Capítulo 7 MAR DE AMOR - ROSANA - PARTE 7

MAR DE AMOR – ROSANA – PARTE 7

Breno cairia no chão se estivesse em pé. Apenas abriu a boca e ficou olhando para os dois filhos.

- Ela já tinha avisado que viria, pai, disse Luciano.

- Eu não consigo me acostumar. Ela sempre fala com vocês por telefone... e é o certo a fazer, ela é mãe de vocês, mas... eu não quero me lembrar das besteiras que fiz depois que me casei com ela. E são só essas as lembranças que eu tenho quando raramente ela vem aqui. E isso já faz muito tempo...

Marcos coloca a mão no ombro do pai.

- A gente está aqui com você. Vai acabar logo. É só o tempo de uma operação de troca de canal...

Breno olhou para ele e soltou o ar pela boca.

- Essa uma das operações que eu detesto fazer, rapaz! Você ainda não aprendeu isso na faculdade?

- Já, claro que já, Marcos disse, rindo. – Mas você consegue.

Breno se levantou.

- Onde ela está?

- Deve estar na cozinha com a Thereza.

Luciano tocou o braço do pai.

- Pai!

- Que foi?

- Você vai me deixar ficar, não vai?

- Não sei, filho... Não sei de nada. Até a página dois... eu estou do lado dela...

- Mas, pai!

- Não me pressione, Luciano! Você não sabe como isso é complicado pra mim. Nós não temos uma casa pra morar, ainda, não sei se você percebeu! Eu estou morando de favor com seu tio que graças a Deus, tem quebrado várias toras de madeira pra nós! Mas eu não tenho nenhum orgulho disso! Você vai entender um dia. Não... me pressione. Eu vou lá fora encarar a fera.

- Ela está até calma, pai. Não vai ser muito complicado, diz Luciano.

- Não é complicado? Eu pedir pra ela se separar do namorado pra poder ter o filho de volta não é complicado? Você não sabe nada da vida mesmo, garoto.

Breno deu as costas e saiu do quarto. Ao chegar à sala, viu Mara conversando com Rosana, ambas vendo álbuns de fotos de família antigas.

- Nossa! Eu nunca vi essa foto do Marcos como formando do colégio! Ele já era um bonequinho! Meu menino já dizia que seria um rosto lindo de se ver na TV ou nas passarelas. Pena que ele nunca quis modelar...

- Concordo! – disse Mara. – Ele é um desperdício de talento. Cansei de brigar com ele por isso.

As duas riram. Rosana ergueu o rosto e viu Breno parado olhando para ela. Levantaram-se as duas.

- Boa tarde, Breno!

- Oi, Rosana. Tudo bem?

- Não sei... Está? – ela pergunta, olhando para o filho.

Thereza apareceu na sala vindo da cozinha e convocou:

- Olha, eu sei que vocês tem assuntos importantes pra conversar agora, mas eu quero só dizer que a mesa do almoço já está pronta e se vocês não forem almoçar agora, se forem deixar pra conversar primeiro, vão acabar jantando e eu não estou disposta a esquenta comida pra ninguém! Vamos almoçar primeiro?

- E o Toni? – Breno perguntou.

- Viajando, disse, Mara.

- Você não foi com ele?

- Acho que não, se estou aqui, não é, cunhado? – ela disse gozadora.

- Por que não?

- Hoje é domingo e eu quis descansar. Não era tão necessária com ele.

- Largou o maridinho um pouco, Marinha? – Marcos perguntou, sorrindo.

- De vez em quando eu dou uma colher de chá pra ele. Confio no meu gatinho.

- Você se importa se a gente almoçar primeiro, Rosana? – Breno perguntou à ex-mulher.

- Não, fui convidada pelo meu filhote e resolvi ficar, ela disse, acariciando o rosto de Marcos.

- Então vamos almoçar primeiro.

- Você ainda vai trabalhar hoje? – Rosana perguntou.

- Não sei... Acho que não. Eu tenho um paciente hoje ainda mais ele pode ser remarcado pra noite.

- Mas hoje é domingo. Você nunca descansa? – ela quis saber.

- Meu período de descanso ficou no passado. Agora eu tenho que recuperar o tempo perdido. Tenho que fazer alguma coisa pra sair dessa casa e sustentar meus filhos de maneira mais digna.

As últimas palavras dele saíram de sua boca de forma bem amarga. Rosana sentiu isso como uma bofetada em seu rosto. Breno foi o primeiro a ir para a cozinha. Todos o acompanharam. Thereza e Luciano ficaram por último e ela perguntou, baixinho:

- Menino, há males que vêm pra bem. Quem sabe você não consegue juntar seus pais de novo, hein?

