/0/2502/coverbig.jpg?v=5f65001e15d11edf5226b5f2fadf180b)
James foi para suas aulas no dia seguinte como se nada tivesse ocorrido. Andava a frente de seu grupo de amigos, com Benjamin ao seu lado. Ao chegarem ao prédio de ciências, viu que a multidão já tinha se reunido. Todos cochichavam, e pareciam abismados com o que estavam vendo. Ao verem os príncipes se aproximando, todos se afastaram para dar espaço a eles e ao seu grupo.
Na frente do prédio de ciências, no chão, havia um enorme mural. Era um mural de James, em cima de um trono, com uma coroa de rei. Porém seus trajes eram os mesmos de um bobo da corte. Benjamin estava ao seu lado, usando uma coroa de prata, com as mesmas roupas. Eles pareciam estar dando uma ordem para um pequeno grupo de súditos. Os súditos todos usavam os chapéus de bobo da corte, e todos pareciam fazer algum tipo de espetáculo para a realeza. Alguns faziam malabarismo, outros estavam em um monociclo usando nariz de palhaço e outros tinham instrumentos.
Em cima de tudo, havia uma enorme placa, que dizia: "Bem vindo a corte dos bobos".
James estalou a língua, enquanto observa a pintura que ele e seus amigos haviam feito na noite anterior. Sentiu que tinham vários olhos em cima deles, mas fingiu que não percebia. Ele passou um bom tempo encarando a figura, antes de inclinar a cabeça para o lado.
- Que pena, erraram as cores de nossos olhos. - James falou, apontando para a figura dele e de Ben.
Benjamin abriu um sorriso conspiratório para ele. As cores não estavam erradas, exceto que os olhos dos dois estavam bem mais escuros do que realmente eram. James levantou a cabeça, encontrando Ashley do outro lado da multidão. Ela lhe lançava um olhar de completo desprezo, enquanto balançava a cabeça. Um dos coordenadores da faculdade chegou no pequeno grupo, se desculpando aos príncipes e dizendo que iam descobrir quem realmente havia feito aquilo. James nada respondeu, viu Ashley sumir na multidão e entrar no prédio, e foi só quando a porta fechou atrás dela, que ele se virou para o coordenador com um sorriso no rosto.
- Não precisa se preocupar. Tenho certeza que isso não passa de uma brincadeira. - James disse, se virando para o seu irmão. - Não ficamos ofendidos, certo?
- Claro que não. Inclusive me desenharam até mais bonito do que realmente sou. É uma honra. - Benjamin comentou.
- Agora, se nos dá licença, estamos um pouco atrasados para nossa aula.
Os meninos passaram pelo coordenador, passando por cima do mural que haviam desenhado, e entrado no prédio. Chegaram na sala junto com os outros alunos, vendo que somente Ashley havia chego na hora, e esperava o professor abrir a sala. Assim que a porta foi aberta, e eles entraram, James tentou não olhar para Ashley, mas não conseguiu evitar.
Ela lhe lançou um olhar estranho, mas foi em direção a sua mesa. As mesas da sala de laboratório, tinha um compartimento por baixo do tampo. Um que Ashley abriu assim que se sentou, e foi nesse momento, que a bomba de tinta explodiu e a ensopou.
A garota se levantou, com o rosto coberto de tinta verde, sua roupa, seu cabelo, nada tinha sido poupado. Um grito de raiva rompeu de sua garganta. Houve um pequeno tumulto, enquanto alguns alunos comentavam sobre o que aconteceu, e o professor ia até a menina. Mas ela recusou sua ajuda e marchou com raiva até James, se aproximando para que somente ele pudesse ouvir o que ela tinha a dizer.
- Você vai pagar caro por isso! - Ela falou, entredentes. - Eu vou fazer você pagar.
- Por favor. Eu a desafio. - James falou, repetindo as palavras que a menina disse na noite anterior.
Ela saiu da sala, deixando um rastro de fúria por trás. Mas James não conseguiu deixar de abrir um sorriso.
--------------------------------------
Ashley realmente tinha feito algo. E James tinha que admitir que por essa ele não esperava. O príncipe estava sentado no escritório de seu pai, girando na cadeira, enquanto aguardava o rei.
