A Princesa em Fuga
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Capítulo 5 Aquele no telhado do palácio - Parte 2

- É tão bom saber que meus filhos se dão bem. – Disse uma voz grossa e rouca, que pertencia ao rei Anthony, em um tom muito irônico.

Ele falou, aparecendo pelo mesmo corredor que seus irmãos surgiram. Harriet se levantou na mesma hora, não sabia porque, mas estava se preparando para o esporro.

- Como soube onde eu estava? – Harriet perguntou.

- Ah querida. Antes desse quarto ser seu, eu dormia nele. – Ele encarou sua filha nos olhos. – Acha mesmo que um homem não conhece seu próprio castelo? Ou seus filhos?

Harriet sorriu para ele, mas logo em seguida o desmanchou, e perdeu sua postura.

- Você... ér... contou para...

- Sua mãe? – Ele adivinhou erguendo as sobrancelhas. – Claro que não. Deus sabe o quanto amo aquela mulher, mas ela pode ter um gênio forte as vezes.

- Às vezes? – Harriet perguntou.

- Quase sempre. – O pai corrigiu. – Muito parecido com uma jovem que eu conheço.

Ele ergueu as sobrancelhas para a filha, que ruborizou um pouco com o comentário do pai. Ele se virou para os outros filhos.

- Vocês podem me dar um minuto com sua irmã?

Harry logo assentiu e se prontificou a sair, porém Hannah continuou no mesmo lugar. Ela olhou desconfiada para o pai.

- Você vai brigar com ela se eu sair.

Harriet abriu um sorriso. Não podia deixar de admirar como a irmã era leal a ela.

- Está tudo bem, Hannah. Pode ir.

Ela se levantou, e foi andando sem tirar os olhos do pai. Quando chegou a porta, parou.

- E o que eu falo para mamãe?

- Céus. Se a ver, fuja como o diabo foge da cruz. - O rei falou, com uma risada. - Mas não diga onde estamos.

- Eu não ousaria. Nem sob tortura. - Hannah disse com uma expressão de cumplicidade.

Então ela saiu saltitando com Harry logo atrás.

- Enfim sós. – O pai disse.

- Enfim, o castigo.

- Acha que vou lhe castigar?

- Acho que sim.

- Eu, com certeza, deveria castigar você. Como rei, tenho que deixar claro a futura governante do meu país que você agiu muito mal hoje. – Ele fez uma pausa, analisando a filha. Sua voz saia grave, e com um claro tom de advertência, a fazendo encolher a cada palavra. – Por mais que eu odeie dizer isso, você não deveria ter causado toda aquela confusão, nem incentivado o seu irmão a agredi-lo de alguma forma. Não deveria ter gritado daquele jeito, nem fugido de uma proposta de casamento. – Abri a boca para contraria-lo, mas seu olhar me fez parar. – Você não tem direito de explodir do jeito que fez com sua mãe, ou melhor, com a soberana de seu país. Não podia ter falado aquelas coisas, muito menos ter jogado aquela tiara longe. E me preocupa as coisas que eu escutei sair de sua boca hoje, por mais que eu já tivesse conhecimento delas.

Harriet já não encarava mais o seu pai. Não conseguia. Tudo em sua postura e tom de voz indicavam a decepção que ele tinha dela. E isso a dava mais medo do que se ele tivesse com raiva.

- Olhe para mim. – Ele vociferou.

Ela obedeceu.

Ele, igual a ela e Harry, tinha os olhos azuis escuros. E apesar de seus cabelos serem loiros iguais aos da Hannah, a primogênita se parecia muito mais com ele do que os outros filhos.

- Como seu rei. – Ele sussurrou. – Estou muito, muito decepcionado com você. – Anthony soltou um grande suspiro. – Mas como seu pai, devo-lhe perguntar. Harriet, você tem algo que queira me dizer?

Sim, ela tinha. Muitas coisas se passavam por sua cabeça, mas nenhuma delas pareceu certas a se dizer naquele momento.

- Eu sinto muito. Não queria ter jogado a tiara longe, nem falado aquelas coisas sobre nosso título e...

Seu pai balançou a cabeça e se aproximou da filha e a abraçou.

- Eu não me importo com coroas e títulos. Eu me importo com minha filha. Harriet, me conte a verdade.

- Papai, eu não sei se quero ser rainha. – Ela confessou, fechando os olhos com força, querendo somente aproveitar o conforto dos braços do pai. – Eu detesto todas as regras que vem junto, detesto as etiquetas que tem que ser seguidas e não poder dizer o que realmente penso.

- Posso te contar algo? – Ela confirmou com a cabeça. – Eu também.

Ela se afastou do pai para que conseguisse olha-lo.

- Mas você sempre me pareceu tão centrado.

- Anos de prática e muita paciência surte esse efeito. Talvez um dia você também aprenda.

Harriet concordou com a cabeça, sem acreditar muito naquilo.

- Pai, eu queria sair daqui, quero ver o mundo, conhecer pessoas novas, coisas novas. Descobrir como é viver de verdade, fora dessa bolha de joias e bailes. Isso é o que eu realmente quero.