- Não sonha, Theca. Não sonha...

Todos almoçaram mais ou menos em paz. Não falaram em momento nenhum sobre o problema que havia levado Rosana até ali. Elogiaram a comida de Thereza e findaram falando do álbum de fotos da família.

- Por que eu não tenho as fotos da sua formatura do colégio, Marcos? – Rosana perguntou. – Foi no Rio, não foi?

- Foi, mas pouco tempo depois vocês dois se separaram e o pai achou por bem trazer com ele pra cá. Ele não quis... deixar com você.

Ela olhou para Breno que estava com os olhos no prato.

- Posso levar algumas fotos pra mim, Breno?

Ele mastigou a comida, limpou a boca com o guardanapo e respondeu:

- Depois eu ou o Marcos mesmo pedimos pra empresa fazer umas cópias pra você. Você mesma pode fazer isso. Devia já ter feito, já que fica no Rio. Não vou dar as fotos pra você. Elas são recordação minha de uma conquista do meu filho.

- Eu sei disso. Mas aconteceu tanta coisa depois que... nem pensei mais nisso. Mas as fotos estão muito lindas. Ainda mais que eu fui sua madrinha de formatura. Queria uma foto sua comigo.

- Eu tenho outras depois daquelas, mãe. Tenho algumas de quando eu passei no vestibular de Odonto.

- Pode ser também, mas aquela é diferente. Nós dois estamos juntos...

- Você tem fotos com ele quando ele nasceu, quando ele fez a quinta série, de vários jeitos. Todos os álbuns de fotografia da infância deles ficaram com você. Você quer tirar mais o que de mim?

Rosana ficou sem saber o que dizer mediante o tom de voz dele.

- Calma, pai...

- Calma, nada! E vamos logo falar do que interessa. Quero acabar logo com isso!

Breno se levantou e foi para a sala, nervoso. Marcos olhou para a mãe que estava totalmente constrangida.

- Releva, mãe. Ele está nervoso. Eu tenho cópias daquelas fotos de você comigo. Pedi pra fazer cópias pra mim pra carregar na minha carteira. Também queria ter uma recordação sua... Eu te dou a minha.

- Não, filho, não precisa. Ele está certo. Eu entro em contato com a empresa que fez seu álbum e vejo se eles fazem uma cópia do álbum todo pra mim. Aí eu vou ter você, o Luciano, seus tios e a família inteira pra mim. Não se preocupe.

- Vamos começar logo com isso ou não!? – Breno gritou da sala.

Luciano, Rosana e Marcos se levantaram. Mara e Thereza continuaram sentadas e Mara disse baixinho:

- Boa sorte!

Os três se juntaram a ele na sala. Rosana sentou-se numa poltrona, Luciano junto do pai no sofá e Marcos ficou em pé perto da porta da cozinha.

- Não vai sentar, filho? – ela perguntou.

- Não, eu estou bem assim. Vou ficar aqui estrategicamente pra pegar água pra quem precisar.

- Ninguém vai precisar de nada, Marcos. O que a gente tem a discutir aqui é simples e vai demorar pouco. Começa com você, Luciano? Quer dizer por que você veio do Rio pra cá do jeito que veio? Afinal, o motivo dessa reunião é você.

- Eu?!

- Claro!

Luciano respirou fundo e começou:

- Eu já tinha avisado todo mundo lá. Falei com o Gilberto e com a minha mãe também, mas ninguém deu muita atenção...

- Não pensei que fosse tão sério, filho, pensei que fosse só... frescurinha de menino mimado.

- Pois é, mãe, o menino mimado não quer dividir a mamãezinha com outro menino! Acho que o mínimo que você podia ter feito era dar ouvidos ao seu único filho presente.

- Gilberto não é um menino, Luciano. Ele tem vinte e cinco anos e é um empresário conceituado no Rio de Janeiro.

- Vinte e cinco anos! O Marcos tem vinte e dois, caramba! Qual a diferença?

- Você está contra ele. Qualquer coisa que eu diga, qualquer coisa que eu fale pra defendê-lo vai soar errado pra você! Você se esqueceu de toda a força que ele te deu pra você começar a modelar e tudo que ele fez por você até agora.

- A força que ele me deu eu até agradeço, serei eternamente grato de coração, até ele se enfiar na sua cama!

- Isso não vem ao caso, Lu!

