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Eu estava verdadeiramente de férias e era bom demais!
Mal podia acreditar nisso, dormir até tarde sem me preocupar com o despertador era maravilhoso. Ainda assim, acordei às oito da manhã para aproveitar bem o tempo. Eu estava eufórica, queria organizar tudo para levar Luan ao dentista naquela semana e poder ficar com os compromissos em dia. Preparei o chocolate quente do meu irmão e fui acordá-lo para começar a organizar a casa. Depois teria que sacar dinheiro para pagar algumas contas atrasadas. No início da tarde eu já estava com quase tudo pronto e também razoavelmente cansada. Desde que meu pai morreu na fábrica em que trabalhava e o caso foi abafado, eu não tinha mais o luxo de tirar um tempo para mim. Fiquei com a responsabilidade de cuidar do Luan, tranquei a faculdade e comecei a trabalhar na livraria mesmo com o coração destroçado pela injustiça.
Afinal, não havia nada que eu pudesse fazer.
Os advogados que consegui na defensoria pública foram destruídos pelo culpado disso tudo e meus esforços, no fim, se resumiram a nada. Não gostava de lembrar, era uma parte dolorosa do meu passado que eu preferia esquecer se pudesse. Não costumava falar sobre isso com ninguém, somente Vanda sabia o que aconteceu. Eu nem compreendi o porquê daquela recordação, até que notei uma fotografia minha com o meu pai entre os livros na estante. Eu tirava o pó, quando me deparei com aquela foto. O que engatilhou várias lembranças ruins que eu tentava a todo custo não permitir que viessem à mente.
Segurei a fotografia com a mão trêmula e não notei quanto Luan surgiu sorrateiramente na sala.
- Não chora, mana - pediu, eu nem percebi que já estava no chão me debulhando em lágrimas. - Um dia vamos conseguir justiça.
Eu já disse que às vezes Luan não parecia uma criança, certo? Forcei um sorriso e comecei a me recompor para não preocupá-lo.
- Vamos fazer pipoca e passar um tempo juntos - comentei, bagunçando seu cabelo cacheado.
- Credo, também não precisa ficar grudenta, né? - respondeu rindo, enquanto envolvia minha cintura.
Tombei a cabeça na sua, percebendo que meu irmão estava crescendo muito rápido e eu não conseguia acompanhar direito de tanto que trabalhava. Eu desejava do fundo do meu coração que pudéssemos ter uma vida mais confortável algum dia.
◆◆◆
Eu estava sentada no sofá, toda largada, com um coque desarrumado e uma camiseta do Popeye, quando alguém buzinou em frente ao portão. Luan deu um pulo e espiou pela janela.
- É o carro do Vini!
- Ah, não... - corri escada acima, pensando em me arrumar um pouco.
Enquanto Luan tomou a sabia decisão de ir atendê-lo.
Joguei água no rosto, ajeitei os cabelos e estava trocando de roupa até ouvir passos e o timbre grave do Vinícius.
- Não é melhor eu esperar lá embaixo?
- Minha irmã correu porque 'tava com vergonha. - Luan riu. - Mas acho melhor você ver como ela é dentro de casa, assim já vai se acostumando... Porque vocês vão namorar, né?
Foi a vez do Vinícius rir.
Esse moleque me paga, mas o que será que Vinícius vai dizer? Caminhei até a porta...
- Sua irmã e eu somos apenas amigos - garantiu outra vez em um tom de voz divertido.
Droga, o que eu esperava? Botei a camiseta que eu vestia anteriormente e saí do quarto. Que se dane o Vinícius e esse seu charme irritante. Se ele quer ser só meu amigo, então é isso o que seremos um para o outro.
- Oi - falei com toda a indiferença que me cabia. - Não te esperava aqui hoje.
- Fiquei com saudades - coçou a nuca daquele jeitinho maroto que eu adorava.
- Quem é que sente tanta saudade de uma amiga? - provoquei, insinuando o que ouvi.
- Eu? - respondeu em tom de indagação.
Acabei desarmando as ferraduras.
