Teus Pedaços
img img Teus Pedaços img Capítulo 6 Crianças ricas
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Capítulo 11 Recomeço img
Capítulo 12 Complicações img
Capítulo 13 Drax img
Capítulo 14 Game day img
Capítulo 15 Apostas img
Capítulo 16 Win img
Capítulo 17 Instável img
Capítulo 18 Tiff img
Capítulo 19 Segredos img
Capítulo 20 Más decisões img
Capítulo 21 Expectativas img
Capítulo 22 Day after img
Capítulo 23 Hotel California img
Capítulo 24 Home img
Capítulo 25 Rome img
Capítulo 26 Covarde img
Capítulo 27 Mão esquerda img
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Capítulo 6 Crianças ricas

O caminho da casa (eu ainda não consigo chamar aquele espaço estranho de minha casa, com exceção do meu quarto, claro, que foi pensado para mim) até a escola foi fácil. Foi apenas eu e Santiago e tudo sempre acaba sendo simples quando somos só nós dois. A conversa flui facilmente e tudo que eu consigo pensar é que parece que a gente se conhece a anos.

Ainda lembro de quando o conheci. Obviamente eu já sabia que ele participaria do painel de tecnologia muito antes de sequer sair a programação, mas quando meu professor orientador me chamou e disse que tinha conseguido um encontro para nós dois, eu juro que quase desmaiei. Claro que encontro é uma expressão um pouco forte, o que aconteceu de verdade foi meu professor me dizendo 'Natasha, consegui que o garoto Mayfield de quem você passa o dia falando te receba por alguns minutos'.

Passei semanas ensaiando em frente ao espelho o que diria para ele, até fiz Tiff atuar como Santi nos meus devaneios, mas, ainda assim, quando me vi frente a ele no dia do evento eu travei. Juro, minha mente parecia mingau. Então, ele sorriu para mim e disse 'Você deve ser a Natasha. Nossa, sou seu fã, o aplicativo de auto adestramento que você criou é simplesmente brilhante. Eu nunca conseguiria pensar em algo assim'.

Sim, eu fiquei ainda mais chocada. Meu ídolo me conhecia, ou melhor, conhecia e admirava meu trabalho. Trabalho esse que desenvolvi totalmente pensando em chamar sua atenção. Mas então, antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, Lina já estava pendurada nada e jogando seu charme que funciona como droga. Depois disso, ele começou a aparecer lá em casa esporadicamente para encontros com Lina, mas ele sempre encontrava tempo para me cumprimentar e conversar comigo sobre meus sonhos e projetos. E foi quando eu percebi que, ignorando o fato dele me deixar nervosa por ser meu ídolo e tudo mais, tínhamos uma conversa fácil de uma forma como ele e Lina jamais teriam.

-Você já sabe o que vai fazer no ano que vem? – ele pergunta, quando estamos quase chegando.

-Vou adiar a Universidade por um ano e tentar um estágio.

-Por que?

-Por dois motivos: 1- Existem certas coisas que não aprendemos dentro da academia, sendo adquiridas apenas com a experiência prática. 2- Eu não tenho dinheiro para a universidade ao mesmo tempo que não sou elegível para bolsa, por causa dos pertences de minha mãe e tudo mais.

-Eu concordo com o primeiro ponto, mas o dois é besteira. Sua mãe com certeza vai te ajudar a pagar seus estudos.

Oh, pobre enganado.

-Minha mãe acha tudo isso perda de tempo.

-Claro que não, ela bancava os estudos de Lina.

Rolei os olhos. Catalina "estudava" moda. Não me entenda mal, não estou julgando sua escolha de curso, pelo contrário, considero as pessoas que se dispõe a estudar cursos ligados a arte incríveis, porque só os artistas sabem o trabalho que dá ser criativo e tentar se superar sempre. Eu mesma me considero uma artista e valorizo muito esse trabalho.

O problema é que Catalina apenas estava matriculada na Universidade. Ela mal ia para as aulas, reprovou em praticamente todos os componentes por não ter atingido o mínimo de presença exigida (só foi aprovada naqueles que a presença não era exigida).