Ele voltava para o palácio todos os dias depois das aulas, para trabalhar junto com o seu pai. Mas nesse dia, em específico, o rei o chamou ao seu escritório. Ele soube o que aconteceu na faculdade, e havia pedido para que James fosse imediatamente ao seu escritório. Ashley havia o dedurado.
- Devo dizer, estou muito decepcionado. - Rei William disse, ao entrar no escritório, e se sentar em sua cadeira. - Pichar a faculdade? Jogar tinta na filha do barão Lester? Além de tudo, influenciou o seu irmão a participar desse espetáculo também! Isso são atos de um moleque, não do futuro rei.
- Talvez seja isso que eu sou. Só um moleque. - James murmurou.
- Não teste minha paciência! Eu te treinei desde os três anos de idade com tudo o que um rei deveria saber! Você teve aulas de boas maneiras, de política, de línguas, de equitação, esgrima, e tudo o que eu poderia te dar. Você vai ser o próximo rei! Deveria dar exemplos aos seus irmãos, e não incentiva-los a cometer vandalismo!
- Mas...
- E Lady Ashley está furiosa. Ela foi humilhada na frente de todo mundo! Você vai pedir desculpas a ela, e a faculdade, e vai prometer limpar tudo. Vai agir como eles esperam que um príncipe herdeiro deveria agir!
Percebendo que não teria como discutir com seu pai, James se encolheu na cadeira, soltando um suspiro.
- Sim, senhor. - Ele falou, contrariado.
- Espero que você veja que estou fazendo isso pelo seu próprio bem. - William falou, parecendo cansado. - Você já tem vinte anos, James, não é mais uma criança, tem que agir como um adulto responsável. Tem que arcar com suas responsabilidades, com sua coroa, com seu povo, com seus irmãos.
James simplesmente engoliu em seco, e acenou com a cabeça. Conhecia aquele discurso de cor. Ele deveria ser o melhor em tudo. O melhor príncipe, o melhor irmão, o melhor aluno. Deveria falar várias línguas, pintar, tocar, esgrimar, cavalgar e dançar com perfeição. Deveria fazer tudo isso com um sorriso no rosto, sem pestanejar. Não deveria se deixar levar, não deveria ir a festas e beber. Deveria cuidar de seus irmãos, de seu país.
E não é que James odiasse tudo aquilo. Mas simplesmente parecia muito peso para um jovem de vinte anos carregar, parecia muito peso para ele carregar. James não era perfeito como todos esperavam que fosse, mas ninguém conseguia ver isso além dele.
Ele não tinha certeza se podia subir ao trono e fazer tudo que seu pai fazia.
Mas ao menos, ele conseguia fingir com perfeição.
- Eu vou arcar com as consequências amanhã. - James falou, erguendo a cabeça. - Se não se importar, eu preciso trabalhar.
- Sim, claro. - William falou, deixando seu filho se levantar. Quando James estava na porta, o rei se lembrou de algo. - Espere, James. Será que você poderia ficar no palácio essa noite, e tomar conta de seus irmãos? Conde Theodore está dando um baile, e convidou eu e sua mãe, vamos passar boa parte da noite fora. E você sabe como Aubrey é, ela fica tensa de deixar as crianças só com os criados, fica preocupada...
- Não se preocupe, eu cuido deles. - James falou, abrindo um sorriso fraco. - Faça tudo o que precisar.
James mal se importou, já estava acostumado com o peso das responsabilidades de qualquer forma.
-------------------------------------------------------
- Vossa Alteza, tem mais um lorde querendo uma reunião com você, é sobre alguns problemas nas terras... - O mensageiro real dizia, lendo algo escrito em um pequeno pedaço de papel.
- Isso é ridículo. - James falou, sem conseguir se conter. - Já são onze horas da noite.
O príncipe tinha passado o dia todo em seu próprio escritório, tinha feito seu trabalho, e assim que seu pai saiu, assumiu o trabalho dele também. Porém parecia que houve um problema com alguns lordes que compartilhavam fronteiras de suas terras, e todos queriam falar com o príncipe e resolver os problemas. O príncipe ouviu, um a um, e conseguiu fazer um acordo entre eles. Mas naquele meio tempo, apareceram mais pessoas, com mais problemas, o que consumiu muito tempo de James.
Ele não tinha se levantado daquela cadeira desde a conversa com seu pai, não tinha tido nenhuma refeição desde o café da manhã. E só se lembrou de beber água porque os criados haviam trago para ele.