- Não vem ao caso?! Putz! O que será que vem ao caso aqui então? Eu posso levar na boa ver minha mãe dividir a cama dela com um gigolô.

- Você não pode falar assim comigo, Luciano!

- Não pode mesmo, Luciano, Breno disse. – Ela é sua mãe. Respeito é bom sempre. Sua mãe tem o direito de refazer a vida dela com quem bem entender.

Luciano olhou para o pai, abismado.

- Ah, é? Você está de acordo com isso?

- Eu não tenho que estar de acordo com nada, Luciano! Eu não estou de acordo com muita coisa que já aconteceu. Eu não estou de acordo com o fato de você ter abandonado a escola, não estou de acordo com o fato de você ter se tornado modelo fotográfico, não estou de acordo com o fato de você ter pintado o cabelo de loiro, mas você fez tudo isso a minha revelia, não fez?

Luciano ficou em silêncio.

- O fato de sua mãe namorar ou não um homem mais novo não vai mudar nada na sua situação agora. O que está em discussão aqui é o seu destino. O que você vai fazer com a sua vida que já bem fora do rumo.

Luciano se encostou no sofá e abaixou a bola por um instante. Breno ergueu-se e foi até a estante, apoiando-se nela por um momento e respirando fundo.

- Se... como o problema aqui é você, eu digo que tudo está dependendo de você. Se você der sua palavra de honra... você já tem dezoito anos e não é mais criança, pode dar sua palavra de homem, já... Eu espero ter feito dois filhos homens que têm palavra de honra...

Ele olhou para Marcos que continuou olhando para ele firme e depois para o filho mais novo que apenas esperou.

- Se você me assegurar que vai criar juízo, me obedecer sempre em tudo, arrumar um trabalho decente...

- Isso eu já tenho. Eu sou modelo e isso dá muita grana...

- Que seja, mesmo contra os meus princípios... Você se safou dessa porque seu irmão está do seu lado e vai ser seu empresário nessa loucura. Se não der certo, a culpa será mais dele do que sua.

Marcos ergueu as sobrancelhas e olhou para o irmão que sorriu para ele.

- Só que essa atividade dá muito tempo livre e esse seu tempo livre deve e será ocupado com alguma coisa útil.

- Como assim? – Luciano perguntou.

- No seu tempo livre, nada de noitadas, nem de namoradas, não quero saber de você gastando o que não tem, porque você não tem, como ninguém aqui tem sobrando. Nada de bebida, nem cigarro nem...

- O Marcos fuma!

- Ele compra o cigarro dele, que nem é tanto assim, Luciano!

- Eu posso fazer isso também com meu dinheiro!

- Não pode não! E você nem fuma, fuma?

- Não, mas posso começar!

- Não pode não!

- Mas pai!

- Enquanto você estiver morando comigo, não vai começar a ter vício nenhum! Vai começar a me ajudar juntar dinheiro pra gente dar uma entrada pequena num apartamento pra podermos sair da casa do seu tio e no tempo livre, vai ficar comigo no consultório me assistenciando.

- Eu não entendo nada de consultório de dentista!

- Não tem mistério. Atender telefone, preencher fichas, anotar recados. Tudo simples e fácil. Eu vou poder dispensar a Cleide que faz isso por mim três dias por semana.

- Você já vai fazer isso agora?

- Não sei. Depende do rumo que vai levar essa conversa. Não estamos aqui pra decidir isso?

- A gente... não podia discutir essa parte depois, pai?

- Sua mãe está aqui pra levar você, Luciano.

- Mas eu não quero ir...

- As condições são essas que eu acabei de falar, filho. Ou você aceita seguir minhas regras... ou vai embora e tudo fica como estava antes. Você continua dependendo da sua mãe no Rio de Janeiro e ela decide o que fazer da sua vida.

Luciano olhou para a mãe e depois para o irmão e finalmente para o pai de novo, indeciso.

- E se a mãe dormisse aqui essa noite pra eu poder... pensar nisso? É muita informação pra eu decidir de uma vez, vocês hão de concordar comigo.

Breno olhou para Rosana e ela para ele. Marcos sorriu sutilmente e percebeu que atrás daquela indecisão toda do irmão havia algum plano escondido. Resolveu ajudar:

- Acho... uma boa ideia... É muita decisão a ser tomada ao mesmo tempo. Uma mudança de vida não se decide assim de uma hora pra outra. Dorme aqui, mãe.

- Dormir aqui? – Rosana perguntou. – Vocês têm quarto de hóspedes?