Vinícius não tinha culpa da minha queda por ele. Fui descendo as escadas e me joguei novamente no sofá.
- Estamos assistindo Liga da Justiça Jovem - informei, dando play na TV.
Vinícius assentiu, sentando ao meu lado.
- Gostei da camisa - brincou, apontando para mim.
Revirei os olhos.
- É o que tem pra hoje - resmunguei dando de ombros.
Eu me sentia completamente à vontade perto dele e isso me assustava bastante. Voltei meus olhos para o Vinícius e soltei um suspiro baixo. Ele cortou o cabelo, mantendo a parte da frente maior, jogado de lado e bem baixinho na nuca. Quando eu me virei, Vinícius pegou meus pés e colocou sobre o seu colo, iniciando uma massagem muito gostosa sem que eu pedisse. Eu poderia me ajeitar no sofá, só que sentir suas mãos em alguma parte do meu corpo era tentação demais. Confesso desejar que fosse em outros lugares, mas infelizmente não se pode ter tudo.
Vinícius me olhou e sorriu, enquanto eu agradecia internamente por estar com os pés apresentáveis. O esmalte branco realçava meu tom de pele e a depilação das minhas pernas estava em dia, amém.
- Você está tensa - falou baixinho para não atrapalhar a concentração do Luan, ele adorava o Super boy e a cena era dele.
- Eu sou tensa, acostume-se - rebati, procurando não demonstrar minhas emoções conturbadas.
- Vem cá - chamou com o indicador.
Meu coração deu um pulo, mas eu obedeci. Vinícius me ajudou a girar o corpo e eu fiquei de costas para ele. Então Vinícius afastou delicadamente meu cabelo e começou a massagear meus ombros de um jeito que me fazia sentir coisas na barriga. Suas mãos eram grandes e firmes, tanto que não pude evitar imaginar ele me tocando em outros lugares e... Droga!
A companhia tocou de novo.
Por que era tão difícil conseguir tirar uma casquinha dele? Sempre tinha algo para atrapalhar. Levantei com raiva e fui atender, era a Vanda e as crianças. No meio do caminho até o portão, senti uma fisgada na cabeça e fechei os olhos ignorando a dor.
- Espero não estar atrapalhando. - Vanda me deu um abraço e em seguida as crianças fizeram o mesmo.
- Que isso, estamos assistindo TV - informei, abrindo um sorriso educado.
Apesar da agonia no meu cérebro.
Ao voltarmos, disfarçadamente eu fui até o armário do banheiro e tirei um analgésico de lá. Olhei para a sala onde Vanda conversava animada com Vinícius e as crianças assistiam TV. Constatando que esta noite eu não teria a remota possibilidade de tentar fazer Vinícius me olhar como mulher e não como uma simples amiga.
Ainda tinha aquela dor irritante na cabeça... Praguejando internamente, eu fui me juntar a eles.
◆◆◆
O restante da semana passou rápido, agora mesmo eu me arrumava para o meu jantar com Vinícius. Ele queria que fosse enquanto eu estivesse de férias, não iria recusar. Apesar de tentar a todo momento ratificar para mim mesma que era apenas amizade ou coleguismo o que existia entre nós. Era impossível ignorar os meus batimentos levemente alterados quando ele estava por perto. Não que fizesse diferença, eu jamais daria vazão a qualquer sentimento que pudesse existir. Até porque Vinícius sempre dizia que éramos apenas amigos. Então eu não ficaria iludida pensando em coisas sem sentido. Pelo menos eu tentava acreditar que não, talvez assim me convencesse de alguma forma.
Vanda surgiu na porta e ficou me espiando, enquanto eu tirava várias peças de roupa do armário sem saber qual vestir.
Muito arrumada? Muito casual? O que eu deveria vestir?
- Que tal o vestido verde e a sandália prata? - perguntou, aproximando-se calmamente. - Está calor e realça a cor da sua pele.
Refleti por alguns segundos e assenti.
- Verdade, é simples e elegante - concordei animada e comecei a me trocar.