-É diferente. Lina recebia dinheiro de seu pai. – conto uma meia verdade.

Meu histórico diz que reclamar de minha mãe e Lina sempre acaba voltando contra mim. As pessoas sempre acham que eu estou com ciúmes ou que quero chamar atenção. Então, é muito mais fácil dar o que eles querem.

-Sim, verdade, tinha esquecido que vocês não dividem o mesmo pai. De qualquer forma eu pagaria por sua educação.

-Não quero seu dinheiro. A menos que eu trabalhe por ele. – Solto a indireta, porque não sou boba nem nada.

-Você é minha amiga, de que vale tanto dinheiro se nem posso ajudar os amigos?

-Podemos falar de outra coisa? Tipo... o seu irmão? Onde é que ele dorme?

Eu acho que em outra vida eu fui jornalista, sério. Eu tenho uma necessidade enorme de saber das coisas e esse negócio do quarto tá realmente me incomodando.

-Pra que você quer saber onde meu irmão dorme?

-Quando você fala assim fica parecendo meio estranho.

-Foi uma pergunta estranha.

-Desculpe, é que eu estou curiosa, porque quando cheguei você me disse que só eu e minha mãe ocupamos o andar e que você e seu pai dividem o segundo andar. Tem algum andar escondido ou algo do tipo?

-Ele transformou o porão em seu quarto. – agora sim estava explicado. – E antes que você pergunte, não, você não pode ver como é. Sebastian odeia que entrem em seu espaço.

-Eu não ia pedir pra ver. – mentira, eu ia pedir sim. Os porões dos ricos costumam ser puro luxo. Pelo menos nos filmes.

-Apenas fique longe de Sebastian, Nat. Ele não é muito sociável e eu não quero que ele te magoe.

-Eu não sou de vidro. Eu sei me defender dele.

-Eu sei que você sabe se defender sozinha, mas Sebastian... olha, ele é complicado. Não complicado como um bug em um dos seus aplicativos que você passa a semana quebrando a cabeça para resolver o problema e quando resolve é como se tocasse o paraíso. Complicado do tipo que vai arrancar sua alma e destruir seu coração.

-Para ter o coração destruído é preciso ter um coração primeiramente. – falo.

-Engraçadinha. – e como sempre, Santi leva como uma brincadeira.

Esse é um dos motivos pelo qual eu nunca falo a verdade de minha mãe e Lina para Santi. Ele não acreditaria e romperia nossa amizade.

-E de qualquer forma, seu irmão não é meu tipo, então, uh, eu não estaria próxima a ele assim.

-E qual é seu tipo?

Fico sem graça.

-Não vou falar disso com você. E voltando ao assunto do seu irmão, ele não gosta de mim. E eu não fiz nada de propósito para irritá-lo.

-Sebastian não gosta do mundo, princesa. Ele apenas é como é. Chegamos. – ele fala parando na frente da escola.

-Me deseje boa sorte.

-Você não precisa de sorte. Você quer que eu te leve até lá dentro?

-Não. Seria meio estranho.

-Sim, seria. Se eles te derem um tempo difícil...

-Vou ficar bem. Você mesmo disse para não temer crianças ricas, lembra?

-Certo, confio que você vai ser incrível. Quer uma carona na volta?

-Não, eu me viro. Obrigada pela carona, Santi. – me despeço.

-Tenha um excelente dia, Nat.

Santiago não estava mentindo quando disse que o diretor estava ansioso para me ter no colégio. Vi seu olhos brilhando quando eu bati em sua porta e disse meu nome. Ele passou a citar todos os aplicativos que eu desenvolvi e contou como derrotamos o colégio dele várias e várias vezes em competições de iniciação tecnológica. Ele disse que sempre quis saber quem era o cérebro por trás das criações mas que minha antiga diretora protegia muito bem nossa equipe. Tentei dizer a ele que tudo foi um trabalho coletivo mas ele continuou me tratando como se eu fosse o Einstein da minha geração.

Completamente exagerado.