Os três riram.

- Não, mas um de nós pode dormir na lavanderia, disse Breno, ainda rindo.

Riram mais ainda. Luciano levantou-se e deu a ideia.

- Falando sério, onde dormem cinco, dormem seis. A mãe pode dormir na minha cama com o Marcos no quarto dele e eu durmo com o pai na cama dele. É de casal...

- Ou vocês dois... podiam dormir juntos... na cama dele... Marcos jogou. – Como amigos... já estão acostumados...

Rosana e Breno se olharam e ela disse, timidamente.

- Não sei... Não sei se seria uma boa ideia. Nem sei se vou ficar mesmo pra dormir aqui.

- Fica... Breno disse.

Ela e os rapazes olharam para ele surpresos, cada um com seu motivo. Marcos, por seu oferecimento ter sido aceito tão facilmente pelo pai; Luciano por ter seu período de decisão mais estendido e Rosana por ver que o ex-marido não tinha se afastado dela tanto assim, ainda oferecendo espaço em sua cama, depois de cinco anos.

- Eu... vou ligar... pro Gilberto... Eu já tinha mais ou menos dito pra ele que talvez ficasse aqui, mas... vou avisar mais formalmente que volto pro hotel amanhã.

- Você acha que ele vai entender? – Breno perguntou.

- Ele tem que entender, adiantou-se Luciano. – Isso aqui é assunto de família, caramba! Uma família que já existia antes de ele nascer!

Um silêncio estranho caiu entre os quatro onde cada um pensou na conclusão de Luciano por seu ponto de vista também.

- Bom, mas diga filho: com que parte das reivindicações do seu pai você concordou, só pra adiantar o assunto.

- Na parte que você pode dormir aqui.

Marcos riu alto, mas colocou a mão sobre a boca reprimindo o riso, tossindo. Breno baixou os olhos e sorriu sutilmente também. Rosana colocou a mão no rosto do filho e sorriu.

- Você não está levando a sério nada do que a gente conversou, não é, Lu?

- Estou sim, mãe, ele disse, colocando a mão sobre a dela. – Eu só quero sentir mais um pouquinho que você e meu pai ainda têm uma chance de reatarem esse casamento que nunca devia ter acabado!

Rosana ficou séria e quase triste.

- Eu vou ficar... mas não fantasie algo que não vai acontecer, Luciano. Eu não vou dormir no quarto com seu pai. Se puder, durmo no quarto do Marcos... se ele deixar.

- Claro, mãe, ele concordou.

Breno passou a mão pelo rosto e disse:

- Bom, se você vai ficar, eu vou voltar ao consultório e ver se realmente vou ter esse meu paciente pra atender e volto mais tarde. Luciano, ajude a Thereza a arrumar aquele colchonete que está atrás do meu guarda-roupas pra você dormir no chão com sua mãe e o Marcos. Ou no meu quarto, você que sabe. Até mais tarde. Rosana, fique à vontade.

- Eu estou... Bom trabalho.

- A casa é pequena, mas... é nossa.

- Eu agradeço.

Breno passou por Marcos, bateu em seu braço e saiu.

- Ele está tão... mais maduro, ela disse.

- O pai mudou muito mãe, Luciano falou.

- E você também... concluiu Marcos.

Ela abriu os braços e pediu que os dois se aproximassem, abraçando os dois.

- Meus bebês...

Esse abraço duraria o dia inteiro se dependesse dela, mas como Luciano não tinha muita paciência, afastou-se da mãe e chamou:

- Theca, pode aparecer!

A empregada abriu a porta da cozinha e apareceu tímida.

- Chamou, menino?

- Chamei. Papai pediu pra você fazer uma coisa. Me ajuda?

- Que coisa?

- Larga de ser sonsa, mulher. Eu sei que você ouviu tudo. Ele me pediu...

- Pra tirar o colchonete de trás do guarda-roupa dele? – ela disse, indo rapidamente na direção do quarto de Breno. – Ele está facinho. Mas vou precisar de ajuda.

- Eu vou te ajudar.

O rapaz entrou no quarto do pai com ela e trataram os dois de providenciar o que Breno havia pedido.

Mara apareceu por ali também vindo da cozinha com uma jarra de suco verde nas mãos e encostou-se no batente.

- Você também estava bisbilhotando, tia? – Marcos perguntou, sentando-se no sofá.

- Eu?! Me respeita, menino! Eu até falei pra ela me ajudar no suco de frutas em vez de ficar ouvindo atrás da porta, mas... Querem um copo? Está uma delícia.