Vanda ficou observando com a expressão longe, mas eu não tinha tempo suficiente para analisar melhor o que aquele olhar significava. Vinícius em breve passaria para me buscar e eu queria estar apresentável. Diferentemente dos dias em que ele me via na livraria de tênis e calça jeans. Não que isso importasse no geral, eu dizia a mim mesma que não era um encontro amoroso e sim um jantar entre amigos. Quando eu já estava pronta e devidamente maquiada, Luan surgiu na porta.
- Caraca, você tá bonita! - exclamou, como se visse um fantasma. - Nem parece minha irmã.
- Se isso foi um elogio, obrigada. - Tentei ignorar o quão distorcida foi sua tentativa de me elogiar.
- Não fica mal acostumada - respondeu, descendo às escadas.
Vanda riu e eu a acompanhei.
- Vou levar o Luan para o cinema junto com a Deby e o Jean - contou, enquanto eu dava os toques finais no meu cabelo. - Se divirta, você está linda.
- Obrigada por tudo, Vanda - agradeci, pegando sua mão. - Você é um anjo na minha vida.
- Que nada, gatinha - desconversou, mas notei seus olhos brilhantes. - Agarre aquele gato, você precisa namorar!
Soltei suas mãos rapidamente e fiz uma careta.
- Somos só amigos - repeti, apesar da incerteza em meu tom de voz.
- Sei. - Ela deu dois tapinhas em meu braço e foi em direção à porta do quarto, pois a campainha tocou.
- Atende pra mim e diz que estou quase pronta, por favor - pedi, me apavorando.
- Calma, vai dar tudo certo. - Vanda encorajou, abri um sorriso de gratidão e finalizei meu cabelo.
Quando desci, Vinícius jogava videogame com o Luan.
- Você não vai sair? - perguntei ao meu irmão.
- Chamei o Vini pra jogar uma partida comigo antes de te levar pra sair - respondeu, apertando todos os botões do controle.
- Oi, Mari. - Vinícius me cumprimentou sorridente. - Não pude negar uma partida ao Luan.
- Tudo bem, imaginei que algo assim fosse acontecer - respondi, esperando que ele notasse minha produção.
Vinícius limpou a garganta, olhando disfarçadamente para mim.
- Você está linda - elogiou, como se ecoasse meus pensamentos.
- Obrigada - agradeci sem jeito.
- Luan, acho que preciso ir - acrescentou, se desculpando. - Marcamos outro dia, beleza?
Luan assentiu, pausando o jogo.
- Beleza! - Meu irmão demonstrava estar empolgado com o novo jogador que encontrou.
Acabei rindo.
Vanda surgiu da cozinha para se despedir e Luan se conformou com a promessa de uma nova partida de videogame, então logo estávamos no carro. Eu procurava não demonstrar meu nervosismo, porque parte de mim tinha expectativas de algo que eu nem sabia descrever. Enquanto a parte sensata seguia acreditando que éramos apenas amigos e que seria mais seguro continuarmos assim.
- O que vamos jantar? - perguntei, me arrependendo depois por parecer esfomeada demais.
Em minha defesa, ele me chamou para jantar. Nada mais justo saber o que seria.
- Risoto de camarão - informou, parecendo inseguro. - Espero que goste, não sou muito talentoso na cozinha.
- Parece promissor - respondi para animá-lo.
Vinícius riu.
- Você não foi muito convincente, mas pretendo te surpreender - afirmou, olhando rapidamente para mim.
Meu coração acelerou de leve e eu não soube identificar se foi graças ao duplo sentido da frase.
- Vamos ver - devolvi, olhando pela janela para esconder meu nervosismo.
Vinícius colocou uma playlist com músicas do The Killers - observador, deve ter percebido que eu adorava a banda - e seguimos conversando sobre a livraria.
- Curtindo suas férias? - perguntou, manobrando o carro para a direita.
- Com certeza - confirmei, lembrando que faltava algum tempo para eu voltar ao trabalho. - Ainda não acredito nisso. Depois que você veio trabalhar na livraria, coisas estranhas estão acontecendo.
- Impressão sua - desconversou, dando seta.
Um motoqueiro surgiu do nada e quase entrou na frente do carro.