Ele estava cansado, com fome, e sua cabeça parecia dar voltas. Já estava ficando difícil de pensar, e encantar as pessoas que apareciam para pedir ajuda a ele.
- Mas, Alteza, eu devo insistir...
- Sinto muito. - James falou, se levantando, tentando manter a postura que esperam de um rei. - Diga a ele que peço desculpas, que irei enviar presentes para recompensar a minha falta hoje, e irei atende-lo assim que o sol raiar.
- Se é o que deseja, Alteza. - O mensageiro falou, antes de fazer uma reverencia e sair da sala.
Antes que mais alguém pudesse pedir mais alguma coisa do príncipe, ele saiu de seu escritório, e entrou na primeira sala que viu. Sua intenção era se esconder, mas percebeu tarde demais que havia alguém na sala.
Por um segundo ele planejou sair e fingir que nunca tinha entrado. Mas foi quando ele reparou que uma das gêmeas tocava o piano. Exceto que ela tocava de um jeito raivoso, e era possível ver a tensão em seus ombros. Ele não conseguiu reconhecer quem era. Aquilo provavelmente era horrível, mas ninguém conseguia diferenciar Julie e Charlie. Pelo menos não pela aparência, até porque, elas faziam questão de vestir as mesmas roupas, só mudando a cor. Diferente dos trigêmeos, que era possível diferenciar de longe, só mesmo pelo modo de se portar.
James sentiu-se na obrigação de andar até ela e abrir um sorriso.
- Sabe, eu acho que você acabou de misturar três consertos diferentes. - James falou, a fazendo parar de tocar. - E conseguiu estragar todos eles.
- Jura? - Ela perguntou, abrindo um sorriso irônico. - Porque aos meus ouvidos eram como se anjos estivessem tocando.
Julie. Aquela era Julie, James pensou, aquela ironia e humor ácido... Charlie não deixa nada a abalar, ela é tranquila. Simplesmente teria aberto um sorriso, e dado de ombros.
- O que houve para você estar assim? - James perguntou, se sentando ao lado dela.
- Não foi nada. - Ela disse, enquanto brincava com algumas teclas. - É besteira.
- Não é besteira se te deixou assim.
- Você não iria querer ouvir, de qualquer forma. - Ela murmurou.
- Por que não?
- Porque você é o príncipe herdeiro. E sem contar que, é meu irmão mais velho. Não vai gostar muito de saber o que eu fiz.
- Bem, agora mesmo que eu quero saber. - Ele falou, sentindo o corpo ficar todo tenso.
Ela revirou os olhos, fechando as teclas do piano e apoiando os braços ali. Ela brincava com um anel em seu dedo, e fazia de tudo para não encarar seu irmão.
- Se eu contar, você promete não ficar irritado?
- Não sei se posso prometer isso.
- Só prometa que não vai enlouquecer, gritar comigo, ou com qualquer outra pessoa?
- Está bem, como quiser, Sua Alteza. Eu prometo. O que foi que aconteceu?
- Sabe como o lorde Anton estava me cortejando? - Ela perguntou, depois de soltar um longo suspiro. James somente concordou com a cabeça, sentindo um gosto amargo na sua boca. - Então, nós estávamos conversando e passeando pelo jardim quando ele me beijou...
- Não posso dizer que gosto, particularmente, dessa parte. - James comentou, franzindo as sobrancelhas. - Mas ainda não entendi o porquê não deveria enlouquecer.
- É que... bem.... nós passamos um bom tempo nos beijando e...
- Poupe-me dos detalhes. Por favor.
- Um pouco antes do jantar, eu o ouvi conversando com os amigos. Sobre como ele planeja seduzir Charlie, porque eu era muito atirada. E como ela deveria ser mais delicada, como uma princesa deveria ser.
James abriu a boca e fechou. A raiva tomava conta dele naquele momento, e somente não disse nada porque havia prometido que não ia gritar. Então ele simplesmente se colocou de pé e começou a andar para fora da sala. Julie franziu as sobrancelhas, mas em um pulo, ela colocou-se na frente dele.
- O que você vai fazer? - Ela perguntou. - Nós estávamos conversando e...
- Vou matá-lo. - James disse, como um rugido. - Com minhas próprias mãos. Vou matá-lo.
- Você me prometeu que não ia enlouquecer, ou gritar. - Julie disse, apontando na direção de James.