Rosana aproximou-se dela e perguntou:

- O que tem aí?

- Abacate, aveia, maçã, hortelã, leite e banana.

- Tem açúcar?

- Não, o Marcos mata a gente se adoçar com açúcar. O natureba da casa é ele.

Rosana foi até a cozinha pegar dois copos e serviu-se e ao filho com um copo grande do suco. Tomou e suspirou, lambendo os lábios.

- Hum... Que delícia! Receita sua, filhote?

- Não e sim. Não tem mistério nesse suco. Só misturar coisas que eu gosto muito e a magia acontece, ele disse, bebendo de seu copo. – Você não vai ligar pro Gilberto, mãe?

- Ele espera... ela disse, tomando mais um pouco do suco. – Vou usufruir dessa delícia primeiro. Mara, está divino!

Mara e Marcos sorriram um para o outro.

Rosana passou aquela tarde de domingo com os filhos, Mara e Thereza, e até se esqueceu de avisar Gilberto que iria dormir ali. Quando se lembrou já eram quase seis da tarde.

O telefone tocou e Marcos atendeu.

- Pronto?

- É da casa do Breno Bianchi? – perguntou uma voz masculina.

- Quem quer falar?

- Gilberto Leme, é da casa dele? Se for, minha mulher está aí. Posso falar com ela?

Marcos ficou em silêncio por um momento e disse:

- Oi, Gilberto.

- Quem está falando? É o Breno?

- Não, é o filho da Rosana, Marcos Bianchi. Tudo bem?

Gilberto silenciou do outro lado da linha, mas respondeu:

- Oi, Marcos. Pareceu a voz do Breno... Você cresceu, hein, cara!

- O que você manda?

- Sua mãe está aí?

- Está... Está com o Luciano, a minha tia e a Thereza, nossa amiga, no quarto...

- Eu posso falar com ela?... Queria... só saber se ela vai voltar logo. Já era pra gente ter voltado pro Rio e... ela não ligou pra dizer se já tinha resolvido... o problema...

- Você tem algo importante pra fazer lá?

- É, eu... vim pra fazer companhia pra ela, pensando que fosse coisa rápida... tenho trabalho lá que não pode esperar...

- Acho que ela vai dormir aqui com a gente, hoje. Se você quiser voltar pro Rio...

- Ela vai dormir aí?!

- Acho que sim, algum problema?

- Não... Só que... O que é que ficou resolvido? O Luciano não vem com a gente?

- Hoje não.

- Ele não gosta mesmo de mim, não? Seu irmão está fazendo essa guerra toda por minha causa, não é?

- A coisa é bem mais complicada do que você está colocando, cara. A "guerra" dele, como você diz, não é com você especificamente. É com...

- A minha idade... não é?

Marcos não respondeu.

- Eu não tenho culpa, Marcos, se me apaixonei pela sua mãe e sou tão mais jovem que ela. O amor não tem essas limitações de idade, cara, você deve entender isso.

Marcos pensou em sua situação em relação a Dione e respondeu:

- Eu entendo... Você nem imagina como eu entendo, Gilberto, mas... na cabeça do meu irmão, você não é só cinco ou oito anos mais novo que minha mãe. Você tem idade pra ser filho dela!

- Eu não tenho culpa disso, cara! E nosso relacionamento não começou ontem. A gente começou a se perceber há muito tempo... depois que ela se separou do seu pai! Não começamos isso de uma hora pra outra. Eu já gosto dela há muito tempo! Não me aproximei antes por respeito a vocês todos! Eu não sou tão imaturo assim!

- Você tinha vinte anos quando ela se separou do meu pai! Como pode dizer que isso começou naquele tempo?

- Sua mãe sempre foi uma mulher muito bonita e eu já admirava muito ela... há muito tempo.

- Admiração é uma coisa. Eu admiro muitas mulheres mais velhas do que eu, agora... a querer dividir uma cama com elas é bem, bem, bem diferente, não concorda?

- Olha, Marcos, não vou ficar discutindo isso com você por telefone. Eu queria estar aí com você pra participar dessa discussão e poder me defender, mas...

- Mas não está e não estava. Deixa o Luciano e meus pais conversarem mais um pouco. Tenha um pouco mais de paciência. Você entrou na nossa vida ontem. Pode esperar mais um pouco. Se você quiser, volta pro Rio sozinho, resolva seus problemas por lá e amanhã... minha mãe volta pra lá com ou sem o meu irmão e você conversam melhor.