- Caramba! - exclamei assustada.
Vinícius contornou com maestria e o motoqueiro ainda deu o dedo do meio para nós.
- Está errado e ainda quer ser mal educado - esbravejou, dando um tapa fraco no volante.
- É a primeira vez que te vejo levemente irritado com alguma coisa - apontei curiosa.
- Eu geralmente sou calmo, mas não quer dizer que não existam coisas que me tirem do sério - revelou, mantendo ainda mais atenção na direção.
- Legal saber disso, antes eu pensava que você era perfeito - escapou espontaneamente e dessa vez não me arrependi de ter confessado aquele pensamento em voz alta.
- Eu não sou um perfeito, estou longe disso - contestou, dando seta novamente para entrar na rua da casa dele.
Na vez que estive ali não cheguei a bisbilhotar muito, portanto estava curiosa para conhecer a casa no geral. Vinícius desligou o carro e me encarou de lado, com uma expressão apreensiva no rosto. Seus olhos verdes estavam ligeiramente maiores, evidenciando os cílios longos.
- Isso é uma ofensa, seus cílios são perfeitos e você é homem! - exclamei irritada.
Ele riu, balançando levemente a cabeça. O que acabou diminuindo o clima estranho que se formou por qualquer motivo que eu desconhecia.
- Escuta, se eu te contar algo importante sobre mim. Que até então escondi por motivos que não me convém dizer. Você ficaria chateada? - perguntou repentinamente.
- O que seria? - devolvi curiosa.
- Eu sou rico - contou, extremamente sério.
Cai na gargalhada.
- Você é rico? - desdenhei, saindo do carro.
- Para de contar piadas e me mostra logo sua casa, estou curiosa e com fome.
Ele me acompanhou sem dizer mais nada, me guiando para dentro de casa. Era simples e bem organizada, até demais para um homem que aparentemente morava sozinho. A sala e a cozinha eram interligadas, com um balcão marrom dividindo o espaço e dando uma espécie de aconchego ao ambiente.
- É o que você esperava? - indagou apreensivo. - Você não chegou a ver direito quando esteve aqui.
- É sim, sua casa é ótima e bem arrumada - opinei, olhando ao redor quando ele acendeu a luz da cozinha. - Nem parece que você é homem e mora sozinho.
- Que frase mais preconceituosa - respondeu, torcendo o nariz. - Homem não pode ser limpo e organizado?
- Pode e deve - afirmei rindo. - Acho que sua casa é exatamente o que eu esperava.
- Fico feliz em saber - observou, chegando perto de mim. Ele abriu uma gaveta do armário e tirou um avental escuro de lá. - Já adiantei algumas coisas, você quer algo pra beber? Tenho vinho, se quiser.
- Adoraria - respondi empolgada.
Vinho era tão promissor!
Sentei em um dos bancos altos da cozinha e fiquei observando Vinícius curiosamente.
- Espero que goste, eu mesmo escolhi - respondeu, indo até a geladeira.
Vinícius tirou uma garrafa de vinho, colocando em duas taças. Em seguida me ofereceu uma, que eu imediatamente provei. Era suave e não muito doce, gostei do sabor. Contudo, o que admirava ainda mais era suas costas largas e os músculos se movendo por baixo da camiseta, além da forma como Vinícius se portava. Tão elegante e altivo, parecia alguém que não deveria estar ali. Como se estivesse deslocado naquela cozinha organizada, ao mesmo tempo simples. Então recapitulei o que ele disse sobre ser rico e uma pulga surgiu atrás da minha orelha.
- O vinho é muito bom - informei, analisando suas expressões e seu jeito com mais afinco. - O que quis dizer sobre ser rico? - Ousei perguntar, ainda que pensasse ser uma piada.
- Esquece isso, era brincadeira - desconversou, parecendo incomodado.
Notei sua mandíbula enrijecer, assim como a postura.
- Hm - murmurei, girando a taça de vinho. - Você bem que poderia ser rico mesmo, tem alguma coisa diferente em você - apontei, refletindo sobre o assunto.