Ele mesmo me levou para um tour pelo colégio e eu realmente fiquei chocada com o quanto o laboratório era avançado, todos os equipamentos de primeira linha. Minha antiga escola até que tentava, mas não tínhamos um incentivo chamado papais ricos para nos bancar como existe aqui.

-Quero apenas falar novamente, senhorita Madison, o quanto estamos felizes com a sua adição a nossa equipe. – o homem falou pela milésima vez.

-O prazer é meu senhor. – minto, porque daria tudo para estar com minhas antigas companhias.

-Se precisar de algo não hesite em chamar.

-Claro, senhor.

-Vou deixar você e a equipe se conhecerem. – ele fala, acenando para que eu entre novamente no laboratório.

-Obrigada.

Respiro fundo três vezes para tomar coragem e entro no laboratório para conhecer a equipe.

-Você deve ser a superstar por quem nosso amado diretor tem salivado pelos corredores. – uma ruiva bonita, estilo a Barbie cientista, fala assim que eu entro. – Pensei que você fosse maior.

-Sinto muito decepcioná-la. – respondo.

-Não ligue pra ela, morena. Ela está assim porque pegou o namorado fazendo xixi na cama errada. – Um cara muito alto responde, ao lado dela.

-Ex-namorado. Me lembre novamente porque você deixou que eu sequer me aproximasse daquela praga?

-Eu? Eu avisei a você que seria a pior besteira que você faria na vida, mas você, como sempre, me ignorou e fez apenas o que você quis. Cega pela beleza física. Como pode ser tão inteligente para certas coisas e tão burra para outras. Eu sou Stefano, a propósito. É um prazer finalmente conhece-la, Natasha. Essa aqui é a Paola, geralmente ela é mais educada, mas seu recém tomado chifre está dificultando sua capacidade de raciocínio.

Sorrio, decidindo que já gosto desses dois.

-Todos aqui já sabem meu nome?

-Sim. Diretor Baker mandou uns 10 e-mails falando sobre você, seu acréscimo na equipe, seus feitos, como ele queria que você fosse bem tratada e blá, blá, blá. – Paola fala.

-Sinto muito por isso.

-Tudo bem, o cara tá desesperado. Nossos pais investiram milhões no laboratório e ele perdeu tudo para uma escola de orçamento inferior. Sem ofensas. –Stefano.

-Não ofendeu, só ajudou a provar que dinheiro não ganha sempre.

-Ai, então você morde? – Paola fala.

-Só quando atacada.

-Ótimo, então você pode andar com a gente. Estava com medo de você ser uma pomposa pelo que li nos e-mails de Baker, mas você é aceitável.

-Você nem precisa conhecer o restante da equipe. – Stefano fala – Somos os únicos aqui que valem a pena. Como mesmo que você veio parar aqui?

-A irmã dela deu o golpe do baú em Santi, lembra? – Paola fala antes que eu pudesse responder. – Desculpe, docinho, mas Bash não fez segredo sobre isso e você não é realmente a pessoa favorita da elite da Royal Elite.

-Eu não sou a minha irmã. – me defendo.

-Se tem uma pessoa que entende isso sou eu. Você está segura conosco. – ela fala.

-Se bem que, espero que não me leve a mal, mas posso ter que me manter um pouco afastado de você nos corredores. Tenho esperança de me livrar do bullying disfarçado de brincadeira agora que eles tem em você uma nova vítima. Nos ver juntos não vai ajudar em nada meu objetivo. – Stefano fala.

Esses dois são dolorosamente sinceros.

Eu gosto e não gosto disso ao mesmo tempo. Certas coisas são melhores dentro do que fora.

-Vou me lembrar disso.

Um alarme toca.

-Hora da aula. Qual é a sua turma?

-A turma B.

-É a mesma que a minha. –Stefano fala – Os professores tiveram que me separar da Paola depois de alguns eventos desagradáveis, então ela tá na outra turma. Eu te levaria até a sala, mas...

-Stefano, isso é uma idiotice.

-Não, tudo bem. Eu entendo seu ponto. Fico feliz em apenas te seguir a uma distância segura.

-Viu? Ela entende. Obrigada por isso, Natasha.