- E planeja desistir da coroa para conseguir liberdade?

A pergunta dele não tinha nenhuma acusação, e sim real curiosidade pela escolha da filha.

Harriet pensou sobre isso. Não sabia se estava pronta para abrir mão de fato da sua vida como princesa. Sim, viver sob constantes olhares era cansativo. E não poder sair do castelo, enlouquecedor. Obviamente ia a muitos bailes, onde sempre via as mesmas pessoas, e dançava as mesmas músicas.

Talvez se ela pudesse ter somente um gostinho...

- Não estou pronta para abrir mão do trono, se é o que pergunta. Mas não vejo porque não posso ter novas experiências.

Seu pai abriu um grande sorriso.

- Falou como uma princesa.

- É isso que sou, não é?

- Com certeza. Mas me conte, o que tem em mente?

- Bem... – Ela começou nervosa, porque não tinha nada em mente, não de verdade. – Jovens da minha idade costumam ir para a faculdade. Por que eu não posso ir?

Seu pai pareceu ponderar a ideia.

- Talvez, posso fazer um arranjo, se fizer um curso que lhe integre na sua vida como rainha... A Universidade de Aston não fica tão longe, pode ir e voltar...

- Não, pai, você não entendeu. – Ela soltou um suspiro nervoso. – Eu quero ir para um lugar longe, onde ninguém saiba quem eu sou, onde não vão fazer as coisas por mim só por eu ser a princesa. Um lugar novo, que eu não conheça.

Por um minuto inteiro, seu pai se manteve com a boca aberta, mas sem sair nada dela. Harriet se preocupou, talvez tivesse dado ao seu pai um aneurisma ou algo do tipo.

Então ele levantou as sobrancelhas, até que se juntasse a linha do cabelo.

- Você quer ir para longe. – Ele afirmou, mas Harriet achou que talvez aquilo fosse uma pergunta.

- Exatamente.

- Eu... Você... Outro país...

- Papai?

Ele passou longos minutos em silencio, parecendo ponderar sobre o que a filha tinha acabado de falar.

- Você não pode estar falando sério. – Ele falou, sem perder a postura, ou elevar a voz.. – Não mesmo. Minha filha, herdeira do meu país, e de uma riqueza incontável, sozinha em outro país. Sem ao menos eu estar por perto para olhar. E quanto suas a suas aulas?

- Para ser justa, eu vou estar tento aulas lá.

- E suas obrigações?!

- O país sobreviveu um milénio sem a minha existência. Creio que pode sobreviver mais uns três anos.

- Três anos? - Ele arregalou os olhos.

Ela deu um passo para trás, mas não queria ficar muito distante de seu pai, tinha medo que ele desmaiasse a qualquer momento. Ele passou as mãos pelo cabelo, quase os arrancando no processo.

- Harriet, isso é... bem... eu não sei o que é. Fazer isso seria muito mais complicado do que você pensa.

- Eu sei que vai ser difícil me levar para outro país e manter minha segurança, mas...

- O problema não é esse, Harriet. - Anthony falou, mostrando rugas de preocupação pela primeira vez. - Você sabe tão bem quanto eu que existem protestos querendo que você saia do trono, sem contar os parlamentares, a câmara dos lordes, muitos são tradicionalistas.

Harriet estava ciente de alguns protestos pelo país, e que alguns nobres importantes não queriam ela no trono, achavam que ela tinha roubado o lugar que pertencia a seu irmão por direito. Mas não via como o afastamento dela poderia afetar em algo, já odiavam ela de qualquer forma.

- Eu sei, mas a situação não pode piorar, não é? E se eu me tornar rainha, essa vai ser minha ultima oportunidade de ver o mundo, eu tenho menos de um ano antes de atingir a idade para assumir a coroa, papai.

- Você tem um pouco de razão. - Ele respondeu, hesitante. - Eu preciso de um tempo para pensar, tudo bem?

Os olhos da garota brilharam de felicidade. Ela não esperava que ele fosse sequer considerar a ideia. Acreditava que no minuto que lhe contasse, ele a mandaria ir para o seu quarto, e não voltaria mais falar no assunto. Ele pensar um pouco, já era uma vitória.

- Tudo bem, papai, leve o tempo que quiser. – Ela falou, sem querer pressiona-lo.

- E vou ter que contar isso para sua mãe.

- Eu imaginei. – Ela disse, um pouco menos animada.

Ele começou a sair do telhado, ainda em choque.

- Papai! – Ela disse, assim que ele chegou no corredor. – E o casamento?

- Não se preocupe com isso agora, Harriet. Eu vou analisar a situação.

Ela concordou com a cabeça, impassível. Ele se virou e foi embora, finalmente. Assim que sumiu de vista, Harriet deu pulinhos de felicidade. Ia convencer seu pai de deixa-la ir.

Tinha certeza disso.

Ia conseguir, ou não se chamava Harriet Russel Spencer.

            
            

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