- Não disse nada sobre não dar um soco na cara presunçosa dele.
- Por isso eu não queria contar a você! - Julie praticamente gritou. - Quer saber? Vai em frente! Faça o que quiser!
Julie se jogou em uma das poltronas mais próximas, puxando suas pernas e as abraçando. Aquilo não era típico dela. Ela parecia tão vulnerável. Julie era sarcástica e arrogante, ela sempre mantinha a pose, mesmo entre família, nunca se deixava abalar.
Mas ali, sentada, ela parecia pequena. Frágil.
James retirou o lorde Anton da cabeça, poderia lidar com ele depois, de alguma forma mais racional. Naquele momento, ele se ajoelhou na frente de Julie e a olhou intensamente. Seus olhos verdes estavam cheios de lágrimas, e ela tentava fazer com que os cabelos loiros escondessem isso, mas era impossível.
- Escute, você merece algo bem melhor do que o lorde Anton. - James disse, pegando a mão dela e apertando gentilmente.
- Eu não estou chateada por causa disso. Bem, estou um pouco, porque ele me fez de idiota. - Ela falou, levantando a cabeça só um pouquinho. - Foi o que ele disse, sobre eu ser atirada. E uma princesa ter que ser delicada. E se ele tiver razão?
- Oh! - James não conseguiu conter a surpresa. - Você não tem que ser delicada para ser uma princesa. Não enquanto você tem outras qualidades muito maiores. Julie, você é forte, é determinada. Não deveria se abalar por isso.
- É fácil você dizer. Charlie é delicada. Ela não teria ficado abalada com isso, ela teria dado de ombros, e talvez até rido da situação.
- E talvez ela também ficaria pensando em como você teria lidado melhor com a situação. - James abriu um leve sorriso, enquanto se levantava. - Você sabe, a Julie que eu conheço, não teria vindo se esconder. Teria andado até ele, teria o ameaçado com um humor ácido, e feito várias piadas irônicas.
- Você tem razão. - Julie disse, secando as lágrimas. - Eu estou sendo uma boba.
- Não, se tem uma coisa que você não é, é boba.
- Obrigada, James.
Antes que ele pudesse dizer que mesmo assim iria atrás de Anton e acabaria com a raça dele. A porta foi aberta, e uma pessoa pequena entrou correndo, parando ao lado de James, e puxando o paletó dele. James olhou para baixo para encontrar o pequeno Liam, abraçado com um ursinho de pelúcia.
O menino estava de pijamas, o cabelo preto todo bagunçado, e os olhos vermelhos de tanto chorar. Ainda tinha um beicinho em seu rosto.
- O que houve, Liam? - Foi Julie que perguntou, bondosamente, parecendo levemente preocupada.
- Eu tive um pesadelo. - Liam respondeu baixinho, encarando James. - Me disseram que mamãe não estava aqui. Você tem que vir, e expulsar os monstros.
- Que monstros, Liam? - James perguntou, vendo o menino puxar o paletó dele, tentando leva-lo na direção da porta.
- Que estão no meu quarto! Eu os ouvi!
- Mamãe sempre vai até o quarto dele, quando ele tem um pesadelo, e conta uma história, até ele dormir. - Julie disse, dando de ombros.
- Eu sei o que ela faz. - James retrucou, revirando os olhos. - Eu mesmo já fiquei com ele algumas vezes. Vamos, Liam, vou te levar de volta para a cama.
Liam concordou com a cabeça, mas apesar de James começar a andar, os olhinhos dele grudaram em Julie, que estava chorando alguns minutos atrás. Ele andou até ela, inclinando sua cabeça para o lado.
- Você também teve um pesadelo? - Ele perguntou.
- Algo do tipo. - Julie respondeu, abrindo um sorriso fraco.
- Então toma. - Ele falou, dando o ursinho para Julie. - Mamãe disse que se você abraçar ele forte, os pesadelos vão embora.
Julie aceitou o ursinho, com um sorriso genuíno no rosto dessa vez. Ela se abaixou, e deu um beijo no topo da cabeça dele.
- Muito obrigada. - Ela sussurrou. - Você é o irmãozinho mais fofo que eu tenho.
Ele abriu um largo sorriso, antes de correr na direção de James e dar a mão para ele.
James levou seu irmão de volta ao seu quarto, pensando que assim que fizesse o pequeno Liam dormir, ele enfim, poderia descansar um pouco.