sofri na universidade, e agora com o trágico acidente do meu querido primo Léo... sou muito grata pelo amor e apoio do meu noivo, Dimitri. Ele é minha rocha, meu tudo."
"Oh, ela não é tão corajosa?" uma das outras garotas arrulhou. "Depois de tudo que a Juliana Coutinho a fez passar, e agora isso com o primo dela. Ela realmente é um anjo."
"E o Dimitri, que partidão!" outra interveio. "Ele é tão leal, tão protetor. Imagine ter um homem assim ao seu lado."
Meu sangue ferveu. Corajosa? Anjo? Ela era uma fraude, uma manipuladora mestre. "Corajosa?" zombei, incapaz de me conter. "Ela é uma mentirosa! Uma farsa! Ela construiu toda a sua carreira em acusações falsas!"
As garotas me encararam, depois para a TV, e de volta para mim, seus rostos uma mistura de choque e pena.
"Você realmente acredita nisso, Juliana?" uma delas perguntou, sua voz tingida de ceticismo. "Depois de todas as evidências, depois do que aconteceu na Mackenzie? Foi você quem foi expulsa, lembra?"
Virei-me, meu maxilar tenso. Qual era o sentido? Ninguém nunca acreditaria em mim. Não quando Cláudia tinha tecido uma narrativa tão perfeita de vitimização inocente.
A campainha tocou, sinalizando minha rotação. Camarote VIP 5. Meu coração martelava contra minhas costelas. Empurrei a porta pesada, carregando minha bandeja de champanhe caro.
E lá estava ele. Sentado na cabeceira da mesa, comandando a sala com sua presença. Dimitri Andrade.