Vinícius sorveu um gole de vinho também e me encarou. Seus olhos verdes escrutinaram meu rosto por alguns segundos e ele ficou muito sério.
- Existe algum manual de como ser rico e eu não sabia? - brincou, acabei rindo.
- Acho que são mais com pequenas atitudes e a forma como cada um se porta - afirmei, lembrando das pessoas para quem já trabalhei. - Não sei dizer ao certo, mas você tem um quê de sofisticação que eu nunca vi em outros homens.
Ele sorriu.
- Posso levar como um elogio? - questionou, enquanto focava em organizar alguns ingredientes.
- Acho que pode. - Dei de ombros, rindo. - Quer ajuda com algo? Posso tentar.
- Você é minha convidada, pode deixar que eu dou conta - devolveu, agindo um pouco mais relaxado e seguro de si.
Em questão de uns trinta minutos Vinícius pareceu finalizar o processo e fomos organizar a mesa de jantar. Enquanto isso eu tentava não deixar aquela noite subir para a minha cabeça. Éramos apenas amigos e continuaria sendo assim, eu não queria me envolver emocionalmente com ninguém que trabalhasse comigo. Entretanto, ficava cada vez mais difícil ignorar o nó que se formava na minha garganta sempre que Vinícius me tocava de alguma forma sem querer. Ou quando eu sentia seu cheiro.
Hoje ele vestia uma camiseta polo azul, calça jeans e All Star branco. Estava, como sempre, elegante e casual.
- Você está linda. - Tornou a me elogiar, olhando bem dentro dos meus olhos.
- Obrigada - agradeci constrangida. - Você também não está nada mal - argumentei para quebrar o gelo.
Vinícius riu.
- Obrigado, espero realmente que minhas habilidades culinárias deem para o gasto - observou, coçando a nuca. - Ou vou processar o YouTube.
Foi minha vez de rir.
- O que vale é o esforço. - Admirei meu prato e constatei que realmente estava com fome.
Eu não faria do tipo que não come na frente do cara bonitão. Me poupe, ele me chamou para jantar, nada mais justo do que aproveitar a comida. E estava realmente divina, principalmente levando em conta a companhia. Vinícius era divertido e leve, conversar com ele não pesava. Mesmo os momentos de hiatus entre nós não parecia forçado. Estávamos simplesmente apreciando a companhia um do outro, como se fossemos de fato amigos de longa data. Ele preencheu novamente minha taça com vinho e eu tomei, entre risos, garfadas e brincadeiras. Nem percebi que minha cabeça ficava cada vez mais leve e eu desinibida.
- Deveria ser um crime ser tão bonito assim! - exclamei em dado momento, já completamente satisfeita com a comida.
Minha atenção agora era toda do Vinícius.
Ele gargalhou e até o som de sua risada era sexy e afrodisíaca.
- Posso dizer o mesmo de você - afirmou, olhando dentro dos meus olhos.
- O que isso quer dizer? - perguntei, piscando algumas vezes para me orientar.
- Acho que eu devo parar de falar sob o efeito do vinho - informou, levantando subitamente. - Quer sobremesa? Eu tive que encomendar, porque doce não é meu forte.
- Você vai mudar de assunto? - retruquei, levantando meio cambaleante da cadeira.
Vinícius me amparou pela cintura, quando tombei para frente.
- Cuidado - sussurrou próximo dos meus lábios. - Acho melhor você não tomar mais vinho e eu também - completou, ainda segurando minha cintura.
Quando ele me apertou um pouco mais, senti uma vontade louca de beijar a boca do Vinícius, só para provar o gosto e ver se era tão bom quanto eu imaginava quando estava sóbria.
- Fique quieto - ordenei, aproximando meus lábios dos dele. - Se não quer me dizer o que sua frase significa, terei que descobrir sozinha.
- Significa que eu me sinto totalmente atraído por você - declarou. Seus olhos passearam pelo meu rosto, parando na minha boca. - Não tem mistério nenhum.
- Eu quero te beijar - respondi baixinho, seu hálito se chocava contra o meu causando um arrepio na minha espinha.