Paola rola os olhos e sai da sala, sendo seguida por Stefano.

Eu mantenho uma distância segura dos dois, me sentindo como um segredinho sujo, uma amante rejeitada.

É frustrante o quanto eu posso ser forte e não abaixar a cabeça para as outras pessoas ao mesmo tempo que eu aceito situações que não são saudáveis para mim. Acho que isso é resultado da minha criação ferrada.

Entro na sala e claro que Sebastian está lá, com mais três outros caras lindos de morrer como ele (será que eles tem uma boy band?) e uma loira (se Paola é a Barbie cientista, essa aqui é a Barbie na versão mais Barbie que existe). Assim que eu passo por eles, toda a sua atenção se volta para mim.

-Você deve ser Natasha. – a loira fala

-A própria.

-Um pouco decepcionante. Se sua irmã for como você Santi tem realmente padrões baixos.

Sério?

Ignorando-a procuro um lugar vago para sentar.

-Você não pertence aqui, não gostamos de caçadoras de ouro. Então poupe nosso tempo, peça transferência e volte para os da sua laia.

-Olha, fofa, isso era tudo que eu queria. Mas infelizmente a vida não acontece sempre da forma que queremos, então... paciência.

-Não estou brincando com você. – ela fala, me impedindo de passar, começando a me irritar.

-Ok, você já deu seu recado, eu já estou morrendo de medo, podemos seguir com nossas vidas?

-Você não perde por esperar, piranha.

-Beleza. – falo, dando a volta nela e sentando na frente.

De onde eu tirei tanta coragem?

Apenas me perguntei como Tiff agiria nessa situação e tenho certeza que a deixei orgulhosa. Mal posso esperar para chegar em casa e contar tudo para minha vadia má favorita.

-Você tem um desejo de morte irritando a Elise desse jeito. – Stefano sussurra de uma forma que evite que os outros percebam.

-Eu enfrento monstros piores na minha vida para me esconder de um projeto de Barbie. Não, obrigado.

-Gosto de você.

Não respondo que gosto dele também por que o negócio do corredor, ao que parece, me deixou um pouco chateada.

A professora entra e, graças a Deus, não faz eu me apresentar na frente da sala inteira (eu odeio essa parte, sério, por favor, vamos nos conhecer ao decorrer do ano letivo, ninguém quer saber qual o sonho de ninguém), ela apenas faz uma chamada e registra nossos rostos com nosso nome.

A professora gasta a aula apresentando o plano de estudo e eu, claramente, anoto tudo porque sou desse tipo de aluna. Fico feliz em saber que eles seguem um modelo pedagógico mais ou menos parecido com o da minha antiga escola, então eu não terei muita dificuldade em conseguir desenvolver um ritmo e acompanhar a turma. Em alguns momentos, acidentalmente, meus olhos encontram Sebastian e seu grupo e eu fico surpresa ao constatar que ele, assim como eu e diferente de seus possíveis amigos, parece atento e também toma notas.

Ele é uma incógnita para mim e eu preciso desvendar. Preciso saber que eu não estava louca na noite passada quando o vi. Mas por hora, decido esquecer o tema Sebastian e focar na aula.

Depois de finalizada a aula, decido ir procurar meu armário e guardar metade dos livros, para diminuir o peso da mochila, porém sem surpresa alguma percebo que tem algo escrito de vermelho naquele que deveria ser o meu armário.

"BEM-VINDA AO INFERNO, VADIA"

Sério mesmo?

Crianças ricas poderiam ser um pouco mais criativas, por favor? Eles são privilegiados, mal sabem o que é o inferno e mesmo que soubessem, eu já vivo nele nos últimos dezessete anos da minha vida ao ponto que ele praticamente já se tornou meu habitat natural.

Se vocês querem jogar, eu posso apertar o play.

Guardo meus livros no armário e tiro uma foto para Tiff.

Nat: Crianças ricas em: como aprender a ser imbecil com filmes da Disney.

Tiff: Deus, eu vou quebrar todos os dedos deles.

Nat: Oh, mama. Deixe que eu faço isso por nós duas.

            
            

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