- Eu não posso falar com ela?

Marcos ouviu os risos de todos conversando descontraídos no quarto e decidiu:

- Eu não quero ser chato, mas não vou tirar minha mãe do papo que ela está tendo com o Lu agora. Ele estava morrendo de saudade de momentos assim e eu acho judiação interromper a felicidade dele.

- O Luciano fugiu desses momentos de felicidade quando foi praí, Marcos! Ele sempre teve sua mãe todinha pra ele morando aqui.

- Até você chegar e se meter entre os dois e começar a dividir ela com ele.

Gilberto ficou em silêncio. Marcos não deixava de ter razão.

- Posso te perguntar uma coisa pessoal? – ele perguntou.

- Que é?

- Você pretende mesmo se casar com a minha mãe?

- Claro...

- E pretende ter filhos com ela se isso acontecer?

- Não sei... Acho que isso não está nos planos dela. Ela não pode mais ter filhos, que eu saiba. Nunca nem discutimos sobre isso. Por quê?

- Você não quer ter filhos? É jovem ainda.

Gilberto pensou por um momento e respondeu:

- Não sei... Acho que não.

- Acha? Então o casamento de vocês tem qualquer outro interesse, menos esse.

- E se for isso?

- Não, nada. Perguntei por perguntar.

- Bom, se eu não posso falar com a Rosana, diz ao menos pra ela que eu liguei e vou voltar pro Rio sem ela.

- Eu digo.

- Marcos...

- Oi.

- Como vai a carreira?

- Que carreira?

- Sua carreira de modelo?

- Eu não tenho carreira de modelo. Fiz só o comercial e foi isso.

- Não quer seguir em frente?

- Não, acho que não. Vou fazer um comercial de refrigerante na mesma agência do outro, mas é tudo só pela grana. Nunca pensei em fazer carreira nisso.

- Você está marcando bobeira. Com a sua cara, rapaz, eu ia ficar milionário. Com a sua genética, você ainda tem uns vinte anos de visual super explorável! Como modelo fotográfico, de passarela, além dos comerciais de TV e até mesmo pra trabalhar em novela da Globo! O Luciano tem esse talento também. Se ele for ficar aí, vai seguir carreira? Eu estava apostando demais nele e ainda aposto se ele voltar pra cá.

- Ele também quer e vai seguir a carreira dele... enquanto meu pai deixar. Ele quer muito... e eu vou ajudá-lo.

- Mas você nunca se viu tentado a isso? Você fotografa bem demais, rapaz!

- Não... Eu quero ser clínico dentista como meu pai.

- Isso só dá dinheiro em longo prazo.

- Pois é, mas quem é que cuida dos dentes branquinhos dos e das modelos fotográficos e de comerciais e de passarela e atores e atrizes de novelas da Globo...? Somos nós: dentistas.

- É... Gilberto respondeu, sem graça, vencido.

- Obrigado pelo incentivo que você deu ao meu irmão e agradeço por ele todo o apoio que você deu a ele. Ninguém vai esquecer aqui em casa.

- Marcos.

- Oi... Marcos respondeu, quase ficando impaciente.

- E a Dione Cardoso? Você ainda tem contato com ela?

Marcos ficou sem reação. Não esperava aquela pergunta dele.

- De vez em quando. Ela está bem. Foi bom você perguntar. Ela... está namorando com meu irmão.

- Com o Luciano? Não teria que ser com você? Ela fez o comercial com você!

- Ela tem quinze anos.

- E daí?

Marcos parou e sorriu, afastando-se do telefone. Sentou-se no sofá e respondeu, sem querer prolongar o assunto:

- Nada, não tem nada demais. Só não é comigo que ela está namorando. É com meu irmão.

- Jurava que rolaria alguma coisa entre vocês. Vocês combinavam demais, cara.

- Nem tudo é o que parece.

- Lamento por você. Ela é um pitel. Que coisinha bonitinha. Mas ela combina com o Luciano também. Está na família, não é? – disse Gilberto, rindo.

Marcos sentiu vontade de dizer um palavrão, mas conteve-se.

- Tchau, cara, foi bom falar com você. Fala pro seu irmão pra voltar pra casa. Eu ainda tenho planos pra ele. Tenho um desfile de sungas masculinas que vai acontecer em um mês. Se ele estiver aqui com certeza está elencado. Tenta convencer ele, ok?

- Vou fazer o possível.

- Tchau, Marcos. Diz pra sua mãe que eu deixei um beijo e espero ela no Rio amanhã.

- Tchau, Gilberto.