- Melhor não, Mariane. - Vinícius me afastou educadamente.
- Por que não? - perguntei desesperada. - Não quero que seja assim, com você bêbada e sem saber toda a verdade sobre mim - informou, minha cabeça girava e eu tinha dificuldade de assimilar suas palavras.
Contudo, algo estava totalmente claro mesmo no meu estado.
Fui rejeitada!
- Acho melhor eu ir pra casa - afirmei, passando a mão nos cabelos para tentar disfarçar meu constrangimento e a dor da rejeição.
- Desculpe, eu quero é só que... - O cortei imediatamente.
- Não precisa se explicar.
- Eu quero - revidou prontamente. - Só preciso te explicar muitas coisas, mas nesse estado acho que não vai adiantar. Podemos nos encontrar amanhã? Prometo que vai entender tudo! - exclamou, tentando se aproximar de mim.
- Amanhã a Vanda vai sair e eu vou ficar com o Luan. - Menti, não queria vê-lo.
- Tudo bem, pode ser outro dia. Quando você estiver livre. Mas é um assunto urgente - propôs ansioso.
- Certo, não precisa se preocupar. Você bebeu e acho melhor eu pedir um Uber. - Ele assentiu, ainda que parecesse contrariado.
- Queria que ficasse um pouco mais - devolveu, passando uma das mãos nos cabelos.
- O jantar foi maravilhoso. De qualquer forma, obrigada - agradeci, forçando um sorriso.
Abri o aplicativo do Uber e solicitei um que chegasse em cinco minutos. Aproveitando para ir ao banheiro nesse meio tempo e assim me poupar de ter que trocar mais palavras com Vinícius depois do fora que ele me deu. Infelizmente, Vinícius decidiu me acompanhar até em casa por não querer que eu voltasse sozinha levemente bêbada com um homem. Achei a atitude adorável, mas não daria o braço a torcer. Dessa forma segui em silêncio nos primeiros dez minutos, depois eu perdi o controle dos meus olhos e quando acordei já estava na porta de casa.
Eu dormi no ombro do Vinícius e ele me acordou assim que chegamos.
- Desculpe - murmurei sonolenta, fazia tempos que eu não bebia nada.
- Não tem problema, só quero que esteja segura - respondeu de um jeito carinhoso que me deu um quentinho no coração. - Você pode aguardar até que eu a deixe em casa? - perguntou ao motorista. - Não vou demorar.
- Claro. - Ouvimos em confirmação.
Vinícius me guiou até o meu portão em silêncio.
- Obrigada por ter vindo comigo - agradeci. - Boa noite.
- Mari, eu... - Vinícius se calou, mordendo o lábio.
- Sim? - incentivei, olhando em seus olhos.
- Não consigo mais resistir - respondeu, puxando meu corpo para perto do seu.
Senti as pernas tremerem quando Vinícius colou a boca na minha, iniciando um beijo afoito e desesperado. Seus lábios sobrepuseram os meus como se ele desejasse aquele beijo há muito tempo. Ele sugou meu lábio inferior com cuidado, enquanto suas mãos apertavam minha cintura de um jeito possessivo. Infelizmente, quando pensei em me entregar ao beijo, Vinícius se afastou abruptamente de mim.
- Desculpe, não sei o que me deu. - Àquelas não eram as palavras que eu gostaria de ouvir naquele momento.
Não após o Vinícius ter me beijado!
- Está arrependido? - questionei confusa.
- Não, eu só preciso pensar - respondeu, piorando ainda mais a situação. - Tenho que te contar algumas coisas e até lá pode não ser uma boa ideia nos envolvermos.
- Pense o tempo que quiser - revidei sarcasticamente.
Inventar uma desculpa para não querer continuar me beijando já era um pouco demais. Éramos adultos, o que poderia impedir que ficássemos juntos além de um dos dois não querer? Notei que Vinícius demorou alguns segundos para retornar ao carro e ir embora. Enquanto eu refletia no quanto aquele encontro foi um desastre sem limites.
Aliás, tudo o que eu não esperava era terminar a noite frustrada e sozinha na minha cama.