Gilberto desligou o telefone e Marcos ficou olhando para o aparelho e disse:

- Quer repetir... Não entendi direito o que você disse depois de "Oi, Marcos!".

Rosana apareceu na sala assustada e disse:

- Filho, eu tinha que ligar pro Gilberto! Me esqueci!

- Calma, mãe, ele acabou de ligar pra cá.

- Ele ligou? E por que você não me chamou?

- Ah, vocês estavam conversando lá no quarto e eu não quis atrapalhar vocês.

- Mas o que ele disse? Você falou para ele que eu vou dormir aqui?

- Falei.

- E o que ele disse? Bronqueou?

- Não, nem tanto, te deixou um beijo e levou até na boa. Foi bem... compreensivo. Disse que vai voltar pro Rio ainda hoje mesmo e te espera lá amanhã.

- Obrigada, filho... ela disse, aliviada.

Luciano veio até a sala e chamou:

- Vem, mãe! Vem, Marcos! O papo estava ficando interessante. Vem dizer pra mamãe como foi sua vinda pra cá, Macbeto. A Mara estava contanto a odisséia toda de vocês.

Luciano pegou a mão da mãe e a puxou de volta para o quarto para sentar novamente na cama ao lado de Mara.

- Espera um pouco só, Mara, vou no banheiro. Não continua antes de eu voltar.

No caminho para o banheiro, Luciano agarrou o braço de Marcos e o levou discretamente para o corredor.

- Quem era no telefone, Marcos?

- O Gilberto.

Ele fez uma careta e perguntou:

- O que ele queria?

- Falar com a mãe, o que mais?

- E o que você disse?

- Muita coisa, mas não vou repetir pra você, Luciano. Ele só está preocupado com o fato de você ficar aqui. Quer que você volte pro Rio com a mãe. Você é a mina de ouro dele, sabia?

- Mesmo? – Luciano disse, com cara de nojo. – Vai querendo. O que ele quer eu não tenho, graças a Deus!

- Mas a mamãe tem...

Luciano colocou a mão sobre a boca do irmão, impedindo-o de falar.

- Cala a boca, Beto! Isso que ele quer é do meu pai! E se Deus quiser, vai voltar pra ele ainda hoje!

Marcos riu.

- Você não está voando longe demais, não, meu irmão? Ter conseguido fazer com que ela ficasse não vai jogar nossa mãe de volta na cama do seo Breno, garoto! Milagres não acontecem todos os dias com essa facilidade.

- Eu cheguei do Rio outro dia e consegui trazer minha mãe pra perto do meu pai de novo, Macbeto. Tudo é possível!

- Luciano, você vai demorar muito! – Mara gritou de dentro do quarto. – Eu não tenho a noite toda!

- Vai lá, Marcos, eu já vou.

O rapaz bateu no ombro do irmão e entrou no banheiro. Marcos entrou no quarto e sentou na cama ao lado da mãe. Rosana segurou a mão do filho e disse:

- Mara disse que só tinha uma cama de casal quando vocês chegaram aqui. E três quartos: um do casal, um do futuro bebê deles e um quartinho de bagunça.

- Foi, ele continuou. – O quarto do bebê era esse aqui. A gente comprou uma cama de solteiro, pro pai e a do bebê, quando crescesse, ficou pra mim. Essa aqui. Ele bateu no colchão da cama.

- Seu pai dormia aqui com você, Rosana disse.

- É.

- O berço foi pro meu quarto, disse Mara. – O Toni ainda tem sonhos de que ele chegue algum dia...

- Você não parece estar animada com isso...

Mara fez uma careta e negou.

- Mas não conta pra ele... segredou ela. – Tentar faz parte. Nada é impossível.

- Tomando anticoncepcional é meio difícil, disse Marcos, rindo.

Mara colocou o indicador em riste sobre a boca, pedindo segredo. Os três riram.

- Há dois anos, o Toni e eu resolvemos comprar uma cama de casal maior e arrumamos nosso quartinho de bagunça e colocamos ela lá, pensando que o Breno pudesse ficar lá, pro Marcos ter mais privacidade e sossego pra estudar aqui. Mas o Breno não quis. Quis continuar dormindo com o Marcos. Mas depois que o Lu chegou...

- Se apossou da cama dele e empurrou o pai pro quartinho de bagunça e pra cama de casal.

- Ficou até bonitinho o quarto dele. Só tem um guarda-roupa e a cama. E o colchonete atrás do guarda-roupa pras visitas.

Luciano voltou do banheiro e ajoelhou-se na cama, abraçando a mãe e o irmão ao mesmo tempo.

- Você não quer dormir no colchonete com o pai, mãe?

- Você vai dormir nele, não é? Não foi o que foi combinado? Só não entendi por que você não dorme na cama de casal com seu pai.

- Porque a cama de casal... não é bem uma cama de casal. É mais uma cama de solteiro grande, explicou Mara. – Quando eu e o Toni nos casamos, a grana não estava sobrando muito e compramos uma cama grande só pra quebrar o galho. Depois descobrimos que existiam camas maiores.

- E eu não vou dormir com o velho numa cama de solteiro, certo? – Luciano perguntou.

- Mas cabem duas pessoas muito bem, disse Mara. – Nunca tivemos problemas, eu e o seu tio.

- Pra quem sabe o que fazer nela, não tem problema mesmo, ele brincou. – Não é com certeza o meu caso. Fico no colchonete mesmo. Mas se você ficasse lá, mãe... Eu posso dormir aqui mesmo com o Beto...

Rosana ponderou sobre aquela sugestão e depois de olhar para todos, respondeu:

- Não acho conveniente, filho...

- É super conveniente, mãe! Nem estou falando pra você dormir na cama com o velho. Fica no colchonete.

- Nem sei se o Breno quer isso, Luciano.

- Eu acho que ele quer, não quer, Marcos?

Marcos olhou para ele e respondeu quase que instintivamente:

- Não sei, Lu, não tenho bola de cristal! Não estou na cabeça do papai.

- Mas ele quer sim! Quem não ia querer uma gata dessas dormindo do seu lado?

Ele beijou o rosto da mãe e Rosana o beijou também.

- Lu... Você está pensando em tudo que seu pai falou durante a nossa conversa?

- Claro que estou!

- E está disposto a fazer o que ele propôs?

Luciano pensou e respondeu:

- Eu tenho que responder agora? Não é melhor deixar pra amanhã?

Rosana percebeu que o filho estava querendo protelar mais um pouco o fato de que ela ia dormir com eles. Se respondesse naquele momento, sua decisão estaria quase tomada e ele não queria isso. Queria prolongar aquele pedacinho de felicidade mais um pouco.

- Tudo bem, não precisa responder agora. Você disse que está namorando alguém aqui? É verdade?

- É...

Ele olhou para o irmão e percebeu que Marcos baixou a cabeça e mudou sua expressão.

- E quem é ela?

- O nome dela é Dione... É a modelo que fez o comercial com o Marcos.

- Ah, é? E ela é gente boa? Não é muito mais velha que você, não?

- Não! Ela tem quinze anos.

- Nossa! Aquela garota tem só quinze anos? No comercial parece ter dezessete, dezoito.

- Ela engana, né? Ela é muito linda! – Luciano disse, animado.

- Mas nenhum dos dois estava na idade certa, disse Marcos. – Eu fiz um cara de dezessete, dezoito também. Éramos só personagens ali. O maquiador que se vire pra reconstruir a gente. Na época eu estava até com a barba crescida e tive que tirar; ela tinha o cabelo mais comprido e liso, teve que cortar e cachear pra entrar no personagem...

- Vocês estavam muito bem, os dois, filho, Rosana disse. - Por que não deixou a barba crescer de novo?

- Não gosto. Prefiro o rosto limpo.

- O Marcos é todo do contra, disse Luciano. – Nunca vi cara que é assediado por tudo quanto é gata de São Paulo e quando ligam pra cá, ele pede pra dizer que não mora aqui.

- Sério, filho? – perguntou Rosana.

- Questão apenas de querer ter paz, Luciano. Eu já te expliquei. Se você não quer entender, paciência.

- Por que fez o comercial então?

- Já expliquei também: foi só pelo dinheiro.

- Tudo bem, mas devia só curtir mais um pouquinho.

- Eu acho que eu entendo o Marcos. Esse tipo de garota que liga pra casa de um rapaz que nem conhece direito, só quer uma coisa. Fazem o mesmo com você também, moleque. Eu é que barro todas e mando todas elas procuram o que fazer. Com meu, bebê, não!

Marcos e Luciano riram. Luciano beijou a mãe.

AMOR – ROSANA – PARTE 7

DEUS NOS ABENÇOE A TODOS NÓS!

OBRIGADA PELA COMPANHIA!

ALIMENTEM A ALMA DE PAZ

E HAVERÁ SAÚDE PARA TODOS!

PAZ E LUZ

            
            

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